Discurso no Senado Federal

ENCONTRO DE S.EXA. COM O MINISTRO DA REFORMA AGRARIA, DR. RAUL JUNGMANN, TENDO EM VISTA AS AÇÕES DO GOVERNO NA AREA CONFLITUOSA DO SUL E SUDESTE DO PARA.

Autor
Coutinho Jorge (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando Coutinho Jorge
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • ENCONTRO DE S.EXA. COM O MINISTRO DA REFORMA AGRARIA, DR. RAUL JUNGMANN, TENDO EM VISTA AS AÇÕES DO GOVERNO NA AREA CONFLITUOSA DO SUL E SUDESTE DO PARA.
Aparteantes
Josaphat Marinho.
Publicação
Publicação no DSF de 29/05/1997 - Página 10667
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • REGISTRO, REUNIÃO, ORADOR, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), DEBATE, CONFLITO, CAMPO, ESTADO DO PARA (PA), ANUNCIO, ASSINATURA, CONVENIO, PREFEITURA.
  • NECESSIDADE, URGENCIA, PROVIDENCIA, GOVERNO, SOLUÇÃO, REFORMA AGRARIA, REGISTRO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ESTADO DO PARA (PA).
  • NECESSIDADE, INFRAESTRUTURA, CREDITO AGRICOLA, ASSISTENCIA TECNICA, FIXAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, ASSENTAMENTO RURAL.
  • DEFESA, DESCENTRALIZAÇÃO, MUNICIPIOS, RESPONSABILIDADE, REFORMA AGRARIA, COLABORAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), PREFEITURA, CAMARA MUNICIPAL, PRODUTOR RURAL, EMPRESARIO, SEM-TERRA, REDUÇÃO, CUSTO.

O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem, no final da tarde, estivemos participando de um encontro com o Ministro da Reforma Agrária, Sr. Raul Jungmann, acompanhado do Deputado Federal Giovanni Queiroz, quando tivemos oportunidade de discutir com S. Exª as ações do Governo Federal para a área conflituosa do sul e sudeste do Pará, e, sobretudo, definir a visita de S. Exª brevemente àquele local. Na ocasião, ele assinará uma série de atos importantes em favor da efetivação da reforma agrária, dos programas e políticas agrárias para aquela região.

Sobre isso gostaríamos de tecer algumas breves e sucintas considerações. Não temos dúvida de que o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso tem obtido vitórias importantes na área econômica e nas áreas das reformas constitucionais e estruturais em favor do desenvolvimento brasileiro. Mas existem certas áreas ou setores onde Sua Excelência tem que concentrar esforços grandiosos para superar problemas graves que afligem a sociedade nacional.

E uma dessas questões graves, que reflete uma problemática econômica e social, é a reforma agrária, tanto que a sociedade hoje se organiza e luta em favor da efetivação dessa reforma.

Todos sabemos que, desde 1964, quando da edição do Estatuto da Terra, muitos Governos passaram, muitas decisões foram tomadas, mas a problemática da reforma agrária não teve um encaminhamento definitivo, a não ser pontual, em regiões do País.

Acreditamos, hoje, que cabe ao Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso tomar decisões firmes e importantes para resolver, de forma definitiva, a problemática da terra no Brasil.

Quero tecer algumas considerações sobre uma das áreas mais conflituosas deste País, senão aquela em que o problema agrário cria mais conflitos - as regiões sul e sudeste do Estado do Pará. Trata-se de uma região pioneira, de uma fronteira agrícola importante, onde brasileiros de outras plagas, derrubando a floresta, implantaram projetos agrícolas e sobretudo pecuários. A partir principalmente da década de 70, muitas fazendas, extensas fazendas foram implantadas, mas, ao lado disso, conflitos agrários começaram a crescer, colimando no grande conflito de Eldorado dos Carajás, no ano passado, quando dezenove sem-terra foram mortos em enfrentamento com a polícia local.

