Discurso no Senado Federal

ESPECULAÇÃO POLITICA SOBRE OS RUMOS QUE O PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO PRETENDERIA IMPOR AO SEU GOVERNO. EMPENHO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO NA TRAMITAÇÃO E APROVAÇÃO DAS REFORMAS NO CONGRESSO NACIONAL.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • ESPECULAÇÃO POLITICA SOBRE OS RUMOS QUE O PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO PRETENDERIA IMPOR AO SEU GOVERNO. EMPENHO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO NA TRAMITAÇÃO E APROVAÇÃO DAS REFORMAS NO CONGRESSO NACIONAL.
Aparteantes
Emília Fernandes, Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 28/05/1997 - Página 10617
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • ANALISE, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, EMPENHO, APROVAÇÃO, REFORMA CONSTITUCIONAL, NECESSIDADE, TEMPO, DEBATE, DEFESA, DEMOCRACIA.
  • ANALISE, POLITICA INTERNACIONAL, CARACTERISTICA, CHEGADA, PODER, PARTIDO POLITICO, TRABALHADOR, SOCIALISMO, OPOSIÇÃO, LIBERALISMO, ECONOMIA.
  • ANALISE, TRAMITAÇÃO, SENADO, PROPOSTA, EXECUTIVO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • DEFESA, POSIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACEITAÇÃO, DECISÃO, CONGRESSO NACIONAL, REFORMA CONSTITUCIONAL, MOBILIZAÇÃO, BANCADA, APOIO, GOVERNO.

O Sr. Lúcio Alcântara - V. Exª traz ao Plenário uma questão interessante. Não conheço - e tenho a impressão de que V. Exª também não - os detalhes dessa aquisição, no sentido de um edital, da avaliação da qualidade do produto, etc. Mas V. Exª chama a atenção para quê? Para o fato de uma empresa - aparentemente, pelos dados que estão na imprensa, confiável do ponto de vista econômico, do seu porte e possivelmente, também, da qualidade dos seus produtos - julgar-se preterida por ter oferecido um produto a preço inferior e não ter sido escolhida. Creio que essa é a questão principal. Recentemente, V. Exª deve ter tomado conhecimento, foi suspensa a vacinação tríplice no Brasil, em função de vários problemas que surgiram quando da aplicação, principalmente no Estado de São Paulo, da vacina que havia sido adquirida na Índia, possivelmente por um preço mais baixo. Então, a Lei de Licitações é muito rígida. Dificilmente alguém consegue - um comprador, alguém que preside uma licitação - justificar a aquisição de um produto mais caro em detrimento de um mais barato. É possível - estou na base da especulação, porque não tenho elementos para julgar - que o Ministério tenha feito a desclassificação em função da qualidade do produto ofertado. Principalmente em se tratando de produto imunobiológico - vacina -, é preciso um controle de qualidade muito rigoroso, obedecem-se determinados padrões, determinados standards internacionais, geralmente fixados pela própria Organização Mundial de Saúde. Não sei se esse é o caso, é possível que sim. E o Governo, o Ministro da Saúde, o próprio Presidente da República tanto tem-se preocupado com essa questão que, entre outras, foi justificativa para a extinção da Ceme que a concentração dessas compras num único organismo era como o mel para a mosca para atrair a corrupção. Assim, a descentralização vai permitir que não haja mais esse grande volume de compras num único órgão. Mas V. Exª tem toda a razão em suscitar a questão e interpelar o Ministério, porque, afinal de contas, há um anúncio até ostensivo e que coloca em xeque as autoridades do Ministério da Saúde. Acredito até que o Ministro dê uma resposta antes mesmo da chegada do requerimento de V. Exª, porque essa é uma indagação pública. O Governo não pode deixar de responder imediatamente. Para concluir, V. Exª deve-se lembrar de que já houve caso de assassinato em Brasília envolvendo uma chamada máfia da venda de medicamentos.

O SR. NEY SUASSUNA - Dois.

