Discurso no Senado Federal

JUSTIFICANDO SUA POSIÇÃO FAVORAVEL A TROCA DO SUPERINTENDENTE DO INCRA NO ACRE, TRATADA EM PRONUNCIAMENTO EM SESSÃO ANTERIOR PELA SENADORA MARINA SILVA. ENCAMINHANDO A MESA REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES AO MINISTRO DA REFORMA AGRARIA, SOLICITANDO TODOS OS PROCESSOS LICITATORIOS, AS CARTAS, AS PROPOSTAS E AS ATAS DAS REUNIÕES DA SUPERINTENDENCIA DO INCRA NO ACRE.

Autor
Flaviano Melo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Flaviano Flávio Baptista de Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • JUSTIFICANDO SUA POSIÇÃO FAVORAVEL A TROCA DO SUPERINTENDENTE DO INCRA NO ACRE, TRATADA EM PRONUNCIAMENTO EM SESSÃO ANTERIOR PELA SENADORA MARINA SILVA. ENCAMINHANDO A MESA REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES AO MINISTRO DA REFORMA AGRARIA, SOLICITANDO TODOS OS PROCESSOS LICITATORIOS, AS CARTAS, AS PROPOSTAS E AS ATAS DAS REUNIÕES DA SUPERINTENDENCIA DO INCRA NO ACRE.
Aparteantes
Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 02/04/1997 - Página 6875
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, POSIÇÃO, ORADOR, APOIO, INDICAÇÃO, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), TROCA, SUPERINTENDENTE, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), ESTADO DO ACRE (AC).
  • REGISTRO, ATUAÇÃO, ORADOR, AMBITO, REFORMA AGRARIA, QUALIDADE, EX GOVERNADOR, ESTADO DO ACRE (AC), CRITICA, GESTÃO, SUPERINTENDENTE, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA).
  • APOIO, DESIGNAÇÃO, JOSUE FERNANDES DE SOUZA, SUPERINTENDENCIA, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), ESTADO DO ACRE (AC), DEFESA, PROJETO, REFORMA AGRARIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB).
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), ESCLARECIMENTOS, ESTATISTICA, FAMILIA, ASSENTAMENTO RURAL, CREDITOS, ESTADO DO ACRE (AC).
  • RESPOSTA, DENUNCIA, ASSUNTO, POLITICA DO MEIO AMBIENTE, ESTADO DO ACRE (AC), OBJETO, DISCURSO, MARINA SILVA, SENADOR.

O SR. FLAVIANO MELO (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, não tenho como hábito trazer à tribuna desta Casa questões paroquiais, administrativas, tais como nomeações de secretários municipais, estaduais e muito menos troca de qualquer cargo indicado pelo PMDB do Acre no Governo Federal.

Entretanto, como estava ausente na quarta-feira, vi no Diário do Senado Federal do dia 27 de março um pronunciamento da Senadora Marina Silva lamentando a troca do Superintendente do Incra no Acre e anexando um plano de trabalho executado por S. Sª, documentos de políticos adversários nossos, da Bancada do PT na Câmara dos Deputados, de sindicatos ligados à CUT e uma série de recortes de jornais adversários que mostram a ira enorme contra minha pessoa em todos esses documentos.

A bem da verdade, gostaria de esclarecer o que de fato se deu, por que se trocou o Superintendente do Incra no Estado do Acre. Em primeiro lugar, é uma troca de rotina porque coube ao PMDB, à Bancada Federal, indicar o Superintendente do Incra no Estado do Acre. A Bancada Federal, com exceção da minha pessoa e do Senador Nabor Júnior, na Câmara Federal foi toda renovada. A indicação ainda é do tempo do ex-Presidente Itamar Franco. E nas eleições de 1994 a Bancada do PMDB na Câmara dos Deputados mudou completamente. O último parlamentar que lá havia era o Deputado Mauri Sérgio, que se elegeu prefeito e assumiu sua suplente. E a Bancada resolveu fazer a mudança.

