Discurso no Senado Federal

REPUDIANDO AS ATROCIDADES PRATICADAS POR POLICIAIS MILITARES CONTRA CIDADÃOS COMUNS EM DIADEMA, SÃO PAULO.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • REPUDIANDO AS ATROCIDADES PRATICADAS POR POLICIAIS MILITARES CONTRA CIDADÃOS COMUNS EM DIADEMA, SÃO PAULO.
Publicação
Publicação no DSF de 02/04/1997 - Página 6872
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • REPUDIO, VIOLENCIA, POLICIAL MILITAR, HOMICIDIO, TORTURA, CIDADÃO, MUNICIPIO, DIADEMA (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • REGISTRO, FALTA, SEGURANÇA, POPULAÇÃO, NECESSIDADE, MOBILIZAÇÃO, SOCIEDADE, GOVERNO, CONGRESSO NACIONAL, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, JULGAMENTO, CRIME, POLICIA MILITAR, MELHORIA, SELEÇÃO, FORMAÇÃO PROFISSIONAL, POLICIAL.
  • CRITICA, OMISSÃO, IMPUNIDADE, VIOLENCIA, INSUFICIENCIA, SISTEMA PENITENCIARIO, MISERIA, DESEMPREGO, CRIME ORGANIZADO, DROGA.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vários colegas já se manifestaram sobre a cena terrível que a televisão brasileira, a Rede Globo, apresentou ontem.

O povo brasileiro está envergonhado e estarrecido com a barbaridade das imagens mostradas ontem pelo Jornal Nacional. É como se estivéssemos voltando à Idade Média, num momento em que a civilização do nosso planeta está chegando ao alvorecer do Terceiro Milênio. As atrocidades da PM paulista contra cidadãos indefesos são um pequeno retrato deformado de um país pacifista e democrático, mas são as imagens desse fato episódico e instantâneo que estão correndo hoje o mundo, mostrando-nos como uma aldeia de bárbaros de quinto mundo.

Acabei vendo o que jamais esperava ver em toda a minha vida. Extorsão, violência, ódio e execução sumária em plena cidade de São Paulo, uma das maiores metrópoles do mundo e cartão de visitas do nosso desenvolvimento econômico. As mesmas cenas monstruosas foram vistas por crianças, adolescentes, pais e mães de família e pessoas idosas que já vivem sitiadas pelo medo. Com isso, cresce o sentimento geral de impotência contra os bandidos que usam a farda para realizar seu instinto assassino, roubar e transgredir todos os códigos das leis cristãs, das leis morais e das leis sociais. São homens que nós, os contribuintes, estamos pagando para barbarizar segundo seus próprios códigos, porque não temos ainda, neste País, uma legislação rigorosa e completa para se sobrepor às normas protetoras do corporativismo policial. É chegada a hora de uma reação em cadeia de toda a sociedade, e é hora de o Congresso e o Governo cumprirem o seu papel.

Está provado que não basta transferir o julgamento dos crimes das polícias militares para a Justiça Comum. É indispensável cercar com todos os rigores a seleção desses policiais, dotá-los de um mínimo de formação humanística após sua integração aos quartéis, aumentar a responsabilidade dos comandantes para os crimes praticados pelos comandados, implantar ritos sumários de condenação e criar novos mecanismos efetivos de proteção às testemunhas. Há poucos dias, a televisão mostrava a precariedade das instalações de segurança para um cidadão que testemunhou contra crimes de policiais militares no Rio de Janeiro. O mesmo Estado que escolhe mal seus agentes e não pune os seus crimes, não protege a vida daqueles que têm a coragem de denunciar. Até quando essa mistura de impunidade e de omissão vai continuar, Srªs e Srs. Senadores?

Carandiru, Vigário Geral, Candelária, Eldorado de Carajás são referências vivas na memória dos registros mais traumáticos dos tempos recentes de nossa sociedade. São episódios eloqüentes que mostram a face mais promíscua de uma sociedade enferma e impotente. Temos uma Justiça lenta e onerosa; temos um sistema de corrupção policial que a toda hora é desnudado pela imprensa; não temos presídios em número suficiente e nem vocacionados para a recuperação dos presos, a miséria das periferias e o desemprego, que jogam na rua milhões de crianças deserdadas que serão os infratores de logo mais, tragados que são pelo império poderoso do crack e de outras drogas. E convivemos impassíveis com toda essa realidade cruel que nos abastarda perante nós mesmos e perante o mundo.

O que a televisão mostrou ontem fere os brios de uma das maiores nações cristãs do mundo, agride toda uma sociedade organizada sob princípios claros do Direito e traumatiza todo um povo que tem horror à violência. E toda essa obra foi realizada por apenas 10 homens da PM de São Paulo, 10 funcionários públicos que são pagos para proteger a vida. Quantas outras vidas foram ceifadas antes por esses assassinos, e quantas outras pessoas eles mataram depois? Não fosse a coragem providencial de um cinegrafista amador, o País não teria conhecimento daquele festival macabro de tortura e morte. Essa é, infelizmente, a nossa realidade. Só reagimos em estado de choque, como agora. Eles estariam ainda matando e sorrindo, suprimindo vidas de trabalhadores indefesos, com a mesma tranqüilidade com que se decreta o fim da vida de uma mosca.

Até quando, Srªs e Srs. Senadores, segmentos localizados de nossa organização policial continuarão livres para comprometer a imagem de todo o sistema de segurança do País, graças à impunidade que contamina todo o tecido encarregado de proteger o cidadão? Até quando essa mesma polícia fará suas próprias leis, contra as leis de Deus e dos homens? E até quando continuaremos dependendo de novos traumas para reagir?

É o que eu gostaria de saber, Sr. Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/04/1997 - Página 6872