Discurso no Senado Federal

CRITICAS A ADOÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA 1.570, DE 26 DE MARÇO DE 1997, QUE DISCIPLINA A APLICAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PUBLICA, ALTERA AS LEIS 8.437, DE 30 DE JUNHO DE 1992, E 7.347, DE 24 DE JULHO DE 1985, E DA OUTRAS PROVIDENCIAS, CUJO OBJETIVO, NA OPINIÃO DE S.EXA. E ATINGIR O PODER JUDICIARIO.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODERES CONSTITUCIONAIS. MEDIDA PROVISORIA (MPV).:
  • CRITICAS A ADOÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA 1.570, DE 26 DE MARÇO DE 1997, QUE DISCIPLINA A APLICAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PUBLICA, ALTERA AS LEIS 8.437, DE 30 DE JUNHO DE 1992, E 7.347, DE 24 DE JULHO DE 1985, E DA OUTRAS PROVIDENCIAS, CUJO OBJETIVO, NA OPINIÃO DE S.EXA. E ATINGIR O PODER JUDICIARIO.
Publicação
Publicação no DSF de 11/04/1997 - Página 7556
Assunto
Outros > PODERES CONSTITUCIONAIS. MEDIDA PROVISORIA (MPV).
Indexação
  • COMENTARIO, INCONSTITUCIONALIDADE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ESTABELECIMENTO, APLICAÇÃO, TUTELA JURISDICIONAL, FAZENDA PUBLICA, AGRESSÃO, JUDICIARIO.
  • CRITICA, AUTORITARISMO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESRESPEITO, INTERFERENCIA, LEGISLATIVO, JUDICIARIO.

              O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB--PA. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente Fernando Henrique Cardoso enviou ao Congresso Nacional a Medida Provisória Número 1.570, de 26 de março, que se destaca das demais pela clareza meridiana de seu objetivo, que é o de atingir o Poder Judiciário.

              Ninguém discorda de que o instituto das Medidas Provisórias tem servido ao atual Governo para mandar e desmandar, mas nunca, anteriormente, se viu algo tão flagrantemente inconstitucional, nunca se viu um ataque tão frontal a outro Poder da República, no caso, o Poder Judiciário.

              A Medida Provisória Número 1.570 estabelece em seu artigo primeiro que "aplica-se à tutela antecipada, prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil o disposto nos arts. 5º e seu parágrafo único e 7º da Lei Número 4.348, de 26 de junho de 1964, no art. 1º e seu parágrafo 4º da Lei Número 5.021, de 9 de junho de 1966, e nos arts. 1º, 3º e 4º da Lei Número 8.437 , de 30 de junho de 1992".

              No artigo segundo, a MP determina que "o art. 1º da Lei Número 8.437, de 30 de junho de 1992, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo. Parágrafo 4º: "Sempre que houver possibilidade de a pessoa jurídica de direito público requerida vir a sofrer dano, em virtude de concessão de liminar, ou de qualquer medida de caráter antecipatório, o juiz ou o relator determinará prestação de garantia real ou fidejussória".

              Por fim, no seu artigo terceiro, a MP altera o artigo 16 da Lei Número 7.347, de 24 de julho de 1985, que passa a vigorar com a seguinte redação: "Artigo 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova".

              Ora, antes de mais nada, é preciso deixar bem claro que essa Medida Provisória é inconstitucional. Como se sabe, a nossa Constituição determina, em seu artigo 68, que trata das leis delegadas, que não serão objeto de delegação, entre outras, a legislação sobre "organização do Poder Judiciário, e do Ministério Público, a carreira e a garantia dos seus membros". Em outras palavras, o Poder Legislativo não pode conceder delegação ao Executivo para que ataque o Judiciário, como se exige agora.

              Também nunca é demais lembrar que a Medida Provisória é um instituto do sistema parlamentarista, que está sendo desmoralizada pelo sistema "presidencialista imperial", que é o que vigora hoje em nosso País.

