Discurso no Senado Federal

RAZÕES PARA O ENCAMINHAMENTO A MESA DE REQUERIMENTO SOLICITANDO A RETIRADA DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 14, DE 1997, DA QUAL S.EXA E O PRIMEIRO SIGNATARIO, QUE DISPÕE SOBRE A GRATUIDADE NO ENSINO SUPERIOR.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR.:
  • RAZÕES PARA O ENCAMINHAMENTO A MESA DE REQUERIMENTO SOLICITANDO A RETIRADA DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 14, DE 1997, DA QUAL S.EXA E O PRIMEIRO SIGNATARIO, QUE DISPÕE SOBRE A GRATUIDADE NO ENSINO SUPERIOR.
Aparteantes
Bello Parga, Carlos Patrocínio, Emília Fernandes, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 07/06/1997 - Página 11051
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, RETIRADA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, OBRIGATORIEDADE, ENSINO SUPERIOR, UNIVERSIDADE FEDERAL, ATENDIMENTO, PAGAMENTO, MENSALIDADE, SOLICITAÇÃO, ENTIDADE, ALUNO, PRAZO, DEBATE.
  • ANALISE, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, UNIVERSIDADE FEDERAL, REDUÇÃO, PESQUISA, QUALIDADE, ENSINO, SALARIO, PROFESSOR, INFERIORIDADE, ACESSO.
  • NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, PROPORCIONALIDADE, RECURSOS, PRIMEIRO GRAU, ENSINO SUPERIOR, DEFESA, PRIORIDADE, ENSINO FUNDAMENTAL, ENSINO PROFISSIONALIZANTE.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou encaminhando à Mesa Diretora o requerimento que pede, na forma regimental, a retirada do Projeto de Emenda Constitucional nº 14/97, que dispõe sobre a gratuidade no ensino superior.

Sendo o primeiro signatário, minha proposição formalizou-se com a assinatura de outros Srs. Senadores, aos quais agradeço o cavalheirismo do apoiamento.

O objetivo do meu projeto foi o de amparar o estudante pobre. Parece que se ignora, neste País, que as universidades públicas estão sucateadas. Sem condições financeiras para se manterem e aprimorarem laboratórios, pesquisas e mesmo o próprio ensino teórico, torna-se óbvio que declina, dia a dia, a qualidade do ensino que se presta neste País.

Ainda nestes dias, em prolongadas reuniões de Reitores com o Secretário de Educação Superior do Ministério da Educação, tem-se dito que o custeio dos inativos, provindos do ensino superior, e dos 46 hospitais universitários é um peso de chumbo nas verbas destinadas ao setor.

Anteontem, dia 4 do corrente, em Belo Horizonte, estudantes saíram com faixas às ruas para protestar contra a progressiva desativação do Hospital das Clínicas de Minas Gerais, hospital universitário tido como um dos mais importantes nosocômios daquele Estado. O hospital está morrendo por falta de verbas que lhe assegurem a sobrevivência.

Tais hospitais, criados para as pesquisas científicas, transformaram-se em centros de atendimento médico-hospitalar para a população pobre. Isso reflete a carência do nosso povo na área de saúde e corresponde a uma necessidade premente a ser realmente atendida. Mas, de algum modo, alterou-se a finalidade pesquisadora de um hospital universitário, sobrecarregando ainda mais os recursos que deviam se dirigir ao constante aprimoramento do ensino superior.

No meu Estado, a Universidade Federal do Maranhão não tem conseguido pagar sequer a água e a energia elétrica que consome. Os Reitores das nossas universidades públicas cruzam-se nos corredores do Ministério da Educação à cata de verbas que ao menos supram seus déficits.

Pressinto, Srª Presidente, que esse estado de coisas se encaminha celeremente ou para a privatização do ensino superior público, ou para a cobrança de mensalidades para todos os universitários, inclusive os pobres, ou para o progressivo fechamento de algumas universidades públicas.

Desejo, sinceramente, que o futuro, a médio e a longo prazo, desminta os meus pressentimentos.

Em São Paulo, o Governo destina 10% da arrecadação total do ICMS para a suas três Universidades, que atendem apenas 15% da população universitária do Estado.

Na China, os cursos superiores comunistas passaram a ser pagos, reservando-se verbas para 20% dos universitários que terão direito a bolsas de estudo, a créditos educativos ou a atividades profissionais que paguem os custos dos seus estudos.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o problema da manutenção adequada do ensino superior não é só brasileiro, é mundial, repetindo-se em vários continentes.

