Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO NA ATUAL POLITICA DE ESTOCAGEM DE GRÃOS, TENDO EM VISTA A PERDA DE ATE 40% DA SAFRA BRASILEIRA, DEVIDO A MA QUALIDADE DOS SILOS OU ARMAZENS, PERDAS ESTAS QUE NÃO ATINGEM 1% NOS PAISES DESENVOLVIDOS.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA.:
  • NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO NA ATUAL POLITICA DE ESTOCAGEM DE GRÃOS, TENDO EM VISTA A PERDA DE ATE 40% DA SAFRA BRASILEIRA, DEVIDO A MA QUALIDADE DOS SILOS OU ARMAZENS, PERDAS ESTAS QUE NÃO ATINGEM 1% NOS PAISES DESENVOLVIDOS.
Publicação
Publicação no DSF de 09/05/1997 - Página 9272
Assunto
Outros > AGRICULTURA.
Indexação
  • NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, POLITICA, ARMAZENAGEM, GRÃO, MOTIVO, PERDA, PERCENTAGEM, SAFRA, BRASIL, EFEITO, QUALIDADE, SILO, INSUFICIENCIA, TECNOLOGIA, APLICAÇÃO, ESTOCAGEM, PROPRIEDADE RURAL, SEGURANÇA, PERMANENCIA, ESTOQUE.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os cadastros da Companhia Nacional de Abastecimento - Conab, indicam que o Brasil possui capacidade para estocar mais de 88 milhões de toneladas de grãos em armazéns e silos espalhados por todo o território nacional.

Desses, apenas o equivalente a 45 milhões de toneladas são credenciados a abrigar os estoques reguladores do Governo.

Isso equivale a dizer que, de cada dois silos ou armazéns, apenas um apresenta condições consideradas satisfatórias para estocagem de produtos adquiridos ou financiados pelo Governo Federal.

Nossa safra gira ao redor de 80 milhões de toneladas anuais, o que significa que temos capacidade para estocá-la toda e ainda manter estoques estratégicos de safras anteriores, correspondentes a mais de 10% da safra anual.

Se considerarmos que nem toda a safra chega a ser estocada, sendo uma parcela logo comercializada, nossa margem de armazenamento de produtos de safras anteriores sobe sensivelmente, aumentando nossa margem de segurança alimentar.

Onde está, então, a falha no sistema de armazenagem agrícola brasileiro? Inúmeros estudiosos do Brasil agrícola apontam perdas de safra que variam entre 10% e 40% da produção bruta. Qualquer desses valores é significativo, se considerarmos que, em países desenvolvidos, o limite superior admitido para as perdas está abaixo de 1%.

Como pode um país que tem a pretensão de se tornar o "celeiro do mundo" conviver com tal desperdício? Ufanamo-nos de nosso potencial agrícola e deixamos escapar pelo ralo boa parte de nosso alimento. Avulta um claro descompasso entre nossos anseios e a dura realidade.

Seriam, metafórica e literalmente falando, as fechaduras quebradas, os furos nas paredes, as infiltrações no telhado que fazem de nossos celeiros vazarem os preciosos grãos, fruto do trabalho árduo do agricultor, base do projeto de um Brasil de primeira grandeza?

Inexistiria remédio eficaz contra os milhares de ratos que sorrateiramente invadem os silos e armazéns destruindo, País afora, o estoque de alimentos dos brasileiros?

Ratos cinza de quatro patas e cauda comprida ou ratos bípedes de mãos e ganância ainda maiores? Alguma providência objetiva tem que ser tomada para salvar nossa safra.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a agricultura é, neste País, uma questão de segurança nacional. Ela responde por quase metade de nossas exportações.

A segurança alimentar nacional traduz-se pela exigência de safras crescentes e suficientes para nutrir corretamente todo e qualquer brasileiro, além de gerar estoques estratégicos adequados.

Temos que produzir excedentes indispensáveis para nossa política de aumento de exportações e conquista de novos mercados.

Assim sendo, é premente que se corrijam as distorções em nossa cadeia produtiva, desde o cultivo até os sistemas de armazenagem, transporte e comercialização.

No que respeita à estocagem, foco central deste pronunciamento, a Conab, em boletim informativo de janeiro de 1997, dá conta de que lavrou até aquela data 22.981 ocorrências de irregularidades em armazéns de terceiros. Dessas, 73,9% já estariam solucionadas, 8,1% entregues às mãos da Justiça, restando 6.004 pendências.

Somente no ano de 1996, foram constituídos 1.402 processos por perdas ou desvios em armazéns. Trata-se, evidentemente, de um número alarmante, face ao total de 15.000 unidades de armazenamento cadastradas pela Conab.

Se considerarmos que as ocorrências em 1996 envolvem cerca de 9% dos armazéns, teríamos implicados oito milhões das quase 90 milhões de toneladas da nossa safra estocada.

O mesmo boletim da Conab traz explicações do Dr. Francisco Turra, Presidente da Companhia, nas quais informa que, em 1996, foram vistoriadas 29 milhões de toneladas dos estoques em AGF e EGF, isto é, grãos adquiridos ou financiados por empréstimos do Governo Federal. Constatou-se que 436 mil toneladas haviam sido desviadas, representando 1,5% do total vistoriado.

