Discurso no Senado Federal

COMENTANDO A DECISÃO DO MINISTRO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, QUE RESULTOU NA IMPLANTAÇÃO DO EXAME NACIONAL DOS CURSOS, POPULARIZADO PELO NOME DE PROVÃO.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • COMENTANDO A DECISÃO DO MINISTRO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, QUE RESULTOU NA IMPLANTAÇÃO DO EXAME NACIONAL DOS CURSOS, POPULARIZADO PELO NOME DE PROVÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/1997 - Página 9896
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, VALIDADE, FORMA, AVALIAÇÃO, UNIVERSIDADE, UNIVERSIDADE PARTICULAR, ELABORAÇÃO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), APLICAÇÃO, FORMANDO, EXAME ESCOLAR.
  • QUESTIONAMENTO, VALIDADE, EXAME ESCOLAR, OBJETIVO, AVALIAÇÃO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), NIVEL, QUALIFICAÇÃO, UNIVERSIDADE, UNIVERSIDADE PARTICULAR.
  • COMENTARIO, DENUNCIA, AUTORIA, ORLANDO SILVA JUNIOR, PRESIDENTE, UNIÃO NACIONAL DOS ESTUDANTES (UNE), REFERENCIA, AUSENCIA, APERFEIÇOAMENTO, INICIATIVA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), IMPLANTAÇÃO, EXAME ESCOLAR, AMBITO NACIONAL, CURSOS, APLICAÇÃO, FORMANDO, MOTIVO, INEXATIDÃO, RESULTADO, FAVORECIMENTO, MANUTENÇÃO, INFERIORIDADE, QUALIDADE, ENSINO SUPERIOR, INSTITUIÇÃO EDUCACIONAL, UNIVERSIDADE, PAIS.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, retorno ao tema da educação, uma vez mais, por seu intrínseco significado e por estar convencido de que ao Parlamento não é lícito omitir-se em assunto de tamanha importância para o País.

Desta feita, desejo focalizar uma decisão tomada pelo Ministério da Educação e do Desporto logo nos primeiros meses do atual Governo, implementada experimentalmente no segundo semestre do ano passado e cujos resultados foram há pouco anunciados. Trata-se do Exame Nacional dos Cursos, popularizado pelo nome de "Provão".

A fim de que não paire qualquer tipo de dúvida, faço questão de, liminarmente, externar o meu ponto de vista francamente favorável à avaliação do sistema educacional. Não acredito - e nisso não faço outra coisa senão acompanhar a esmagadora maioria dos que atuam na área - numa educação de qualidade que cumpra a sua função precípua de formadora de cidadãos preparados para compreender, refletir e agir no mundo em que vivem, sem a utilização de mecanismo adequado de avaliação de seu desempenho.

Também estou entre aqueles que sabem ser a avaliação um tema recorrente nos estudos e debates que profissionais interessados na educação vêm fazendo, no Brasil, nas últimas décadas. É importante ressaltar esse aspecto para que não caiamos na tentação - que desgraçadamente tem atingido alguns de seus dirigentes - de imaginar que o tema somente agora tem vindo à baila. Não, definitivamente não! Por mais que isso possa incomodar a alguns, a verdade é que temos uma história, e muito do que hoje pode estar sendo realizado é fruto do tempo, muitas vezes de longa e difícil maturação.

Faço essas observações preliminares, Sr. Presidente, exatamente para ressaltar a minha posição de defesa intransigente de uma educação de qualidade, em todos os níveis e graus, que, aberta a todos, não admita qualquer forma de exclusão. Para tanto, repito, nada mais útil e indispensável para o sistema do que contar com instrumentos ágeis e adequados de avaliação, interna e externamente, identificando os pontos positivos - para serem mantidos e estimulados - e os negativos - para uma óbvia correção de rumos.

Infelizmente, o "Provão", tal como proposto e, principalmente, da forma como foram apregoados seus primeiros resultados, está longe, muito longe, do que se imagina ser uma avaliação correta e confiável.

Em primeiro lugar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Exame Nacional de Cursos padece de um erro de origem, cuja gravidade se acentua por tratar-se de um tema polêmico: não houve o salutar debate que pudesse orientar a formulação da proposta. Como bem salientou a Educadora Vanilda Paiva, em artigo publicado no jornal O Globo, edição de 10 de abril de 1995, "se a avaliação é sempre um assunto polêmico, sua discussão pública torna-se um saudável indicador de maturidade democrática". Ora, isso não se deu no caso em questão.

Anunciado com a clara intenção de provocar impacto, ganhando manchetes e generosos espaços nos meios de comunicação, o Provão deu a impressão de ser uma medida fadada a medir a capacidade de nossas instituições de ensino superior, tendo condições de identificar os pontos fracos do sistema. Para muitos, especialmente para aqueles que atuam nas universidades públicas, ficou a incômoda sensação de algo montado não para averigüar seu desempenho mas, prioritariamente, para puni-las por eventuais desacertos.

