Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÕES E CONSTATAÇÕES DE S.EXA. ACERCA DA CISÃO DA AREA NUCLEAR DE FURNAS E CONSEQUENTE INCORPORAÇÃO DO PATRIMONIO CORRESPONDENTE A NUCLEAN. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA PRIVATIZAÇÃO DO SETOR ELETRICO BRASILEIRO.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • PREOCUPAÇÕES E CONSTATAÇÕES DE S.EXA. ACERCA DA CISÃO DA AREA NUCLEAR DE FURNAS E CONSEQUENTE INCORPORAÇÃO DO PATRIMONIO CORRESPONDENTE A NUCLEAN. CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA PRIVATIZAÇÃO DO SETOR ELETRICO BRASILEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 11/06/1997 - Página 11204
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • CRITICA, MODELO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, ADOÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA PUBLICA, RESPONSAVEL, PRODUÇÃO, FORNECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, POPULAÇÃO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • DEFESA, GARANTIA, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PRESERVAÇÃO, PATRIMONIO, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, INVESTIMENTO, CURTO PRAZO, CONCLUSÃO, CONSTRUÇÃO, USINA NUCLEAR, EFICACIA, OPERAÇÃO, USINA, MUNICIPIO, ANGRA DOS REIS (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), EFEITO, CISÃO, FURNAS CENTRAIS ELETRICAS S/A (FURNAS), INCORPORAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, ENERGIA NUCLEAR.

A SRª BENEDITA DA SILVA (BLOCO-PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, em primeiro lugar, gostaria de agradecer ao Senador Ronaldo Cunha Lima por possibilitar que eu ocupe a tribuna nesta tarde.

O Presidente da República editou, no último sábado, decreto autorizando a realização de assembléias dos acionistas de Furnas Centrais Elétricas S.A. e da Nuclen Engenharia S/A, ambas controladas pela Eletrobrás e com sede no Rio de Janeiro, com o intuito de promover a cisão de área nuclear de Furnas e conseqüente incorporação do patrimônio correspondente à Nuclen.

Como representante do Estado do Rio de Janeiro estou acompanhando atentamente o desenrolar dos fatos que levaram a essa decisão governamental, e venho, neste momento, expressar minha opinião em relação a todo esse processo que envolve não só a questão nuclear no Brasil, mas também a política energética, particularmente aquele referente ao setor elétrico.

Tenho ouvido todos os segmentos envolvidos com essas questões, desde os representantes dos trabalhadores do setor elétrico, dos técnicos da área nuclear, especialistas da área acadêmica e autoridades governamentais.

Após uma profunda avaliação, a partir dessas opiniões, dos dados físicos colocados e da política que vem sendo praticada pelo Governo Federal no setor de energia elétrica, cabe-me apontar para esta Casa e para a sociedade brasileira minhas principais preocupações e constatações.

Primeiramente, cabe ressaltar que a reformulação empresarial ora em curso se insere, necessariamente, no contexto mais geral da política energética e, mais particularmente, dentro das mudanças estruturais que o Governo Federal vem promovendo no setor de energia elétrica, que inclui fundamentalmente a privatização de empresas públicas que integram esse setor de vital importância para o Brasil.

Se por um lado não podemos ter a ilusão de que mudanças no setor energético não são necessárias, por outro lado não podemos, absolutamente, concordar que essas mudanças se imponham apenas pela força do atendimento de condições inerentes ao modelo econômico adotado pelo Governo Federal, modelo este contrário, na minha visão, aos interesses da maioria do povo brasileiro.

Se mudanças devem ser realizadas no setor elétrico, que sejam justificadas pela importância desse setor para a sociedade, representada pela absoluta necessidade da energia elétrica como fator de elevação do nível de qualidade de vida do brasileiro e como vetor, insubstituível, voltado para a promoção do crescimento econômico, e não pela pura motivação de geração de receitas para cobrir déficit das contas públicas e alimentar a sede do capital internacional especulativo por ativos valiosos pertencentes à Nação.

Se o Governo Federal quer mesmo promover a verdadeira reformulação do Estado, levando-o a deixar de ser elemento de espoliação política das oligarquias, como ficou demonstrado pelo fato recente dos precatórios, e transformá-lo em agente controlado pelo Congresso Nacional e pela sociedade, voltado para a defesa da cidadania e promoção do bem-estar da população, então os critérios de reformulação do setor elétrico não deveriam ter como ponto básico de partida a privatização.

Neste sentido, como Senadora de um Estado que importa quase 70% da energia elétrica que consome, aponto legitimamente que a garantia do suprimento futuro de energia elétrica para o povo do meu Estado e para todo o centro-sul brasileiro não pode ficar dependente de um setor elétrico privatizado, que se autocontrolaria pelas leis de mercado.

