Discurso no Senado Federal

TRAZENDO A TONA A DISCUSSÃO DO TEMA DOS DIREITOS HUMANOS, A PROPOSITO DOS FATOS OCORRIDOS EM DIADEMA - SP, SOMADO AS VIOLENCIAS DE CARANDIRU, CANDELARIA, CARAJAS, PIXOTE E TANTAS OUTRAS. PROGRAMA NACIONAL DE DIREITOS DA PESSOA HUMANA, QUE VISA A PROTEÇÃO DO DIREITO E TRATAMENTO IGUALITARIO PERANTE A LEI.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • TRAZENDO A TONA A DISCUSSÃO DO TEMA DOS DIREITOS HUMANOS, A PROPOSITO DOS FATOS OCORRIDOS EM DIADEMA - SP, SOMADO AS VIOLENCIAS DE CARANDIRU, CANDELARIA, CARAJAS, PIXOTE E TANTAS OUTRAS. PROGRAMA NACIONAL DE DIREITOS DA PESSOA HUMANA, QUE VISA A PROTEÇÃO DO DIREITO E TRATAMENTO IGUALITARIO PERANTE A LEI.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/1997 - Página 7101
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • REPUDIO, VIOLENCIA, POLICIAL MILITAR, MUNICIPIO, DIADEMA (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DESRESPEITO, DIREITOS HUMANOS, PREJUIZO, REPUTAÇÃO, PAIS.
  • ANALISE, PROGRAMA NACIONAL, DIREITOS HUMANOS, AMBITO, DIREITO A VIDA, MELHORIA, SEGURANÇA PUBLICA, COMBATE, IMPUNIDADE, DIREITO A LIBERDADE, APERFEIÇOAMENTO, SISTEMA PENITENCIARIO, DIREITO A IGUALDADE, OPOSIÇÃO, DISCRIMINAÇÃO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na última segunda-feira, assistimos a uma das cenas mais cruéis entre as tantas cenas cruéis que a tevê se encarrega de levar à nossa casa todos os dias. A polícia militar de Diadema extorquiu, bateu e matou pessoas inocentes cujo único crime consistiu em passar pelo local onde policiais faziam uma blitz.

Diante da ferocidade irracional que chocou telespectadores do mundo inteiro, não nos podemos furtar de trazer à tona a discussão de tema que constitui o calcanhar de Aquiles do Brasil. Falo, Senhor Presidente, dos direitos humanos.

O deprimente espetáculo de Diadema é flagrante desrespeito aos direitos fundamentais, que incluem todas as pessoas, sem discriminação de cor, sexo, nacionalidade ou classe social. Mulheres, negros, homossexuais, índios, idosos, portadores de deficiências, populações de fronteiras, estrangeiros, migrantes, refugiados, portadores de HIV, crianças, adolescentes, presos, despossuídos -- todos devem ser respeitados e ter a integridade física protegida.

A violência das cenas de Diadema não constitui fato isolado em nosso país. Veio se somar à de Carandiru, Candelária, Carajás, Pixote e tantas outras. Ela expõe a brutalidade primária, irracional, animalesca. A polícia, cujo papel é defender a população, espalha terror e desespero entre indefesos que não têm como se livrar da barbárie.

Cenas como essa nos angustiam, Senhor Presidente. Nos angustiam e comprometem o gigantesco esforço do governo brasileiro no sentido de pregar os direitos humanos como direito de todos, capaz de abrigar sob seu manto de proteção os excluídos e desamparados.

Mais. Mancham a imagem do país no exterior. As cenas de terror reveladas pela TV mereceram destaque na imprensa falada, escrita e televisiva do mundo inteiro. É amargo, Senhor Presidente. O país que luta por um assento no Conselho de Segurança da ONU não consegue pôr em prática os direitos universais da pessoa humana definidos pela própria ONU há exatos 49 anos.

Democracia não rima com violação dos direitos fundamentais. Violação não só como a registrada em Diadema. Mas violação nas suas diferentes faces: a violência sexual, o trabalho forçado, o trabalho infantil, a discriminação das mulheres, dos idosos, das minorias e dos excluídos.

Respeito aos direitos humanos, Senhor Presidente, constitui condição sine qua non à existência digna e civilizada de qualquer pessoa. As cenas que presenciamos no dia-a-dia de nossas cidades revelam que a sociedade brasileira ainda tem muito chão a percorrer até chegar lá.

Basta observar cenas do cotidiano para chegar a essa conclusão. A violência do trânsito, os maus tratos impingidos aos encarcerados, a marginalização dos menores carentes, a discriminação das minorias, a intolerância aos diferentes são prova mais que suficiente do exercício que precisa ser feito para mudar a mentalidade dos brasileiros, muitos ainda vivendo como se ainda estivéssemos divididos em casa grande e senzala.

A mutação cultural impõe mudança nas práticas do governo e dos poderes em suas diferentes esferas. É nessa direção que caminha o Programa Nacional de Direitos da Pessoa Humana, implantado recentemente pelo governo federal em cumprimento aos compromissos assumidos interna e externamente pelo Brasil na luta contra a violência.

O programa tem um objetivo claro: eleger prioridades e apresentar propostas concretas que busquem equacionar os graves problemas relacionados à promoção e proteção dos direitos humanos no Brasil.

As propostas, traçadas democraticamente em conjunto com diversas organizações da sociedade civil, seguem três grandes linhas. A primeira é a proteção do direito à vida; a outra, a proteção do direito à liberdade; a última, mas não menos importante, a proteção do direito a tratamento igualitário perante a lei.

No primeiro grande título -- a proteção do direito à vida -- estão previstas ações relacionadas à segurança das pessoas e à luta contra a impunidade. Entre elas, a elaboração de mapas da violência urbana e da violência rural para possibilitar análise mais aprofundada da atuação do Estado; a implementação de programas de desarmamento; a promoção de cursos de direitos humanos para as polícias estaduais; o apoio a experiências de polícias comunitárias ou interativas; a atribuição à Justiça comum da competência de processar e julgar os crimes cometidos por policiais militares no policiamento civil ou com arma da corporação.

No tocante à proteção do direito à liberdade, destacam-se ações relacionadas à liberdade de expressão e classificação indicativa, trabalho forçado e penas privativas de liberdade. Aí, Senhor Presidente, merecem aplauso especial as propostas voltadas para a humanização das prisões e do tratamento dado aos presidiários e às respectivas famílias.

Ações nesse sentido não podem esperar. Clamam urgência. Nenhum país que se quer medianamente civilizado pode conviver com um sistema carcerário como o nosso. As prisões em nosso país não recuperam o infrator. Ao contrário, especializam-no no crime. Esse é um quadro que precisa mudar.

Por fim, Senhor Presidente, nobres Senadores, o Programa Nacional dos Direitos Humanos arrola uma série de propostas relacionadas à proteção do direito a tratamento igualitário perante a lei.

Neste país desigual, em que alguns são mais iguais perante a lei, são sempre bem-vindas ações que proíbam a discriminação com base em origem, sexo, raça, etnia, classe social, idade, credo religioso, convicção política e orientação sexual.

O programa está aí. As linhas foram traçadas. Deu-se o primeiro passo. É importante, mas não suficiente. Cabe a nós, membros da sociedade organizada, atuar e cobrar para que as intenções não se tornem letra morta. Ao contrário, virem realidade e tornem cenas como as de Diadema, Caruaru, Carajás e Candelária pesadelos de um passado que a ninguém agradaria reviver.

Era o que tinha a dizer, Senhor Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/1997 - Página 7101