Discurso no Senado Federal

DISTANCIAMENTO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DO POVO BRASILEIRO EM RELAÇÃO AO GRAU DE DESENVOLVIMENTO ECONOMICO JA ALCANÇADO PELO PAIS, TENDO EM VISTA INFORMAÇÕES APURADAS PELO RELATORIO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO, PUBLICADO RECENTEMENTE PELO PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO - PNUD.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA HABITACIONAL.:
  • DISTANCIAMENTO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DO POVO BRASILEIRO EM RELAÇÃO AO GRAU DE DESENVOLVIMENTO ECONOMICO JA ALCANÇADO PELO PAIS, TENDO EM VISTA INFORMAÇÕES APURADAS PELO RELATORIO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO, PUBLICADO RECENTEMENTE PELO PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO - PNUD.
Publicação
Publicação no DSF de 09/05/1997 - Página 9274
Assunto
Outros > POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), DEMONSTRAÇÃO, PRECARIEDADE, NIVEL, ESCOLARIDADE, RENDA PER CAPITA, HABITAÇÃO, BRASIL.
  • ANALISE, DEFICIT, HABITAÇÃO, PAIS.
  • APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, AUMENTO, LIMITAÇÃO LEGAL, INVESTIMENTO, ENTIDADE FECHADA, PREVIDENCIA PRIVADA, MERCADO IMOBILIARIO, CONSTRUÇÃO, HABITAÇÃO POPULAR, REDUÇÃO, DEFICIT, HABITAÇÃO, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ADOÇÃO, SUGESTÃO, REDUÇÃO, NIVEL, CARENCIA, OFERTA, HABITAÇÃO, POPULAÇÃO, BRASIL.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda há muito a percorrer para que se promova a aproximação entre os níveis de desenvolvimento humano que caracterizam o povo brasileiro e o grau de desenvolvimento econômico já alcançado por nosso País. Certamente, não há contraste mais vergonhoso do que esse. De um lado, um País de economia pujante, uma das mais industrializadas entre as nações emergentes e a décima maior do mundo; de outro lado, um Brasil onde a grande parte do povo é maltratado, mal alimentado, pouco educado e sem moradia.

Esse paradoxo entre estrutura econômica e bem-estar social, no caso brasileiro, ficou claro a partir das informações apuradas pelo Relatório de Desenvolvimento Humano, publicado recentemente pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o PNUD. Em que pese aos inegáveis avanços dos indicadores sociais brasileiros ao longo das últimas três décadas, o fato é que, comparado com os enormes recursos de que dispomos em razão do tamanho de nossa economia, o desenvolvimento humano no Brasil é pífio, ridículo e mesmo cruel.

Décima economia do mundo, estamos classificados em qüinquagésimo oitavo lugar no que concerne ao índice de desenvolvimento humano elaborado pelo PNUD. Na América Latina, nosso povo vive piores condições do que, por exemplo, os povos do Panamá, da Venezuela, do México e da Colômbia. Em relação à situação do Chile, do Uruguai, da Costa Rica e da Argentina, estamos ainda mais afastados.

À guisa de ilustração, o tempo de escolaridade do nosso povo é, em média, de apenas quatro anos. Por sua vez, 16% da população brasileira é analfabeta. Quando se sabe que, no Brasil, considera-se alfabetizada a pessoa que mal sabe assinar o próprio nome, fica-se imaginando qual seria a verdadeira percentagem de analfabetos no País. Cito, de passagem, estatísticas sobre escolaridade apenas para compartilhar com os Srs. Senadores minhas apreensões a respeito das dificuldades que aguardam o Brasil no processo de globalização em que se vai adentrando, no qual há pouco ou nenhum lugar para uma mão-de-obra de baixo nível educacional.

Quanto ao item distribuição de renda - talvez o indicador que mais reflita o grau de solidariedade existente em uma nação - não é necessário relembrar que somos o pior País do mundo. No Brasil, os 20% mais ricos da população detêm uma fatia da renda nacional 32 vezes superior à dos 20% mais pobres: um recorde mundial! Fosse má distribuição de renda esporte olímpico, voltaríamos de Atlanta com nossa medalha de ouro garantida.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tudo isso nos faz refletir a respeito de que tipo de elite temos sido para este País. A situação miserável suportada por grande parte do povo brasileiro envergonha-nos e nos apequena aos olhos da comunidade internacional das nações. Parece que, no Brasil, ainda não fomos capazes de superar a divisão intransponível entre casa grande e senzala vigente à época da escravatura.