              Durante a Assembléia Nacional Constituinte de 1988, os constituintes brasileiros foram buscar as Medidas Provisórias no direito italiano. Acontece, porém, que, na Itália, o emprego desse instituto é muito raro, porque sua derrubada pode implicar na queda do Governo. Como em nosso País não há uma punição para o Governo caso a Medida Provisória seja derrubada, os presidentes da República, desde 1988, vêm editando uma MP depois de outra e reeditando-as sempre que necessário.

              A Medida Provisória, como determina a Constituição, no seu artigo 62, deve ser editada apenas "em caso de relevância e urgência", o que não é o caso da MP 1.570 e de tantas outras. Aliás, são incontáveis os exemplos de temas irrelevantes e indignos da menor urgência que já foram tratados em MPs por esse Governo.

              Como disse de início, essa Medida Provisória tem como objetivo central ferir o Poder Judiciário. É sabido que a MP 1.570 visa a contrariar recente decisão do Supremo Tribunal Federal, que mandou o Governo pagar a todos os seus funcionários civis um aumento de 28,86%, o qual foi concedido, anteriormente, apenas aos militares.

              Por ocasião dessa sentença, o Presidente Fernando Henrique Cardoso referiu-se ofensivamente aos Ministros do STF, afirmando que "eles não pensam no Brasil". Sua intenção velada era de jogar a opinião pública contra os juízes.

              Agora, com a MP 1.570, que trata temas de natureza processual, o Governo quer amarrar as mãos da Justiça. Como bem lembrou o Senador Josaphat Marinho, em discurso proferido nesta Casa, todas as Medidas Provisórias que tratavam matéria de natureza processual -- as MPs Números 185, 231 e 375 -- ou perderam a eficácia ou foram rejeitadas pelo Congresso Nacional. Para usar uma expressão popular, eu diria que, com a MP 1.570, o Governo está "dando o troco" ao poder Judiciário, que teve a ousadia de mandá-lo pagar o aumento devido aos servidores civis da União.

              O ataque ao Poder Judiciário, consubstanciado nessa Medida Provisória, é apenas mais um ato de uma cadeia de atentados à democracia e às instituições brasileiras, comportamento que vem marcando a administração do Senhor Fernando Henrique Cardoso.

              Depois de massacrar o Congresso, com a formação de uma esdrúxula base de sustentação, calcada na barganha e no clientelismo, o Governo parte contra o Judiciário.

              Ao tentar estabelecer que "a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites de competência territorial do órgão prolator", o Governo quer impedir que os cidadãos recorram de uma sentença de um juiz singular a um tribunal. Ora, o direito de recurso das partes, da instância inferior para as instâncias superiores, está assegurado pela Constituição. Em outras palavras, a MP 1.570 estabelece o efeito vinculante. Ocorre, porém, que apenas uma emenda constitucional pode estabelecer o efeito vinculante.

              Já no seu artigo segundo, a Constituição brasileira estabelece que os Poderes da União devem ser "independentes e harmônicos entre si".

              Mas, pergunto eu, como pode haver independência entre Poderes se um deles se julga dono da verdade? Como pode haver harmonia se um desses Poderes se arroga o direito de interferir em questões internas dos outros Poderes?

              Recentemente, tivemos aqui no Congresso Nacional a eleição dos presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Como nunca antes havia ocorrido, desta vez o Governo engajou-se abertamente na disputa, sem o mínimo pudor de esconder essa intromissão indevida. A MP Número 1.570, de certa forma, repete a ousadia intervencionista, só que agora no Judiciário.

              Como estou certo de que essa tentativa de usurpação será derrubada pelo Congresso Nacional, concluo que a Medida Provisória Número 1.570, veio para jogar um pouco de luz sobre a verdadeira natureza do atual Governo, arrogante e autoritário.

              Era o que tinha a dizer.

              Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/04/1997 - Página 7556