Discurso no Senado Federal

NEGOCIAÇÃO DE PARLAMENTARES E PREFEITOS COM O GOVERNO, VISANDO A MANUTENÇÃO DE RECURSOS AOS MUNICIPIOS BENEFICIADOS PELO FUNDO DE MELHORAMENTO E DESENVOLVIMENTO DA VALE DO RIO DOCE, ATRAVES DO BNDES, TENDO EM VISTA A PRIVATIZAÇÃO DA REFERIDA EMPRESA.

Autor
Coutinho Jorge (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando Coutinho Jorge
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • NEGOCIAÇÃO DE PARLAMENTARES E PREFEITOS COM O GOVERNO, VISANDO A MANUTENÇÃO DE RECURSOS AOS MUNICIPIOS BENEFICIADOS PELO FUNDO DE MELHORAMENTO E DESENVOLVIMENTO DA VALE DO RIO DOCE, ATRAVES DO BNDES, TENDO EM VISTA A PRIVATIZAÇÃO DA REFERIDA EMPRESA.
Aparteantes
Ademir Andrade.
Publicação
Publicação no DSF de 29/04/1997 - Página 8747
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, MELHORAMENTO, MUNICIPIOS, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), APREENSÃO, APLICAÇÃO, RECURSOS, POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO.
  • REGISTRO, REUNIÃO, PREFEITO, AREA, ATUAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), ENTREGA, DOCUMENTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), SOLICITAÇÃO, MANUTENÇÃO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, ALTERAÇÃO, GESTÃO, RECURSOS, VINCULAÇÃO, MUNICIPIOS.
  • REGISTRO, ASSINATURA, PROTOCOLO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), CASA CIVIL, PRESIDENTE, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), GARANTIA, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, GESTÃO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES).
  • NECESSIDADE, CONGRESSISTA, ACOMPANHAMENTO, DEFINIÇÃO, METODOLOGIA, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), APLICAÇÃO, RECURSOS, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, MUNICIPIOS, AREA, ATUAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD).

O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com a criação da Vale do Rio Doce, pelo Decreto nº 4352, de 1942, criou-se também o Fundo de Melhoramento e Desenvolvimento da Vale do Rio Doce, voltado a atuar na área de influência dos vários projetos dessa empresa, para aplicar recursos oriundos do lucro líquido da Vale em favor dos Municípios dessa área de influência.

Originalmente, o Fundo foi criado para beneficiar Minas Gerais e, posteriormente, Espírito Santo, e, à medida que a Vale ampliava suas ações diversos projetos em vários Estados do Brasil, esse número de Municípios aumentava e o Fundo de Desenvolvimento passava a ter uma abrangência mais significativa. Hoje, o referido Fundo envolve oito Estados: Minas Gerais, onde atende 48 Municípios; Espírito Santo, 13; Pará, 12; Maranhão, 12; Sergipe; Bahia; Mato Grosso do Sul; e Tocantins. Portanto, oito Estados, beneficiando dezenas de Municípios sob sua influência ou que recebem impactos dos projetos da Vale do Rio Doce.

Pergunta-se: por que há necessidade desse Fundo? Qual a grande influência que ele teria em relação a esses Municípios? É bom lembrar que a Vale do Rio Doce é uma companhia que atua explorando, sobretudo, recursos naturais renováveis e não renováveis, particularmente os minerais. Normalmente, a exploração de recursos naturais não renováveis traz efeitos positivos na geração de renda e de emprego, mas a exploração mineral traz seqüelas negativas, sobretudo na área ambiental. Além de desorganizar o espaço econômico no qual se insere, gerando problemas nos Municípios e comunidades face à expectativa que traz, também cria regiões marginais na área do projeto.