O Sr. Lúcio Alcântara - Foi isso que levou um japonês de São Paulo, com a venda de bombas de inseticida, a denunciar, na época do Governo Collor, aquisições fraudulentas no Ministério da Saúde. Enfim, trata-se de um terreno movediço, que exige rigor e fiscalização de parte do Governo. Tenho a certeza de que o Ministério haverá de dar uma resposta cabal para o assunto, mas não há a menor dúvida de que a explicação é necessária e indispensável.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, Senador Lúcio Alcântara. V. Exª tem razão.

Na página de hoje, a LG Chemical Ltda informa que apresentou uma proposta no dia 27 de maio de 1997 para o fornecimento de vacina do tipo Hepatite B DNA, recombinante, nos protocolos do Ministério da Saúde e da Fundação Nacional de Saúde, determinando sob qual número e a que preço.

Tenho certeza de que há alguma explicação para o fato, por isso estou enviando ao Ministro um pedido de informações, mas não sem antes fazer estas considerações, a que dou continuidade.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é claro que não teria eu a leviandade de atestar o comportamento fraudulento de instituições idôneas e com relevantes serviços prestados ao País, como é o caso do Ministério da Saúde ou da Fiocruz, ou de pretender colocar sob suspeição qualquer desses órgãos, baseado apenas em informações a mim trazidas por terceiras pessoas, mesmo que tenham reputação ilibada.

Entretanto, não deixa de causar estranheza a imensa discrepância entre o preço publicamente ofertado pela multinacional coreana e aquele supostamente praticado quando da última compra, segundo informações veiculadas pela imprensa.

Pela magnitude do diferencial (mais de três vezes o valor ora proposto), entendo caber, no mínimo, a ampliação do debate, estendida a sua abrangência de modo a permitir que os canais competentes se manifestem, oferecendo elementos concretos para a melhor avaliação da realidade.

O cotejo puro e simples dos dois valores até agora divulgados (aquele que serviu à compra de 1994 e o atualmente proposto pela LG Chemical) acena para um caso virtual de sobrepreço, no meu entendimento somente possível de desmentido a partir da ação concreta dos agentes econômicos públicos e privados, mediante o fornecimento dos dados que ampararam o processo decisório.

Nesse sentido, estou encaminhando ao Ministro da Saúde requerimento de informações visando a completa elucidação dos fatos, no melhor propósito de salvaguardar os legítimos interesses não só da população brasileira, mas, inclusive, do próprio Ministério.

Aqui está, portanto, a solicitação, que passo à Mesa, do pedido de informações que solicita esclarecimento ao Ministro Carlos César Albuquerque sobre a compra da vacina contra Hepatite B, que diz:

      "Sr. Presidente, nos termos constitucionais do art.50, § 2º e na forma regimental do art. 216, requeiro que sejam solicitadas do Sr. Ministro Carlos Albuquerque, da Saúde, as seguintes informações:

      1 - De que laboratório foram adquiridos os lotes de vacina contra Hepatite B, quando da última aquisição feita pelo Governo brasileiro? A que preço se deu a compra e quando ocorreu?

      2 - Quais os laboratórios que participaram do processo e quais os preços e condições oferecidos?"

E exatamente como justificativa, dou esta página que está circulando nos jornais de hoje, que diz que a empresa atuante tem registro internacional, tem registro da Organização Mundial de Saúde e em Ministérios de 120 países.

Portanto, precisamos de uma resposta a curto prazo, porque essa é uma situação conflitante, que nos deixa a todos sem entender.

Por essa razão, Sr. Presidente, passo às mãos da Presidência o requerimento e encerro a minha oração.

Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - O requerimento lido por V. Exª, na tribuna, será despachado à Mesa para decisão, na forma do Regimento.

Concedo a palavra ao nobre Senador Lúcio Alcântara, por 20 minutos.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, os últimos dias têm sido marcados por uma grande especulação política sobre rumos que o Presidente Fernando Henrique pretenderia impor ao seu governo: alterações na área da coordenação política, alterações no Ministério e reformulação de políticas públicas a serem implementadas. Tudo isso, evidentemente, com uma grande dose de especulação e imaginação por parte da imprensa e de políticos. No entanto, alguma coisa se aproveita desse debate e dessas notícias.

