Discurso no Senado Federal

PREMENCIA DE UMA REFORMA TRIBUTARIA QUE SIMPLIFIQUE DRASTICAMENTE O SISTEMA DE TRIBUTAÇÃO NO PAIS, FACILITANDO TANTO A ARRECADAÇÃO QUANTO A FISCALIZAÇÃO, E VISANDO ERRADICAR A SONEGAÇÃO FISCAL.

Autor
Ronaldo Cunha Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ronaldo José da Cunha Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • PREMENCIA DE UMA REFORMA TRIBUTARIA QUE SIMPLIFIQUE DRASTICAMENTE O SISTEMA DE TRIBUTAÇÃO NO PAIS, FACILITANDO TANTO A ARRECADAÇÃO QUANTO A FISCALIZAÇÃO, E VISANDO ERRADICAR A SONEGAÇÃO FISCAL.
Aparteantes
José Alves, Mauro Miranda, Ney Suassuna, Valmir Campelo.
Publicação
Publicação no DSF de 04/04/1997 - Página 6964
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • DEFESA, REALIZAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, SIMPLIFICAÇÃO, FORMA, ARRECADAÇÃO, REDUÇÃO, NUMERO, IMPOSTOS, CONTRIBUIÇÃO SOCIAL, AGILIZAÇÃO, FACILITAÇÃO, FISCALIZAÇÃO, MELHORIA, COMBATE, SONEGAÇÃO FISCAL, PAIS.

O SR. RONALDO CUNHA LIMA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, preferi escrever o pronunciamento que farei esta tarde, pela sua responsabilidade, pela sua importância e para que o improviso não me permitisse omitir algum detalhe do problema que enfoco.

A rejeição ao sistema tributário vigente no Brasil é praticamente consensual, reunindo pessoas das mais diversas e mesmo opostas concepções ideológicas. Temos um sistema demasiadamente complexo e injusto, punindo não só os assalariados e a população de menor rendimento como também o setor produtivo.

A necessidade de custear sucessivos resultados deficitários do setor público, somada à complacência com a evasão, foi criando um cipoal de tributos e contribuições que efetivamente tornou muito difícil a vida das empresas na plena legalidade. O resultado disso se estampa naquela estimativa um tanto aproximada, mas que tem sido divulgada diversas vezes pela própria Receita Federal, de que para cada real arrecadado há um real sonegado. Aumenta-se o número de impostos, ou aumentam-se suas alíquotas, e a cada vez um número maior de agentes econômicos passa a optar pela sonegação.

A simplificação drástica do sistema, com significativa redução do número de impostos e contribuições sociais, facilitando o cumprimento das obrigações bem como sua fiscalização, é a primeira das exigências que se impõem quando se pensa em uma reforma tributária em nosso País. Nesse sentido, o projeto do Governo ora em tramitação, consubstanciado na Proposta de Emenda Constitucional nº 175, de 1995, é de fato bastante tímido. Excetuado o Imposto sobre Produtos Industrializados, cuja extinção é proposta, toda a atual parafernália fica mantida. Há diversas propostas consistentes que reduzem para seis ou sete os tipos de impostos e contribuições, sendo previsto, por meio de cuidadosas projeções, que não haveria diminuição da arrecadação, graças ao aumento da base tributada.

A ousadia governamental em outras áreas da administração não aparece com o mesmo ímpeto no campo tributário. Por excessiva cautela, perde o Executivo a oportunidade de avançar em uma direção, que é a do curso da história e que parece ser irreversível. Em futuro talvez não muito distante, as operações monetárias, em sua quase totalidade, vão ocorrer por meios eletrônicos, o que tornaria bastante exeqüível a tributação por meio de um imposto único. Enquanto não vem esse momento, é urgente que ocorra uma substancial desburocratização do sistema tributário, facilitando a vida das empresas e também a das pessoas físicas que mantêm por vezes a heróica intenção de pagar seus impostos.

