Discurso no Senado Federal

POSSIBILIDADE DE BRASILIA SEDIAR A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, EM VIRTUDE DA ATUAL GUERRA DE DIFICULDADES PROVOCADA PELO PREFEITO DE NOVA IORQUE A ENTIDADE, EM VIRTUDE DA GRANDE QUANTIDADE DE MULTAS NÃO PAGAS PELAS REPRESENTAÇÕES ESTRANGEIRAS.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • POSSIBILIDADE DE BRASILIA SEDIAR A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, EM VIRTUDE DA ATUAL GUERRA DE DIFICULDADES PROVOCADA PELO PREFEITO DE NOVA IORQUE A ENTIDADE, EM VIRTUDE DA GRANDE QUANTIDADE DE MULTAS NÃO PAGAS PELAS REPRESENTAÇÕES ESTRANGEIRAS.
Aparteantes
Valmir Campelo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/1997 - Página 9763
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), POLITICA INTERNACIONAL, CRITICA, ESTADOS MEMBROS, INTERESSE, REDUÇÃO, ORGANISMO INTERNACIONAL.
  • REGISTRO, CONFLITO, PREFEITURA, SEDE, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), MOTIVO, FALTA, PAGAMENTO, MULTA, DIPLOMATA.
  • DEFESA, TRANSFERENCIA, SEDE, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), JUSTIFICAÇÃO, SUGESTÃO, ESCOLHA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF).

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a criação da Organização das Nações Unidas, em 1945, mal encerradas as batalhas da Segunda Guerra Mundial, foi seguramente a forma mais sensata e racional de se colocar um ponto final naquele que foi o mais duradouro e universalizado conflito da época contemporânea.

Cicatrizar as profundas feridas abertas pela guerra, reparar os estragos morais e materiais que ela ocasionou, abrir as portas de um novo tempo: eis algumas das mais urgentes e decisivas tarefas que homens e Estados se viram forçados a assumir naquele momento de farta amargura e sofrimento sem paralelo.

Constituída com a finalidade precípua de construir as condições ideais para uma paz duradoura e para o desenvolvimento harmonioso das sociedades, o que pressupunha esforços e medidas capazes de superar as barreiras do atraso e das desigualdades, a ONU produziu uma história em que os pontos positivos sobrepõem-se, em muito, aos fracassos eventuais.

Analisar o itinerário das Nações Unidas implica, preliminarmente, não desconhecer em que condições o sistema internacional se apresentou nesses mais de 50 anos.

Entender, por exemplo, que, a partir do famoso discurso do Primeiro Ministro britânico Winston Churchill, em 1947, conclamando os Estados Unidos da América do Norte a assumirem a liderança da defesa do "mundo livre", frente ao modelo comandado pela União Soviética, tinha início a chamada "Guerra Fria", tornando absolutamente tensas e nervosas as relações internacionais a partir de então.

Claro que o quadro de Guerra Fria, com toda a dramaticidade e a hipocrisia que lhe deram o tom, foi responsável, muitas vezes, pela paralisação das ações da ONU.

O direito de veto concedido aos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança - fórum privilegiado para a discussão de todas as questões envolvendo situações de risco para a paz mundial - é, a par de seu indiscutível pragmatismo realista, prova maior dos limites a que a Organização se vê contingenciada.

No entanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não há como negar as expressivas vitórias obtidas pelas Nações Unidas em áreas da mais diversa natureza, sobretudo naquelas em que os interesses das superpotências puderam ser tangenciados.

A esse respeito, cito o trabalho desenvolvido, ao longo dessas décadas, por agências e órgãos especializados da ONU - na economia, educação, cultura, saúde, alimentação, entre tantas outras áreas -, cujos resultados foram e são extremamente relevantes, especialmente para os povos mais pobres de todo o mundo.

Exatamente por isso, assustam e incomodam as cobranças e os ataques que, nos últimos tempos, têm sido dirigidos à ONU, partidos sobretudo dos setores mais conservadores de países como os Estados Unidos.

Não sei se motivados pela crença - falsa, diga-se - de que o desmoronamento da União Soviética e do bloco socialista significou o "fim da história", ou seja, dos embates e dos interesses conflitantes no âmbito do poder mundial, ou por qualquer outra razão não claramente explicitada, o certo é que esses "falcões" preconizam uma ONU drasticamente diminuída, mitigando sua força supranacional.

Nos últimos anos, a Secretaria-Geral da Organização das Nações Unidas tem denunciado a verdadeira asfixia orçamentária da qual tem sido vítima, o que prejudica o funcionamento de sua máquina administrativa e, o que é mais grave, atinge os programas que implementa pelo mundo afora.

O problema decorre, fundamentalmente, da decisão de muitos estados de não honrarem seus compromissos com a Organização, deixando de lhe repassar os recursos necessários à sua própria manutenção.

