Discurso no Senado Federal

LANÇAMENTO DO NUMERO INAUGURAL DA PUBLICAÇÃO 'CEARA MULHER', PELA FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PLANEJAMENTO DO CEARA, CUJAS INFORMAÇÕES CONTRIBUIRÃO PARA O APROFUNDAMENTO DAS DISCUSSÕES RELATIVAS AOS DIVERSOS ASPECTOS DA DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER. PESQUISA NACIONAL POR AMOSTRA DE DOMICILIO (PNAD) DE 1995, QUE APRESENTOU DADOS SOBRE A CONDIÇÃO SOCIO-ECONOMICA DA MULHER, DESTACANDO AS QUESTÕES RELACIONADAS A SAUDE E MORBI-MORTALIDADE, A SUA PARTICIPAÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO E NA POLITICA, SEU GRAU DE INSTRUÇÃO E A VIOLENCIA DE QUE E VITIMA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • LANÇAMENTO DO NUMERO INAUGURAL DA PUBLICAÇÃO 'CEARA MULHER', PELA FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PLANEJAMENTO DO CEARA, CUJAS INFORMAÇÕES CONTRIBUIRÃO PARA O APROFUNDAMENTO DAS DISCUSSÕES RELATIVAS AOS DIVERSOS ASPECTOS DA DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER. PESQUISA NACIONAL POR AMOSTRA DE DOMICILIO (PNAD) DE 1995, QUE APRESENTOU DADOS SOBRE A CONDIÇÃO SOCIO-ECONOMICA DA MULHER, DESTACANDO AS QUESTÕES RELACIONADAS A SAUDE E MORBI-MORTALIDADE, A SUA PARTICIPAÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO E NA POLITICA, SEU GRAU DE INSTRUÇÃO E A VIOLENCIA DE QUE E VITIMA.
Publicação
Publicação no DSF de 03/04/1997 - Página 6933
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • LANÇAMENTO, PUBLICAÇÃO, INICIATIVA, FUNDAÇÃO, PLANEJAMENTO, ESTADO DO CEARA (CE), CONTRIBUIÇÃO, DISCUSSÃO, PROBLEMA, DISCRIMINAÇÃO, MULHER.
  • ANALISE, PESQUISA, COMPROVAÇÃO, SUPERIORIDADE, NUMERO, MULHER, COMPARAÇÃO, HOMEM, REDUÇÃO, NIVEL, FERTILIDADE, INFERIORIDADE, REMUNERAÇÃO, TRABALHO, ANALFABETISMO, VIOLENCIA, ESTADO DO CEARA (CE).

              O SR. LUCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Fundação Instituto de Planejamento do Ceará -- IPLANCE, vinculada à Secretaria do Planejamento e Coordenação do Estado do Ceará -- SEPLAN, acaba de lançar o número inaugural da publicação Ceará Mulher, com o apoio, entre outras instituições, do Fundo de População das Nações Unidas e do Conselho Cearense dos Direitos da Mulher.

              A publicação vem preencher uma lacuna historicamente enfrentada pelos órgãos responsáveis pela tomada de decisão e a formulação de políticas públicas, qual seja, a carência de dados estatísticos que possam subsidiar o planejamento das ações públicas, particularmente em relação a este segmento populacional que tem sido alvo de discriminação e esquecimento: as mulheres.

              Ao traçar o perfil da mulher cearense nas diversas vertentes e atividades da sociedade, Ceará Mulher cumpre tarefa de singular importância, fornecendo informações que contribuem para o aprofundamento das discussões quanto a diversos aspectos nos quais a discriminação contra a mulher se faz sentir de forma mais ostensiva. Nesse sentido, destacam-se os cuidados com a saúde, educação, segurança e redução de disparidade entre os sexos, temas da maior importância, sobretudo em países com o nosso atual grau de pobreza.

              Nos últimos quarenta anos, o Ceará apresenta uma proporção de mulheres superior a de homens em sua população, e os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) de 1995 confirmam essa tendência: 48% da população é masculina e 52% é feminina, ou seja, 3.247.971 homens e 3.486.055 mulheres. Entretanto, conforme a publicação demonstra, as mulheres apresentam condições sociais e econômicas inferiores às dos homens.