No Brasil, as empresas costumam contratar profissionais para identificar e calcular os impostos devidos, dada a sua complexidade. Muitas vezes, também, são contratados especialistas para que os mesmos tributos não sejam pagos, no todo ou em parte. Devemos reconhecer que os estímulos para o bom cumprimento das obrigações tributárias é reduzido. A fiscalização do pagamento desse emaranhado de tributos, sendo a legislação de cada um deles também um emaranhado, torna-se igualmente difícil e precária. A punição dos sonegadores na esfera penal permanece sendo uma hipótese remota em nossa vida jurídica.

Reduzir o número de tributos e as alíquotas, simplificar suas regras e obrigações acessórias, ampliar a base de contribuintes efetivos, combater e punir a sonegação são medidas que se complementam e se reforçam mutuamente. Se isso parece plano e cristalino, na hora de se pôr em prática surgem problemas, como o receio de uma queda imediata, ainda que transitória, da arrecadação. É o que vem ocorrendo com a reforma tributária em curso.

Há, sem dúvida, em seu bojo, importantes aperfeiçoamentos da legislação vigente. A não-incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias nas operações de exportação bem como a obrigação de sua seletividade em função da essencialidade das mercadorias e serviços são sem dúvida inovações desejáveis; a primeira delas, inclusive, já está em vigência, em razão da promulgação da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1986. Aliás, a criação desse novo ICMS, que passa a ser um imposto de competência comum dos Estados, Municípios e da União, em contrapartida à extinção do IPI, é a principal alteração presentemente proposta. Sua inspiração é louvável na medida em que se busca uma unificação de tributos e a uniformização das regras para aplicação do tributo resultante. Mas é, sem dúvida, problemático que isso seja feito justamente com um imposto de competência atual dos Estados. Na prática, a autonomia tributária dos Estados, já não muito ampla, fica virtualmente anulada. Esse caráter excessivamente centralizador no delineamento do novo imposto deve ser cuidadosamente analisado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a perversidade do nosso sistema tributário revela-se muito especialmente no modo como é penalizada a população de renda mais baixa. É a funesta regressividade do sistema: quem ganha menos gasta tudo, pagando o ganho em proporção dos impostos embutidos nos preços das mercadorias. A taxação excessiva por meios de impostos indiretos, que vão sendo aplicados em cascata e que nem sequer são visíveis para os seus contribuintes efetivos, deverá ser atenuada com novas regras propostas pelo Governo. A desoneração dos produtos da cesta básica, estimulada pela seletividade obrigatória do ICMS, seria outra medida de grande impacto para a melhoria das condições de vida do nosso povo.

É possível, sem dúvida, fazer muito mais para aumentar a justiça fiscal em nosso País. Mais que isso, ela pode ser um instrumento efetivo para se obter maior justiça social. Anda infelizmente um pouco esquecida a proposta de criação de imposto sobre a criação de grandes fortunas, constante de projeto de lei complementar de autoria do então Senador Fernando Henrique Cardoso. Eis uma medida que contribuiria para a diminuição das tremendas desigualdades sociais com as quais convivemos, sendo proposta em termos bastante razoáveis, com a alíquota máxima de um por cento.

Uma alternativa é tornar mais significativa a taxação das heranças, que em países de Primeiro Mundo alcança valores realmente expressivos. A alíquota máxima do imposto por transmissão causa mortis e doação, que é de competência dos Estados e do Distrito Federal, foi fixada por esta Casa Legislativa em oito por cento, por Resolução de maio de 1992. É viável e recomendável um aumento desse percentual, respeitada a idéia de progressividade em sua aplicação, bastando compará-lo, por exemplo, com a alíquota máxima incidente sobre a renda das pessoas físicas, que está na faixa bastante suportável de vinte e cinco por cento.

O Sr. Mauro Miranda - V. Exª me permite um aparte?

