Discurso no Senado Federal

ENFATIZANDO ASPECTOS RELEVANTES DO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR ROBERTO FREIRE, QUE SERIA PRONUNCIADO NA TARDE DE ONTEM, A PROPOSITO DO DOCUMENTO ELABORADO PELO CIENTISTA POLITICO BRASILEIRO E PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE HARVARD, ROBERTO MANGABEIRA UNGER, NO ENCERRAMENTO DO ENCONTRO DE REPRESENTANTES DE PARTIDOS DE ESQUERDA E MOVIMENTOS SOCIALISTAS LATINO-AMERICANOS, RECENTEMENTE REALIZADO EM SANTIAGO DO CHILE. REALINHAMENTO NECESSARIO DA ESQUERDA COM A NOVA REALIDADE MUNDIAL.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA.:
  • ENFATIZANDO ASPECTOS RELEVANTES DO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR ROBERTO FREIRE, QUE SERIA PRONUNCIADO NA TARDE DE ONTEM, A PROPOSITO DO DOCUMENTO ELABORADO PELO CIENTISTA POLITICO BRASILEIRO E PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE HARVARD, ROBERTO MANGABEIRA UNGER, NO ENCERRAMENTO DO ENCONTRO DE REPRESENTANTES DE PARTIDOS DE ESQUERDA E MOVIMENTOS SOCIALISTAS LATINO-AMERICANOS, RECENTEMENTE REALIZADO EM SANTIAGO DO CHILE. REALINHAMENTO NECESSARIO DA ESQUERDA COM A NOVA REALIDADE MUNDIAL.
Aparteantes
José Eduardo Dutra, Roberto Freire.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/1997 - Página 12432
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • ANALISE, PROCESSO, AJUSTAMENTO, AMBITO, MUNDO, PARTIDO POLITICO, IDEOLOGIA, SOCIALISMO, LUTA, DEFESA, PROPOSTA, INCENTIVO, RETOMADA, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, SIMULTANEIDADE, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, JUSTIÇA SOCIAL.
  • ANALISE, DOCUMENTO, ESTUDO, AUTORIA, ROBERTO MANGABEIRA UNGER, PROFESSOR, CONTEUDO, DISCURSO, PROFERIMENTO, ENCERRAMENTO, ENCONTRO, REPRESENTANTE, PARTIDO POLITICO, IDENTIFICAÇÃO, SOCIALISMO, REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, CHILE.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, semanas atrás, quando ocupei esta tribuna para uma análise das causas, implicações e possíveis lições da vitória eleitoral do Novo Trabalhismo, de Tony Blair, lembro que o meu pronunciamento terminava com uma exortação à esquerda brasileira em geral para que enfrentasse o desafio do aggiornamento político-ideológico, sob o risco de comprometer sua própria sobrevivência a médio prazo.

Recordo ainda que em minhas críticas às posições conservadoras, ou mesmo imobilistas e reacionárias, assumidas por Partidos e personalidades eminentes dessa importante vertente da opinião nacional, excetuei de modo explícito o Senador Roberto Freire, do Partido Popular Progressista, chegando a mencionar trechos de sua contribuição ao primeiro número da revista Política Comparada, onde ele delineia, com clareza e coragem intelectual, os novos horizontes de um pensamento e de uma ação eficaz para a esquerda no limiar do terceiro milênio.

Folgo em ver que no seu discurso, que seria pronunciado na tarde de ontem, cuja leitura ele me antecipou, S. Exª retoma e aprofunda essa interessante e importantíssima discussão a propósito do documento elaborado pelo cientista político brasileiro e professor da Universidade de Harvard, Roberto Mangabeira Unger, no encerramento do encontro de representantes de Partidos de esquerda e movimentos socialistas latino-americanos, recentemente realizado em Santiago do Chile.