A partir daí, o Governo Federal tomou uma decisão firme com relação àquela área e praticamente federalizou as suas ações naquela região, que envolve dezenas de municípios, que envolve projetos importantes, como Carajás e outros. Em decorrência das potencialidades daquela região, é necessário buscar a pacificação agrária, para que ela possa continuar seu desenvolvimento agrícola, pecuário e industrial. Nesse sentido, foi criada a primeira superintendência especial no Brasil, cuja sede é em Marabá, ligada diretamente ao Ministro; de Brasília, poder-se-ia discutir e tomar decisões em relação àquela área, cheia de conflitos agrários.

É claro que o Governo Federal passou a tomar uma série de decisões importantes. Dentre elas, iniciou um processo sucessivo de desapropriação de grandes fazendas. Para que os Srs. Senadores tenham uma idéia, no meu Estado, a partir de 93, já foram desapropriadas mais de 60 grandes áreas e, particularmente, a partir de 95, durante o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, praticamente 40 fazendas foram desapropriadas, inclusive a Fazenda Macaxeira, onde ocorreu o conflito de Eldorado. Outras estão em fase de desapropriação. Uma grande fazenda, a Bradesco, em Conceição do Araguaia, deverá ter os decretos finais completados ainda no decorrer deste ano.

Sabemos que a solução da reforma agrária não significa apenas desapropriar terras. Esse é apenas um aspecto da questão. Ela necessita de um conjunto de outras medidas, de outras políticas para viabilizar o assentamento dos colonos nessas áreas desapropriadas; precisa de rodovias para escoar a produção; precisa das estradas vicinais, de educação, de saúde, para que o colono não receba a sua terra e, pouco tempo depois, por falta de apoio e de infra-estrutura, tenha de vendê-la e de tornar-se mais um sem-terra na cidade, a gerar problemas econômicos e sociais graves para a região.

Para se efetivar uma reforma agrária, é necessário, sobretudo, assistência técnica do especialista em agropecuária para assessorar o plantio, orientar o produtor em relação ao que deve fazer e como fazer, em prol da real produtividade do solo. Em função disso, é claro que ele produzirá a cultura certa, plantará no momento correto e, com isso, obterá o sucesso necessário à sua lavoura, à sua pequena pecuária, não tenho dúvida nenhuma.

Porém, ele ainda precisa da assistência creditícia, completando um ciclo indispensável para que se efetive realmente uma reforma agrária realista, sem os discursos bonitos; uma reforma agrária de pé no chão, operacional, que funcione na realidade. Nesse sentido, busca-se para aquela região uma reforma agrária que fuja do discurso, a fim de que sua implementação seja viabilizada de fato.

Os prefeitos daquela região, que envolve mais de três dezenas de grandes municípios, em reunião, em janeiro, através da Associação dos Municípios do Araguaia-Tocantins, junto ao INCRA, discutiram uma estratégia global, visando sobretudo à participação efetiva dos municípios na reforma agrária daquela região. Significa dizer, na prática, municipalizar a reforma agrária, co-responsabilizar os municípios, co-responsabilizar a região em favor de uma solução prática e objetiva, não delegando simplesmente ao Governo Federal, em Brasília, as decisões importantes em favor da solução desse problema tão difícil.

Realmente, foi uma atitude corajosa e consciente dos prefeitos. Participamos desse encontro desde janeiro; acompanhamos pari passu junto ao INCRA, junto ao Ministro Jungmann, junto a outros Parlamentares a viabilização dessa tese de municipalização, que envolve vários atores no processo, a fim de que a reforma agrária, objeto de muitos discursos, seja realizada em várias partes do Brasil. Queremos fazer uma reforma agrária realista, viável e possível.

Por isso, a partir de janeiro, junto com o Ministério da Reforma Agrária e do INCRA, começou a ser desenhado o modelo em que os municípios criariam conselhos municipais de reforma agrária, dos quais o INCRA, os Prefeitos, a Câmara, a Associação de Produtores Rurais, o Movimento dos Sem-Terra, os produtores rurais, os empresários da área agrícola, os vários segmentos da assistência técnica pudessem participar; não seria em caráter deliberativo, mas consultivo.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, o objetivo desses conselhos seria discutir as possíveis áreas a serem desapropriadas e também definir os sem-terra aptos a assumir os lotes a serem definidos pelo Governo Federal em conjunto com o Estado e o Município.