Eu, particularmente, acompanhei muito de perto toda e qualquer ação no que diz respeito ao Incra, até porque tenho um compromisso com a reforma agrária. Está aí minha vida pública, os trabalhos que realizei pela reforma agrária em meu Estado. Quero aqui relembrar apenas alguns. O melhor projeto de assentamento no Acre é o Projeto Humaitá, no qual os parceleiros realmente hoje estão emancipados, porque, quando Governador do Estado, fiz ali um investimento enorme, coloquei asfalto no acesso desse projeto, asfaltei alguns quilômetros de ramais dentro do projeto, conseguimos, naquela época, distribuir o crédito do Procera à quase totalidade dos produtores rurais, e com isso eles conseguiram a independência. Até escola com segundo grau foi instalada nesse projeto. E assim fizemos em vários projetos de assentamento no Acre, levando escola, educação, saúde. Por isso os projetos mais bem estabelecidos são aqueles nos quais os produtores são mais próximos.

Entretanto, ao acompanhar a atuação do atual superintendente, ele mostra claramente no seu relatório de atividades que, por exemplo, o Movimento Sem-Terra reclama muito de que o Governo Federal está mascarando o número das famílias assentadas. O próprio Incra rebate alegando que, para a instituição, regularização fundiária também é reforma agrária. E um simples fato, no Acre, quero registrar nessa Casa. O projeto extrativista Chico Mendes, também criado no meu Governo, o primeiro projeto extrativista do Brasil e do mundo, é de 1989, e consta lá nesse relatório, do ano de 1996, que há 59 famílias assentadas nesse ano.

Pelo que me consta - e estou fazendo um requerimento ao Ministro da Reforma Agrária sobre essa questão e outras que passarei a falar em seguida -, não há, em momento algum, nenhum seringueiro novo na reserva extrativista Chico Mendes. Quantas vezes lutei, pedi, reivindiquei no sentido de que se fizesse o acesso desse projeto extrativista - o seringal Cachoeira, era reivindicado pelos seringueiros -, e nenhum sinal nos foi dado pelo superintendente da época.

Outra reivindicação que fiz com muita veemência foi a de expandir o crédito Procera para as reservas extrativistas, porque os projetos extrativistas estão lá, foram instalados, mas não melhorou em quase nada a condição de vida das pessoas que residem e que vivem nesses projetos. Portanto, nada mais justo que extinguir o crédito Procera para as reservas extrativistas.

Observando também o quadro de atividades da Superintendência do Acre, vejo que foram assentadas, no ano passado, em 1.141.714 hectares, 2.540 famílias. É bom dizer que temos aqui 32 projetos de assentamentos relacionados. Tive o cuidado de olhar. Apenas oito projetos são áreas novas que somam 110 mil hectares. Então, de 1.141.714, todos, tirando 110 mil hectares, são projetos antigos que já estão para ser emancipados e nos quais, com certeza, pode ter havido uma mudança ou outra, assentado um ou outro, mas não nessa área de 1.141.714, ou seja, a Superintendência do Incra não estava cumprindo as metas.

Como parlamentar, como Senador da Bancada do PMDB do Acre, não posso admitir algo dessa natureza em sua Superintendência, que sempre teve um trabalho reconhecido em todo o Brasil, haja vista que a Superintendente indicada pelo PMDB em 88 já foi, durante muitos anos, Procuradora-Geral do Incra, sem nenhuma injunção política. Hoje, é a Chefe de Gabinete do Ministro da Reforma Agrária. Trata-se de um reconhecimento, no meu entender, do trabalho que a Drª Othília de Mello Sampaio fez dentro do Incra, na Superintendência do Acre. S. Sª é oriunda do Acre. Essas desapropriações, esse projetos, todos, com exceção desses oito, são das décadas de 70 e 80, quando, na realidade, se desapropriou terras no Acre.

Gostaria de deixar registrado nesta Casa que se trata de uma mudança de rotina. O PMDB não concordou com a ineficiência que o Superintendente, indicado pelo PMDB naquele órgão, estava desenvolvendo. Ele ocupava aquele cargo há quatro anos.