O estudante pobre que cursa ou aspira cursar nossas universidades públicas, mantidas pelo Governo Federal ou pelos Governos Estaduais, tem pela frente, portanto, uma perspectiva gravemente pessimista para o seu futuro profissional.

As universidades brasileiras passam por notórias dificuldades financeiras há bastante tempo. Já a deterioração dos salários dos professores, juntamente com a falta de verbas para as pesquisas, tem causado uma queda inegável e preocupante na qualidade e na formação profissional acadêmica.

O Sr. Romero Jucá - Permite V. Exª um aparte?

O SR. EDISON LOBÃO - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Romero Jucá - V. Exª traz a debate nesta manhã um tema extremamente importante. E, antes de entrar na discussão em si, quero ressaltar o mérito do projeto de V. Exª que, apenas trazendo para a discussão essa questão do ensino pago nas universidades, suscita um tema que é da maior importância, passando a ser inadiável a discussão deste na sociedade brasileira. Estive ontem com o Ministro da Educação, Paulo Renato, juntamente com o Reitor da Universidade Federal de Roraima, Professor Sebastião Alcântara, tratando exatamente das questões colocadas por V. Exª: recursos para as universidades, falta de bibliotecas, falta de laboratórios, enfim, as precárias condições de funcionamento a que estão jogadas as universidades brasileiras. Paralelamente a isto, vê-se, como bem disse V. Exª, o volume de recursos carreado para as universidades. O que se tem que fazer é uma ampla discussão e uma reforma do ensino técnico e universitário do País. Da maneira como estamos fazendo a reforma da Previdência, mais dia menos dia, teremos que fazer a reforma na educação, a reforma no ensino técnico e a reforma no ensino universitário. V. Exª, ao trazer esta emenda, ao trazer este Projeto, trouxe à baila um debate de fundamental importância. Parabenizo-o, inclusive pelo espírito democrático de retirar o Projeto para uma melhor apreciação. Espero que a Comissão de Educação e a Comissão de Assuntos Sociais se debrucem sobre este importante tema que V. Exª levantou com seu Projeto.

O SR. EDISON LOBÃO - Veja como V. Exª traz um testemunho importante ao debate desta matéria. Eu falava sobre a Universidade do Maranhão, de suas dificuldades, sobre a Universidade do Rio de Janeiro, sobre a Universidade de São Paulo, além de outras, e V. Exª traz a informação da Universidade de seu Estado, Roraima. Ontem mesmo esteve com o Reitor, no gabinete do Ministro da Educação, lutando por recursos e observando que a Universidade passa, no seu Estado, por dificuldades incríveis. Mas é assim no Brasil inteiro. Ou nós tomamos uma decisão corajosa agora, ou amanhã será muito tarde para salvarmos as universidades federais da crise financeira em que se encontram mergulhadas.

Recebi, no meu Gabinete, a visita do Presidente da UNE e também do ex-Presidente da UNE, Srs. Deputados Lindberg Farias e Ricardo Gomyde, além de outros estudantes que me fizeram um apelo no sentido de retirar da pauta de votação este Projeto de Emenda Constitucional que eu havia apresentado, a fim de serem ouvidos professores, estudantes, reitores, autoridades do Governo Federal e dos governos estaduais, para que possam debater mais profundamente esta matéria e buscar um norte, uma solução para este grave problema nacional.

Agora pergunto aos Srs. Senadores: quais os estudantes que estarão mais prejudicados por essa carência de recursos no nosso ensino superior?... Evidentemente são os estudantes de menores condições financeiras, já que os que as têm não se deixarão prejudicar pela falta de recursos da sua faculdade. Tratarão de suprir, em instituições privadas, naturalmente pagas, o que o ensino público não lhes puder proporcionar.

Sabem V. Exªs qual o montante de recursos despendidos pelo Ministério da Educação com o nosso ensino superior neste País? Algo em torno de 70% de todas as receitas do Ministério da Educação são destinadas, hoje, exatamente ao ensino superior. E, ainda assim, verificamos que as universidades enfrentam dificuldades.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, veja-se que chegamos ao paroxismo em matéria de tais gastos. O Ministério está incapacitado de investir mais um centavo sequer no ensino superior mantido pelo Governo Federal.

Resta ao Ministério buscar mais dotações extras que lhe permitam ao menos cobrir os mais de 100% dos compromissos assumidos no setor, e assistir, de braços cruzados, à débâcle do nosso ensino superior público.