Irei ao sul do Pará e, na próxima sexta-feira, deveremos fechar as linhas básicas desses conselhos municipais, assessorados pelo INCRA, para que possam ser aprovados nas Câmaras de Vereadores e ter a legalidade indispensável para que tenham autoridade de ajudar e colaborar na efetiva reforma agrária daquela região.

Além disso, a idéia de municipalização não implica só criar conselhos, mas a participação das prefeituras como parceiras efetivas dos investimentos nos assentamentos, como a implantação de estradas vicinais, de escolas, de postos de saúde, por exemplo. As prefeituras daquela região têm custos mais baixos do que o custo médio utilizado pelo INCRA em todo Brasil. Portanto, o próprio Governo Federal teria vantagens, em termos de estrutura de custos, com a participação interessada e efetiva das prefeituras.

Há o compromisso na Associação dos Municípios daquela região de que as prefeituras, com recursos repassados do INCRA, poderiam efetivamente ajudar a implantar esses assentamentos. Já há experiências anteriores nesse sentido. Na verdade, apenas iríamos ampliar essa ação efetiva das prefeituras em favor dos novos assentamentos, considerando, como disse, que uma série de fazendas e de áreas foram recentemente desapropriadas.

Com isso, teríamos custos mais baixos, participação das prefeituras, que teriam a responsabilidade de acompanhar as estradas vicinais, as escolas, os postos de saúde, permitindo que o homem se fixasse efetivamente no campo, produzindo e, ao mesmo tempo, recebendo educação, saúde, enfim, a infra-estrutura necessária. Iríamos fazer um programa simples, concreto de parceria em favor da efetivação da reforma agrária naquela região.

Não temos dúvida nenhuma de que essa forma de municipalização, de parceria, essa forma de co-responsabilização dos Municípios e Estados em relação à problemática da reforma agrária seria a solução real, possível e viável. Queremos, insisto, sair do discurso para a prática, para a operacionalidade efetiva.

Na reunião de ontem, o Ministro Jungmann definiu que, dentro de 15 dias, estaria na região, assinaria convênios com as prefeituras para os atos de desapropriação de fazendas e garantiria assistência técnica dentro do assentamento, que é um aspecto importante capaz de viabilizar qualquer reforma agrária.

Por isso, o Governo Federal criou o Projeto Lumiar. Trata-se de uma inovação mediante a qual os assentamentos, organizados, poderiam contratar especialistas em agronomia, técnicos na área de agropecuária, que iriam viver, morar nos assentamentos. Acredita-se que uma média de cinco técnicos poderiam atender a 300 famílias.

O INCRA chegou à conclusão de que não adianta fazer assentamentos no Brasil sem que esses tenham, além dessa infra-estrutura social, orientação técnica permanente que permita viabilizar a produtividade. Dessa forma, fecharíamos o ciclo. Além do mais, há financiamentos específicos em favor da reforma agrária, como o Procera. Portanto, há uma lógica nesse planejamento em favor de uma região que consideramos a mais difícil, a mais complexa, a maior em problemas agrários do Brasil.

O Sr. Ministro Raul Jungmann, repito, garantiu que dentro de duas semanas estaria naquela região para assinar os atos, definir políticas em favor de uma nova fase de vida para o sul do Pará. Não tenho dúvida de que, implantados dessa forma, com essas variáveis, com esses detalhes, com esses aspectos, há de haver não só a regulamentação da terra, mas o apoio e infra-estrutura econômica, social, técnica e creditícia para que os assentamentos e a produção sejam viáveis. Isso evitaria o abandono da terra pelo colono. Assim poderíamos finalmente minimizar os problemas decorrentes do conflito agrário naquela região.