Para que se tenha uma idéia, várias emendas, inclusive emendas coletivas da Bancada do Acre, foram colocadas para a Superintendência do Incra, e, para a minha surpresa, ao consultar o Siafi ontem, constatei que aquela Superintendência gastou, ano passado, apenas 42% do orçamento a ela destinado. Isso sem deixar de dizer que a Bancada do PMDB sempre esteve à disposição do superintendente para levar-lhe os recursos necessários ao desenvolvimento de seus trabalhos. E conseguimos liberar uma gama enorme de recursos do Orçamento da União não apenas para um órgão federal, mas para o Governo do Estado e para vários Municípios.

Quero deixar registrado nesta Casa que os funcionários do Incra ensaiaram uma greve, entretanto, quando souberam o nome indicado pelo PMDB para ocupar aquele cargo, houve um esfriamento dos ânimos. O PMDB indicou novamente para assumir a Superintendência do Incra o Prof. Josué Fernandes de Souza, homem respeitado no Estado por sua conduta moral, Secretário-Geral do Partido na Regional Acre, de competência comprovada em todos os cargos que ocupou, como os de Secretário Municipal, Secretário Estadual, Vice-Presidente da Fundação Cultural, Presidente do Conselho Estadual de Educação, Presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação, oportunidade em que conheceu o atual Ministro da Reforma Agrária. Foi ainda Pró-Reitor da Universidade, hoje, é o Assessor de Comunicação da Universidade. E, acima de tudo, é ele um profundo conhecedor da história fundiária do Acre, com uma história de luta em favor da reforma agrária. Na década de 70, enquanto eclodiam conflitos fundiários, estava ele, como jornalista, noticiando o episódio e clamando pela reforma agrária naquele Estado.

O Prof. Josué Fernandes é bem aceito em toda a sociedade acreana, e assumiu, na quarta-feira da semana passada, a Superintendência do Incra naquele Estado. Ele está aqui em Brasília conversando com os diretores da entidade e, no final da próxima semana, estará no Acre para dar continuidade ao programa de reforma agrária do PMDB.

O PMDB tem um projeto de lei avançado sobre reforma agrária; esse projeto está tramitando com as ressalvas dos setores mais conservadores, contudo, conta com o apoio do Governo e dos partidos de esquerda, por representar um passo a favor da reforma agrária no nosso País.

Para encerrar, Sr. Presidente, encaminho à Mesa um requerimento ao Ministro da Reforma Agrária, solicitando o número de famílias assentadas oficialmente, por projeto do Estado do Acre nos anos de 1993, 1994, 1995 e 1996; o valor financiado pelo Procera; número de famílias beneficiadas nos anos de 1988 a 1996.

A nova Lei de Licitação, cujo ponto básico é o preço mínimo, garantiu o direito a todos, pequenos, médios e grandes, de disputar. Portanto, porque me foi feita uma acusação, peço aqui todos os processos: carta-convite, tomada de preço, concorrência, inclusive as atas, para que eu possa deixar registrado, nesta Casa, as inverdades que estão assacando contra minha pessoa.

Fico surpreso, pois o Acre neste momento passa por uma grande dificuldade: estamos tendo agora o terceiro alagamento em três meses. O nível do Rio Acre já chegou a 17 metros e 60 centímetros, o maior de toda a história; baixou, mas, infelizmente, hoje quase atingiu 17 metros.

Neste momento de dificuldades, quando a população está sofrendo, fico triste em ver que surge uma campanha violenta contra minha pessoa. Trata-se apenas de um ato administrativo: trocando, no Ministério em que o PMDB tem influência do Governo que ele apóia e dá sustentação, uma pessoa que não estava atendendo ao programa traçada pelo Ministério da Reforma Agrária.

A Srª Marina Silva - V. Exª concede-me um aparte, nobre Senador?

O SR. FLAVIANO MELO - Ouço o aparte da nobre Senadora Marina Silva.