Falo em débâcle, Sr. Presidente, porque o objetivo de uma faculdade superior não é apenas o de dar aulas para os alunos interessados. Cabe-lhe a tarefa da pesquisa e da extensão cultural, tão necessária ao desenvolvimento do País.

E onde fica, em meio a tantas falhas, o estudante pobre, que, impossibilitado de buscar reforço nas aulas práticas e nas experiências laboratoriais de cursos particulares, é privado do seu direito à igualdade no confronto futuro com o estudante rico ou de maiores recursos financeiros?

Num documento da UNESCO, do qual o Brasil é um dos signatários, define-se o ideal universitário, estabelecendo-se como aspiração da humanidade que cada instituição de ensino superior seja:

      "Um lugar de aprendizagem baseado unicamente na qualidade e no conhecimento, que inculque nos futuros graduados o compromisso de prosseguir a aprendizagem, e a responsabilidade de colocar sua formação ao serviço do desenvolvimento social", e

      "Um lugar que acolha aos que regressam para atualizar e aperfeiçoar seus conhecimentos e suas qualificações como parte da prática e da cultura institucional".

O Sr. Bello Parga - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDISON LOBÃO - Ouço, com muito prazer, o eminente Senador Bello Parga.

O Sr. Bello Parga - Senador Edison Lobão, louvo a atitude ponderada de V. Exª neste momento, ao retirar de pauta o projeto de sua autoria que tornaria obrigatório o pagamento das mensalidade dos alunos de maior poder aquisitivo das universidades brasileiras. Fui signatário desse projeto, por entender, como V. Exª, que é preciso dar maiores condições de recursos financeiros às universidades. Mas o problema brasileiro não reside, no momento, nessa carência de recursos para o ensino de Terceiro Grau e sim, evidentemente, nos recursos que a ele são destinados, que estão sendo feitos em detrimento do Ensino de Primeiro Grau, que é o que mais interessa ao Brasil. Nós, a quem cabe, por delegação popular, a tarefa de legislar, muitas vezes, imbuídos em um dos melhores propósitos, fazemos, redigimos um texto, depois de ouvir consultorias, diversos setores da sociedade, convictos de que estamos fazendo a coisa certa. No entanto, V. Exª foi procurado por pessoas do setor, ligadas às universidades, tanto dos corpos discentes como dos corpos docentes, que pediram que fosse dado mais tempo, a fim de que o assunto fosse melhor discutido. Considero de grande equilíbrio a posição de V. Exª e, também na qualidade de subscritor, louvo aqui essa atitude de prudência - não de desistência do projeto -, para que possamos, ouvidos outros setores que porventura não tenham sido ouvidos, melhorar os termos e o texto da proposição da iniciativa de V. Exª. Tem, portanto, V. Exª o meu louvor e o meu apoio no seu ato.

O SR. EDISON LOBÃO - Senador Bello Parga, quando decidi apresentar este projeto, realmente procurei V. Exª pedindo apoio, pela sua sobriedade de sempre, bom-senso e sensatez. Discutimos juntos esta questão e chegamos à conclusão de que o debate era conveniente, era necessário. Tornar-se-ia importante, para o futuro da universidade brasileira, abrir o debate sobre essa questão, e foi o que fizemos.

Mas a prudência, expressão que agora V. Exª usa, há de presidir sempre as decisões de natureza política, e é o que estou fazendo neste momento. Agindo com prudência, para que não se tome uma decisão da qual possamos vir amanhã a nos arrepender. Fui sensível aos apelos dos estudantes do meu Estado, o Maranhão, aos apelos do Presidente da UNE e de outras autoridades políticas, mas também devo dizer que recebi a solidariedade de inúmeros estudantes, de dezenas de professores e de pessoas da sociedade que entendiam que isto deveria ser feito, até como um meio de salvar a universidade brasileira.

Sr. Presidente, é difícil dizer que nossas universidades públicas, de tão gloriosas reputações, estejam atualmente em condições de se transformar no lugar idealizado pelo documento ao qual o Brasil deu integral apoio.

Aí, pelo fato de o ensino superior público não poder cumprir o ideal universitário, o brasileiro pobre é mais uma vez penalizado, pois o estudante que tem recursos vai buscar, até mesmo no exterior, o ambiente idealizado que faltou aos seus irmãos desprovidos de meios materiais.

