Discurso no Senado Federal

INTERDIÇÃO ETICA DO EXERCICIO PROFISSIONAL DA MEDICINA AO CENTRO DE MEDICINA TROPICAL DE RONDONIA - CEMETRON, IMPOSTA PELO CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO.

Autor
Odacir Soares (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • INTERDIÇÃO ETICA DO EXERCICIO PROFISSIONAL DA MEDICINA AO CENTRO DE MEDICINA TROPICAL DE RONDONIA - CEMETRON, IMPOSTA PELO CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO.
Publicação
Publicação no DSF de 18/06/1997 - Página 11787
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, DECISÃO, CONSELHO REGIONAL, MEDICINA, ESTADO DE RONDONIA (RO), INTERDIÇÃO, UNIDADE DE SAUDE, LEITURA, DOCUMENTO, COMISSÃO, FISCALIZAÇÃO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, HOSPITAL.
  • CRITICA, OMISSÃO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE RONDONIA (RO), NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, LIBERAÇÃO, RECURSOS, RECUPERAÇÃO, HOSPITAL, APURAÇÃO, RESPONSABILIDADE, PUNIÇÃO, DESTRUIÇÃO, UNIDADE DE SAUDE.

         O SR. ODACIR SOARES (PFL-RO. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a interdição ética do exercício profissional da medicina, imposta ao Centro de Medicina Tropical de Rondônia -CEMETRON, pelo Conselho Regional de Medicina do Estado, abalou-me profundamente, assim como, quero crer, há de ter produzido igual impacto em toda a população esclarecida de meu Estado.

         O auto de interdição foi lavrado, após visita de inspeção feita àquela Unidade de Saúde, pela Diretoria do Conselho Regional de Medicina de Rondônia e por sua Comissão de Fiscalização, com a finalidade de averiguar as condições de funcionamento daquela unidade hospitalar, de vital importância, não apenas para o Estado de Rondônia, mas também, para toda a região amazônica.

         No Relatório de visita da referida Comissão, cabe destaque a alguns trechos que descrevem com crueza de detalhes o estado de total abandono em que se encontra o CEMETRON.

         Sob sua estrutura física, é dito, por exemplo que:

         "Localizado à margem esquerda da BR-364 (Porto Velho-Cuiabá) em uma região pantanosa, o prédio está em péssimo estado de conservação apresentando infiltrações severas em todos os ambientes, com instalações elétricas e hidro-sanitárias em precaríssimas condições. Por falta de manutenção são poucas as enfermarias em funcionamento. A maioria virou depósito de sucatas".

         Sobre as condições Sanitárias que cercam a Unidade de Saúde é pintado este quadro estarrecedor:

         "O esgoto antes tratado, hoje é jogado sem qualquer tratamento através de uma bomba em terreno alagadiço, que cerca o hospital e por falta de equipamento adequado para o serviço, estão sendo usadas as mangueiras de incêndio.

         O incinerador de lixo existente está ultrapassado e nunca funcionou. O lixo encontrava-se, no momento da visita, a céu aberto, para alegria dos inúmeros urubus que o devoravam.

         As instalações elétricas estão em pane, há 2 anos, desde que a sub-estação local danificou-se. O grupo gerador também funciona precariamente por falta de manutenção. As instalações elétricas atuais não permitem uso de ar-condicionados. O diretor colocou um guarda próximo à sub-estação para avisar aos transeuntes do perigo de aproximarem-se da mesma.

         Na lavanderia só há uma máquina de lavar em condições precárias de uso que funciona com água fria e não há água sanitária para a desinfecção. A roupa do isolamento também é lavada nestas condições".

         Sobre o Funcionamento do CEMETRON, é dito que ante o quadro caótico averiguado, não se deve esperar pelo "bom funcionamento" da instituição, tanto mais que esta tem seus problemas agravados pela falta de "autonomia administrativo-financeira, dependendo em tudo da SESAU, o que aumenta em muito a burocracia".

