Discurso no Senado Federal

ELOGIOS A INICIATIVA DO JORNAL O DIA, CONVOCANDO AUTORIDADES, CIDADÕES, CIENTISTAS SOCIAIS, POLICIAIS, JORNALISTAS, POLITICOS, JURISTAS E MAGISTRADOS PARA DISCUTIREM O PROBLEMA DA VIOLENCIA URBANA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • ELOGIOS A INICIATIVA DO JORNAL O DIA, CONVOCANDO AUTORIDADES, CIDADÕES, CIENTISTAS SOCIAIS, POLICIAIS, JORNALISTAS, POLITICOS, JURISTAS E MAGISTRADOS PARA DISCUTIREM O PROBLEMA DA VIOLENCIA URBANA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
Aparteantes
Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/1997 - Página 9655
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • ELOGIO, INICIATIVA, JORNAL, O DIA, CONVOCAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, AUTORIDADE, SEGURANÇA, DISCUSSÃO, PROBLEMA, SITUAÇÃO, VIOLENCIA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • DEFESA, PARCERIA, INICIATIVA PRIVADA, ESTADO, SOLUÇÃO, INTERESSE PUBLICO, NECESSIDADE, UNIÃO, BANCADA, CONGRESSISTA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • ANUNCIO, ELABORAÇÃO, ORADOR, PROJETO DE LEI, PACIFICAÇÃO, CIDADE, LEVANTAMENTO, FUNÇÃO, POLICIA, DIREITOS, SOCIEDADE CIVIL.

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco-PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Rio em paz. Pela pacificação do Rio.

            Sacudido por chacinas, violências policiais, balas perdidas, seqüestros, desrespeitos aos mais elementares direitos dos cidadãos, o Rio de Janeiro há muito tempo deixou de ser a cidade alegre, pacífica e exuberante do passado. É mais uma entre tantas outras metrópoles contaminadas pela violência. Uma situação grave; nunca, contudo, intransponível. Há soluções.

A complexidade dos dias modernos mostra que o Estado e seus governos são insuficientes para resolver problema de tamanha gravidade. A sociedade civil também deve-se ocupar dessa tarefa.

Com esse espírito, atendendo aos reclamos das sociedades carioca, fluminense e pela pacificação do Rio de Janeiro, o jornal O Dia convocou autoridades federais, estaduais, municipais, cidadãos, cientistas sociais, policiais, jornalistas, políticos, juristas e magistrados para discutirem o problema da violência urbana e encontrarem uma solução.

Essa iniciativa, na minha avaliação, é digna de registro. Em que pese o pronunciamento de ontem do Senador Artur da Távola, quero, na condição de carioca, de cidadã, manifestar-me neste momento, pois, antes de essa ser uma preocupação de um órgão de imprensa, deve ser preocupação do Governo Federal e dos Poderes constituídos.

A segurança pública no Brasil chegou a um nível ameaçador. A questão é também de preocupação internacional.

Lembro-me que o ex-Presidente Itamar Franco, através do seu ex-Ministro da Justiça, Senador Maurício Corrêa, convocou representantes da sociedade civil, do Congresso Nacional, autoridades governamentais para criar um fórum que formulasse uma política de ação imediata para o combate à violência que se instalara no Rio de Janeiro naquela época. Tive o prazer de participar dessa reunião, dando a minha contribuição no que diz respeito às violações dos direitos, principalmente nas áreas carentes.

É o que faço agora. E faço-o muito à vontade, porque tenho a responsabilidade de trazer para a tribuna do Senado as preocupações da sociedade do Estado do Rio de Janeiro, que também é a minha cidade. Mas jamais deixarei de registrar iniciativas dessa natureza, porque são um compromisso. Durante toda a minha vida, busquei essa responsabilidade em forma de casamento entre a iniciativa privada e os Poderes Legislativo e Executivo e com a sociedade civil organizada, em defesa dos interesses dos nossos Estados.

Tenho dito também que é importante que se levantem vozes, tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados, para defender o Estado do Rio de Janeiro, não mais como uma iniciativa somente de um mandato ou de uma representação partidária no Congresso Nacional, mas sobretudo como as que temos visto se manifestar aqui, do Norte e Nordeste. Só assim estaríamos ajudando a resolver o problema, como a iniciativa do jornal O Dia. É por isso que, neste instante, coloco-me a serviço dessa iniciativa.

O jornal O Dia, que é um jornal popular, está abordando o tema segurança, que é importantíssimo para o Brasil e para o Rio.