Eu pergunto: que agentes irão garantir os investimentos necessários à expansão da oferta de energia elétrica para a região, que concentra 70 milhões de consumidores? Que agentes e de que forma estes poderão assegurar a redução da dependência energética do Estado do Rio de Janeiro?

Certamente não posso me permitir aguardar passiva que essas perguntas sejam respondidas e que, se respondidas, não venham a satisfazer a gravidade da atual situação, haja vista a seqüência de blecautes e o reconhecimento público por parte de autoridades do setor elétrico quanto à sensibilidade desta situação, que aponta para riscos crescentes de déficit no abastecimento de energia elétrica.

Mesmo lideranças do setor empresarial ligado aos grandes empreendimentos hidroelétricos questionam a capacidade do modelo proposto pelo Governo Federal em dar as respostas necessárias que propiciem os investimentos privados.

No passado, durante o regime militar, as empresas públicas do setor elétrico já funcionaram como bancos voltados para a captação de recursos externos, funcionaram como área de influência de grandes empreiteiras que ainda as utilizam para viabilizar seus interesses e são ainda objeto de clientelismo partidário por parte de maus políticos, que buscam e conseguem colocar apadrinhados nessas empresas.

Certamente essas práticas deletérias, realizadas ao longo de décadas e ainda nos dias de hoje, cooperaram para que essas empresas perdessem seu dinamismo inicial e a capacidade de se adaptarem à nova conjuntura econômica que se apresentou.

Acredito firmemente que, se essas empresas fossem remodeladas, esses vícios históricos fossem firmemente combatidos e a sua gestão se tornasse verdadeiramente transparente, sob o controle social, essas estariam plenamente capazes de cumprir papel relevante na construção do parque gerador necessário para a continuidade do crescimento econômico.

É certo que o Estado brasileiro, em conseqüência de equívocos de três sucessivos governos civis, perdeu sua capacidade de investir e de acumular poupança interna.

Dentro do quadro de demanda por energia e da capacidade do Estado em atendê-la, o setor privado deve ser acionado para participar dos novos investimentos em fontes de geração de energia elétrica. Mas devo advertir que uma saudável participação do setor privado não significa que o Estado esteja desobrigado de cumprir suas atribuições constitucionais de garantir o suprimento de energia elétrica a preços acessíveis para o povo brasileiro.

O Estado não está autorizado a abrir mão de seu papel fiscalizador e regulador dos serviços de eletricidade e mesmo o de financiador da expansão da oferta de energia elétrica. Nem mesmo é aceitável que ao Estado reste somente o papel de subsidiar a iniciativa privada, como sugerem algumas lideranças empresariais do setor, que não aceitam arcar com os riscos ambientais e sociais dos novos empreendimentos e pretendem legá-los ao Estado, ficando somente com a lucratividade dos projetos.

Portanto, quero apontar para esta Casa a absoluta necessidade de avaliarmos com profundidade as transformações previstas e em andamento no setor elétrico brasileiro. Na qualidade de representante das diversas regiões do nosso País, propormos os ajustes que se façam necessários de modo a assegurar o abastecimento de energia elétrica, hoje e no futuro, que não seja a mera privatização de empresas públicas e a transferência de patrimônio já amortizado para a iniciativa privada.

No que tange ao setor nuclear, dedico atenção especial ao segmento por dois motivos: primeiramente, as usinas nucleares localizam-se no Município de Angra dos Reis, governado pelo Partido dos Trabalhadores e localizado no Estado que represento nesta Casa; em segundo lugar, porque tenho defendido que o Brasil utilize a tecnologia nuclear como instrumento estratégico para a sua autonomia energética, científica e tecnológica.

Nesse sentido, coloco sob inteira responsabilidade do Governo Federal, em particular do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que autorizou a mudança empresarial em questão, a efetivação das ações que tornem essa operação viável, sob o ponto de vista da sustentabilidade econômico-financeira desse setor de grande importância estratégica para o País.

Temos a oportunidade agora de demonstrar que uma empresa pública gerenciada com responsabilidade e transparência pode dar resultados para a sociedade. Portanto, independente do julgamento crítico que faço do processo ora em curso, seja garantida a preservação do patrimônio técnico-científico constituído pelos empregados das empresas envolvidas e os investimentos de curto, médio e longo prazos, para a concretização das unidades nucleares e a operação competente e segura da usina de Angra I.

Em conjunto com o nosso Prefeito de Angra dos Reis, José Marcos Castilho, estaremos atentos na fiscalização das atividades nucleares no nosso Estado e exigimos a total transparência das decisões e a observância dos preceitos legais que as regulamentam e resguardam.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/06/1997 - Página 11204