Darei um exemplo prático em relação a um projeto emblemático, o de Carajás. Carajás, localizado em meu Estado, é o maior Projeto de ferro no mundo em sua área de atuação. As comunidades lá estabelecidas vivem no primeiro mundo. Quem conhece o Projeto Carajás verifica que é organizado, não há dúvida alguma, com todas as condições de infra-estrutura em favor daqueles que nele atuam. Mas, à medida que o Projeto se desenvolveu, trouxe para o Município em que está localizado, Parauapeba, condições absolutamente indesejáveis, negativas, como a grande insalubridade, os problemas ligados ao desemprego, ao funcionamento da própria realidade urbana. Ora, isso ocorreu não só no meu Estado, mas também tem ocorrido em todos os Estados onde a Vale do Rio Doce tem atuado.

Na verdade, o Fundo existe para quê? Ele teria, digamos assim, um efeito compensatório para minimizar os impactos negativos que os projetos da Vale poderiam trazer às comunidades onde atua, que seriam corrigidos pelos efeitos compensatórios desse fundo. Portanto, o Fundo minimizaria esses impactos que trariam sérios prejuízos aos Municípios.

Podemos dizer que esse fundo que já vem funcionando há 47 anos, com uma certa experiência. O Fundo atua beneficiando vários tipos de aplicação como eletrificação urbana e rural, construção de estrada de rodagem, hospitais, distritos industriais, na área de saneamento básico, habitação, educação, cultura, saúde, assistência social, assistência a entidades filantrópicas, de um modo geral em toda a infra-estrutura econômica, física e social no seu sentido mais amplo. Hoje, o Fundo atua em dois níveis: na aplicação de recursos reversíveis, com financiamento subsidiado a 1% ao ano em favor da infra-estrutura econômica e física; e recursos não reversíveis, a fundo perdido, para os projetos da área social, como saúde e educação.

O Fundo acumulou uma experiência significativa e, até hoje, já foram aplicados cerca de 300 milhões de dólares nesses municípios. Assim, dentro do possível, o Fundo tem minimizado os impactos negativos desses projetos nas comunidades onde atua.

Em função da proposta de privatização da Vale do Rio Doce, inserida no edital de privatização, há um dispositivo que diz que 85 milhões e 900 mil reais, oriundos do Fundo de Desenvolvimento da Vale em favor das comunidades e dos projetos da sua área de influência, seriam doados - assim está no edital - ao BNDES para que fossem feitas aplicações em projetos de desenvolvimento regional.

Essa é uma afirmação absolutamente lacônica por si só; acabaria definitivamente com o Fundo e impediria, portanto, a aplicação de recursos nos Municípios que recebem influência desses projetos. Portanto, esse Fundo estaria praticamente desaparecendo.

O edital, portanto, é muito claro.

Perguntaríamos: em que período, onde e como seria aplicado o fundo? Que critérios se adotariam para aplicar o fundo, considerando que hoje há critérios perfeitamente definidos, como falei há pouco, em projetos de importância para esses Municípios, que não são de valores altos, mas que resolvem ou minimizam os problemas dos impactos negativos desses megaprojetos da Vale do Rio Doce?

Portanto, ele teria e tem um efeito compensatório, que melhoraria as condições de vida das populações que atuam nesse projeto.

Entretanto, o que ocorreu?

Com esse edital, o fundo desapareceria também. Então, uma série de Prefeitos, não só do meu Estado, mas dos oito onde a Vale atua, reuniram-se, num encontro havido aqui, na primeira semana do mês de abril, inquietos, preocupados com a extinção desse fundo, consideraram a viabilidade da privatização da Vale talvez para salvar alguma coisa daquilo com que a Vale beneficiava os Municípios. Reuniram-se com vários Parlamentares, e tive o privilégio e a oportunidade de discutir com esses Prefeitos.

Depois de muitas análises, se elaborou, naquele encontro, uma proposta que seria encaminhada ao Governo Federal, especialmente ao Presidente do conselho que trata da problemática da privatização, que é o Ministro Antonio Kandir, de tal ordem que encaminhamos uma proposta.