O pronunciamento desse nosso ilustre Par merece ser relido na íntegra e meditado com toda a atenção. Limito-me, portanto, a enfatizar seus aspectos que considerei mais relevantes para a remoção do entulho ideológico que, na bem-humorada definição do filósofo carioca Olavo de Carvalho, vem transformando tantos indivíduos inteligentes em verdadeiros imbecis coletivos e, o que é mais grave, tem franqueado espaço político nacional à hegemonia de interesses conservadores e oligárquicos, sem o contraponto de uma concepção moderna e realista do estado do bem-estar social. Um Estado que não seja nem o mínimo do liberalismo selvagem, nem o máximo da esquerda arcaica, mas o "Estado necessário". Um Estado, enfim, capaz de assumir, a um tempo, as tarefas clássicas, ligadas à distribuição da justiça e à provisão da segurança pública; as tarefas sociais, atinentes à formação e reprodução ampliada de capital humano de boa qualidade e competitividade internacional (educação, saúde, saneamento básico, infra-estrutura social em geral); e as tarefas especiais que preencham o vácuo deixado pelas externalidades negativas do mercado em um país de tantas e tão profundas desigualdades sociais e regionais como o nosso (e aqui me refiro especificamente à reforma das instituições e à melhoria dos recursos humanos e organizacionais, em apoio a uma política de desenvolvimento para as regiões mais atrasadas do País).

O primeiro ponto que desejo salientar diz respeito ao reconhecimento mais do que oportuno da necessidade de a esquerda brasileira retomar o fio histórico de uma estratégia de alianças que a retire do seu atual isolamento político. Isolamento esse que tem sido reafirmado a cada votação das reformas constitucionais no Congresso, quando os Partidos de esquerda jamais conseguem ultrapassar a barreira de 20% a 25% dos votos, a despeito da reconhecida habilidade de alguns de seus quadros na articulação de manobras regimentais protelatórias.

É necessário que saiamos desse gueto e driblemos "o rolo compressor" com a defesa de propostas que, votadas à promoção da retomada do desenvolvimento com justiça social e sustentabilidade ambiental, conseguiriam a adesão de parcelas importantes da opinião parlamentar em praticamente todos os Partidos, pelo seu conteúdo reformador, progressista e humano. Afinal, como ressalta o publicista liberal francês, o consagrado escritor francês, Guy Sorman, em artigo recente de Le Figaro, o embaralhamento das velhas opções ideológicas neste final de século é tamanho que nem todos os adeptos do social-estatismo conservador situam-se à esquerda, e nem todos os partidários progressistas da livre iniciativa alinham-se exclusivamente à direita.

As recentes vitórias trabalhista e socialista na Inglaterra e na França alertam as forças de esquerda em todo o mundo, mas também as instigam a repensar suas teses e sua retórica ultrapassadas. É preciso não tirar lições erradas desses eventos nem alimentar ilusões. Os esquerdistas britânicos e franceses não pretendem rejeitar a disciplina fiscal e monetária imposta por Maastricht, mas exigem a discussão de uma agenda social que impeça o desmonte da rede de proteção social e o crescimento do desemprego. Porque estão conscientes de que o velho modelo estatizante está condenado, não porque assim o querem os liberais, mas porque se exauriu, golpeado internamente por uma grave crise fiscal e externamente pelo inelutável processo de globalização. Seriam suicidas se buscassem um retorno ao passado, na forma de um Estado obeso e ineficiente, vítima daquilo que Carlo Rosselli chamou de "elefantíase burocrática", que o inviabilizou financeiramente, além de torná-lo presa fácil do fisiologismo político, do corporativismo sindical e do cartorialismo empresarial.

Neste final de século e de milênio, a esquerda brasileira, a exemplo de sua congênere européia, precisa renovar o discurso e a plataforma, para um alinhamento com a nova realidade mundial. E somente terá futuro, como alternativa de poder, se tiver a lucidez de compreender que socialismo, hoje, não se confunde mais com estatização da economia, mas com a reconstrução do Estado, ao qual incumbe assegurar e estimular o dinamismo das forças de mercado, impedindo ao mesmo tempo que se transformem num processo perverso de crescente exclusão social.

Como disse o primeiro Ministro Tony Blair, "ser de esquerda, nos dias atuais, significa lutar pela eficiência econômica, mas sem perder o senso de compaixão e de justiça".

O Sr. Roberto Freire - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo o aparte ao nobre Senador Roberto Freire.