Enquanto as universidades públicas brasileiras enfrentam penúrias praticamente insolúveis sob a atual legislação, o nosso ensino básico queda-se à míngua de recursos, os mais modestos que sejam.

Sabemos que há uma crise profunda na educação. Mais do que isso: trata-se de um problema secular que o País nunca soube equacionar corretamente. Nações mais pobres do que a nossa, inclusive na América Latina, desenvolveram sistemas educacionais muito mais eficientes.

Temos problema no acesso e permanência no sistema: em que pesem os avanços dos últimos anos, quase 10% das nossas crianças de 7 a 14 anos continuam fora das salas de aula, enquanto há vários países mais pobres que têm garantido a universalização do ensino fundamental. Apenas 4,5 milhões de estudantes estão cursando o ensino médio, em uma população de 16 milhões de jovens entre 15 e 19 anos.

No que se refere ao ensino superior, estamos há 15 anos estacionados nos 10% da população jovem que a ele tem acesso, enquanto há vários países da América Latina em que esse índice atinge 20 ou 30%.

Do total de 1,8 milhão de estudantes do terceiro grau - este é um dado muito importante - 1,2 milhão, ou seja, o dobro dos estudantes de instituições oficiais, arcam com seus próprios custos em estabelecimentos particulares.

A Srª Emilia Fernandes - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDISON LOBÃO - Ouço a eminente Senadora Emilia Fernandes com muito prazer, até porque se trata de uma educadora de renome, interessada permanentemente nessa questão fundamental para o nosso País.

A Srª Emilia Fernandes - Senador Edison Lobão, antecipadamente, agradeço as considerações, mas o meu breve aparte é para cumprimentar V. Exª pelo tema que aborda com tanta propriedade, relacionado à educação e, mais especificamente, à questão do ensino universitário. Gostaria apenas de dizer que esse é um problema que está atingindo todo o País, conforme V. Exª registrou e outros Srs. Senadores aqui também confirmaram. A exemplo disso, ontem, numa reunião aqui no Congresso Nacional, a Bancada gaúcha ouviu dirigentes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a Reitora, Professora Wrana Parizi, e representantes de entidades ligadas às universidades, em função da gravidade desse problema na educação e nas outras áreas também. Concordo plenamente com o Senador Bello Parga, que chamou a atenção para a questão do ensino fundamental. Temos muitas questões a serem discutidas, como a questão do ensino profissionalizante. E, sem dúvida, estamos diante de uma reforma proposta pelo Governo com relação à questão universitária. Portanto, esse é um assunto a que toda a sociedade deve estar atenta, acompanhando. Não entro no mérito do projeto de V. Exª; cumprimento-o porque teve a sensibilidade de entender que se trata de um assunto complexo que precisa de amplo debate - e, certamente, também teremos oportunidade de nos manifestar -, mas ainda não entro na sua avaliação, a não ser para chamar atenção para a importância do ensino universitário da pesquisa, que é necessário para que o Brasil se fortaleça como um país de mão-de-obra qualificada, de técnicos competentes, de profissionais competentes. Gostaria ainda de acrescentar ao pronunciamento que faz nesta manhã - se me permite V. Exª - que o Rio Grande do Sul, por intermédio da sua Bancada, das suas autoridades representadas, também está profundamente preocupado com a questão. Reunimo-nos ontem, no Congresso Nacional, quando designamos uma subcomissão, com representação de todos os partidos, a fim de, em reuniões a partir de terça-feira, buscarmos alternativas em debates com o Governo, com a sociedade, no sentido de melhorar as condições, principalmente em termos de recursos, de autonomia, enfim, de qualidade, sem dúvida, para o ensino universitário. Sob a coordenação do Deputado Jair Soares, ex-Governador do Estado do Rio Grande do Sul, certamente teremos oportunidade de trocar idéias, debater a questão juntamente com parlamentares do Brasil todo. Porque a questão é grave e diz respeito a todos nós, ao Governo e à sociedade como um todo. Muito obrigada pela oportunidade.

O SR. EDISON LOBÃO - Como vê o Senado, as preocupações não são apenas minhas, as preocupações são de todos nós. O Senador Jucá foi ontem ao Ministro da Educação com o reitor da universidade do seu Estado. A Senadora Emilia Fernandes nos dá conta de que a Bancada inteira do seu Estado se reúne, numa atitude até bonita, preocupada com o mesmo problema. Não podemos deixar que o Governo se preocupe sozinho com uma questão de tamanha transcendência. É necessário, e indispensável até, que nós todos, que somos políticos, que aurimos na raiz dos problemas as inspirações para resolvê-los, tenhamos também a nossa posição fixada neste plenário, em ajuda a todos quanto pretendam resolver esse grave problema.