Vejo com uma certa preocupação - e até já me reportei a esse tema em pronunciamento anterior que fiz no Senado - a manifestação de setores da sociedade, até de Partidos Políticos e de personalidades, que, ultimamente, têm cobrado certas posturas do Presidente da República quanto ao exercício da sua autoridade e quanto ao empenho na aprovação das reformas que estão tramitando no Congresso Nacional. Alguns dos pronunciamentos chegam mesmo a exigir do Presidente Fernando Henrique, como foi o caso do presidente da UDR, que assuma uma postura de Fujimori.

Ora, Sua Excelência - e creio que nesse particular nem a oposição mais ferrenha discordará - é um espírito democrata, um homem que tem uma história de vida, uma trajetória intelectual, política, uma formação humanista que lhe dá realmente um conteúdo democrático muito forte.

Ora, como se poderia dizer que o Presidente não tem empenho na tramitação das reformas e na sua aprovação no Congresso Nacional!

Sua Excelência - inclusive sou um dos que reconheço, pois não estou cem por cento de acordo com as propostas de reforma que aqui tramitam - arca com um desgaste junto ao funcionalismo público, aos aposentados, aos pensionistas ao propor essas reformas, que entende necessárias - como também eu as entendo, embora discordando de alguns de seus aspectos. Sua Excelência assumiu o ônus político de enviá-las ao Congresso, onde estão sob exame. Então, a primeira pergunta que cabe ser feita é a de como Sua Excelência iria abandonar as reformas, se já pagou um grande ônus por havê-las proposto? Não me parece que essa seja uma posição sensata. Evidentemente que o Presidente Fernando Henrique Cardoso não tem nada de insensato. Então, se o Presidente assumiu o ônus de propor essas reformas é porque acredita que sejam necessárias, indispensáveis, urgentes para o equilíbrio do Estado brasileiro. E, em sendo um democrata, é evidente que Sua Excelência nada poderá fazer, a não ser acatar a decisão do Congresso Nacional. Não há como exigir outro comportamento de Sua Excelência que seria o de querer que o Presidente da República vestisse uma "túnica de César" e implantasse um "cesarismo", e que propostas fossem imediatamente convertidas em lei, em reforma da Constituição. É claro - e o Presidente da República disse isso no discurso de posse do Senador Iris Rezende e do Deputado Eliseu Padilha - que a responsabilidade será de cada um de nós. Afinal de contas a instância onde as propostas estão sendo apreciadas, no momento, é o Congresso Nacional. Estamos dispostos a assumir a nossa cota, a nossa parcela de responsabilidade. O que também não se pode dizer é que a tramitação seja morosa, porque, em diversos países onde essas reformas estão sendo realizadas, elas têm levado anos e ainda não foram concluídas. Mesmo na Inglaterra, França, Espanha e Portugal, a reforma da previdência tem levado anos e anos sob o exame da sociedade e do Parlamento e ainda não foi concluída. É de tal modo que o Presidente da França resolveu antecipar as eleições para tentar, a partir delas, sair fortalecido para empreender algumas reformas econômicas e também da previdência. O governo francês recuou nessa reforma quando houve uma grande reação da sociedade francesa. E agora, após a realização do primeiro turno, o resultado foi desastroso porque mostra uma ampla vitória das forças de esquerda, dos socialistas e de outros partidos, como o comunista e o partido Verde, que reúnem um maior número de votos e, possivelmente pelas projeções, um maior número de cadeiras do que os partidos da direita.