Esse programa, essa proposta poderia servir de modelo em várias partes deste País. Tenho a satisfação de dizer que acompanhei, de forma determinada, todo o processo dessa tomada de decisão do Governo Federal, dos Governos Estaduais e dos Governos Municipais. Juntos, pretendem resolver a problemática agrária da região sul e sudeste do Pará.

O mero discurso sempre é bonito, mas o importante é transformá-lo em prática. É isso que se quer, é isso que se vai fazer em relação à reforma agrária do sul e sudeste do Pará. 

O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. COUTINHO JORGE - Com todo o prazer.

O Sr. Josaphat Marinho - Não tive o prazer de ouvir o início do seu discurso. Pude, entretanto, perceber a linha geral do seu pronunciamento buscando soluções mais objetivas para o problema agrário. Notei que V. Exª louva bastante a idéia da parceria de Estados e Municípios; deu mesmo muito realce à participação dos municípios na solução do problema. Eu lhe perguntaria: de onde virão os recursos municipais para essa atuação nos programas da reforma agrária? Sabemos que eles estão sem recursos. Se o Governo Federal os propiciar, bem; se não os propiciar, como poderão os municípios concorrer efetivamente para a solução do problema agrário? 

O SR. COUTINHO JORGE - Senador Josaphat Marinho, V. Exª tem toda a razão. Talvez eu não tenha sido muito claro e explícito nas minhas considerações.

Na verdade, já que o INCRA é um programa de parceria concreto, realista, pergunto: na prática, o que faz? Juntamente com os municípios, analisa os assentamentos que serão implementados, as rodovias que deverão ser viabilizadas, as unidades de saúde e postos de saúde que deverão ser construídos e ainda analisa aspectos ligados à assistência técnica. Faz-se um cálculo de custo. A prefeitura poderá, se tiver máquinas, utilizá-las, mas o Governo Federal repassará o valor da rodovia, do posto de saúde integralmente à prefeitura. Ela seria um executor fiel, que utilizaria a capacidade local, sem precisar contratar grandes empresas a custos altos. Provou-se que o custo da prefeitura no local é quase 50% abaixo da média nacional. O INCRA ganha com isso, o Governo Federal também, e ainda se pode viabilizar o projeto.

É claro que as prefeituras só poderão executar as obras depois da assinatura de convênios através dos quais se determine o repasse de recursos do INCRA. Por isso mesmo, o Ministro Jungmann, daqui a duas semanas, estará naquela região para, repito, discutir e assinar convênios não só relativos à infra-estrutura econômico-social - essa será acompanhada por conselhos municipais que envolvem a sociedade civil, os agentes públicos -, mas também os atos desapropriatórios complementares.

V. Exª tem razão. Acho que essa é a única solução. Sem isso, estaríamos diante de uma utopia.

O Sr. Josaphat Marinho - Em resumo, o que V. Exª sustenta é que a União entrará com os recursos financeiros?

O SR. COUTINHO JORGE - Perfeitamente. Posso dizer a V. Exª que talvez o INCRA, em termos de recursos, é o segmento da União que tem mais...

O Sr. Josaphat Marinho - Espero que o seu entusiasmo e a sua boa vontade possam converter-se em realidade, porque até aqui o que se verifica é que, nos seus próprios programas isolados, a União não cumpre os prazos estabelecidos para o fornecimento do dinheiro. Um exemplo claro: a recuperação da lavoura cacaueira na Bahia.

O SR. COUTINHO JORGE - Pessoalmente, nobre Senador, estamos acompanhando, juntamente com outros Parlamentares, Governo do Estado e Ministro, o desenrolar dos acontecimentos. Notamos, por parte do Governo Federal, ontem, uma boa vontade imensa em relação às propostas, já que naquela área há uma única superintendência especial federalizada, portanto, há um acompanhamento nosso juntamente com os prefeitos. Até hoje o Governo Federal tem respondido à altura.

Espero que essa idéia seja posta em prática. Quero voltar aqui, depois da visita do Ministro, e dizer: - O Ministro assinou os convênios, cumpriu a palavra; e o Governo Federal está tentando, pelo menos naquela região, solução para a problemática agrária no nosso País.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/1997 - Página 10667