Discurso durante a 64ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DIA DO ASSISTENTE SOCIAL, TRANSCORRIDO NO ULTIMO DIA 15. PROCESSO DE ORGANIZAÇÃO DA II CONFERENCIA NACIONAL DE ASSISTENCIA SOCIAL, QUE TERA COMO ATRIBUIÇÃO PRINCIPAL AVALIAR A SITUAÇÃO DO SETOR E PROPOR DIRETRIZES PARA SEU APERFEIÇOAMENTO.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • DIA DO ASSISTENTE SOCIAL, TRANSCORRIDO NO ULTIMO DIA 15. PROCESSO DE ORGANIZAÇÃO DA II CONFERENCIA NACIONAL DE ASSISTENCIA SOCIAL, QUE TERA COMO ATRIBUIÇÃO PRINCIPAL AVALIAR A SITUAÇÃO DO SETOR E PROPOR DIRETRIZES PARA SEU APERFEIÇOAMENTO.
Publicação
Publicação no DSF de 22/05/1997 - Página 10170
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, ASSISTENTE SOCIAL.
  • DISCORDANCIA, PRETENSÃO, GOVERNO FEDERAL, MINISTERIO DA PREVIDENCIA E ASSISTENCIA SOCIAL (MPAS), ADIAMENTO, REALIZAÇÃO, CONFERENCIA NACIONAL, ASSISTENCIA SOCIAL, RESPONSABILIDADE, CONSELHO NACIONAL DE ASSISTENCIA SOCIAL (CNAS).
  • SOLICITAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA E ASSISTENCIA SOCIAL (MPAS), EMPENHO, REALIZAÇÃO, CONSELHO NACIONAL DE ASSISTENCIA SOCIAL (CNAS), CONFERENCIA NACIONAL, ASSISTENCIA SOCIAL, SOLUÇÃO, PROBLEMA, ATRASO, GOVERNO, REPASSE, RECURSOS FINANCEIROS, ATUALIZAÇÃO, VALOR, DESTINAÇÃO, INSTITUIÇÃO ASSISTENCIAL, PAGAMENTO, BENEFICIO PREVIDENCIARIO, BENEFICIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA, SALARIO MINIMO, IDOSO, DEFICIENTE FISICO, AGILIZAÇÃO, PROCESSO, DESCENTRALIZAÇÃO, SERVIÇO SOCIAL, INCENTIVO, MELHORAMENTO, PARCERIA, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIOS.

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o transcurso, em 15 de maio, do Dia do Assistente Social compele-nos a vir a esta tribuna para deixar registrada, mais uma vez, nossa homenagem a essa laboriosa categoria à qual tanto nos orgulhamos em pertencer.

Se é inegável que o exercício de todas as atividades profissionais é fortemente influenciado pelas transformações sociais, precisando adaptar-se para responder às demandas concretas colocadas pelas situações conjunturais e específicas, isso é ainda mais verdadeiro no que se refere à atividade do Assistente Social. Mais do que qualquer outra prática profissional, o Serviço Social necessita acompanhar o movimento histórico que a sociedade realiza, ajustando continuamente o desempenho de suas funções próprias às novas realidades sociais que se vão apresentando.

Nessa medida, qualquer reflexão a ser hoje feita acerca do Serviço Social, acerca do papel do Assistente Social, precisa considerar primeiramente o quadro social brasileiro. Precisamos ter em mente, em primeiro lugar, que não estamos falando de serviço social na Bélgica, na Holanda ou no Canadá. Estamos falando de Serviço Social neste País de carências humanas tão gritantes, tão dramáticas, tão assustadoras. Estamos falando de Serviço Social neste Brasil líder mundial na concentração da riqueza, recordista na injusta distribuição da renda, campeão na exclusão e na apartação social.

Talvez seja exatamente em decorrência da crueza de nosso quadro social que o Serviço Social tem experimentado uma evolução tão significativa no Brasil, constituindo-se hoje numa profissão reconhecida academicamente e legitimada socialmente. Superando suas raízes fincadas no antigo assistencialismo, o Serviço Social conseguiu realizar essa notável caminhada no sentido da sua afirmação tanto como campo autônomo do conhecimento acadêmico quanto como profissão com domínio próprio de competências e atribuições.

Apenas 65 anos separam-nos da criação do Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo - CEAS, episódio que representa o marco inicial no processo de profissionalização da ação social no País. Nesse espaço relativamente curto de tempo, um longo percurso foi cumprido pelos profissionais e estudiosos da área, que transitaram de uma posição inicial conservadora, caracterizada por uma postura assistencialista, paternalista e autoritária, para uma perspectiva progressista, transformadora, politicamente engajada.

No livro Formação Profissional do Assistente Social, Maria Ozanira da Silva e Silva explica:

      "O Serviço Social apresenta uma perspectiva doutrinária de corte humanitário, a serviço de um homem abstrato, desvinculado da história, negando o antagonismo e compreendendo a sociedade como uma organização harmônica, o que justifica a desigualdade como natural.

      A tendência de vinculação do Serviço Social aos quadros populares parece ser a tendência atual de grupos de profissionais em toda a América Latina. Nessa postura, o Serviço Social desvenda a dimensão política da profissão e enfatiza a relação teoria e prática, sendo a prática fonte fundamental da elaboração teórica, adotando uma abordagem metodológica de aproximação sucessiva, através de uma abordagem do homem como ser concreto nas suas relações sociais, enquanto membro de uma classe. A organização popular torna-se a grande estratégia da ação profissional, dando-se grande significado à participação social."

É nesse contexto que a assistência social é direito social e dever do Estado, garantidos constitucionalmente e efetivados mediante política social, com características próprias, que assegure à população pior situada na escala de distribuição de riquezas o usufruto das prerrogativas consignadas no art. 6º da Constituição Federal ("São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados").

