Discurso no Senado Federal

ALARMANTES DADOS SOBRE A VIOLENCIA NO BRASIL.

Autor
Flaviano Melo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Flaviano Flávio Baptista de Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. DIREITOS HUMANOS.:
  • ALARMANTES DADOS SOBRE A VIOLENCIA NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/1997 - Página 7375
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • REPUDIO, CRIME, AGRESSÃO, POLICIAL MILITAR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ANALISE, ESTATISTICA, VIOLENCIA, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO ACRE (AC).
  • NECESSIDADE, REFORMULAÇÃO, POLICIA MILITAR, AMBITO, TREINAMENTO, POLICIAL, DIFERENÇA, SOLDADO, DEFESA, MODERNIZAÇÃO, AUMENTO, SALARIO, OPOSIÇÃO, IMPUNIDADE.
  • NECESSIDADE, PROVIDENCIA, EXECUTIVO, REDUÇÃO, VIOLENCIA, URGENCIA, LEGISLATIVO, VOTAÇÃO, MATERIA, DEFESA, DIREITOS HUMANOS.

O SR. FLAVIANO MELO (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais uma vez, o Brasil esperou uma nova tragédia para discutir um dos problemas que há muito o aflige. A violência praticada por policiais militares contra um grupo de moradores de uma favela em Diadema, na grande São Paulo, que resultou na morte de um rapaz, causou indignação em toda a Nação e resultou na certeza de que algo precisa ser feito. Certeza essa ratificada com as novas cenas de violência policial, desta vez no Rio de Janeiro, mostradas, ontem, pela Rede Globo de Televisão.

Os dados a respeito da violência no País são alarmantes. Tanto que o País é o terceiro colocado na escala de violência mundial, perdendo apenas para a Colômbia e El Salvador, conforme confirma o novo Secretário Nacional de Direitos Humanos, José Gregori.

É um problema que piorou a partir da década de 80, quando se acirrava a crise econômica no País. Se, neste período, o Estado deixou de investir em segurança, se deixou de ter capacidade para investimento para a área social, ao que parece, nos dias atuais, mesmo com a estabilização da moeda, pouca coisa mudou.

Principalmente a partir de 1991, estamos vendo números alarmantes. Para se ter idéia, em seis anos - de 1985 a 1991 - morreram mais pessoas no Rio de janeiro do que em toda a guerra do Vietnã. A violência no Brasil causou 70.061 mortes, 20 mil a mais do que na guerra do Vietnã. Se igualou às mortes na Bósnia. Infelizmente, as mortes violentas no País só perdem, hoje, para as causadas por infarto.

A cada dia, episódios trágicos são estampados nos jornais. No meu Estado - o Acre - por exemplo, em menos de 15 dias, três crianças, de quatro, dez e doze anos, foram estupradas, sendo que depois de violentadas as duas menores foram assassinadas.

A Delegacia da Mulher no Acre, proporcionalmente, é uma das recordistas em número de queixas em todo o País. Cerca de 70% dos l.672 casos registrados, em 96, pelo Juizado Especial Cível e Criminal do Estado, são desta delegacia.

Estes são apenas exemplos dos fatos que mais se destacam. Existem centenas de outros atos de violência num Estado que tem menos de 500 mil habitantes. Em 1995, por exemplo, a taxa de homicídios local foi de 141, equivalente a 31 por cada mil habitantes.

O quadro nacional ainda é mais grave. Infelizmente, os fatos que marcaram terrivelmente o desrespeito aos direitos humanos teve o envolvimento da polícia.

Tivemos o confronto de PMs e sem-terras em Corumbiara/Rondônia, onde 12 pessoas morreram. Em seguida, o massacre, por PMs, de 19 sem-terras em Eldorado de Carajás. Na semana passada e, ainda ontem, o Brasil viu as cenas de violência policial em São Paulo e no Rio de janeiro, respectivamente. Em todos os casos, policiais militares aparecem como agressores daqueles que deveriam defender.

Na edição do último domingo, do jornal "O Estado de São Paulo", o atual chefe de gabinete do Ministério da justiça, José Gregori - indicado, também no domingo, para assumir a recém-criada Secretaria Nacional de Direitos Humanos -, fala que em alguns Estados as Polícias Militares são entraves para os direitos humanos e reconhece a necessidade de que algo precisa ser feito, até mesmo para que o Brasil deixe de ocupar a vexatória terceira colocação na escala de violência mundial.

É fato que nas Polícias Militar do país existem pessoas decentes, bons pais de família, excelentes policiais e defensores dos Direitos humanos. Quem não se recorda das cenas heróicas praticadas por policiais militares durante a tragédia de Osasco, onde mais de 40 pessoas morreram, em junho passado. Além das muitas cenas diárias de humanitarismo, que incluem até partos. Mas a violência praticada por um grupo de insanos PMs, em Diadema e no Rio de Janeiro, colocou em xeque toda uma instituição. 

Há que se ver ainda, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que o problema da violência não é só a falta de policiais nas ruas. É certo que o Brasil não tem o efetivo adequado, de 320 mil homens, mas o quadro atual, de 284 mil policiais, não se distancia do padrão mundial, que é de um policial para cada 500 habitantes. O que é preciso mudar é a própria polícia, inclusive para que possa ter de volta a confiança da população.

É necessário reavaliar o modelo da Polícia Militar. Hoje, muita coisa mudou no Brasil. Mas o treinamento dos PMs, por exemplo, ainda não. A Polícia Militar, mesmo não tendo mais vinculação com o Exército, continua recebendo instrução de soldado de infantaria. Ao invés de serem treinados para lidar com a segurança pública, são adestrados para tratar com o inimigo, quando deveriam ser capacitados para atuar em defesa do cidadão.

Os métodos das Academias de polícia são arcaicos. As próprias instalações são inadequadas e não há equipamentos modernos que possibilitem ao novo policial ter uma visão moderna de suas atividades. Os Currículos são defasados e não há padronização. Nas academias de polícia militar, por exemplo, a instrução e o comportamento é semelhante a do regime militar, o que, ao que se sabe, não é mais adotado nem mesmo por nossas forças Armadas.

Além de tudo, os policiais brasileiros não possuem uma remuneração ideal. Isso não é desculpa para a prática de delitos. Mas é um fato que poucos consideram. Por causa dos baixos salários, muitos Estados deixam de recrutar pessoas capacitadas e acabam introduzindo nas guarnições pessoas despreparadas que chegam até a influenciar seus companheiros. Aliado a isso, existe o corporativismo que, muitas vezes, deixa impunes policiais que só servem para macular a corporação.

Concordo com o Dr. José Gregori quanto a necessidade de mudanças. Enquanto o futuro das polícias é discutido, porém, cabe ao Governo tomar iniciativas para melhorar as academias de polícia. Se é preciso unificar os efetivos, só um estudo profundo dirá. Enquanto isso não acontece, não se pode cruzar os braços e esperar novas ondas de violência. E isto também vale para os governos estaduais, que também não podem se omitir.

Esta Casa já deu a sua contribuição. O gesto do presidente do Senado, Senador Antônio Carlos Magalhães, ao determinar a votação urgente da Lei da Tortura é exemplo disso. Muito, porém, ainda há que ser feito.

Ainda há projetos importantes para a população que precisam ser votados, como o que transfere para a justiça federal os crimes praticados contra os direitos humanos.

Mas as medidas tomadas até agora já representam uma boa caminhada neste sentido. Resta-nos continuar caminhando rumo à redução da violência que assola o país e à real concretização do respeito aos direitos humanos e à vida.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/1997 - Página 7375