              Em relação aos aspectos da saúde e morbi-mortalidade feminina, o estudo demonstra que a atenção à saúde tem se concentrado, tradicionalmente, na importância do papel reprodutivo-materno, diminuindo a atenção e a ponderação quanto às outras necessidades e riscos que estão ligados aos vários papéis que a mulher desempenha nas diferentes etapas de sua vida. No que se refere à queda na fecundidade, essa tem sido um fenômeno bastante recente na dinâmica demográfica do Estado do Ceará, que em várias décadas caracterizou-se por níveis elevados de fecundidade. Em 1970, a taxa de fecundidade total era de 7,5 filhos por mulher. A partir daí, iniciou-se uma acentuada queda, chegando a 6,6 filhos por mulher em 1980 e 3,5 filhos por mulher em 1991. Ressalte-se que a média nacional estimada é de 2,9 filhos por mulher, mostrando que ainda há diferencial considerável entre o Ceará e o Brasil.

              Em relação ao mercado de trabalho, os números confirmam que as mulheres ocupam postos hierarquicamente inferiores, percebendo, conseqüentemente, menores remunerações. As mulheres que ganhavam até meio salário mínimo, em 1990, totalizavam 40,92%, enquanto para os homens esse percentual foi apenas de 13,48%. Nas faixas de rendimento de 5 a 10 salários mínimos, os homens alcançaram o percentual de 3,67% e as mulheres de 2,54%. Com os melhores salários, acima de 10 salários mínimos, estavam 3,1% dos homens e 1,9% das mulheres. À medida que a classe de rendimento mensal aumenta, o percentual de mulheres diminui. Esse comportamento é semelhante nas áreas urbanas e rurais do Estado. Contudo, a atuação da mulher como chefe de família, por sua vez, aumentou em 34,6% nos últimos cinco anos. Registre-se que, mesmo com todos os avanços alcançados pela mulher a partir do seu ingresso no processo produtivo, ainda existe um longo caminho a percorrer para que logre o reconhecimento pelo seu trabalho.

              No âmbito da política, embora sejam a maioria do eleitorado, as estatísticas revelam que as mulheres não conseguem sobressair-se numericamente na conquista de cargos legislativos. Da mesma forma, constata-se pouca representatividade feminina no exercício de cargos do Poder Judiciário no Ceará. A situação da mulher cearense na vida política assemelha-se ao quadro nacional, haja vista que na eleição de 1994, das 46 cadeiras da Assembléia Legislativa cearense, apenas duas foram preenchidas por mulheres. Quanto às eleições de 1996 para prefeitos e vereadores, o Ceará registrou 52 mulheres candidatas a prefeita, das quais 16 conseguiram eleger-se. O ingresso de mulheres no Poder Judiciário é ainda de menor significância, pois é rara a aprovação desse segmento populacional para a magistratura. No Ceará existem 21 desembargadores e apenas uma é do sexo feminino. Já o Ministério Público do Estado conta com 266 membros ativos, sendo 115 mulheres.

              O trabalho registra 309 mulheres cearenses, cadastradas, que desenvolvem atividades artísticas, destacando-se aquelas envolvidas com literatura, televisão, música, dança, cujo reconhecimento público ultrapassa os limites territoriais do Estado. No caso específico das atividades culturais, talvez os números não expressem o enorme potencial feminino nesse contexto.