Essa iniciativa é muito positiva, e os ganhos são tanto para o jornal O Dia como para a população do Estado e para a cidade do Rio de Janeiro. O jornal, quando convoca essas autoridades e representantes da sociedade civil, evoca o debate carioca sobre a questão da segurança em níveis nacional e internacional. Todo o Brasil, sobretudo o Estado do Rio de Janeiro e o Município do Rio de Janeiro, tem os olhares voltados para a segurança do meu Estado.

Como carioca, venho fazer este registro, reconhecendo que O Dia é o jornal de maior circulação na cidade e passa nas áreas populares, carentes, necessitadas. Dados de pesquisa realizada pela Folha de S. Paulo coloca o jornal como o terceiro em circulação no País.

É importante essa manifestação para eu dar também a minha contribuição, o meu apoio a esse jornal, voltado para os problemas identificados no cotidiano da população do Estado. Quero também fazer parte dessa iniciativa e difundir as aspirações populares.

Diante disso, pude observar que várias autoridades ali presentes elaboraram um programa de vasta dimensão, cujo registro, na íntegra, já foi solicitado.

Eu gostaria de ressaltar alguns pontos desse documento: tivemos um encontro com José Gregori, Secretário Nacional de Direitos Humanos - portanto, o Governo se fez presente e assinou esse compromisso - e estivemos também com os Srs. Hélio Sabóia, Coordenador do Painel do Direito; Rubem César Fernandes, Coordenador do Painel de Polícia; o Sr. Ari Carvalho, Presidente das Organizações O Dia; e Ruth de Aquino, Diretora da redação do jornal O Dia. Hélio Luz foi o coordenador geral.

Por que estou na tribuna para falar a esse respeito? Primeiro, porque, as suas considerações - a minha é a décima -, dizem o seguinte: "Elaboração de um Programa de Proteção às Testemunhas". Ficou reconhecida a impossibilidade de se denunciarem crimes publicamente.

Por que estou afinada com as determinações desse fórum? Porque, desta tribuna, já manifestei a necessidade de proteção às testemunhas. Temos projetos nesse sentido e precisamos respaldar essa iniciativa. Programa de Renda Mínima para as famílias de baixa renda; ampliar a presença do Estado nas favelas com o aumento do número de escolas, de centros sociais, para que os moradores dessas comunidades não vivam à mercê de bandidos e traficantes; salário mínimo digno; política econômica que defina a vocação real do Estado do Rio de Janeiro, valorizando as lavouras e as pequenas indústrias; revisão da estrutura fundiária do Estado do Rio de Janeiro.

Como não apoiar essa iniciativa? Sabemos que a questão da violência no Estado do Rio de Janeiro parte redundantemente deste princípio, que é elaborar políticas públicas que possam atender a esses setores marginalizados.

Fui mais adiante em relação à reflexão que fiz sobre este documento: além dos projetos que tenho apresentado nesta Casa, fiz desse fórum, "O Rio em Paz", patrocinado pelo O Dia, o material para que eu possa apresentar um projeto de lei sobre a pacificação das grandes e médias cidades. Fiz algumas colocações preliminares, e hoje começo a comentá-las aqui da tribuna. Prosseguirei, durante todo o trajeto desse projeto, colocando a necessidade de se resgatar aqui no Senado Federal tantas outras propostas que se referem a vários aspectos enfocados pelo "Rio Em Paz".

A partir da publicação desse material, destaco algumas questões: primeira, o que fazer com a Polícia? Segunda, qual a interferência no campo do Direito? Terceira, qual a participação da sociedade cidadã?

A questão policial começa pela condicionante: a Polícia só tem comprometimento com o Estado. É preciso que ela tenha comprometimento com a sociedade civil. Isso não é fácil no Brasil devido a fatores que vêm da sua História. Por exemplo, durante o período da escravidão, a Polícia, ainda não formada como é hoje, tinha forte vínculo com o Estado. Grande parte da população era negra, e o compromisso com a cidadania era muito pequeno, pois as elites se confundiam com o Estado. Os demais eram ou muito pobres e explorados - essa era a condição no Nordeste -, ou escravos. Essa era, portanto, a razão de ser da opressão policial.

O Sr. Romeu Tuma - Senadora Benedita da Silva, permite-me V. Exª um aparte, quando possível?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Logo a seguir, concederei um aparte a V. Exª.