A situação, hoje, adquire contornos mais dramáticos. Nos últimos dias, a imprensa mundial tem noticiado uma autêntica guerra declarada à ONU pela cidade que tem a honra de sediá-la, Nova Iorque. Notas, como a que transcrevo a seguir, ocupam as páginas dos principais jornais de todo o mundo:

      "O prefeito de Nova Iorque, Rudolph Giuliani, declarou guerra contra o mundo. Ele está em conflito com delegações diplomáticas de cento e oitenta e cindo países da Nações Unidas, cuja cede fica na cidade. A discórdia foi motivada pelas multas por estacionamento proibido que os diplomatas colecionam e se recusaram a pagar, alegando direitos de imunidade.

      As multas somam "vários milhões de dólares", segundo a imprensa americana. Só a delegação russa teria mais de trinta mil multas em atraso, enquanto países como o Brasil e a França acumulariam mil e quinhentas infrações cada um."

Essa é uma das pressões que a cidade de Nova Iorque tem feito sobre a ONU.

Por que não pensar em outra sede para as Nações Unidas? Não creio que a idéia possa ser estapafúrdia. A própria imprensa internacional dá conta de que delegações de peso, como a russa e a francesa, trabalham com essa hipótese, ou seja, pretendem a nova sede da ONU.

Afinal, ou se compreende - e respeita - o papel da ONU e sua fundamental importância para a construção de um mundo de paz e de superação das desigualdades, da fome e da ignorância, ou se perde de vez a esperança de vitória da civilização sobre a barbárie.

Nesse sentido, ouso imaginar a possibilidade de ver nossa Brasília sediando a Organização das Nações Unidas. Muitos são os argumentos favoráveis à proposta.

Brasília é patrimônio cultural da humanidade. Que outra cidade moderna teria condições estruturais para hospedar uma instituição como a ONU?

Concebida por uma visão generosa de igualdade, voltada para a construção do futuro, Brasília oferece todas as condições indispensáveis ao bom funcionamento das Nações Unidas.

Ademais, não nos esqueçamos ter sido o Brasil signatário de primeira hora da Carta das Nações Unidas e que, por pouco, não foi escolhido para ter assento permanente no Conselho de Segurança, quando de sua instalação.

No momento em que a Guerra Fria deixa de existir, nada melhor que um País emergente, legítimo representante da maioria esmagadora dos Estados componentes das Nações Unidas, para sediar a instituição que está sendo tão maltratada na cidade de Nova Iorque.

Com toda certeza, cobranças mesquinhas deixariam de existir. Sem falar que, fisicamente afastada do núcleo do poder mundial, a ONU estaria mais livre para agir no fiel cumprimento de sua missão.

O Sr. Valmir Campelo - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Concedo o aparte ao nobre Senador Valmir Campelo, com muito prazer.

O Sr. Valmir Campelo - Apenas registro o meu apoio a V. Exª pela manifestação que acaba de fazer. Realmente, acompanhamos há anos e anos a dívida que os países têm com a ONU. Os Estados Unidos, todos sabemos, é um dos maiores devedores da ONU. V. Exª sugere inclusive que haja ampla discussão em relação ao nome da nossa cidade. Brasília é uma cidade do terceiro milênio; como tão bem disse V. Exª, uma cidade tombada pelo Patrimônio Histórico Internacional. Congratulo-me com V. Exª pela lembrança do nome de Brasília e acrescento que nossa cidade preenche esses requisitos. Brasília, com as suas avenidas largas, com essa população heterogênea, que, de todo o Brasil, veio para construir um novo Brasil e uma nova Capital da República, sem dúvida nenhuma, receberia de braços abertos a Organização das Nações Unidas. Parabenizo V. Exª. Tenho certeza de que Brasília sentir-se-ia muito honrada se assim acontecesse, ou seja, se a sede da ONU fosse fixada nesta Capital. Seria um prestígio não só para o Brasil, mas uma honra para todos os brasilienses.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, Senador Valmir Campelo. Como eu disse, trata-se de uma ousadia, mas é uma ousadia que decorre do que está acontecendo, pois os Estados Unidos, que são os maiores devedores da ONU, hoje tudo fazem para esvaziá-la.

A Prefeitura de Nova Iorque tem feito uma guerra permanente contra a ONU. Como eu disse, a delegação francesa e a delegação russa têm buscado mundo afora apoio para sediar a ONU. O fato de um país de Terceiro Mundo, um país igual à maioria dos países-membros da ONU, sediá-la representaria a saída da tutela dos Estados Unidos, ou seja, do que hoje é hegemônico. Teríamos mais liberdade e, com certeza, seria um fator de desenvolvimento.

É uma ousadia o que hoje profiro nesta tribuna. Vou mandar cópias para o Presidente da ONU, para o Governador de Brasília, para a Câmara Distrital, para o Ministério das Relações Exteriores e, por que não, para as delegações da França e da Rússia, que estão capitaneando a mudança de sede exatamente por causa dessa guerra insana contra um organismo que tanto tem trabalhado, que tanto tem feito pelo bem da Humanidade.

Encerrando, Sr. Presidente, peço que o Governo brasileiro pense na sugestão, que o Governo do Distrito Federal se movimente no mesmo sentido antes que outros o façam. Seria bom que a Capital do Terceiro Milênio se oferecesse para receber a ONU em seu solo, materializando, de maneira nítida, o sonho grandioso dos que a conceberam.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/1997 - Página 9763