Discurso no Senado Federal

APREENSÃO E DESASSOSSEGO DO MEIO RURAL BRASILEIRO, FRENTE AS CONSTANTES INVASÕES DE FAZENDAS PELOS SEM-TERRA. DIFICULDADES DO PEQUENO AGRICULTOR NA OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTO JUNTO AOS BANCOS.

Autor
Lúdio Coelho (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Lúdio Martins Coelho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • APREENSÃO E DESASSOSSEGO DO MEIO RURAL BRASILEIRO, FRENTE AS CONSTANTES INVASÕES DE FAZENDAS PELOS SEM-TERRA. DIFICULDADES DO PEQUENO AGRICULTOR NA OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTO JUNTO AOS BANCOS.
Aparteantes
José Alves, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 10/05/1997 - Página 9321
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • REGISTRO, APREENSÃO, PROPRIETARIO, ZONA RURAL, CONTINUAÇÃO, INVASÃO, SEM-TERRA, EFEITO, FALTA, SEGURANÇA, ATIVIDADE AGRICOLA, CRITICA, OMISSÃO, GOVERNO.
  • CRITICA, CARACTERISTICA, REVOLUÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA.
  • CRITICA, POLITICA AGRICOLA, NECESSIDADE, APOIO, PEQUENO PRODUTOR RURAL.

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ouvimos hoje, aqui no Senado, diversos pronunciamentos tratando de assuntos ligados ao campo brasileiro. Ouvimos o pronunciamento do Senador Ramez Tebet, a respeito do FCO; agora ouvimos o pronunciamento do Senador Nabor Júnior, sobre o Ministro da Agricultura.

E quero tratar hoje, mais uma vez, sobre a reforma agrária brasileira.

A grande imprensa nacional já vem, há quase dois meses, dando um destaque enorme a este assunto, como a marcha dos sem-terra. Todos os dias, na televisão e nos jornais saem notícias a este respeito.

Quero transmitir aos meus companheiros do Senado a apreensão que sinto no meio rural brasileiro.

Há cerca de quinze dias, vi pela televisão um repórter perguntar ao líder Rainha se concordava em ser filmado cumprimentando o Ministro Extraordinário da Política Fundiária, a quem havia chamado de canalha na semana anterior. Ele concordou. Depois disso, o Ministro concedeu um empréstimo para que fosse comprada uma usina de fécula falida, no Pontal do Paranapanema, e também uma frota de caminhões.

Dias atrás, vi um filme, em Uberaba, em que apareciam pretendentes à terra votando se invadiriam ou não uma fazenda; decidiram que sim. Então, tromparam com um trator no portão da fazenda; trator esse financiado pelo Poder Público brasileiro.

Os sem-terra, que foram se reunir com o Presidente da República, saíram de lá dizendo que iriam continuar invadindo propriedades urbanas e rurais.

Há três dias, quando assassinaram um segurança de uma fazenda de lá, um líder dos sem-terra declarou que aquilo era um aviso aos fazendeiros.

Ontem, recebi um ofício da Fetag, do Mato Grosso do Sul, informando que nos últimos 35 dias foram invadidas 10 propriedades naquele Estado. No ano passado, em pronunciamento, aqui no Senado, alertei sobre o caminho que as coisas estão tomando. Não sei até quando teremos que esperar para que o Governo exerça as suas responsabilidades, o Executivo exerça a sua autoridade sobre este assunto.

Assistimos, pela televisão, seguidamente, principalmente no Estado de São Paulo, à Polícia acompanhando invasões. Isso está trazendo um enorme desassossego no campo. Lá no meu Estado, os fazendeiros com as suas famílias estão muito apreensivos, o que está tumultuando o setor agrícola brasileiro.

A Nação precisa tomar consciência, principalmente o pessoal da cidade, de que reforma agrária não se faz do dia para a noite.

Há poucos dias, o Ministro Extraordinário da Política Fundiária disse a mim e ao Presidente do meu Partido, Senador Teotonio Vilela, que eles tinham em estoque 3,5 milhões de hectares de terra, e que a reforma agrária não dependia de mais terras, porque elas existem à vontade.