A Srª Marina Silva - Agradeço a V. Exª a oportunidade desse aparte. No início de seu pronunciamento, declarou que eu havia mencionado, na quarta-feira, o episódio relativo à exoneração do Superintendente do Incra no Acre. Lamentavelmente, não o vi na sessão, talvez por ter ocorrido um longo feriado. A documentação, que anexei ao meu pronunciamento, estava em minhas mãos, e, dessa forma, senti-me na obrigação de cumprir com o meu dever de Parlamentar. Naquela ocasião, ao iniciar minha fala, dizia que não me reportaria à troca de cargos de confiança do PMDB no Governo Federal se não tivesse recebido documentos que me foram entregues pelos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais e, inclusive, pelo Sindicato dos Funcionários do Incra, de entidades não-governamentais, colocando no bojo de suas insatisfações a troca do Sr. Raimundo Araújo pelo Sr. Josué Fernandes. A troca, diziam, se deveu ao fato de o superintendente exonerado ter assumido uma posição contrária aos interesses dos empreiteiros locais. Como tenho zelo pela coisa pública - conforme todos os Senadores desta Casa -, senti-me na obrigação de falar a respeito desse fato, no mínimo, estranho: pela primeira vez, estávamos vendo uma manifestação de trabalhadores e de funcionários em benefício da permanência de um superintendente. Como V. Exª mesmo pode observar, inúmeras são as denúncias que temos aqui de acampamentos de trabalhadores por estarem insatisfeitos com a atuação de seus superintendentes. Então, a minha estranheza é em relação a esse episódio em que havia e há um apoio por parte dos produtores com relação à figura do Sr. Raimundo de Araújo. Como já mencionei, não é da minha competência discutir troca de cargos, até porque penso ser realmente constrangedor utilizar o espaço dessa tribuna para ficar discutindo quem assume cargos. Sou de um Partido de Oposição e, quando tenho contribuições positivas a oferecer ao Governo, como tenho feito com o movimento dos seringueiros, com o trabalho que estamos realizando na Amazônia com relação ao desenvolvimento sustentável, não me tenho furtado de oferecer essas sugestões ao Governo Federal ou a qualquer governo, porque a nossa função aqui é contribuir com a Nação para a resolução dos seus problemas. Mas há documentos e denúncias, no caso em pauta, que dão conta de que o superintendente teria contrariado interesses de empreiteiros locais e que, em função dessas pressões, ele haveria sido exonerado. Então, entendi que se trata de algo que diz respeito ao interesse da Nação e, por isso, me reportei, inclusive anexando a documentação nos termos em que as recebi. Disse ainda que não estava fazendo qualquer juízo de valor, porque, juntamente com a minha assessoria, fazia levantamento das informações, para encaminhar cópias de documentos ao Presidente da República, ao Ministro da Reforma Agrária e ao Presidente do Incra no sentido de dar-lhes conhecimento das insatisfações que o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, a Federação de Trabalhadores Rurais, algumas ONG´s e os funcionários estavam enviando para o meu Gabinete. Causa estranheza que a ausência dessa pessoa esteja envolvida com denúncias por parte de sindicatos - tanto do sindicato que representa a categoria dos funcionários quanto dos trabalhadores rurais - de que ele estaria sendo exonerado por ter ferido interesses de empreiteiros. No caso, entendi que o Ministro da Reforma Agrária deveria e deve tomar conhecimento desse fato para que não venha a pecar por omissão. Os termos com os quais me reportei desta tribuna foi por zelo com o interesse público - e acredito essa deva ser a preocupação de todos nós. Quero registrar que a Reserva Extrativista Chico Mendes, implantada e criada após seu assassinato, foi fruto de uma longa luta dos seringueiros, cujo desdobramento mais cruel foi a morte de Chico Mendes. Talvez em função de todos aqueles episódios. Há décadas essa era a luta dos seringueiros e para que isso acontecesse tivemos vários assassinatos: Calabi, Wilson Pinheiro e Chico Mendes. Não foi uma dádiva dos céus, mas a luta de uma comunidade, de um povo que sabe resistir e lutar por seus direitos. Mais uma vez reitero que ao colocar minhas observações relacionadas a esse episódio não estou entrando no mérito da troca pura e simples de cargo envolvendo a base de sustentação do Governo. Reporto-me sim às denúncias que foram feitas, porque entendo que todos nós temos a obrigação de zelar pelo interesse público; e se elas nos chegam às mãos e não as encaminhamos, podemos pecar por omissão. Muito obrigada.