Sabemos, Senadora Emilia Fernandes, que hoje se gasta mais com 600 mil alunos nas universidades federais e estaduais do que com 30 milhões de alunos de primeiro e segundo graus neste País. Evidentemente, algo está errado, e temos que procurar as soluções e corrigir o problema. O ensino profissionalizante a que V. Exª se refere é fundamental para o País, e estamos negligenciando essa questão. Temos que dar ênfase ao ensino fundamental no Brasil, ao ensino profissionalizante, porque, de outro modo, estaremos até formando doutores que, muitas vezes, não vão encontrar emprego ao concluírem seus cursos. Já para o ensino profissionalizante, há uma evidente carência de profissionais. É aí que, a meu ver, devemos investir mais fortemente para resolver os problemas do ensino em nosso País.

A crise mais aguda, Sr. Presidente, é a da qualidade do ensino. As taxas somadas de repetência e evasão no ensino fundamental são superiores aos 30%, conforme os últimos dados do Ministério da Educação. Esse percentual, sobrepondo-se nas diferentes séries, faz com que uma parcela bastante reduzida dos alunos conclua o primeiro grau. Mesmo quando aprovado, o aluno, provavelmente, apresentará uma série de deficiências na aprendizagem dos conteúdos previstos, como têm demonstrado fartamente as pesquisas do Sistema de Avaliação da Educação Básica.

O Brasil, no entanto, não gasta pouco com educação. Os dispêndios - este é outro dado importante - das várias esferas de governo com educação corresponderam, em 1990, a 3,8% do Produto Interno Bruto, superiores aos de países como Coréia (3,6%), Uruguai (3,1%) e Espanha. Como explicar nosso precário nível educacional em relação a esses países? A resposta procede, em grande parte, da maneira como são distribuídos e aplicados os recursos.

De acordo com dados oficiais relativos ao Orçamento da União, em 1996, mais de 70% dos gastos com educação foram destinados ao ensino superior.

Segundo artigo da autoria de Cláudio Castro, João Batista Oliveira e Simon Schwartzman, Presidente do IBGE, publicado em O Globo em dezembro último, estudos recentes demonstram que "os governos federal e estaduais, juntos, gastam mais com o ensino de 600 mil universitários do que o País gasta com 30 milhões de alunos da escola pública básica".

Isso acontece, Sr. Presidente, em que pese a clareza da esquecida norma contida no §3º do citado artigo 212 da Constituição:

      "A distribuição dos recursos públicos assegurará prioridade ao atendimento das necessidades do ensino obrigatório, nos termos do plano nacional de educação."

Bem diferente é o quadro de um país como a Coréia do Sul. Além de manter constante o nível dos investimentos em educação há vários anos, a Coréia tem aplicado os recursos públicos, em níveis semelhantes aos nossos, prioritariamente no ensino fundamental e médio: 88% dos jovens coreanos da correspondente faixa etária estão matriculados no curso secundário, em contraste com o índice brasileiro de apenas 28%. O grande desenvolvimento econômico e tecnológico recentemente obtido por aquele País tem uma relação direta com o nível educacional da população, como diversos outros exemplos têm demonstrado. A escolaridade média de um trabalhador na indústria brasileira é de três anos e meio - na Coréia, a média é de 10 anos.

O ensino universitário, imprescindível para o País, necessita de investimentos muito elevados. É certo que o Governo deve continuar aplicando substanciais recursos no ensino superior, ao mesmo tempo que nas atividades correlatas de pesquisa e extensão. A questão básica é que os gastos proporcionalmente muito elevados com as universidades não têm assegurado o nível de ensino desejável, ao mesmo tempo que retiram recursos importantíssimos para garantir a oferta do ensino fundamental, gratuito e obrigatório para todos, como consta da Constituição, garantia que deve ser progressivamente estendida ao nível médio.

Com o nosso projeto, pretendi abrir e aprofundar as discussões sobre tão grave questão. Procurei as soluções definitivas que, em primeiro lugar, assegurassem ao estudante oriundo de famílias de baixa renda, do nível secundário ou do nível superior, a eqüidade constitucional de tratamento, na sua formação educacional, que ainda não lhe foi garantida em termos práticos.

O Sr. Carlos Patrocínio - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Edison Lobão?