Feitos esses comentários, porém, gostaria de me limitar, no restante do presente discurso, à consideração de um dos itens mais importantes no que diz respeito à elevação do padrão de vida do povo brasileiro: a habitação.

Ao lado da expectativa de vida ao nascer, do grau de escolaridade e da renda per capita, indicadores utilizados pelo PNUD para preparar o índice de desenvolvimento humano dos diversos países, as condições de moradia figuram como um dos fatores chaves para o bem-estar da população. Tivessem as Nações Unidas considerado também a situação habitacional no cômputo do índice de desenvolvimento humano, talvez o Brasil ocupasse uma colocação ainda mais desfavorável do que aquela que lhe coube.

Pois bem, vejamos. O déficit habitacional no Brasil é de 12,7 milhões de residências, calculado por pesquisadores da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo. Esse cálculo foi baseado em informações obtidas a partir do censo demográfico de 1991. Desde então já se passaram cinco anos. No entanto, como esse período coincide com a falência do Sistema Financeiro de Habitação acredito que a estatística ainda seja válida. O número respeitável de 12,7 milhões para o déficit habitacional brasileiro representa uma estimativa ampla, incluindo a moradia conjunta, na qual se amontoa mais de uma família, a moradia precária e a moradia deficiente, a que não conta com água potável encanada nem sistema de esgoto. Vê-se que muitos recursos têm de ser mobilizados. São 12,7 milhões de unidades que precisam ser construídas ou dotadas de saneamento básico.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a reorganização do Sistema Financeiro da Habitação é matéria complexa, de discussão demorada e envolve uma série de técnicas. Entretanto, existem soluções parciais que possuem a vantagem de serem mais simples, de estarem ao alcance de nossa mão e de poderem ser implementadas de forma imediata.

Enquanto se vai desenhando o esboço de uma nova roupagem institucional a presidir a reestruturação das políticas públicas voltadas para o setor habitacional, eu gostaria de apresentar uma sugestão que muito nos poderia auxiliar na diminuição do déficit habitacional brasileiro em curto intervalo de tempo.

Hoje em dia é crescente a participação, no mercado financeiro, das entidades fechadas de previdência privada, chamadas popularmente de fundos de pensão. Tais entidades, responsáveis pela gestão de patrimônio pertencente aos empregados de determinada empresa ou de grupo de empresas, patrimônio que há de responder posteriormente às aposentadorias de seus titulares, fortalecem-se a cada dia no Brasil, aumentando a soma de recursos a sua disposição. Exemplo do peso financeiro dos fundos de pensão tem sido sua participação agressiva no processo de privatização das empresas estatais.

Ainda, nesta semana, assistimos à privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Os ganhadores dessa política de privatização, desse leilão, foram justamente os fundos de pensão, liderados pela Companhia Siderúrgica Nacional.

Nesse particular, destacam-se os fundos vinculados ao Banco do Brasil, à Petrobrás e ao Banco Central, respectivamente a PREVI, a PETROS e o CENTRUS.

Calcula-se que os fundos de pensão atualmente administram um patrimônio da ordem de R$62 bilhões. Desse montante, R$ 8,8bilhões estão aplicados em imóveis, ou seja, 14% do total. De acordo com a Associação Brasileira de Entidades Fechadas de Previdência Privada - a ABRAPP, haveria interesse de seus associados em aumentar significativamente a exposição de sua carteira de investimentos às aplicações no setor imobiliário.

Não é necessário dizer que, caso o aumento dos investimentos em imóveis dos fundos de pensão pudessem ser direcionados para a construção de novas unidades residenciais, isso seguramente teria um efeito nada desprezível sobre a diminuição do déficit habitacional no Brasil, já que se está tratando de recursos na casa dos bilhões de reais.

No entanto, o Conselho Monetário Nacional, na contramão das necessidades econômicas do País, reduziu, recentemente, de 20% para 15% a aplicação das reservas dos fundos de pensão em imóveis. Até o ano 2002, todos os fundos deverão se enquadrar nesse limite.