Os Prefeitos prepararam um documento, assessorados por vários Parlamentares, e conseguiram uma audiência com o Ministro Antonio Kandir neste mês. Mostrou-se a S. Exª que o fundo é fundamental, mesmo que se privatizasse a Vale; é fundamental manter um mecanismo que possa compensar esses municípios. Os Prefeitos, por seu turno, não aceitavam essa decisão equivocada do Governo Federal, conforme explicitado no edital de privatização da Cia Vale do Rio Doce.

Propôs-se, em síntese, que fosse mantido esse fundo, que os 85 milhões fossem incorporados a ele e que 80 milhões, os quais deveriam vir daquele processo de reversão - e o processo de financiamento dos municípios que haviam recebido recursos, mesmo um financiamento bastante subsidiado, deveria ter recursos para o caixa do Fundo - poderiam, a médio prazo, transformar-se em 150 milhões de reais, o que poderia ser significativo para atender às carências e às necessidades desses municípios.

Também se insistiu com o Ministro que o valor fosse alterado, não sendo mais o de 85 milhões; segundo, que a destinação fosse explícita, ou seja, que os recursos serão destinados aos municípios da área de influência da Cia. Vale do Rio Doce, nos oito Estados onde ela atua; e, terceiro, que haveria alguém com experiência para gerenciar esse fundo. A proposta original é que fosse a Fundação da própria Vale, juntamente com a Fundação que atua junto aos empregados. De qualquer maneira, levamos a questão ao Ministro, sobretudo, com essas três inquietudes. Perguntas que eram fundamentais para os Prefeitos e Governadores, uma vez que havia o interesse dos governos dos Estados do Pará, Minas Gerais, Espírito Santo e do Maranhão, para citar quatro dos oito Estados, onde é muito grande a incidência de carência dos Municípios da área de influência do projeto da Vale do Rio Doce.

Após muitas delongas, fomos aos ilustres Senadores porque o Ministro Antonio Kandir mostrou boa vontade e sensibilidade ao pleito dos Prefeitos e Governadores e procurou estudar uma alternativa. Durante este mês de abril, nós, Parlamentares, mantivemos vários contatos com o Ministro Antonio Kandir e com o Presidente do BNDES.

Na semana passada, no dia 17, para ser preciso, tivemos uma audiência com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Ministro Antonio Kandir. Participei como representante dos Parlamentares na negociação final das propostas que estavam sendo concebidas para salvar este Fundo que, - seria e é importante para os Municípios, de tal ordem - depois de muitas discussões, ficou definido pelo próprio Presidente da República teria de ser mantido com o mecanismo um pouco diferente, mas de tal ordem que os recursos seriam ampliados e a sua destinação em favor dos Municípios seriam assegurados. Portanto, são as três condições que defendíamos e que seria gerido pelo BNDES, que é o Banco de Desenvolvimento Econômico e Social, que tem hoje uma carteira voltada para o social.

Tínhamos algumas restrições quanto a essa destinação pela grandeza do BNDES, pois este banco não está acostumado a trabalhar com pequenos e médios projetos de interesse de Estados e municípios. Mas, em função da garantia do Presidente do BNDES de que esse setor da área social seria ampliado e esse programa poderia ser incorporado como prioritário, ficou mais ou menos definido que os recursos seriam mantidos, ampliados e a destinação assegurada.

Portanto, quanto ao problema do fundo, tivemos a garantia do Presidente da República e do Ministro Antonio Kandir de que seria viabilizado.

De fato, foi concretizado na quinta-feira à noite, num encontro entre vários parlamentares, o Ministro Antonio Kandir, o Ministro Clóvis Carvalho e o próprio Presidente da Vale do Rio Doce, com a assinatura desse protocolo.

Em síntese, esse protocolo trata claramente daquilo que estamos falando. Ele diz:

- "os R$85.900 milhões voltados à reserva e ao desenvolvimento das regiões de influência da Vale do Rio Doce serão investimentos mantidos nas comunidades que integram a área de influência da Vale.