A Nação precisa tomar consciência de que esse movimento liderado pelo Rainha, pelo Sr. João Pedro Stédile e outros é um movimento revolucionário, que hoje está aglutinando as Oposições ao Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Seria importante que o Presidente da República se conscientizasse de que essas pessoas que estão fazendo as invasões, que estão ameaçando, não são as que o elegeram. Quem elegeu o Presidente Fernando Henrique Cardoso foi a grande maioria da Nação, que acreditou no compromisso de Sua Excelência de fazer as reformas de que a Nação necessita, dentro da ordem, dentro da lei.

Penso que precisamos fazer todas as reformas. O Congresso precisa votar urgentemente o restante das reformas, para que o País assuma sua posição no mundo, uma posição moderna, para que a nossa Administração fique adequada, mas tudo dentro da ordem, tudo dentro da lei.

Então, quero transmitir aos Companheiros aqui do Senado a minha preocupação.

O Sr. José Alves - V. Exª me concede um aparte?

O SR. LÚDIO COELHO - Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. José Alves - Senador Lúdio Coelho, V. Exª, com a responsabilidade que tem no seu Estado, com a sua experiência, traz uma denúncia muito grave à Nação, porque, na medida em que constata que o Governo está permitindo uma desorganização, não está cumprindo as suas funções de dar garantia ao produtor rural e, em conseqüência, nota-se um temor no campo, no seu Estado, no meu Estado, enfim, em todo o País. V. Exª faz este alerta no momento correto, porque entendemos que é hora de encarar e diagnosticar o que está acontecendo no campo brasileiro. O produtor rural tem sido vítima da ausência de uma política agrícola clara; os juros são estratosféricos. Não há em qualquer país do Planeta juros para o campo como há no Brasil, essa taxa de câmbio irreal e uma situação que tem levado o campo a uma desorganização. Estamos expulsando do campo o pequeno produtor, o homem que ama a sua terra e que tem compromisso com ela, como também o médio e grande produtor, que estão sendo sacrificados por esse quadro grave. A diminuição da área agrícola do País, neste ano, levou a uma redução de mais de 400 mil empregos no campo. São esses fatores que, realmente, alimentam e fomentam o Movimento dos Sem-terra, que tem uma visão social justa, correta, com a qual V. Exª, tenho certeza, concorda. Mas os métodos utilizados, a maneira de agir não encontram ressonância com a parte da Nação mais responsável, da qual V. Exª faz parte, com a sua larga experiência, trazendo, nesta manhã de sexta-feira, uma denúncia que consideramos muito importante. Esses fatos realmente assumem uma gravidade muito grande para o contexto e para a paz do País. Muito obrigado a V. Exª pelo aparte.

O SR. LÚDIO COELHO - Agradeço o aparte de V. Exª, nobre Senador José Alves.

O Sr. Romero Jucá - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚDIO COELHO - Com muito prazer, nobre Senador.

O Sr. Romero Jucá - Gostaria também de registrar nesta manhã, nobre Senador, a nossa preocupação - e temos dito isso já da tribuna inúmeras vezes - com a questão da legalidade do Movimento dos Sem-terra. Entendemos que a reforma agrária é um instrumento importante para equacionar a dívida social que o País tem. Entendemos também que tanto a questão da terra quanto a questão da reforma agrária devem ser encaradas pela ordem, primeiro, da legalidade, porque efetivamente fora da lei não há caminho a se dar neste País, e, em segundo lugar, exatamente como instrumento de produção. Quer dizer, volto a reafirmar o que tenho dito sempre: não entendo a terra como a carteira de identidade de ninguém. A pessoa não é mais ou menos cidadão porque tem terra. Se assim fosse, no Japão ninguém seria cidadão, porque naquele país ninguém é proprietário de terra alguma. O que nós temos que encarar é a condição de vida da população, buscando caminhos para que essa decência social seja atingida. O Movimento dos Sem-terra alcançou uma vitória importante com a caminhada em Brasília, conscientizando a população da popularização da questão da reforma agrária. Mas isso não faz com que o Movimento tenha o direito de burlar a lei ou agir da forma violenta como V. Exª tem relatado. Portanto, gostaria de também deixar a minha preocupação e o meu alerta para que efetivamente a Justiça e os Poderes Públicos caminhem no intuito de reforçar esse respeito à lei. Desejamos ver a reforma agrária implantada, somos favoráveis a ela, mas, sem dúvida alguma, dentro da ordem, do respeito e da lei. Queremos também fazer um apelo ao Ministro Raul Jungmann e ao Governo Federal para que, efetivamente, em suas ações, não reforcem qualquer atividade que venha gerar o descumprimento da lei. O Governo tem uma responsabilidade social muito grande não só com o Movimento dos Sem-Terra, mas com todo o País e não pode, a título de atender a uma necessidade social, reforçar qualquer tipo de atuação que venha ferir os preceitos da legalidade do País. Muito obrigado.