Em texto escrito para a Folha de S. Paulo, em 24 de março de 1995, o Professor José Arthur Giannotti foi enfático: "A medida não foi bem estudada e até agora não estou convencido de que logrará os efeitos desejados. Se os cursos universitários precisam ser melhorados, não creio que essa nota final possa avaliar a instituição".

Há, ademais, outro aspecto que não pode ser olvidado. A página de opinião do Correio Braziliense acolheu, no último dia 6 de maio, artigo assinado pelo Presidente da União Nacional dos Estudantes, Orlando Silva Júnior, no qual é citado o Presidente da Universidade Harvard, Derek Book: "Uma forte ênfase em testes uniformes ameaça trivializar o ensino preparatório e privá-lo de diversidade, ao orientar a instrução um tanto exageradamente na direção de um meio simples e imperfeito de aferição. Tal política não há de interessar ao corpo docente, muito menos aos estudantes mais capazes, por não encorajar um esforço de base ampla para realçar a qualidade da educação".

O mais grave, no entanto, é a denúncia feita pelo Presidente da UNE de que instituições de reconhecida deficiência acadêmica obtiveram bom conceito no Provão em função de terem submetido seus alunos a testes simulados, enfim, a uma preparação intensiva e exclusiva para o exame do MEC. Para quem tem memória, há que se recordar a fantástica expansão de empresas educacionais que, nos anos 70, se especializaram na preparação de alunos aptos a enfrentar os testes objetivos que, àquela época, proliferavam nos exames vestibulares. Assim, a "eficácia" dos resultados sobrepunha-se aos valores maiores e definidores de uma educação qualificada.

Quantos jovens, doravante, não se sentirão atraídos pela falsa noção de competência de uma instituição de ensino superior, cujo mérito reside no desenvolvimento das habilidades de seus formandos em responderem bem a um teste de fim de curso? Quantas mazelas não poderão ser encobertas em instituições dessa natureza, muito mais preocupadas em adestrar seus alunos que formar cidadãos competentes?

São questões, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, rigorosamente pertinentes e que precisam ser enfrentadas. Mesmo porque, em que pese a insistência do Sr. Ministro da Educação e do Desporto em afirmar que o Provão é o primeiro passo para a avaliação da educação superior, concretamente nada além dele foi proposto até o momento. A esse respeito, deploro a decisão da atual gestão do MEC de, na prática, ter abandonado a feliz iniciativa do Governo Itamar Franco de promover avaliação institucional da universidade brasileira. Sob a liderança do Professor Murílio Hingel, então Ministro da Educação, foi lançado um programa - o PAIUB - que, centrado nos cursos de graduação, envolvia, sucessivamente, a auto-avaliação, avaliação externa e a execução das medidas necessárias à melhoria dos cursos.

Optou-se, infelizmente, pelo caminho mais simples e, ao mesmo tempo, de fortíssimo apelo publicitário. Temo que, seguindo esse diapasão, o Ministro Paulo Renato acabe por permitir que suas grandes realizações possam ser diminuídas ou confundidas com jogadas de marketing, o que não é bom para sua biografia e péssimo para a Educação brasileira.

Espero, sinceramente, que se abra um franco debate sobre o Exame Nacional de Cursos, discutindo-se a metodologia empregada, o alcance de suas metas, a possível utilização de seus resultados. Afinal, a arrogância nunca foi a melhor conselheira.

Sr. Presidente, é claro que há necessidade de se corrigirem distorções, de melhorarem várias universidades, vários cursos espalhados pelo Brasil afora, para que, na verdade, eles tenham qualidade e possam transferir conhecimentos profundos aos nossos estudantes, sem nenhuma dúvida. Mas não se vender a idéia de que vários cursos superiores receberam nota A na qualificação do Provão, usando isso como marketing, usando os meios de comunicação, as televisões etc e dizer: A nossa é qualificada, a nossa tem a letra A; as outras, com as notas B, C, D, estão desqualificadas. E aí começa a haver uma discriminação muito forte entre os estudantes: - E agora, como vai ser? Como vou ficar? Estou sendo diferenciado do meu colega que estuda numa universidade que recebeu a qualificação da letra A, ou coisa que o valha.

Essa exploração de marketing que está ocorrendo em vários pontos do País, por várias universidades, por vários cursos superiores que receberam essa qualificação, em detrimento dos outros, não sei se vai levar a bom termo.

É necessário, sim, procurar as deficiências e corrigi-las, mas sem extravasar, sem fazer esse espalhafato publicitário, em detrimento de estudantes, de outros cursos, de professores. Temos que encontrar os meios e os mecanismos de melhorá-los, de fazer com que haja uma eficiência mais ou menos generalizada, uma isonomia de padrão das nossas universidades no País inteiro.

Sr. Presidente e nobres Colegas, eram essas as considerações que eu desejava trazer, no dia de hoje, em relação ao Provão, como é conhecido no Brasil inteiro.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/1997 - Página 9896