- que a utilização desses recursos será orientada por princípios e parceria de integração participativa: comunidade, empresa e Poder Público.

- outro aspecto: todos os critérios que historicamente foram adotados pela Vale na aplicação, ou seja, os mecanismos, os critérios, os prazos, as prioridades setoriais seriam mantidas, que seria uma condição sine qua non que os prefeitos buscavam e lutavam. De tal ordem, foi concebido um protocolo em que o BNDES passou a assumir a gestão financeira dos recursos e a definir critérios e linha de atuação.

Mais importante é que, além dos 85 milhões, o BNDES se compromete com a incorporação de mais 115 milhões dos seus recursos orçamentários a este programa, com um total de 200 milhões, aplicando os juros e as condições que aplicadas anteriormente pelo fundo tradicional da Vale do Rio Doce, ou seja, 1% ao ano em favor dos municípios. A Vale passa a fazer o papel de entidade de transição. Diz claramente:

"A Vale repassará ao BNDES a metodologia e os parâmetros historicamente adotados na aplicação dos recursos." Ou seja, relação dos municípios, prioridades, os planos de aplicações que aí existem, a participação dos Estados, como também colaborar com o BNDES na elaboração do respectivo plano de aplicação de recursos." Portanto, a Vale não se afasta, pois fará um papel de entidade de transição, e o BNDES assumirá a gestão desse programa, incorporando um valor altamente significativo.

Quero lembrar aos Srs. Senadores que a legislação que trata da Companhia Vale do Rio Doce define que 8% do lucro líquido da Vale deve ser destinado a atender os Municípios da sua área de influência, como efeito compensatório. Mas, na verdade, a Vale nunca aplicou os 8%. Aplicou no máximo 5%. E essa percentagem era definida anualmente em assembléia geral pela Companhia Vale do Rio Doce. E a média anual, nos últimos anos, tem sido de R$25 milhões para aplicação nos Estados e Municípios em projetos de infra-estrutura econômica e social.

Portanto, essa grande alteração do volume de recursos que passa a cotar já por R$200 milhões muda toda a filosofia do programa.

Por outro lado, a nossa ressalva é a seguinte: os critérios serão aplicados rigorosamente, como historicamente tem ocorrido nesses 47 anos de Companhia Vale do Rio Doce, desde a época de Minas Gerais, e nos oito Estados que têm projetos ligados à Vale?

Foi feita uma redefinição e houve a garantia desses recursos. Creio que houve uma vitória, um fato positivo. Isso não impede que o consórcio que adquirir a Vale incorpore um compromisso social com as comunidades. Mas não nos cabia negociar esse percentual no protocolo. Esse não é um papel nosso. Não cabia ao Governo fazê-lo. Mas deveremos oportunamente trabalhar junto ao consórcio que vier adquirir as ações da Vale do Rio Doce que pertencem ao Governo, para negociar essa responsabilidade que o consórcio não pode rejeitar.

O importante é garantir os mecanismos históricos de aplicação dos recursos em favor dos Municípios carentes, definir as áreas e as condições de financiamento subsidiado e as condições de doação. Oitenta por cento de recursos são financiados, como disse, de forma subsidiada; e 20% são doados e, portanto, são recursos não reversíveis.

De qualquer maneira, esse trabalho feito pelos Prefeitos dos oito Estados e de vários Parlamentares do meu Estado e de outros Estados que atuaram em favor da garantia desse mecanismo, já foi uma grande vitória, não tenho dúvida. Foi um grande compromisso que o Governo honrou com esses Municípios na privatização da Vale do Rio Doce.

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª me concede um aparte?

O SR. COUTINHO JORGE - Concedo o aparte a esse companheiro do meu Estado, o nosso caro Senador Ademir Andrade.