              Quanto à Educação, a PNAD de 1995 registra que entre as mulheres cearenses de 15 anos ou mais 21% são analfabetas, sendo 16% nas áreas urbanas e 30% nas áreas rurais. Embora essa situação seja desfavorável para as mulheres, o estudo constata que, relativamente aos homens, elas se posicionaram em níveis de instrução mais elevados, tendo em vista que as mulheres em idade ativa superam os homens a partir de 2 anos de estudo. Nas áreas urbanas, o nível de instrução dos homens é inferior ao das mulheres, sobretudo em faixas maiores de anos de estudo. A proporção de mulheres com 12 anos ou mais de estudo é bastante superior à de homens, visto que apenas 5.678 homens atingiram esse perfil educacional, enquanto 29.145 mulheres o fizeram. É extremamente relevante essa mudança, uma vez que, como sabemos, a variável educação é fator determinante que favorece mudanças de atitude, possibilitando o rompimento das relações de gênero que produzem uma discriminação e conseqüente distribuição desigual das oportunidades, no trabalho, na vida política e na vida sexual e reprodutiva da mulher.

              O derradeiro aspecto do estudo aborda a violência contra a mulher, admitindo que a escassez de dados relativos ao tema comprova que, até pouco tempo, as autoridades não se haviam conscientizado desse problema. Segundo a análise, somente a partir da criação das delegacias de apoio à mulher, em 1986, os registros de tais ocorrências passaram a ser confiáveis. Os dados mostram que, nos anos de 1994, 1995 e 1996 (até agosto), o número de mulheres agredidas e vítimas de ameaça de morte foram, respectivamente, 3.620, 5.048 e 4.480. Dados também alarmantes dizem respeito aos assassinatos de duzentas mulheres no período 1993-96. No que se refere a mulheres estupradas, o número de ocorrências vem aumentando, haja vista que, em 1994, houve 381 denúncias, enquanto em 1995 foram registrados 421 casos, conforme boletim do Instituto Médico de Fortaleza. Os dados de violência dizem respeito somente ao município de Fortaleza, ficando o resto do Estado a descoberto, por falta de informações fidedignas. O documento relaciona, ainda, diversas instituições direcionadas à questão feminina, apresentando uma súmula de suas linhas de ação e fornecendo seus endereços.

              Presumo, Srªs e Srs. Senadores, que alguns de V. Exªs poderão indagar o sentido de tal estudo restringir-se ao universo feminino, uma vez que os problemas abordados atingem toda a população brasileira. Nesse sentido, permitam-me considerar que tal exclusividade vem, na verdade, inscrever-se numa tendência universal recente que é a da "discriminação positiva", que pode ser brevemente conceituada como a implementação de ações destinadas a compensar uma discriminação passada que se apresenta como uma violação dos direitos de uma minoria.

              Na verdade, quando se trata exatamente de uma "diferenciação positiva", o Estado deve corrigir as diferenças materiais entre os cidadãos atribuindo-lhes diferenças de tratamento jurídico que conduzam à igualdade de oportunidades. A "discriminação positiva" traduz-se na adoção de normas jurídicas que prevêem um tratamento distinto para certas pessoas ou categorias de pessoas, com vista a garantir-lhes uma igualdade material em relação aos outros membros da sociedade.

              Certamente, Srªs e Srs. Senadores, não podemos considerar, no mesmo nível de ação a iniciativa de publicação da Ceará Mulher. Podemos, contudo, vê-la como importante subsídio, que poderá fornecer uma inestimável base de dados para a fundamentação das decisões políticas do Estado naquelas situações em que as desigualdades necessitam de medidas compensatórias.

              A grande vantagem, Srªs e Srs. Senadores, de dispor de elementos que orientem a definição de prioridades por parte do Estado é crucial neste momento em que, inegavelmente, cresce a consciência de que o Estado já não pode mais ser o provedor de todas as necessidades. As ações generosas de suprimento incondicional de bem-estar passaram das mãos do Estado para a realidade das leis de mercado e da concorrência.

              Contudo, há distorções históricas que só podem ser minimizadas pela ação mediadora do Estado. É, pois, nesse contexto que se insere a importância da iniciativa Ceará Mulher: empreende um esforço considerável para resgatar as informações até então à mercê da indiferença e da discriminação; restabelece, em tempo, a convicção na importância estratégica da função de planejamento; e, finalmente, enceta louvável atuação no sentido de valorizar a objetividade dos números na pátria da retórica e da grandiloqüência. É uma tarefa de mérito que faz jus ao nosso registro.

              Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/04/1997 - Página 6933