De vital importância para o desenvolvimento do País, a Constituição Federal reservou-lhe espaço privilegiado. Assim, o Título da Ordem Social comporta a Seção "Da Assistência Social" (arts. 203 e 204), onde determina que:

      "A assistência social será prestada a quem dela necessitar."

O serviço social traduz, hoje, uma nova racionalidade, que amplia as funções e redefine as responsabilidades da assistência social.

Confundida quase sempre com a prestação de serviços de caridade, a assistência social vem tentando mudar essa imagem assistencialista, trazendo as forças populares à participação de gestão dos próprios serviços sociais. As atividades assistenciais organizam-se nas lutas por direitos sociais, redefinindo permanentemente modos de vida e, por si mesmo, caracterizam-se como práticas educativas.

Em março deste ano, o Ministro da Previdência e Assistência Social comunicou que o Governo estava avaliando a possibilidade de adiar, por mais dois anos, a realização da II Conferência Nacional de Assistência Social, alegando que o espaço de dois anos entre as Conferências era muito curto para a avaliação do que fora encaminhado. A II Conferência é convocada a cada dois anos pelo Executivo, para propor diretrizes à Política Nacional de Assistência Social. O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) realiza os preparativos para o lançamento social dessa Conferência, prevista para ser realizada em dezembro deste ano.

O processo de organização da II Conferência está em andamento há vários meses, e tem como atribuição principal "avaliar a situação da assistência social e propor diretrizes para aperfeiçoamento do sistema". Fazem parte do Conselho as seguintes instituições: Associação Brasileira de ONG (ABONG); Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Central Única dos Trabalhadores (CUT); Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos; Associação Nacional de Servidores da SAS/MPAS; Conselho Federal de Serviço Social; Instituto de Estudos Sócio-econômicos (Inesc); Associação Nacional de Gerontologia; Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR).

Até aqui, o Conselho segue o curso normal do processo de organização, divulgação e mobilização da II Conferência Nacional de Assistência Social, por meio da realização de eventos programados e fóruns da assistência social. Os Conselhos municipais e estaduais estão se preparando para a realização das conferências municipais e estaduais de assistência social em todo o País. Essas conferências precedem a Conferência Nacional. Os gestores, usuários, trabalhadores, prestadores de serviço, enfim, todas as parcerias envolvidas e comprometidas com a efetiva implantação da Lei Orgânica da Assistência Social e do sistema descentralizado e participativo da assistência social já se mobilizam para desencadear todo esse processo e para concretizá-lo a contento dos interesses da sociedade. Portanto, quero daqui registrar que, nesta homenagem que presto ao Dia do Assistente Social, faço uma denúncia e um reclamo, pois não estou enxergando as razões que justifiquem o cancelamento da II Conferência.

Passados dois anos do início do processo de descentralização da assistência social, sabemos que graves problemas persistem e carecem de soluções eficazes.

No entanto, o Ministro coloca-se contrário à realização dessa II Conferência, querendo adiá-la para daqui a dois anos. Penso que esse espaço de tempo não é suficiente para que possamos fazer uma avaliação correta, como assistente social e com esse serviço prestado à Nação, que resgate e que até mesmo possa corrigir o fato de o Governo não ter dado conta dessas demandas.

Para se ter uma idéia, os valores repassados às instituições prestadoras de serviços assistenciais são irrisórios e indignos para a manutenção de crianças em creches, idosos em asilos e pessoas portadoras de deficiência em programas. Exemplificando, o valor mensal para manutenção de crianças em creches por oito horas, recentemente reajustados, após três anos, é de R$17 (dezessete reais) por criança.

Há que solucionar os persistentes atrasos no repasse de recursos relativos aos compromissos firmados com as entidades prestadoras de serviços; o não-cumprimento do compromisso público do Governo de revisão dos critérios e restrições impostas à concessão e pagamento do benefício de um salário mínimo mensal às pessoas portadoras de deficiência e aos idosos, conforme prevê o art. 203 da Constituição Federal; a precária parceria da União com os Estados e Municípios na condução do processo de descentralização da assistência social.

Portanto, tenho que fazer desta tribuna um apelo insistente ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e, em especial, ao Ministro da Previdência Social, para viabilizar a realização da Conferência.

Em defesa da democracia, da vida, da inclusão das questões sociais como prioridade para um país justo e digno, defendemos a realização da II Conferência Nacional de Assistência Social, em dezembro deste ano. E o fazemos porque temos consciência de que não foi só porque o Governo não atendeu a essa demanda, mas porque há necessidade de uma reformulação.

Com relação à prestação de serviços, a que hoje assistimos, realizada pela Comunidade Solidária, na verdade, sequer temos sistematizadas as assistências sociais realizadas nesse contexto. Não sabemos ainda quantos repasses foram feitos para a implementação dessas políticas.

Há necessidade, neste momento, de que apoiemos a II Conferência, que representa também uma contribuição dos profissionais dessa área, a fim de que os serviços prestados possam ser eficientes.

É preciso entender que essa Conferência também faz, na oportunidade, um levantamento das políticas aplicadas. Sabemos, perfeitamente, que há distorções.

Como assistente social que sou, não vi melhor momento ou melhor forma de homenagear esta data, senão trazer para esta tribuna, para o Senado, as preocupações que hoje temos com o não-cumprimento do compromisso público do Governo, com as revisões dos critérios e com as restrições impostas à concessão e pagamento dos benefícios atribuídos a essa área, garantidos pela Constituição brasileira, que não fiscalizamos suficientemente para fazer acontecer.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/05/1997 - Página 10170