O SR. FLAVIANO MELO - Senadora Marina Silva, agradeço o aparte de V. Exª. Com relação a denúncias, tomou-se como norma em nosso País simplesmente jogar-se contra homens públicos uma série de acusações, como nesse caso. V. Exª disse muito bem: todos os documentos, todos os recortes de jornais que tenho em mãos são de opositores meus, que despejam uma ira louca contra minha pessoa e, em momento algum, me procuram para perguntar o que eu tenho a dizer sobre esse caso. Está registrado nos Anais desta Casa.

Para que isso seja esclarecido, estou encaminhando requerimento ao Ministro da Reforma Agrária, solicitando todos os processos licitatórios, as cartas, as propostas e as atas de reunião. Quero deixar tudo bem claro. Encaminharei também a V. Exª uma cópia, para que tenha conhecimento desse fato.

Inclusive os jornais do sul do País, repentinamente, estão envolvendo meu nome em algo com o que nunca mexi; nunca me meti em licitação, nunca fui ao Incra para saber quem ganhava licitação ou coisa desse tipo, porque penso que isso é da competência do Poder que lá está estabelecido. Quando o Ministro da Reforma Agrária enviar os documentos, vou transcrevê-los nos Anais desta Casa, para que se provem todas as mentiras de que me estão acusando.

A Reserva Chico Mendes foi uma luta longa. Graças a Deus, participei dela também, quando tomei a decisão, no ano de 1987, de montar a comissão agrária, em que Chico Mendes tinha assento. Fiz vários convênios com o sindicato do Chico Mendes, mais de 12 escolas foram construídas na zona rural de Xapuri, onde ele tinha atuação, em convênios com o sindicato. Inúmeras vezes, o Líder Chico Mendes foi ao Palácio do Governo para conversar comigo sobre um plano, uma forma de desenvolvimento. A idéia dessa reserva extrativista surgiu dessa comissão, do diálogo com a Drª Othília, do Incra; conosco, do Governo, e com Chico Mendes. Graças a Deus, conseguimos sensibilizar o então Presidente da República, José Sarney, a agir dessa forma.

Quando assumi o Governo, um discurso ambientalista louco, no Acre, havia paralisado o asfaltamento da BR-364, que liga Rio Branco a Porto Velho - o sonho de todos os acreanos. Tive muito trabalho para desembargar essa obra, que tinha financiamento do Banco Interamericano; tive que sentar com membros do Comitê do Meio Ambiente e mostrar tudo o que eu pensava para o Acre, as ações que eu havia empreendido, como a criação do Instituto do Meio Ambiente, uma fundação de tecnologia, por meio da qual começamos um zoneamento agroecológico no Estado. Graças a isso, o banco também se sensibilizou. E mais: a questão tomou um vulto tão grande que, no ITTO, um instituto de madeiras tropicais, sediado no Japão, os próprios ambientalistas aprovaram os projetos apresentados pelo Governo do Estado do Acre. Isso mostra a nossa responsabilidade, a nossa preocupação com a questão ambiental, o nosso compromisso em querer preservar nosso Estado e aproveitar os recursos de forma harmônica, sem acabar com a natureza.

E a maior prova disso, o maior documento desse entendimento que existia entre Chico Mendes e o meu Governo é a reportagem do Jornal do Brasil, de duas páginas, publicada no dia seguinte ao da morte de Chico Mendes. Para minha sorte, porque queriam me execrar, um jornalista do Jornal do Brasil, uma semana antes, tinha feito uma entrevista com Chico Mendes e a publicou no dia seguinte ao da sua morte. Nessa entrevista, se não me falha a memória, pelo menos cinco vezes ele fala bem da minha pessoa e do meu Governo, do meu compromisso em desenvolver o Estado da forma como ele pensava.

A Srª Marina Silva - V. Exª me permite mais um aparte?

O SR. FLAVIANO MELO - Ouço V. Exª, Senadora Marina Silva.