O Sr. Ademir Andrade - Senador Coutinho Jorge, fico realmente impressionado. Os senhores que defendem o Governo se conformam com tão pouco e se deixam enganar com tanta facilidade. Tenho uma denúncia grave, que vou fazer num pronunciamento em seguida sobre as terras da Vale do Rio Doce. Mas quanto ao fundo, quero dizer que não consigo entender como os senhores se conformam com isso. Em primeiro lugar, o lucro da Companhia Vale do Rio Doce, esse lucro de onde se retiravam recursos para esse fundo, não vai mais existir a partir do momento em que ela estiver privatizada. V. Exª falou no final que vai tentar isso, vai tentar aquilo outro, mas é claro que a empresa privada não vai dar fundo para coisa nenhuma. Então, o Brasil, o Estado do Pará, os Municípios da área de influência da Vale perdem esses recursos, que não são apenas da ordem de R$25 milhões. Neste ano de 1996 e em 1997, estavam previstos recursos da ordem de R$40 milhões para aplicação nesses Municípios. Mas o BNDES, que está louco, desesperado, na pessoa desse senhor aí, esse Luiz Carlos Mendonça de Barros, que é uma pessoa obcecada pela privatização da Companhia Vale do Rio Doce, vem agora com essa história de que está tirando a função de companhia de desenvolvimento da Vale, passando-a para o Estado. E V. Exª vem elogiar o fato de ele estar passando R$120 milhões do BNDES para o fundo. Na verdade, deixou-se de ter um fundo que vem do lucro líquido de uma empresa para tirar-se dos recursos públicos - porque recursos do BNDES são recursos públicos -, para se fazer a doação com o fim de tapear pessoas. Nós não podíamos nunca, em nenhuma circunstância, aceitar a perda desse fundo. Uma dos condições a serem estabelecidas no edital de venda da Vale deveria ser a seguinte: a empresa que ganhar a Vale terá como obrigação manter o compromisso de destinar 8% do seu lucro líquido ao desenvolvimento dos Municípios da sua área de influência e do seu Estado. É lamentável que os senhores se conformem com um negócio como esse. A Vale não vai dar mais coisa nenhuma. Agora, o BNDES vai dar o dinheiro agora - e não será por muito tempo; só Deus sabe se o BNDES vai cumprir esse compromisso. V. Exª sabe que o BNDES não está cumprindo nem com o compromisso de destinar recursos para a macrodrenagem no Estado do Pará. Não consigo compreender o conformismo dos senhores diante dessa situação. Não aceitaria isso como governista em nenhuma hipótese. A Vale do Rio Doce deveria continuar dando 8% de seu lucro líquido. A empresa que ganhasse a Vale deveria ter a obrigação de continuar fazendo isso. O Governo quer tapear todo mundo, e V. Exª sabe disso. No começo falou-se que metade do dinheiro da privatização iria para investimento dos Estados. Hoje, já não se fala mais nisso, não se fala em coisa nenhuma. Sempre que alguém reage, o BNDES dá "bombom", conforma políticos e outras pessoas. Sinceramente, estou revoltado com isso. Não aceito isso como uma vitória. Percebo isso como um consolo, um consolo que não vai existir por muito tempo. V. Exª sabe que esses R$80 milhões que são emprestados aos Municípios dificilmente têm retorno. As Prefeituras que tomarem esse dinheiro não têm condições de retorná-lo, não têm condições de mandar de volta para o fundo esse dinheiro. V. Exª sabe muito bem, como homem experiente, como Secretário de Planejamento que foi, o que vai acontecer com esses R$80 milhões. Só Deus sabe se o BNDES vai tirar do caixa dele R$122 milhões para atender Municípios. Se o fizer, será um pecado. Antes o fundo era uma percentagem sobre o lucro líquido da empresa; hoje, o fundo vai ser um recurso público. Tudo para atender ao interesse do Presidente Fernando Henrique Cardoso de privatizar a Vale do Rio Doce a qualquer custo. Lamento profundamente o conformismo dos senhores que defendem o Governo.