O mesmo Dr. Turra enfatiza que a Conab teria condições de fiscalizar 100% dos estoques governamentais. E o restante da safra? Não há qualquer tipo de controle físico ou sanitário? Esse distanciamento do Governo em relação ao controle de qualidade é que faz países como os Estados Unidos proibirem a entrada de produtos brasileiros sob o pretexto de que não têm fiscalização sanitária na origem.

Nosso sistema de armazenamento, se quantitativamente suficiente, padece de problemas graves, a exigirem ações corretivas urgentes.

São problemas como o da inadequação da rede local frente ao tipo de produto demandante (granel ou ensacado); má distribuição espacial da rede; qualidade das instalações; existência ou não de equipamentos que garantam a qualidade dos produtos estocados; facilidade de escoamento, tanto na existência de vias quanto de meios de transporte.

Todos eles contribuindo para a instabilidade do setor agrícola, atingindo diretamente todos os agentes envolvidos, desde os produtores até os consumidores finais.

Obviamente, quaisquer desestruturações, disfunções políticas ou carências tecnológicas, conjunturais ou estruturais, existentes nos diversos estágios da produção, industrialização e comercialização dos produtos agrícolas afetam direta ou indiretamente o sistema nacional de ensilagem.

Conclui-se, por conseguinte, que ainda é extremamente precária a coordenação e execução de uma política de armazenagem. Política que inclua uma fiscalização efetiva; que defenda margens de lucro condizentes em todos os estágios; que colabore para evitar a especulação perniciosa, a intermediação desnecessária; que proteja o produtor rural de preços aviltados e, finalmente, contribua para garantir ao consumidor do mercado interno as quantidades demandadas a preços justos, ou seja, a própria normalidade do abastecimento.

O Governo Federal, desde o período Collor, decidiu desobrigar-se da manutenção de armazéns próprios, repassando para Estados e Municípios a maioria dos que detinha, conservando menos de 10% da capacidade de estocagem nacional.

Não podendo fazer retornar o passado, é preciso que o atual e os futuros governos enfrentem a realidade de lidar com armazenadores privados para os estoques governamentais.

Há que haver controle férreo e rigor espartano na cobrança de responsabilidades por perdas e desvios. Impõe-se a busca de soluções político-estratégicas para os problemas que resultam da opção feita. Se não, vejamos.

Tendo em vista o custo dos armazéns em nível de fazenda, o acesso a essa infra-estrutura de apoio dá-se normalmente aos agricultores com áreas acima de 200 hectares. Observe-se, contudo, que os grandes países agrícolas têm na ensilagem, na origem, isto é, na fazenda, a parte maior de seu sistema de armazenamento.

Assim se faz na Europa, onde 50% da produção fica na fazenda; na Argentina, com 45%, e, nos EUA, com mais de 65%.

No Brasil, estamos abaixo de 10%, o que obriga a transferência acelerada da produção para os agentes coletores, prejudicando o correto beneficiamento do produto e maximizando as perdas.

Ocorrem graves problemas de adequação das unidades de armazenamento, quanto ao tipo de produto estocado e manuseio dos estoques, além de atraso tecnológico. Temos poucos armazéns equipados com termometria, aeração, laboratórios, balança de fluxos etc, que garantam a permanência e a segurança dos estoques, por longos períodos.

Os agentes que operam em nível coletor são as cooperativas, os armazéns gerais, os Governos Municipais, Estaduais e Federal. Nesse universo, verifica-se a real possibilidade da existência de déficit de armazenagem em áreas de expansão da fronteira agrícola e em localidades de crescimento acelerado da produtividade, onde deveriam estar presentes os órgãos públicos reguladores.

Enquanto isso, nas áreas consagradamente rentáveis, registra-se uma concorrência acirrada entre os agentes armazenadores.

Os armazéns portuários, de acordo com o tipo de produto, necessitam de novas tecnologias, adaptações e, localizadamente, de aumento de velocidade da recepção e expedição, além de uma maior flexibilidade intermodal.

Em se tratando da formação e guarda de estoques reguladores, nota-se uma ação incipiente e improvisada, tendo em vista a quantidade cada vez menor de recursos alocados pelo Governo e a falta de uma definição clara da política de sustentação da atividade.

Acentue-se uma precariedade de pesquisa e de treinamento de pessoal no segmento, principalmente nos últimos 10 anos, em decorrência da falta de recursos e incentivos governamentais.

Considere-se o anacronismo da legislação correlata, alguns conflitos na normalização técnica e a ausência de diretrizes, para se ter um quadro de cores turvas e pouco estimulantes para a agricultura do Brasil no século XXI.

Por falta de coordenação, observa-se um crescimento pouco ordenado da capacidade estática, agravando os problemas da distribuição espacial da rede, de qualificação e dimensionamento.

De fato, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de acordo com os dados da Conab, nossa capacidade está estacionária ao redor de 15 mil armazéns desde 1995, correspondendo a cerca de 89 milhões de toneladas estáticas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, repetindo o que já disse neste discurso, a agricultura é, neste País, uma questão de segurança nacional. É a resposta a muitos dos graves problemas brasileiros, como a fome, o desemprego, a conquista de novos mercados consumidores, enfim, até à melhoria de nossa Balança Comercial.

Todavia, como toda atividade de alto risco, carece de apoio, a nosso ver, cabe ao Governo Federal dar as respostas às questões aqui levantadas, para o bem do Brasil e dos brasileiros.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/05/1997 - Página 9272