O Sr. Roberto Freire - Senador Jefferson Péres, inicialmente, quero dizer da satisfação de que um artigo por nós publicado tenha começado a render frutos. V. Exª, ao fazer referência e iniciar um processo de discussão, está, talvez, nos dando a dimensão de que aquilo que tentamos, publicando na revista Direito Comparado um adjuntivo esquerda velha/esquerda nova, começa a render frutos, porque aquilo era uma das teses que temos como o PPS, desde o antigo Partido Comunista Brasileiro, algo bem polêmico, polêmico até entre nós. E ótimo que seja polêmico para a sociedade. E a segunda satisfação é a de que uma das preocupações que sempre tive, e o nosso Partido também, é a de que o Partido da Social Democracia Brasileira é um Partido do campo de esquerda, do campo democrático e que, portanto, o diálogo com ele deve ser um objetivo de todas as forças de esquerda, mesmo que eventualmente possamos estar na Oposição, possamos ter profundas diferenças, divergências, como parece que hoje ocorre no Brasil. Mas, do ponto de vista estratégico, evidentemente que é nosso aliado. Diria mais, socialdemocracia para o Brasil, novos moldes, novos paradigmas, é um objetivo revolucionário, porque o que temos é muito diferente do que foi conquista da social democracia, do Estado do bem-estar social. Temos Estado do mal-estar social. Portanto, algo de importante pode sair desse debate, desse diálogo e até da polêmica. E eu queria, por isso mesmo, parabenizar V. Exª, porque, como representante socialdemocrata nesta Casa, sempre teve esta preocupação de afirmar posições mais avançadas, de que o PSDB faça jus ao nome que tem, de socialdemocrata, e, portanto, discutir com aqueles que estão no campo também da esquerda, como nós.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Obrigado, Senador Roberto Freire. V. Exª realmente tem sido uma voz dentro da esquerda que tem clamado sempre pela necessidade dessa discussão. Quanto ao meu PSDB, é um Partido heterogêneo, reconheço, e mais ficou nos últimos meses, infelizmente, mas é, em sua origem, um Partido socialdemocrata, de centro-esquerda, e estou lutando muito dentro do Partido, pequeno que sou lá dentro, mas ainda assim dando a minha contribuição, tanto quanto possível, para que não perca essa identidade.

Prossigo, Sr. Presidente, essa agenda de modernização e revitalização da esquerda consiste numa reavaliação sem preconceitos do processo de privatização na ótica do que me referi há pouco como o Estado necessário. Conforme já alertaram muitos, não faz sentido combater o desmantelamento do Estado pela insensibilidade neoliberal, sob a bandeira de um projeto que procure fortalecer esse mesmo Estado em benefício seja do corporativismo de interesses organizados, seja do populismo manipulador das aflições e da ignorância daqueles setores mais desorganizados da população. Corporativismo e populismo são duas versões igualmente degeneradas da proposta esquerdista que devemos descartar de uma vez por todas!

Por último, gostaria de frisar minha convergência com o colega do PPS no que respeita à absoluta prioridade de uma reforma tributária e fiscal para a consecução da agenda de políticas públicas por ele defendida.

Notem as senhoras e os senhores que, nos chamados países desenvolvidos, pós-industriais ou de capitalismo avançado, onde impera amplo e sólido consenso operacional sobre os direitos civis, políticos e socioeconômicos da cidadania, assim como sobre as esferas de ação legítima do Estado, distinguem-se os Partidos ou coalizões no Poder, ao longo da clivagem esquerda/direita, sobretudo por nuances de política fiscal e tributária. Os esquerdistas tendem a ser sensíveis às demandas por mais igualdade social e orientam a máquina arrecadadora no sentido de extrair mais recursos para o sistema público de saúde, a educação e o seguro-desemprego. Já a Direita liberal no Poder procura reafirmar seu compromisso histórico com a liberdade de empreender e, conseqüentemente, privilegia o corte da carga tributária sobre as empresas e medidas desburocratizantes que reduzam os chamados custos de transação.