Ora, se assim o é, é também tempo de refletirmos um pouco sobre o que está acontecendo na Europa. Já tivemos a eleição Tony Blair - o Partido Trabalhista Britânico obteve uma vitória esmagadora na Inglaterra. A maior dos últimos 150 anos. E, agora, os socialistas, na França, venceram a eleição no primeiro turno, juntamente com os comunistas e com o partido Verde e outros partidos menores. Então, talvez algo esteja acontecendo no mundo, um princípio de revisão desse processo, o que não significa negá-lo absolutamente, negá-lo totalmente. Nenhum de nós iria negar a necessidade de reforma do Estado, negar a necessidade de uma reforma da Previdência. O que podemos discordar é da maneira pela qual está sendo feita ou de alguns de seus tópicos.

Então, é preciso paciência. E ninguém pode exigir que o Presidente Fernando Henrique Cardoso faça mais do que está fazendo - mobilizar a sua base política, os Partidos que o apóiam, despertar o Congresso para a necessidade de decidir essa questão. Mas não podemos deixar de ter o tempo necessário para examinar esses problemas e de decidirmos com independência e liberdade. Vamos aceitar totalmente as propostas do Presidente? Vamos aceitá-las parcialmente ou rejeitá-las completamente? Evidentemente que, ao Presidente, só restará uma postura: aceitar o que o Congresso decidir.

Muitas dessas cobranças considero até impertinentes. Elas talvez pudessem ser dirigidas ao Congresso, mas, mesmo assim, só poderíamos acolhê-las como manifestações de certos setores da sociedade que desejam uma solução que seja do seu agrado. Mas a palavra final, a decisão é nossa. E devemos estar preparados para assumir a inteira responsabilidade das nossas decisões.

O Senador Beni Veras, por exemplo, tem feito, aqui no Senado, um notável esforço de reformulação da proposta da Previdência, restando talvez da proposta de S. Exª um ou dois pontos que venham a suscitar debate, discussão e exigir realmente uma votação em que os Senadores se posicionem em favor dessa ou daquela alternativa, porque são matérias sobre as quais dificilmente se poderá chegar a um acordo e a um entendimento. Mas tudo isso feito com parcimônia, com cautela e com observância aos prazos, com a atenção que um problema dessa gravidade merece. Tenho certeza de que todos nós estamos recebendo do País inteiro, todos os dias, mensagens, cartas, correspondências, comissões, representantes de instituições e de entidades que fazem as suas ponderações sobre os desdobramentos dessa reforma da Previdência ora em análise aqui no Senado.

Então, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero, como membro do PSDB, como Senador do PSDB que apóia o Presidente, dizer que, por maiores que sejam essas pressões e por maior que seja o seu empenho, o seu interesse no desfecho dessas matérias que estão tramitando no Congresso Nacional, Sua Excelência não irá nunca - tenho certeza disso - abdicar da sua postura democrática em aceitar o pronunciamento do Congresso, ainda que não seja exatamente aquele que Sua Excelência deseja.

Quando o Presidente diz que "o problema está com o Congresso, e que cada um assuma perante a história, a sua responsabilidade" - foi mais ou menos isso - estou plenamente de acordo com Sua Excelência e disposto a assumir essa responsabilidade.

A Srª Emilia Fernandes - Permite V. Exª um aparte, Senador Lúcio Alcântara?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Pois não, Senadora Emilia Fernandes.

A Srª Emilia Fernandes - Peço-lhe desculpas por interromper o pronunciamento de V. Exª.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Recebo com maior agrado a intervenção de V. Exª.