Para o SECOVI-SP, "a menor participação dos fundos de pensão no setor é altamente negativa, mesmo porque a grande afinidade de longo prazo com o setor imobiliário, bem como as garantias reais oferecidas pelo bem imóvel, justificam exatamente o inverso, ou seja, a ampliação ou eliminação dos limites de direcionamento."

Até 1983, esse limite era de 40%. Depois, a escalada da dívida pública interna e a crescente dificuldade do Governo em financiar-se junto ao mercado foram levando à adoção de limitações legais mais rígidas para as entidades de natureza financeira, no que diz respeito a uma série de investimentos de caráter estritamente privado.

O objetivo dessas limitações tem sido garantir a sobra de vultosos recursos para a compra de títulos do Governo. A mesma resolução a que me referi, por exemplo, estabelece que até 100% dos recursos dos fundos de pensão podem ser aplicados em títulos públicos de responsabilidade do Tesouro Nacional. Por meio desse tipo de regulamentação, cria-se uma espécie de poupança compulsória destinada ao financiamento do Governo Federal deficitário.

Então, Sr. Presidente, a proposta que tenho a apresentar, com a intenção de diminuir um pouco o enorme déficit habitacional brasileiro em tempo não muito longo, é esta: que se aumente o limite legal hoje vigente para investimentos imobiliários por parte das entidades fechadas de previdência privada, os fundos de pensão. Isso garantirá que o acréscimo de recursos voltados para os investimentos imobiliários atenda à necessidade por novas moradias. Tal aumento do limite legal deveria ser vinculado, de maneira exclusiva, às inversões em construção de residências.

Não seria má idéia, por exemplo, o Conselho Monetário Nacional revogar essa medida, aumentando a percentagem do limite legal para 40%, valor vigente, como disse há pouco, até 1983. Caso isso ocorresse, poderia haver uma expansão dos recursos disponíveis para investimentos em moradias de até R$6,2 bilhões, uma soma bastante respeitável.

O comprometimento de 40% em carteira imobiliária dos recursos disponíveis para aplicação dos fundos de pensão não caracterizaria uma superexposição dessas entidades a um único tipo de investimento. Além do mais, os investimentos em bens de raiz são reconhecidamente conservadores, apresentam alto grau de segurança e estão muito menos sujeitos a oscilações bruscas de valor, como outras opções do mercado, como, por exemplo, ações negociadas em bolsa.

Não deve ser olvidado, outrossim, o benefício que poderia representar a autorização para um maior comprometimento dos fundos de pensão com investimentos imobiliários, em relação à geração de novos empregos, uma vez que se estaria estimulando o setor de construção civil, grande empregador de mão-de-obra, em especial a de baixa qualificação, principalmente agora, quando há um grande desemprego em todo o território nacional.

Ocorre, porém, que não cabe ao Congresso Nacional legislar sobre essa matéria. Em conformidade com o § 1º do art. 40 da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, que dispõe sobre as entidades de previdência privada. As entidades fechadas de previdência privada que temos chamado aqui de fundos de pensão terão suas aplicações reguladas por diretrizes emanadas do Conselho Monetário Nacional.

Dessa forma, a proposta no sentido de que se aumente a percentagem autorizada para as aplicações dos fundos de pensão destinada ao setor imobiliário, aplicações restritas à construção de moradias, deve tomar a forma de um apelo ao Governo Federal, ao Presidente Fernando Henrique e sua equipe econômica e, em particular, ao Conselho Monetário Nacional. Esse apelo eu o faço com toda a ênfase, pois, como já disse, essa é um solução simples, rápida, eficaz e, além de tudo, não envolve nenhuma burocracia da máquina estatal: o setor privado da economia dela se encarregará.

Encerro este discurso tendo a certeza de que serei ouvido pelas autoridades competentes. Confio no apoio de meus nobres Pares para essa proposta, cuja maior virtude é a simplicidade em face do grande impacto que pode vir a alcançar. Ou seja, aumentar o número de moradias para a população brasileira e, também, dar emprego para os desempregados que, neste momento, são milhões neste País.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/05/1997 - Página 9274