Seja como for, tanto a esquerda quanto a direita têm a latitude de sua ação governamental clara e severamente cingida por dois parâmetros econômicos inelutáveis: de um lado, a racionalidade dos agentes no mercado, que antecipam medidas restritivas à alocação dos recursos, reduzindo seu nível de atividade, demitindo trabalhadores, buscando aplicações mais atraentes num mercado cada vez mais mundializado e criando barreiras à incorporação da massa de jovens à procura de seu primeiro emprego ou de operários ou empregados deslocados pela revolução científico-tecnológica; de outro, pelo estreito leque de opções de política fiscal quando vigoram apenas cinco ou, no máximo, seis tipos de imposto.

Quando trazemos a atenção de volta para a nossa tragicômica realidade patrimonialista, onde empresários, trabalhadores e cidadãos em geral são avassalados por cerca de 50 impostos e taxas, aí então, logo vemos o enorme "espaço" que o Brasil ainda tem para crescer, desde que o governo seja capaz de unificar uma coalizão suficientemente progressista e sólida em apoio a um choque tributário e fiscal de inéditas proporções na nossa história. Um choque que libere as energias produtivas de nossa sociedade, tire milhões de empreendedores informais da, deixe de punir o reinvestimento dos lucros na ampliação da capacidade produtiva das empresas, mas castigue exemplarmente a evasão e a sonegação.

A esquerda, a meu ver, só terá a ganhar se empunhar corajosamente essa bandeira. A bandeira a que me refiro é a bandeira de, sem esquecer a necessidade de uma austeridade fiscal, cuidar para que a máquina arrecadadora puna severamente e fiscalize a sonegação e a evasão e cuidar para que a receita seja encaminhada, como eu disse, predominantemente para a área social.

A esquerda, a meu ver, só terá a ganhar, se empunha corajosamente essa bandeira, pois seu gesto patenteará definitivamente o imobilismo e a inapetência dos liberais hoje no Poder, para colocar esse guizo no pescoço do gato, contribuindo simultaneamente, para forjar uma ampla base de apoio social a essa fórmula consistente e não-demagógica de promoção da distribuição da renda e do acesso de todos brasileiros ao benefício da cidadania.

O Sr. José Eduardo Dutra - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo-lhe o aparte com prazer, Senador José Eduardo Dutra, V. Exª que hoje é um dos expoentes da esquerda brasileira.