O SR. COUTINHO JORGE - Entendo a sua posição de Parlamentar de Oposição. A inquietude de V. Exª é também a minha. Penso exatamente como V. Exª.

O correto seria o consórcio vencedor manter este fundo para financiar os Municípios da sua área de influência. Concordo em gênero, número e grau com V. Exª quanto a isso.

No entanto, como o processo de privatização está-se dando de forma irreversível, tínhamos de tomar uma decisão e de encontrar um mecanismo realista, sem utopias, que funcionasse e atendesse os Municípios. Essa decisão foi tomada não por mim, mas pelos Prefeitos dos Municípios que recebem esses recursos há anos.

Eles fizeram ao Governo a proposta de tentar viabilizar um mecanismo similar - já que seria muito difícil alterar o edital de licitação - para manter esses benefícios para os Municípios.

A Vale do Rio Doce nunca cumpriu o que a legislação estabelece, ou seja, a destinação de 8% do seu lucro líquido. Fizemos um levantamento recente e verificamos que ela nunca cumpriu esse percentual, que, no máximo, chegou a 5%. Sendo deliberada em assembléia geral, a média variava entre R$20 e R$25 milhões, que seriam aplicados com base em critérios de prioridade e carência já definidos e aceitos pelos Estados e Municípios. Quanto a isso, é indiscutível a aceitação.

O que se fez? O que o Governo fez quando lançou o edital e colocou os R$85 milhões foi uma projeção para cinco anos, dos R$20 milhões que, em média, a Companhia Vale do Rio Doce destinava para esse fundo. Mas, ao invés de destinar isso para o Fundo de Desenvolvimento para aplicá-lo no Município, definiu esse fundo para aplicar em desenvolvimento regional genericamente. Portanto, em rigor, a intenção do Governo era acabar definitivamente com esse fundo. Não há dúvida.

A luta dos Prefeitos foi legítima, os interesses dos Parlamentares que atuaram foram legítimos, no sentido de tentar salvar o possível de qualquer maneira. Não se aceitava a destinação desses R$85 milhões genericamente; exigia-se que esse valor fosse destinado a cumprir o papel do fundo da Vale, de modo que, além da destinação desses recursos para os Municípios, da área de influência da Vale, eram necessárias a ampliação e a garantia de mais recursos.

Em 47 anos, a Vale aplicou US$300 bilhões. Depois de muitas negociações, não foi o Governo que, de forma benevolente, destinou esses recursos para o fundo e o ampliou através do BNDES; não, absolutamente! Foi um trabalho dos Municípios, foi um trabalho dos Prefeitos, foi um trabalho dos Parlamentares, dos Governadores, que encontrou, da parte do Presidente, a sensibilidade e a compreensão no sentido de que ele tinha de ceder, tinha de mudar. Por isso, aquiesceu realmente, a fim de implantar esse programa. Ele substituiria o fundo, mas de forma mais ampla, com recursos significativos. Os recursos serão mantidos nos mesmos financiamentos, nas mesmas condições anteriores.

Foi, portanto, uma nova alternativa, um novo mecanismo de financiamento. Mas o importante é que os Prefeitos agora estão tranqüilos, porque, pelo menos nesse período, terão recursos para financiar a infra-estrutura econômica e social, o que, da forma como estava no edital, era absolutamente inviável.

Quero fazer justiça à sensibilidade do Presidente, que entendeu a pressão, teve de ceder e realmente conseguiu recursos a mais para que se viabilizasse esse programa de apoio a todos os Municípios da área de influência dos projetos da Vale do Rio Doce.

É claro que, se além disso, a empresa incorporasse 4%, 5%, 6%, como historicamente a Vale fazia a 5%, seria o desejável. Mas isso não impede que se negocie com a empresa, posteriormente, esse condicionante.