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Mauro Miranda - V. Exª traz a esta Casa um dos temas mais importantes sobre a reforma da Constituição que, proximamente, iremos discutir. Somos irmãos, o Nordeste, o Centro-Oeste e o Norte, por isso devemos estar sempre atentos. Participei da Constituinte de 1988 e só com trabalho conjunto e muita união conseguimos superar algumas dificuldades e um preconceito segundo o qual o Sul e o Sudeste, ou seja, o Brasil nº 1, fazia contra nós dessas regiões. Acho que deve ser inserida essa preocupação também no discurso de V. Exª, com relação à distribuição desses recursos dentro dessa reforma tributária. Não podem impedir a nossa vontade de desenvolver e de tornar as nossas regiões mais justas. Queria deixar esse alerta, pois, além da capacidade de liderança de V. Exª, do nome forte que é nesta Casa, para que também se conscientize - sei que V. Exª já é conscientizado disso - no sentido de olharmos a reforma tributária também com o olho da justiça social nos nossos Estados e regiões periféricas. Porque têm sido olhados e conduzidos pelo esquema do Centro-Sul, pelos grandes empresários de São Paulo, em detrimento sempre das nossas regiões que têm vontade de se desenvolver. Essa é a ponderação que gostaria de deixar a esse belíssimo pronunciamento de V. Exª.

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Muito obrigado, Senador Mauro Miranda. Registro, com muita alegria a sua intervenção e, com honra, as considerações que faz a respeito do modesto pronunciamento que faço neste instante, incorporando ao meu discurso, dentro do possível, extraindo evidentemente a parte generosa das referências.

O Sr. José Alves - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. José Alves - Senador Ronaldo Cunha Lima, V. Exª traz, na tarde de hoje, uma importante contribuição ao trabalho desta Casa, quando levanta uma questão que consideramos fundamental, que é a reforma tributária. No momento em que o Plano Real mostra sua face cruel, de abandono à área social, em que a saúde se debate por falta de recursos, vemos um sistema tributário perverso. E V. Exª, com autoridade e conhecimento de ex-Governador de um Estado importante do Nordeste, levanta questões que nos levam a reflexões profundas. Quero, portanto, parabenizar V. Exª pelas questões levantadas, associando-se às preocupações de V. Exª.

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Muito obrigado, Senador José Alves, pela manifestação a respeito do pronunciamento que faço, o da oportunidade da matéria e a sua significação. Em verdade, trago a experiência de quem já exerceu outros cargos, inclusive no Executivo; fui prefeito, fui governador e posso dimensionar a importância do sistema tributário, penalizando não apenas os contribuintes, efetivamente contribuinte, mas também as cidades de pequeno porte e os Estados brasileiros.

O Sr. Ney Suassuna - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Concedo, com alegria, o aparte ao Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna - Senador Ronaldo Cunha Lima, o tema que V. Exª traz é um dos mais importantes desta República. Estamos num caos tributário e V. Exª lembra que a reforma urge, que a reforma precisa ser justa, que a reforma tem que ser urgentemente implementada. Concordamos com V. Exª e acreditamos que, neste momento, estão sendo penalizados principalmente os pequenos Municípios; as grandes cidades estão bem. Tivemos há pouco uma reunião com a grande maioria dos prefeitos aqui na Capital Federal e verificamos que não há voz destoante, todas as pequenas prefeituras estão numa miséria terrível. Neste mês, uma prefeitura 06, que representa 95% das prefeituras do País, está recebendo R$53 mil para cuidar de saúde, de estradas, enfim, de todas as atribuições; os prefeitos ajudam desde o momento em que o cidadão nasce até a sua morte. É claro que deve haver uma reformulação. Parabenizo V. Exª por estar levantando um tema que já deveria ter sido implementando como dos primeiros em importância nesta República.