         Não menos precárias, são as condições de infra-estrutura e de recursos humanos disponíveis, assim descritos no documento:

         "O número de leitos hoje disponíveis é mínimo, sendo reservado apenas aos casos de extrema gravidade. Faltam medicamentos (67 itens), mesmo os básicos e de primeira necessidade. Há na farmácia apenas os medicamentos da CEME. Faltam gases, esparadrapo, algodão e até seringas. Há quatro meses não são realizadas licitação.

         O laboratório funciona precariamente com constante falta de kitts e só há 01 (um) microscópio.

         Recentemente a SESAU autorizou a contratação emergencial de 18 (dezoito) médicos, ficando o corpo clínico com 23 (vinte três) profissionais, que se as condições permitissem poderiam oferecer um bom serviço à população. O que encontramos, no entanto, foram funcionários desmotivados e com salários atrasados há 6 (seis) meses".

         É óbvio que este quadro configura um conjunto de condições extremamente favoráveis a todo o tipo de contaminações. Os riscos daí decorrentes, foram descritos com bastante antecedência, pelo Diretor da Unidade, em documento no qual reclama, em caráter de urgência, a reforma completa do CEMETRON.

         Como se poderá verificar abaixo, o teor desse documento é mais severo do que é o do Relatório da Comissão Fiscalizadora. É o que se infere desta passagem:

         "Existe infiltrações em toda a parede externa do prédio, em decorrência da não existência de calçada de proteção, sendo grande o acúmulo de águas pluviais na região. Estas infiltrações trazem rachaduras nas paredes internas das enfermarias, vazamentos internos nas enfermarias, de água acumulada na parte externa, queda de azulejos nos banheiros, acúmulo de água nos ralos dos banheiros, acúmulo de água no reservatório da fossa, levando a um retorno desta água para todos os recipientes que drenam para este reservatório, como exemplo, os ralos da cozinha do hospital, sendo que esta água traz resíduos fecais para estes ralos. As torneiras encontram-se na maioria, amarradas, por arames e equipos de sóros. No isolamento, falta água nas torneiras das enfermarias e no posto de enfermagem, impedindo a lavagem das mãos, após a manipulação nos pacientes infectados.

         O piso das enfermarias é tipo paviflex e encontram-se, na maioria, delas todo quebrado impedindo a desinfecção destas enfermarias. A gravidade da situação torna-se evidente, pois nossa clientela é de pacientes potencialmente infectantes como hepatites, meningites, colera....."

         Defrontando-se com um quadro tão deplorável, não é de extranhar que a Comissão Fiscalizadora do Conselho Regional de Medicina tenha chegado à seguinte conclusão:

         "O hospital encontra-se em situação calamitosa, não oferecendo segurança para os pacientes e funcionários que ali trabalham. É o retrato do descaso em relação a saúde no nosso Estado

         O Conselho Regional de Medicina de Rondônia no uso de suas atribuições legais, como órgão fiscalizador do exercício profissional médico e de defesa social e conforme decisão da Plenária de 18/02/97 informa que, no prazo de 30 (trinta) dias a partir do recebimento deste, determinará interdição do exercício da medicina no Hospital CEMETRON, caso não sejam adotadas medidas saneadoras que viabilizem a boa prática da medicina no que tange às condições mínimas para o exercício digno da profissão e sergurança no atendimento ao paciente".

         Concluindo este relato, Sr. Presidente e Srs. Senadores, que tanto compromete a competência administrativa e, até mesmo, a responsabilidade profissional das autoridades sanitárias, às quais está subordinado o CEMETRON, não posso furtar-me a um posicionamento severo, e sem nenhuma complascência, face às realidades deploráveis aqui expostas.

         Preliminarmente, porém, quero cumprimentar os dirigentes do CREMERO, por terem, no exercício corajoso de seus deveres institucionais, aplicado o remédio amargo, porém, necessário que o quadro mórbido do CEMETRON estava a reclamar.

         Felicito-os, inclusive, pelo "puxão-de-orelha" que indiretamente, infligiram a todos aqueles cujo dever funcional impunha a urgência em atalhar, de há muito, todos esses fatores ou todas essas negligências que concorreram para que o CEMETRON chegasse ao nível de deterioração a que chegou.