De qualquer maneira, como ressalva, como garantia de que recursos seriam assegurados para atender Estados e Municípios na área de influência, creio que a assinatura desse documento, na quinta-feira, mostrou a boa vontade do Governo Federal, a determinação do Presidente e do Sr. Ministro Antonio Kandir, no sentido de que não se pode enganar. Temos de tentar resolver um problema que aí ficou e que continua com a privatização da Vale.

Portanto, é uma solução, sim, pode não ser a desejável, mas é a possível técnica, econômica e politicamente no momento. Não quer dizer que vamos ficar de braços cruzados e que não lutaremos por novas alternativas. Mas, no momento, é uma segurança que foi aceita pelos Governadores e Prefeitos da área de influência da Vale e pelos vários Parlamentares que participaram da assinatura desse protocolo na quinta-feira passada.

No entanto, cabe-nos acompanhar os aspectos relacionados à normatização e à definição clara da metodologia pelo BNDES, já que eles têm 30 dias para isso. Também devemos continuar acompanhando as instruções normativas, pois os recursos cresceram de forma significativa, mas é importante que os critérios e as metodologias sejam mantidas rigorosamente, para que os Municípios carentes de infra-estrutura econômica e social continuem recebendo esses benefícios sem a complicação e a burocracia de um banco como o BNDES.

Essa foi uma das nossas argumentações ao Presidente do BNDES e ao Ministro Kandir, já que o BNDES é um banco voltado para o setor privado, com toda uma metodologia sofisticada. Portanto, se estamos incorporando isso a um banco como o BNDES, que não tem a tradição histórica de utilizar recursos, sobretudo da área social, cabe a nós, Parlamentares, acompanhar esses critérios rigorosamente, a fim de que esse protocolo, estimulado pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso como um compromisso seu com os Governadores e Prefeitos da área de influência do projeto da Vale do Rio Doce, possa ser viabilizado e não fique só no papel, mas que seja concretizado.

De qualquer forma, no seu novo mecanismo, o fundo foi melhorado, foi ampliado - não tenho dúvidas -, foi garantido em termos de valores de uma forma tal que, historicamente, não tínhamos igual. Mas é fundamental, insisto, que se acompanhe os mecanismos que viabilizarão, através do BNDES, o envolvimento desse fundo.

Quero lembrar também que, nesse protocolo, além do Ministério, do BNDES, da Vale, do próprio Comunidade Solidária, através de seu Conselho como instância de recursos dos Municípios, das entidades não-governamentais que podem pleitear recursos desse fundo, será uma área de recursos, quando as próprias críticas, as próprias carências, as próprias correções poderão ser viabilizadas através de um Conselho do Comunidade Solidária. Portanto, serve o Comunidade como um anteparo, como fórum natural para que as críticas e qualquer equívoco na aplicação do plano ou os programas e projetos concebidos para esses Municípios possam ser corrigidos.

De qualquer maneira, dentro das circunstâncias, das possibilidades do momento, foi a melhor solução possível que se encontrou. E quero parabenizar a sensibilidade do Ministro Antonio Kandir, do Presidente do BNDES e, particularmente, do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que, atendendo aos anseios e à busca dos Prefeitos, dos Governadores e dos Parlamentares, tentou reverter um quadro que parecia muito negro em relação à perda do fundo, que tem sido historicamente muito importante em favor dos Municípios.

Creio que esse foi mais um passo dado. Por isso, festejo aqui esse passo, esse avanço e estarei acompanhando para que esse protocolo não fique só no papel, mas que realmente possa resolver os problemas das áreas social, econômica e ambiental de todos os Municípios da área de influência de todos os projetos da Vale do Rio Doce, dentro dos oito Estados da Federação brasileira.

Eram essas as considerações que queria trazer ao Plenário sobre esse tema palpitante, mas muito importante para os nossos Municípios.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/04/1997 - Página 8747