Discurso no Senado Federal

SOLIDARIEDADE DO PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO A MARCHA DOS SEM-TERRA A BRASILIA. UM ANO DO MASSACRE DE TRABALHADORES RURAIS EM ELDORADO DOS CARAJAS-PA, SEM PUNIÇÃO AOS CULPADOS. REFORMA AGRARIA.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • SOLIDARIEDADE DO PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO A MARCHA DOS SEM-TERRA A BRASILIA. UM ANO DO MASSACRE DE TRABALHADORES RURAIS EM ELDORADO DOS CARAJAS-PA, SEM PUNIÇÃO AOS CULPADOS. REFORMA AGRARIA.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/1997 - Página 8011
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ELOGIO, IMPORTANCIA, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, PROVOCAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, DIALOGO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • COMENTARIO, LUTO, SEM-TERRA, ANIVERSARIO, MORTE, TRABALHADOR RURAL, ESTADO DO PARA (PA), CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO, COMBATE, VIOLENCIA, CAMPO, OMISSÃO, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA.
  • JUSTIFICAÇÃO, AUSENCIA, GOVERNADOR, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), RECEPÇÃO, MARCHA, SEM-TERRA.
  • CRITICA, NOMEAÇÃO, ENCARREGADO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), MUNICIPIO, PARAGOMINAS (PA), ESTADO DO PARA (PA), FALTA, COMPROMISSO, REFORMA AGRARIA.

O SR. ADEMIR ANDRADE (BLOCO-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero também, em nome do Partido Socialista Brasileiro, dizer da minha admiração a esse povo.

O Partido Socialista Brasileiro, especialmente no meu Estado do Pará, surgiu da luta pela terra, pois é um Partido que tem base no campo. E quando vejo um governo como o do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que conseguiu, de certa forma, anestesiar os movimentos sociais organizados, enfraquecer as suas lutas, vejo que, dentre todos esses movimentos, o MST foi o único que ascendeu, foi o único que cresceu, que se estruturou e que ganhou a opinião pública brasileira.

Creio que cada um desses cidadãos deve sentir um orgulho muito grande, uma consciência de cidadania muito grande. Eles enfrentaram este Governo e dobraram a arrogância e a prepotência deste Presidente da República. Conseguiram de fato fazer isso, porque nunca vi um Presidente tão prepotente e tão arrogante quanto o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Sua Excelência tratou o MST com a mesma arrogância que tratou os petroleiros, quando fizeram greve na Petrobrás, e como tem tratado a CUT e outros movimentos sindicais. Sua Excelência tentou passar à opinião pública que os integrantes do MST eram marginais, baderneiros, subversivos. No entanto, foi vencido. Esse movimento, pela sua persistência, pela sua coragem, pela sua determinação e por levar adiante uma luta que conta hoje com a compreensão da grande maioria da população brasileira, fez com que o Presidente se dobrasse à força e à vontade do povo, descesse do seu pedestal de imperador e tomasse consciência de que precisaria tratar esse movimento à altura do que ele representa hoje em todo o País. Em conseqüência disto o Presidente da República irá receber os integrantes do MST amanhã.

Hoje é dia 17 de abril. Assisti, pasmo, alguém falar que é um dia de festa, que a manifestação desses trabalhadores de todo o País seria uma festa. Talvez os que se tenham pronunciado dessa forma não possuam consciência de que exatamente há um ano, 19 trabalhadores rurais foram barbaramente assassinados no Município de Eldorado dos Carajás no meu Estado, o Pará, pela Polícia Militar. Foram assassinados justamente pela arrogância, pela prepotência, pela incompreensão, pela falta de espírito democrático e de sensibilidade dos governantes do PSDB. O Governador do Pará não se diferencia, na maneira de agir, do Presidente Fernando Henrique Cardoso. S. Exª é igual: prepotente, autoritário, um verdadeiro imperadorzinho, lá, do Pará. E numa atitude de intransigência e intolerância negou-se ao diálogo com os dirigentes do Movimento, negou-se a atender reivindicações e deu ordens expressas à polícia do Pará para desobstruir a estrada, e não foi capaz de avaliar as conseqüências dessa ordem. Sua incompreensão política - na verdade S. Exª não passa de um burocrata colocado num cargo político - o fez dar aquela ordem que teve como conseqüência a morte de 19 trabalhadores sem-terra. Portanto, hoje não é um dia de festa, hoje é um dia de luto.

O movimento escolheu este dia de luto, este dia de morte, para mostrar à Nação inteira a realidade que estamos vivendo, a necessidade que tem o nosso País de ver implementada a reforma agrária.

Espero que o Presidente da República deixe de apresentar soluções para criar impacto na opinião pública. Esse é o seu costume. No dia em que morreram os 19 trabalhadores rurais sem-terra no Estado do Pará, o Presidente da República criou o Ministério da Reforma Agrária. Esse Ministério foi criado exclusivamente por causa das mortes dos 19 trabalhadores que vinham em seqüência a uma séria de chacinas ocorridas no Brasil: o caso de Carandirú, o caso de Corumbiara.

Essas mortes o fizeram tomar uma atitude e criar o Ministério da Reforma Agrária. E eu pergunto: o que fez o Ministério da Reforma Agrária? Nada. É um Ministério sem dinheiro, sem recursos, que só desapropria depois que a área está invadida e que só atua depois que as mortes ocorrem. Não quero culpar o Ministro Raul Jungmann, que, aliás, agora atendeu a uma das reivindicações dos trabalhadores do Pará, desapropriando a antiga fazenda chamada Bradesco, hoje Tainá-Recam, antes que ela fosse invadida.