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Muito obrigado, nobre Senador Ney Suassuna. Queria até aproveitar, ao embalo das considerações que V. Exª faz a respeito desse Encontro de Prefeitos, aqui em Brasília, para - não sei se é a oportunidade - estender o apelo ao Sr. Ministro da Fazenda e ao Senhor Presidente da República, no instante em que edita uma Medida Provisória permitindo o parcelamento dos débitos do INSS para as prefeituras, que o faça igualmente em relação ao FGTS, porque a maioria das prefeituras está com dificuldades mais em relação ao FGTS do que propriamente em relação ao INSS.

E como o Presidente da República teve a sensibilidade para editar uma Medida Provisória em relação ao parcelamento ou alongamento do perfil das dívidas das prefeituras para com o INSS, que o faça também em relação ao FGTS como medida urgente, para que os municípios que estão iniciando novas administrações agora possam renegociar suas dívidas, equacioná-las e dispor de parte da sua arrecadação para investimentos.

Eu sei o quanto isso é difícil. Disse, há poucos instantes, Senador Ney Suassuna, - e V. Exª sabe disso - fui prefeito por duas vezes da minha cidade, Campina Grande; fui Governador de Estado e sei quantas dificuldades enfrentamos para negociar a dívida e consolidar débitos e para não permitir um maior endividamento do Estado. E, hoje, assisto, com orgulho, a Paraíba se conduzindo como está porque nós iniciamos o saneamento financeiro do Estado, quando o encontramos com os salários atrasados em até seis meses, com o Banco Estadual fechado, com operações de antecipação de receita (ARO) com 17 bancos; negociamos, pagamos, reduzimos o débito, não contraímos um só centavo, consolidamos a posição financeira. A partir daí, em 1991, começou-se o saneamento efetivo, o saneamento financeiro da Paraíba, consolidado agora. Agradeço a intervenção de V. Exª.

O Sr.Valmir Campelo - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Concedo o aparte ao eminente Senador pelo Distrito Federal, com muita honra.

O Sr. Valmir Campelo - Nobre Senador Ronaldo Cunha Lima, gostaria de parabenizá-lo por trazer a este plenário um assunto de relevância, mais um assunto de tanta importância para a vida do nosso País. V. Exª está preocupado com a reforma tributária, que ainda se arrasta na Câmara Federal. Entendo que a reforma tributária é, talvez, a mais importante, talvez estivéssemos invertendo a pauta de discussão das reformas que hoje tramitam no Congresso Nacional. Entendo que a reforma tributária deveria estar em primeiro lugar nas discussões, porque sabemos o quanto é difícil para uma empresa ou pessoa física recolher os impostos, que são em número excessivo, em alíquotas altas que o comerciante, pequeno e micro, é obrigado a recolher aos cofres do Estado e do Município. Entendo também, Senador Ronaldo Cunha Lima, que, diminuindo o número de impostos e reduzindo a alíquota de determinados impostos, vamos reverter o quadro da evasão fiscal do nosso País. Como tão bem disse V. Exª, a cada real arrecadado, deixa-se de arrecadar um real, um outro real é sonegado. Tenho absoluta certeza de que, se o Congresso Nacional fizer uma reforma tributária à altura do que a sociedade precisa e espera, o Estado vai arrecadar muito mais, com a simplificação dessa operação. Uma empresa, hoje, precisa praticamente de uma outra para fazer a sua contabilidade, diante de tantas normas e de inúmeros impostos. Parabenizo V. Exª por estar iniciando uma discussão que deveria, talvez, ser uma das primeiras desta Casa, a respeito das reformas em tramitação no Congresso Nacional e ainda por trazer mais um assunto tão importante para o debate aqui no Senado Federal.

O SR. RONALDO CUNHA LIMA - Agradeço a V. Exª , Senador Valmir Campelo. O seu aparte enriquece o meu modesto discurso neste instante.

Concluindo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, consideramos que muito há de ser feito até chegarmos a uma sistema tributário justo, conciso e eficaz. A proposta de reforma tributária acena com alguns avanços nessa direção. A maior parte do caminho, entretanto, ainda está por ser trilhada.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/04/1997 - Página 6964