O SR. LÚDIO COELHO - Agradeço o aparte do nobre Senador Romero Jucá.

Estão acontecendo coisas que devem ser ditas. O pequeno agricultor brasileiro, o proprietário de 20, 30 hectares que não seja considerado sem terra não consegue financiamento no banco. É grande a dificuldade que eles têm, oferecendo a terra em hipoteca. Entretanto, o Sr. Ministro da Reforma Agrária empresta dinheiro sem nenhuma garantia. Quer dizer, estamos assistindo o Poder Público, o Executivo, financiar as invasões de terra na Nação brasileira, as invasões de prédios públicos, fazendo reféns.

Ontem ouvi, se não me engano, no noticiário da Globo, que um comerciante, dono de um bar, estava acampado, mas, à noite, voltou para sua casa, porque não estão cumprindo o compromisso de fazer os levantamentos, o cadastramento daqueles que devam ser assentados. Financiamentos absolutamente sem nenhuma garantia, com o aval de pessoas que não têm nem endereço certo.

Mas não conseguem fazer funcionar o FCO; o Governo brasileiro precisa fazer o dia-a-dia funcionar. Criamos o Fundo de Desenvolvimento do Centro-Oeste brasileiro há anos, na Constituinte, e eles não foram capazes de criar o Conselho. Criaram agora, mas o Conselho não se reúne. Existem mais de trezentos milhões na conta do FCO, recursos esses que deveriam estar servindo para aumentar a produção agrícola brasileira, para gerar divisas, através do café, da soja, do milho, entretanto, não dão conta de operar, mas dão conta de perturbar a ordem interna, financiando pessoas desocupadas.

Apresentei um projeto aqui, no Senado, estabelecendo uma ordem de prioridade para assentamento, em primeiro lugar, a agrônomos e técnicos agrícolas, arrendatários de terra, pessoas que perderam suas terras para pagar contas, a fim de que essa reforma agrária tivesse, efetivamente, alguma ligação com a produção agrícola brasileira. O movimento ideológico, o Movimento Sem-Terra, hoje está aglutinando as oposições ao Presidente Fernando Henrique Cardoso. Agora, Sua Excelência quer conversar com Lula. Conversar o quê? É o mesmo que dialogar com os sem-terra, com aqueles que não o elegeram.

A maioria silenciosa da família brasileira elegeu o Presidente Fernando Henrique Cardoso para que, dentro da ordem legal estabelecida, fizesse as reformas que a Nação precisa. Não podemos permitir que se tente fazer uma reforma agrária que venha desestruturar a agricultura brasileira, o setor que tem dado maior sustentação à estabilidade econômica e que gera divisas e trabalho. A agricultura desenvolve um processo enorme de geração de empregos, isso não se dá apenas no campo, mas nas fábricas de caminhões, de tratores, de borracharia, de pneus, de transportes, de beneficiamento do produto agrícola, de embalagem e de comercialização. É o setor que gera mais emprego com menos recursos.

É preciso que a Nação tenha consciência disso. Na Europa, a população da cidade apóia enormemente a agricultura, pois tem consciência da importância agrícola em seus países. nobres Senadores.

Era o que eu desejava falar nesta Casa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/05/1997 - Página 9321