O SR. EDISON LOBÃO - Ouvirei V. Exª, com todo o prazer.

O Sr. Carlos Patrocínio - Eminente Senador Edison Lobão, nunca é demais falar sobre educação em nosso País. V. Exª assegura, com muita propriedade, que esse assunto tem que passar por esta Casa e acaba de apresentar um projeto de alto alcance social, que tem que ser discutido. V. Exª traz à reflexão das pessoas responsáveis deste País essa questão que é muito grave. Existe evidentemente uma disparidade muito grande entre o que se gasta com o ensino superior, o ensino de terceiro grau em nosso País, e o ensino fundamental, o ensino essencial. V. Exª acaba de assegurar isso. Eu também apresentei uma proposta de emenda à Constituição. Levei-a ao Exmº Sr. Ministro da Educação e do Desporto, Paulo Renato, que vem atuando a contento à frente da Pasta, que talvez seja a mais importante do nosso País, porque trata da educação. Procurei mudar a Constituição para inserir um terceiro tipo de escola, além da escola pública, da escola particular: ou seja, a escola de co-gestão ou cooperativa escolar, em que se estabelece a co-gestão administrativa, financeira e pedagógica. O Governo construiria a escola e a equiparia e depois a entregaria aos professores e pais dos alunos, para que eles fizessem a sua manutenção, sob todos os pontos de vista. Já existem escolas desse tipo no País e essas até já receberam as homenagens de órgãos das Nações Unidas. Portanto, essa preocupação com a educação sempre está inserida em nossos discursos. V. Exª, mais uma vez, preocupado que é com essa questão, traz com muita propriedade a sua sugestão para que seja debatida no âmbito do Senado Federal. Tenho a certeza de que, se aproveitadas as diversas idéias que nascem nesta Casa, haveremos de melhorar em muito a educação em nosso País. Portanto, quero me congratular com V. Exª por trazer mais essa contribuição para reflexão dos membros desta Casa, além de tantas outras de grande importância que V. Exª tem para cá trazido. Muito obrigado.

O SR. EDISON LOBÃO - Ao agradecer a intervenção oportuna de V. Exª, devo acrescentar que é mais uma observação que faço no sentido de que não há, nesta Casa, uma única Bancada de Senadores que não tenha preocupação com esse problema, de grande envergadura do País. Ou contribuímos de alguma maneira para resolvê-lo ou vamos ter que enfrentar daqui a pouco dificuldades muito maiores do que aquelas que estamos vivendo neste momento.

Srªs e Srs. Senadores, tenho plena consciência de que, no exercício do mandato que me foi conferido pelo povo maranhense, estou nesta Casa cumprindo as funções para as quais fui eleito, refletindo em cada um dos meus atos as aspirações de interesse público do povo do meu Estado. Como todos os Srs. Senadores, não me deixo impressionar com as reclamações urdidas por grupos de ação anódinos. Do contrário, estaria consentindo que parcelas ativistas pretendessem influir na condução de mandatos por elas não outorgados. Como disse o sempre pranteado Pedro Aleixo, num dos seus memoráveis discursos parlamentares:

      "Iríamos, então, conformar-nos em proceder nesta Casa, não segundo as orientações dos que nos elegeram, mas de acordo com imposições de quem, mobilizando massas anônimas, atribuísse a essas massas a competência de representar o povo, de exprimir a vontade nacional."

Contudo, neste episódio da desistência de projeto que hoje formalizo, sinto que não fui compreendido pelos estudantes maranhenses, nos quais, no seu conjunto, sempre encontrei aplausos e demonstrações de carinho. Por conseguinte, não me resta outra alternativa se não atender, como sempre fiz, às inclinações de uma parcela do povo maranhense que represento no Senado, já que dela não obtive, nem de nenhum outro setor do meu Estado, o apoio que supunha obter para levar adiante essa proposição.

Atendo também, como disse, às ponderações do Presidente e do ex-Presidente da UNE e de outras correntes para que o assunto seja melhor debatido, para que, depois, volte ao exame desta Casa. Devo dizer, porém, que se tornou grave a responsabilidade dos que negaram o imprescindível apoio à iniciativa que tomei, pensando sempre naquele jovem de família de baixa renda que merece, na disputa do mercado, a mesma oportunidade oferecida aos mais afortunados em recursos materiais.

Sr. Presidente, era o que tinha a dizer, agradecendo a atenção que mereci deste Plenário e o apoio de todos os Srs. Senadores.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/06/1997 - Página 11051