Cobrei de S. Exª, quando o mesmo esteve neste plenário, que demonstrasse que uma única desapropriação do Governo Fernando Henrique Cardoso foi feita em uma área de terra que já não tivesse sido ocupada. Fiz um pedido de informação e, até hoje, não recebi resposta, Senador Pedro Simon. Na verdade, todas as desapropriações só foram feitas depois que as terras foram invadidas. Talvez, agora, com a nossa pressão, com a luta do MST, o Governo tenha a iniciativa de desapropriar a terra para distribuí-la antes que os trabalhadores a ocupem.

Houve também uma chacina em Ourilândia do Norte, no meu Estado do Pará. Foi divulgado na mídia nacional o assassinato bárbaro de três trabalhadores rurais que ocuparam uma propriedade em Ourilândia do Norte. O Presidente, mais uma vez, foi a público para propor uma operação desarmamento: "Vamos chamar as Forças Armadas; vamos chamar a Polícia Federal; vamos chamar a Polícia Militar e colocá-las nas ruas e nas estradas do Norte do Brasil para fazer uma operação desarmamento".

Isso causa impacto na opinião pública; isso causa impacto em quem não conhece o problema. O próprio Presidente não deve conhecê-lo. Quem propõe uma solução como essa não tem boa vontade e não quer resolver problema algum.

A solução, Sr. Presidente, está em fazer a reforma agrária, em colocar recursos no Orçamento da União para realizar a reforma agrária. A solução não consiste em planejar e organizar operações de desarmamento, que nada resolvem.

Espero que, agora, diante desse movimento, diante da repercussão que o movimento está tendo nacional e internacionalmente - pois que o mundo inteiro está de olho no que está acontecendo aqui -, o Presidente da República saia da sua retórica, da conversa própria de quem quer aparecer para a mídia nacional, que deixe de apresentar soluções que não são soluções de coisa alguma e ouça com sinceridade as reivindicações que a Sua Excelência serão apresentadas amanhã e trabalhe para atendê-las.

É extremamente lamentável que milhares de trabalhadores deste País inteiro, em vez de estarem produzindo, tenham que estar pelas estradas do Brasil, andando 800, 1.000, 1.200 quilômetros, para chegar à Capital da República e sensibilizar esse cidadão absolutamente insensível.

Espero que Sua Excelência entenda bem a mensagem que lhe está sendo enviada. Que não fique a apresentar soluções que não se concretizam; que compreenda que errou; que faça dados comparativos; que veja o que acontece nas outras partes do mundo e aprenda um pouco, para que nós possamos fazer um pouco do que os outros fazem.

A China tem uma área agricultável menor do que a do Brasil, mas uma produção agrícola que atende a uma população doze vezes maior do que a nossa e ainda sobra para a exportação.

A França é dezessete vezes menor do que o Brasil, só tem 60 milhões de habitantes, 95% de suas propriedades rurais são familiares, e produz 60 milhões de toneladas de grãos por ano.

Nós, com essa imensidão de território, com duas vezes e meia a população da França, produzimos, com muito custo, 80 milhões de toneladas de grãos.

Que o Presidente da República desça do pedestal e entenda que não é imperador. Que o Presidente da República entenda que foi eleito e que vai ter que se submeter a uma nova eleição. Que, se quiser reeleger-se, tem que trabalhar, realizar, resolver e não apenas conversar e impor a sua vontade àqueles que Sua Excelência acha que lhe devem obediência.

É esse o recado do Partido Socialista Brasileiro.

Antes de encerrar, Sr. Presidente, gostaria de fazer um registro. Hoje, pela manhã, recebi um telefonema do Governador de Pernambuco e Presidente do nosso Partido, Miguel Arraes, justificando-se pelo fato de não estar hoje aqui participando do ato. Preferiu receber os Sem-Terra do Estado de Pernambuco. S. Exª, que foi o único Governador que em movimentos ocorridos no ano passado recebeu os Sem-Terra, não pôde estar presente e pediu que justificasse sua ausência em nome do nosso Partido.

Essa é a mensagem do PSB. Esperamos que todos possamos trabalhar para ver concretizada a reforma agrária em nosso País.

Faço um último registro para mostrar como as questões são difíceis de serem resolvidas no Governo do PSDB. Recebi um ofício do Prefeito e do Presidente da Câmara Municipal de Paragominas. Os companheiros, de maneira veemente, repudiam a nomeação de um cidadão para executor do Incra naquele grande Município do Estado do Pará, Município, aliás, bastante conflagrado, que é popularmente chamado de Paragobala, e que elegeu o Deputado Estadual, do meu Partido, João Carlos Batista, assassinado pelas balas do latifúndio. Pois o Presidente nomeou um cidadão que não tem absolutamente nada a ver com a reforma agrária, ligado ao latifúndio, atendendo ao pedido de um Deputado Federal, porque este parlamentar votou favoravelmente à reeleição pela troca de dois cargos em órgãos federais no Estado do Pará.

É difícil fazer política quando ela é utilizada por Deputados sem compromisso com a reforma agrária, permitindo que esse Deputado indique alguém que vai combater a reforma agrária, que vai privilegiar o latifúndio no meu Estado, porque esse Deputado trocou o voto da reeleição por cargos.

Espero que o Senhor Presidente da República enxergue seus erros, corrija-os, retome sua posição e implante a reforma agrária, porque é disso que a nossa Nação está precisando.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/1997 - Página 8011