Depois da escravidão e com o advento de uma pequena classe média citadina, quase não houve alteração das elites, e, de forma clara ou indireta, os militares orquestraram a questão da segurança pública no Brasil. Ampliou-se, então, o conceito do compromisso da polícia com o Estado. A Campanha do Contestado, em Santa Catarina, e a de Canudos são exemplos. O surgimento do cangaço mostra a reação e a ligação direta dos coronéis com a polícia, comprometida com os interesses desses, transvertida em defesa do Estado.

Concedo um aparte ao Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma - Desculpe-me interrompê-la, mas eu estava ouvindo o discurso de V. Exª em meu gabinete e vim o mais rápido possível. Em primeiro lugar, pela importância do seu pronunciamento e, em segundo lugar, porque hoje me inscrevi para falar, na mesma linha de V. Exª, sobre o "São Paulo sem Medo". Esse programa, organizado pela Rede Globo em parceria com o Departamento de Não Violência da Universidade de São Paulo, praticamente desenvolve esses temas que V. Exª traz ao nosso conhecimento. Tenho que elogiar V. Exª por essa preocupação permanente com alguns aspectos que dizem respeito à cidadania e à segurança do indivíduo, que, a meu ver, é uma das peças de que a sociedade tanto precisa. Infelizmente, os homens de bem vivem prisioneiros do medo, tantas são as circunstâncias e o estresse que afetam o seu comportamento. Não é só a bandidagem que anda pela rua, são vários fatores. V. Exª levanta esse aspecto com muita inteligência e com profundo conhecimento. Tenho certeza de que, se for Governadora do Rio de Janeiro, V. Exª praticará essas teses para tentar modificar um aspecto que tanta angústia traz ao Rio de Janeiro. Trata-se de um tema importantíssimo. Associo-me a V. Exª e, se permitir, sugiro que conversemos depois sobre esse tema, sobretudo no que diz respeito a esse eixo São Paulo/Rio de Janeiro. Em relação a esse debate, inclusive nos aspectos de direitos fundamentais do homem, direitos humanos -, poderíamos conversar com o Secretário José Gregori. Se V. Exª me permitir, podemos fazer alguma coisa em conjunto, quem sabe uma Comissão Especial, para tentarmos orientar o prosseguimento desses projetos, como o de V. Exª e outros que correm na Casa. Quero cumprimentá-la por isso, Senadora.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço a V. Exª pelo aparte, Senador Romeu Tuma, conhecedor profundo da questão da segurança. V. Exª sabe que é preciso respaldar essas iniciativas - V. Exª já as trouxe a esta Casa e vai fazê-lo novamente da tribuna. De antemão, V. Exª tem o nosso apoio, em que pese o jornal O Globo estar tratando nesse momento da questão em São Paulo - já o fez em relação ao Estado do Rio de Janeiro. Agora, o jornal O Dia dá essa contribuição, como bem enfatizei, com a representação dessas autoridades, inclusive com a representação do Governo, que nos dá condição de, também no Legislativo, no Senado e na Câmara, respaldar os projetos já existentes.

É importante travarmos debates sobre temas dessa natureza, porque não queremos de forma nenhuma desautorizar o Estado no que diz respeito à sua competência. O que queremos é fortalecer o Estado, fortalecendo as suas iniciativas; é colocá-lo realmente como liderança para resolver problemas que são naturais de uma sociedade como a nossa.

Também não queremos que a Polícia veja em nós, nos nossos pronunciamentos contundentes em relação às arbitrariedades que comete, adversários. Ao contrário, lutamos para que se tenha uma política de segurança que dê também à Polícia segurança, para que se tenha uma doutrina e uma prática que possa assegurar-lhe um bom salário, equipamentos, um novo relacionamento, a fim de que se tenha instrumentos e se veja o cidadão como sendo o seu próximo, a quem ela deve proteger, indiferentemente da sua classe social, do seu gênero ou da sua raça.

É isso que estamos buscando. É isso que o "Rio em Paz" fez, através do jornal O Dia. Isso foi bom e saudável, mas queremos também que isso se traduza em ações concretas, baseadas em dados e informações que já temos. O Dia levantou propostas que poderemos implementar, iniciativas do Poder Legislativo e da sociedade civil. Nesse foro, houve ausência total de decisões e de iniciativas de políticas públicas, porque não se fez esse debate, não houve participação da população, de um segmento da sociedade. Quando isso acontece, os documentos de resultados viram peças para bibliotecas, mas não ações concretas no sentido de reformular o papel do Estado, a sua relação com a sociedade e o compromisso que os Poderes constituídos têm para uma renovação, uma modificação e uma transformação dos direitos no nosso País.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/1997 - Página 9655