         Não ignoro, Sr. Presidente, que o governo do Estado, alertado pelas repercussões negativas e pelo mal-estar, provocados pelo vexaminoso ato interditório do CREMERO, contra seus efeitos interpôs recurso no Tribunal de Justiça, sob alegação de incompetência do órgão regional para tomar tal medida.

         Consta-me, ainda, que nessa chicana jurídica, o governo do Estado levou a melhor.

         Não desconheço, todavia, que uma simples liminar não invalida a setença já transitada em julgado, dando o Centro de Medicina Tropical de Rondônia, como desprovido de requisitos e de condições mínimas para que nele se exerça idoneamente a medicina, sem graves riscos para os pacientes nele abrigados, assim como para os profissionais da saúde, que nele atuam.

         A competência do CREMERO para lavrar atos interditórios pode ser posta "sub judice", como de resto o foi, mas é iquestionável a competência de sua Comissão Fiscalizadora para avaliar as condições de funcionamento de um estabelecimento hospitalar.

         Portanto, ao indigitar o Centro de Medicina Tropical de Rondônia como destituído das condições mínimas, aceitáveis de funcionamento, o Conselho Regional de Medicina de Rondônia, lavrou, sem que esse tivesse sido o seu objetivo, uma sentença duramente condenatória, das negligências, da irresponsabilidade e das desídias, acumuladas em sucessivos governos.

         Foram elas que permitiram o progressivo sucateamento de um Centro Hospitalar que já foi o orgulho de Rondônia, graças aos resultados de suas pesquisas sobre doenças tropicais, conduzidas em parceria com instituições de renome, nacionais e internacionais, como, por exemplo, o Instituto Pasteur de Paris.

         A ponderar tudo isso, estou certo de que o governador Waldir Raupp há de adotar duas linhas de ação:

         - Acelerar a liberação dos recursos necessários à plena recuperação do CEMETRON, sem omitir um item sequer, dentre os doze apontados como de primeira urgência, no Relatório do Conselho Regional de Medicina.

         I - Independência administrativo-financeira, a exemplo do João Paulo II e Hospital de Base, para maior agilidade administrativa;

         2. Reforma completa nas instalações físicas;

         3. Tratamento do Esgoto;

         4. Destino adequado do lixo hospitalar;

         5. Construção da sub-estação de energia elétrica e reparo do grupo gerador;

         6. Aquisição emergencial de medicamentos e material penso, e outros indispensáveis ao atendimento dos pacientes;

         7. Regularização do pagamento dos funcinários há 6 meses em atraso;

         8. Reforma da lavanderia;

         9. Aquisição de microscópio e demais materiais necessários ao funcionamento do laboratório;

         10. Reforma com melhoramento para o Setor de Nutrição e Dietética.

         11. Veículos para uso da direção e do Setor de Manutenção do Hospital;

         12. Acesso ao CEMETRON com vias pavimentadas e iluminadas.

         - Apurar as responsabilidades e punir os culpados pelo desmantelamento do CEMETRON.

         Sinto-me a cavaleiro para lembrar ao governador, sem risco de ser mal interpretado, que muitas mazelas que ocorrem na administração pública de países em desenvolvimento, costumam ser relevadas, sob o rótulo de carências próprias do Terceiro Mundo.

         Isso não se aplica ao ocorrido com o CEMETRON de Rondônia.

         A carência de recursos, a insuficiência de equipamentos e outras deficiências materiais e técnicas podem, muito bem, conviver com a responsabilidade, com os cuidados de manutenção do pouco que se tem, com a limpeza e higiene, e, sobretudo, com o respeito à saúde e à dignidade das pessoas.

         O que ocorreu no CEMETRON foi a falência de tudo isso. O que é imperdoável.

         Tudo isso deve, ser apurado, para que seja sanado.

         É o que penso, senhor Presidente

MUITO OBRIGADO


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/06/1997 - Página 11787