A Srª Emilia Fernandes - Senador, quero cumprimentá-lo pelo assunto, pelas ponderações que está fazendo, suscitando, acima de tudo, o debate, a reflexão sobre assuntos de tão grande relevância que, sem dúvida, são as reformas propostas pelo Governo, até porque são medidas profundas que atingem a sociedade brasileira como um todo, os trabalhadores da ativa, os aposentados. Gostaria de dizer que vindo de V. Exª essa reflexão, pessoa altamente qualificada pela seriedade com que desempenha o seu trabalho, a sua ação política, tanto pela responsabilidade, seriedade e competência, queremos nos solidarizar, dizendo que o que temos levantado em relação às questões propostas pelo Governo é exatamente na linha posta por V. Exª. O que não podemos - e a isso me somo a V. Exª, aliás penso que todos os Parlamentares, tanto Deputados quanto Senadores, deveriam ter como princípio a importância do cumprimento das nossas atribuições, as prerrogativas que temos diante da sociedade brasileira como legítimos representantes que somos. Então, em hipótese alguma, em momento algum, deveríamos abrir mão do nosso direito de debater, de modificar, de alterar, de construir novas propostas, e infelizmente não é o que temos sentido nos últimos tempos. Parece-me que o Congresso Nacional, em momentos importantes, em assuntos da mais alta relevância do interesse do Brasil, às vezes, coloca o debate e as suas prerrogativas em segundo plano. Cumprimento-o, mais uma vez, porque V. Exª faz um alerta no sentido de que um debate sobre esse assunto seria da mais alta relevância, fazendo um estudo comparativo com a realidade de outros países, com as conseqüências, com a reação do povo, enfim, para que o Governo pudesse deixar o Congresso Nacional exercer as suas prerrogativas na sua plenitude. Faço o meu raciocínio e o encaminhamento das minhas posições exatamente na linha que V. Exª expõe nesta tarde.

O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Senador Lúcio Alcântara, desculpe-me por interrompê-lo, é apenas para prorrogar a Hora do Expediente pelo tempo necessário a que V. Exª conclua o seu pronunciamento.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Pois não, Sr. Presidente. Muito obrigado.

Antes de ouvir o Senador Lauro Campos, e aí concluir o meu pronunciamento, devo dizer que o limite da autoridade política do Presidente da República é o de mobilizar a sua base de apoio, para que apóie as suas propostas. Mas, evidentemente, essa é uma decisão soberana, livre, do Congresso. Por isso tem toda a razão a Senadora Emilia Fernandes, quando diz que exigir-se mais do Presidente da República seria querer que Sua Excelência ultrapassasse o limite da democracia, como se fosse legítimo que desse prazo ao Congresso Nacional. Os nossos prazos são os prazos constitucionais, são aqueles que estão assinados na Constituição.

O que devemos fazer, evidentemente sem desperdiçar o nosso tempo, sem perder de vista o interesse nacional, é deliberar com conhecimento de causa e com a segurança de quem está adotando esta ou aquela posição no entendimento, na compreensão de que aquela é a que melhor consulta o interesse nacional.

É nesse sentido o meu pronunciamento, de preservar a figura do Presidente da República, não lhe exigindo aquilo que não pode dar. Não é justo que se cobre de Sua Excelência que, de alguma maneira, coaja o Congresso, ou feche o Congresso, a deliberar num regime que não seja aquele livremente determinado pelo nosso Regimento e pela nossa vontade, enquanto Congressistas que somos.

Ouço o nobre Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos - Nobre Senador Lúcio Alcântara, de início, reafirmo a V. Exª a minha admiração pela maneira como vem desempenhando o seu mandato no Senado Federal. Realmente, se todos os Senadores do seu Partido tivessem a coerência, o empenho no desempenho do mandato, a seriedade que V. Exª tem demonstrado, as coisas poderiam correr melhor, inclusive para o próprio PSDB e para o Presidente Fernando Henrique Cardoso. O que me parece que V. Exª traz à baila de realmente importante é o fato de que tanto na Inglaterra quanto na França está havendo uma mudança de rumo, tendo em vista os últimos resultados das eleições. Não há dúvida de que também no Brasil a aprovação, o comportamento do Presidente Fernando Henrique Cardoso caiu de 70%, em novembro do ano passado, para 50%, talvez menos, porque essa apuração de 50% foi antes do escândalo da compra de votos na Câmara dos Deputados. Gostaria de dizer apenas o seguinte: quando Sua Excelência assumiu a Presidência da República, mais do que ninguém, tinha consciência da situação em que nós nos encontrávamos, uma crise que tendia a se aprofundar; optou então pelo Plano, que é um plano duro, já aplicado no Brasil em outras épocas, muito parecido com o aplicado pelo ex-Senador e ex-Ministro Roberto Campos e pelo ex-Ministro Octávio Bulhões. Portanto, como diz Sua Excelência, um processo que foi reiniciado através do Cruzado I. Então, temos a experiência acumulada. Há muito tempo já se sabe que é muito mais difícil sair das conseqüências do Plano do que baixá-lo. Dessa forma, uma vez que Sua Excelência, o Presidente, baixou esse Plano, com todas as conseqüências e toda a engenharia que o constitui, e com a sua aplicação, é evidente que é muito difícil para Sua Excelência ou para qualquer outro Governo sair desse plano para adotar outras soluções sem que a lógica do que aí está seja profundamente atingida. Assim, parece-me que Sua Excelência, apesar das declarações e até mesmo da intenção de retificar certos rumos, encontrará muita dificuldade em fazê-lo. Muito obrigado, Senador.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Senador Lauro Campos, com muita satisfação, recolho os conceitos elogiosos que faz a meu respeito. Evidente que, ressalvadas as diferenças individuais, todos nós aqui, independentemente de partido, procuramos, na maneira de encarar as coisas, a melhor forma possível para exercer o nosso mandato.