A Srª Marina Silva - V. Exª falou alguma coisa com relação à loucura. Entendo que a ida de Chico Mendes aos Estados Unidos, naquela época, para fazer crítica ao processo de asfaltamento da BR-364 não se constituía nenhum tipo de loucura de ambientalista, até porque ele tinha uma visão muito clara do que queria para o Acre, para a Amazônia e para os seringueiros. O que queria mesmo era chamar a atenção das autoridades estaduais, das autoridades federais e das agências multilaterais que estavam financiando a estrada. Chico Mendes tinha essa lucidez de saber tratar de forma ética seus adversários. Como ele agora está morto talvez não mereça que V. Exª diga que o ato que praticou era algum tipo de loucura. Entendo mesmo que queria chamar a atenção da autoridades para aquelas propostas que entendia interessantes, que deveriam ser encaminhadas e levadas a cabo e acredito que foi vitoriosa a sua ação em que pese à perversa campanha de difamação que foi deflagrada contra sua pessoa quando assumiu essa atitude corajosa. Muitas pessoas diziam que o Chico era contra a estrada, que não queria o desenvolvimento do Acre ou da Amazônia, e, por isso, ele sofreu muito. Isso o fragilizou junto à sociedade. Quando foi assassinado, muitas pessoas até pensavam que o Chico era contra o progresso, contra os seringueiros e uma série de coisas que V. Exª sabe muito bem, porque nós Senadores sofremos uma campanha de difamação perversa por causa de estradas - e V. Exª sabe disso - em que os fatos foram distorcidos. Diziam que, por estarmos fazendo denúncias contra uma série de atitudes que estavam sendo encaminhadas de forma errada pelo Governador do Acre, éramos contrários à estrada. Lembro esse fato porque é muito recente. Estou apenas querendo defender a atitude do Chico quando foi aos Estados Unidos expor o ponto de vista do movimento dos seringueiros sobre a estrada. Não queriam que ela não criasse problemas, mas que fosse a solução deles. A estrada era o anseio de todos - dos governos, das populações tradicionais, dos colonos e do próprio Chico - só que feita da forma como era entendida naquele momento. Hoje se reconhece que as atitudes tomadas, tais como o financiamento do Banco, a partir dessas pressões, foram bem-sucedidas. Só estou querendo colocar aqui que a atitude de Chico Mendes foi de lucidez, inclusive foi um ato de colaboração com o Governo de V. Exª.

O SR. FLAVIANO MELO - Senadora Marina Silva, acredito que V. Exª não escutou o que eu disse. Em momento algum, disse que o Chico Mendes viajou para fora do País a fim de brigar contra a rodovia. No momento em que eu estava lá, não chegou nenhum documento do Chico Mendes pedindo que não se liberasse a rodovia. Pelo contrário. Ele não quis assinar nenhum documento. Algumas entidades ambientalistas fizeram uma série de acusações, mas todas elas foram derrubadas por mim porque mostrei as ações que estava realizando.

Em momento algum falei que Chico Mendes paralisou a rodovia. Ele tinha uma visão muito clara do assunto, já que conversava comigo e dizia que queria o desenvolvimento, no que eu concordava. Em momento algum Chico Mendes atrapalhou o asfaltamento da rodovia, pelo menos que eu tenha conhecimento ou que tenha lido algo a respeito.

No entanto, há outras entidades - e por isso que chamei de loucura - que não tinham o compromisso que ele tinha e que tentaram atrapalhar. Mas, graças a Deus, derrubamos todos esses argumentos e, com isso, conseguimos que o Banco Interamericano de Desenvolvimento retomasse os empréstimos para a pavimentação dessa rodovia.

Tinha em Chico Mendes um grande aliado. Inclusive, esse repórter do Jornal do Brasil fez uma entrevista com Chico em que ele, por cinco vezes, falou bem do meu governo, da minha pessoa e das ações que estava empreendendo.

Por fim, Sr. Presidente, gostaria de encaminhar à Mesa requerimento de informações ao Ministério da Reforma Agrária, para que se elucide de vez essas graves acusações que fazem contra a minha pessoa. Fico impressionado com a capacidade dos meus adversários em tentar denegrir a minha imagem. Apesar disso, no entanto, continuamos como Senador da República, elegemos o nosso prefeito e vamos continuar na vida pública.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/04/1997 - Página 6875