O Sr. José Eduardo Dutra - Senador Jefferson Péres, V. Exª traz um tema que, particularmente, considero muito instigante. É verdade que a esquerda brasileira, particularmente o meu Partido, em algumas situações, tem cometido erros. Eu diria, sem querer estabelecer um grau de responsabilidade pela situação de isolamento que a esquerda está vivendo hoje, sem querer medir quem tem mais ou menos responsabilidade nisso, que há um outro componente que julgo deve ser introduzido, particularmente na parte do pronunciamento de V. Exª que faz referência à situação de isolamento das esquerdas no Congresso Nacional: o Governo. E discordo do pronunciamento, que tive oportunidade de ler, que me parece que o Senador Roberto Freire ainda vai fazer, quando S. Exª estabelece uma comparação entre a situação atual e aquela que havia na época da Constituinte. Por ocasião da Constituinte, estavam em discussão teses, idéias, projetos futuros e, portanto, a ação do Governo de então não tinha a mesma influência que tem a ação do Governo atual no Congresso Nacional. A grande verdade é que, hoje, o chamado Centro está desaparecido; o Centro, hoje, é meramente um chapa-branca, que oscila, em alguns momentos, não em função de teses políticas, mas de maior ou menor atenção que o Governo Federal esteja lhe dando. E isso dificulta significativamente esses alinhamentos que, teoricamente, poderiam ser mais naturais entre, por exemplo, o PT, o PSDB e setores do PMDB do que vem acontecendo atualmente. É verdade que um setor do nosso Partido - nem tanto o PT -, é verdade que o setor sindical, particularmente o do funcionalismo público, tem adotado uma posição reacionária quando diz que "reforma, só a agrária", quando se diz contra a reforma da Previdência, contra a reforma administrativa - como se a Previdência que está aí tivesse sido construída por nós, ou como se ela estivesse voltada para o interesse da maioria da população, como se esse modelo de Estado e de administração tivesse sido construído pela esquerda, coisa que não é. Mas também é verdade que o nosso Partido tem, em todas essas questões, apresentado projetos de reforma que são diferentes dos projetos do Governo. Alguns, como o da reforma da Previdência, projeto originalmente apresentado pelo Deputado Eduardo Jorge e que, depois, foi assumido pelo Partido enquanto instituição, com algumas modificações, chegaram a ser analisados como os melhores, mas não foram nem levados em consideração para o processo de negociação política. E aí é lógico que não temos tido a capacidade, até porque quem pauta a agenda política é o Governo Federal, de passar para a opinião pública que temos esses projetos, que são de reforma também; que não concordamos com esse tipo de Estado, que não concordamos com esse modelo de administração, que não concordamos com esse modelo de Previdência. Mas o debate acaba sendo, como aconteceu na Câmara dos Deputados, quase que de torcida de futebol, em que não interessa muito o mérito do que é votado. O que interessa é derrotar o Governo. Recentemente, o Governo foi derrotado na votação de um item da reforma administrativa - a questão do subteto. Conversei com pelo menos uns 15 Deputados do meu Partido, e todos eles disseram que eram a favor da manutenção do subteto. Mas não sei por que razão a Oposição toda acabou votando contra o subteto - talvez pelo simples objetivo de derrotar o Governo, dentro da lógica da torcida de futebol: interessa fazer o gol, não interessa se ele é roubado, se há impedimento ou não. A verdade é que o Governo, e, particularmente, o PSDB, que deveria ser o Partido capaz de estabelecer negociações com a esquerda, não têm feito negociações. Acaba prevalecendo apenas a lógica do Governo, o interesse imediato do Governo. E como o que prevalece é o interesse do Governo, a discussão mais filosófica, ideológica e programática fica relegada a segundo plano. Este é um assunto que seria interessante que, nas sessões não-deliberativas ou nos momentos em que não há votação, trouxéssemos para debate no Senado Federal. Se, na Câmara, a coisa vem acontecendo em forma de jogo de futebol, talvez pudéssemos aqui, no Senado, modificar um pouco essa lógica. Penso que a reforma da Previdência seria uma ótima oportunidade para modificá-la. Não sei se a base do Governo vai ter interesse em fazê-lo. Muito obrigado.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Senador José Eduardo Dutra, não quero atirar a culpa toda desse distanciamento entre Centro-esquerda e o restante da esquerda apenas nos Partidos mais à esquerda. O Governo tem culpa, o próprio PSDB acredito que tenha. Mas creio, Senador José Eduardo Dutra, que se a esquerda tivesse acenado, logo no início do Governo, quando o Governo apresentou os primeiros projetos de reforma, com uma negociação... E aí acho que ela foi intransigente. Vou dar um exemplo concreto. Quando o Governo pretendeu quebrar o monopólio estatal do petróleo - de forma alguma o monopólio pode ou deve ser uma bandeira de Partido de esquerda -, se os Partidos de esquerda não tivessem rejeitado liminarmente a negociação, se os Partidos não tivessem se mantido intransigentes, não tivessem dito que o monopólio era intocável, se tivessem iniciado uma negociação, já trocando a quebra do monopólio pela manutenção da Petrobrás como empresa estatal e por pontos da futura agência reguladora do setor, por exemplo, teria havido talvez um início de entendimento profícuo. Mas não. Na medida em que os Partidos de esquerda diziam que o monopólio era intocável, não havia negociação nenhuma a ser feita. Quem sabe dali teríamos evoluído até para uma proposta de emenda hoje consensual em torno da Previdência. Eu, por exemplo, acho que o projeto do Deputado Eduardo Jorge é o melhor.

Para finalizar, Sr. Presidente, quero dizer que o Senador Roberto Freire iniciou o seu discurso fazendo uma alusão até poética a um filme de Akira Kurosawa em que ele se refere ao movimento da montanha. Estou, portanto, me referindo a essa imagem do Senador Roberto Freire quando concluo dizendo que, em companhia de tantos expoentes da esquerda brasileira, na minha condição de socialdemocrata, faço votos para que a montanha continue a mover-se célere e decididamente na direção dessas mudanças.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/1997 - Página 12432