E V. Exª, como professor de Economia, vai-me dar razão num ponto - tenho certeza - que, de certa maneira, distingue o Plano Real dos outros planos. É que o Presidente Fernando Henrique, na época do Presidente Itamar Franco, como seu Ministro da Fazenda, e agora no exercício da Presidência da República, está implantando e executando esse Plano num contexto democrático. Afinal de contas, isso veio ao Congresso - o Congresso aberto - Câmara funcionando, imprensa livre etc., o que evidentemente exige muito mais talento, muito mais cuidado, muito mais atenção do que em outras situações, em que esses planos foram baixados, ou num período de restrição democrática, das liberdades públicas, ou de forma abrupta, através de instrumentos como medidas provisórias, que foram baixadas sem uma discussão ou uma reflexão maior do Congresso.

Para concluir, Sr. Presidente, voltando ao ponto em que o Senador Lauro Campos destacou como de importância, e que também penso assim, o que estaria havendo? A Inglaterra estava num dos períodos de maior crescimento da sua economia, com a taxa de desemprego das mais baixas da sua história e, de repente, ainda que atenuado, ainda que modernizado, o trabalhismo vence as eleições.

Agora, na França, o Governo, eleito há pouco tempo - acho que não tem dois anos - do Presidente Chirac, submete-se a uma eleição convocada por ele, quer dizer antecipada. Certamente deveria ter as suas pesquisas, suas avaliações, para fazer essa convocação, porque afinal de contas foi uma decisão unilateral, que a Constituição lhe facultava. E vai, pelo menos no primeiro turno, perdendo as eleições.

Será que é um caso de parafrasear aquele general-presidente, que disse que o país vai bem e o povo vai mal, na Inglaterra, como na França? Ou seria o caso de se dizer que a economia vai bem e o povo vai mal? Quer dizer, a inflação está baixa, a economia cresce, mas alguma coisa falta. Certamente poderíamos ir muito adiante, especulando sobre os vários indicadores de insatisfação que poderiam estar gerando a reversão de toda essa situação política, em função, sobretudo, dos desdobramentos da economia e das condições de vida naqueles países.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, concluindo, afirmo que, para mim, o maior mérito do Presidente Fernando Henrique é propor essas reformas, tentar essas transformações, essas mudanças do Estado brasileiro, sem querer entrar no seu mérito quanto a sua profundidade, qualidade, desdobramentos, agindo como um democrata, procurando realmente, dentro do pleno funcionamento da democracia, obter esses elementos que permitam a execução do seu programa de governo. Penso que Sua Excelência deve perseverar sim, e não pode evidentemente curvar-se a qualquer tentativa de exigência de uma postura que não seja absolutamente de acordo com a sua formação, com a sua convicção pessoal e com a sua trajetória política e humanista. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/05/1997 - Página 10617