Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO DE SUA INICIATIVA, QUE CONVOCA UM CONGRESSO REVISOR A PARTIR DE 1 DE JANEIRO DE 1999.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO DE SUA INICIATIVA, QUE CONVOCA UM CONGRESSO REVISOR A PARTIR DE 1 DE JANEIRO DE 1999.
Aparteantes
Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 03/07/1997 - Página 12940
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • DEFESA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, ESTABELECIMENTO, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, CONDICIONAMENTO, CONVOCAÇÃO, ASSEMBLEIA GERAL, REVISÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REFERENDO, LEGITIMIDADE, APROVAÇÃO, LEGISLATIVO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a imprensa brasileira e os parlamentares já discutem a convocação de um Congresso revisor.

Considero, modéstia à parte, a emenda constitucional que apresentei o projeto mais importante de minha carreira política aqui no Congresso Nacional, resultado de um longo estudo que fiz com técnicos, juristas, políticos e de uma longa análise sobre a situação em que vive o nosso povo e nosso País.

Sr. Presidente, não há como deixar de reconhecer que a situação institucional hoje é complicada em termos da Constituição de 1988. Eu vivi, como tantos brasileiros, a euforia da Constituinte, a convocação da Constituinte. Não participei da Constituinte, mas assisti, várias vezes, como Governador do Rio Grande do Sul, a muitas reuniões e emocionavam-me os debates, as discussões dos mais variados assuntos.

Já se disse, em mais de uma oportunidade, que não houve talvez no mundo uma Constituição que tenha sido elaborada de maneira mais democrática, com mais debate, com mais discussão, com mais consulta à sociedade, ao povo brasileiro, do que a Constituinte de 1988.

Eu me emocionei com a promulgação da nova Constituição, a chamada Constituição Cidadã. Eu era amigo pessoal de Ulysses Guimarães. Vínhamos nós do combate ao movimento de 1964, ao regime militar, e achávamos que com aquela Constituição lavávamos a alma, porque tudo que imaginávamos que se devia fazer em matéria de mudanças, de transformações, tinha sido feito na Constituinte de 1988.

O tempo passou. Hoje, reconheço que foi uma grande Constituição, que é uma grande Constituição. Reconheço que foi um grande avanço e reconheço que aquele foi um dos momentos mais épicos e mais bonitos do Congresso Nacional! No entanto, somos obrigados a reconhecer que cerca de 300 emendas à Constituição estão tramitando no Congresso. Eu mesmo sou autor de mais de 15 delas. Somos obrigados a reconhecer que a própria Constituição de 1988 tem mais de 250 artigos à espera de lei complementar, porque, todas as vezes em que houve confusão na Constituinte, quando se entrava no chamado buraco negro, para o qual não havia acerto, a fórmula de encontrar o entendimento foi colocar uma vírgula e dizer: "..., de acordo com lei complementar". E a quase totalidade dessas leis complementares não foi regulamentada até agora.

Não há como deixar de reconhecer, Sr. Presidente, que o mundo mudou. A realidade lá fora é outra e em nível interno também é outra.

Sabemos que um país não pode crescer sem democracia. Hoje temos democracia! Sabemos que um país não pode crescer sem combater a corrupção. Sabemos que um país não se desenvolve se não olhar para o social! Esse é o grande desafio da Constituição.

Sr. Presidente, pela minha emenda convoca-se uma Assembléia Nacional Revisora mediante um plebiscito, a ser realizado junto com as eleições de outubro do ano que vem. Na cédula, o cidadão vota para Presidente da República, Senador, Governador e Deputado Federal e Estadual. Minha proposta não aumenta os custos em um centavo sequer, nem complica. Apenas acrescenta na cédula a pergunta: "Você concorda que o Congresso Nacional eleito transforme-se em Assembléia Nacional Revisora, pelo prazo de um ano, a partir de 1º de janeiro de 1999?". É só essa pergunta. Se o povo concordar, no dia 1º de janeiro de 1999 teremos a Assembléia Nacional Revisora, com Congresso unicameral, decidindo por maioria.

Depois da minha emenda, Sr. Presidente, que apresentei há cerca de seis meses, apareceram outras que com ela guardam semelhança. Uma delas, por exemplo, pretende que transformemos o Congresso a ser eleito em Congresso Revisor, sem o plebiscito. Isso não existe, Sr. Presidente. Estaríamos dando um golpe. Como poderemos fazer isso? Pelo voto de três quintos do Congresso, podemos emendar a Constituição, mas não podemos, por três quintos, convocar uma Assembléia Nacional Revisora para revisar a Constituição por maioria. Isso não pode acontecer, senão consultando o povo.

Eu não só consulto o povo antes, como consulto depois. Plebiscito e referendo. Referendo, para evitar que aconteça na Assembléia Nacional Revisora o que ocorreu na Assembléia Nacional Constituinte. Na Assembléia Nacional Revisora terá de haver entendimento, e os itens em que não se obtiver entendimento serão decididos no referendo.

Promulgada a revisão, proponho que se faça o referendo. O povo se pronunciará sobre o texto aprovado e sobre os itens debatidos pela Assembléia Nacional Revisora encaminhados para referendo. Darei alguns exemplos para que todos entendam: você é a favor ou contra a pena de morte? Você é a favor ou contra o aborto? Você é a favor ou contra o parlamentarismo?

Então, se houver dúvida na votação, se não houver certeza, se não for aprovado, se houver confusão, não haverá buraco negro, não haverá uma minoria que depois se transformará em maioria ou uma maioria eventual que imporá à Nação determinada situação. O referendo determinará isso.

Sr. Presidente, nós terminaríamos esse trabalho em 1999. Acho muito difícil entrarmos no próximo século de uma maneira mais correta do que esta que estou propondo. Vamos nos reunir. Já disse várias vezes desta tribuna que não vou analisar como fiz. Constato que, nas últimas Constituições, o Brasil sempre teve um problema: não houve paz de espírito, não houve tranqüilidade, não houve serenidade no sentido de se buscar um caminho.

Quando a Arena esteve no Governo do regime militar fez duas Constituições: a de 1967, feita pelo Congresso Nacional, e a de 1969, que é a Emenda Constitucional nº 01 - na verdade, uma nova Constituição, feita na Granja do Riacho Fundo, quando o Presidente Geisel fechou o Congresso. Não havia um contexto de representação popular. A que fizemos, a de 1988, foi uma página fantástica de beleza, de culto à liberdade e à justiça, mas houve equívocos que têm que ser alterados.

Sr. Presidente, se depender da minha proposta, realizaremos uma assembléia nacional revisora convocada por plebiscito e, depois, um referendo com o povo dizendo que aceita. Essa é a grande fórmula e a grande tese. Mas a minha proposta vai além. Estamos vivendo uma situação complexa institucionalmente, que abrange a Lei Maior e a situação política atual. A rigor, está - e sempre foi - muito complicada a situação partidária no Brasil. Nunca vivemos um período áureo, um período bonito de vida partidária, como ocorre, por exemplo, na Argentina, onde há os Radicais e os Peronistas, e no Uruguai, onde há uma longa história entre os Brancos e os Colorados.

No Brasil, a vida partidária sempre foi complicada, ligada a fatos como a Revolução, a Arena, a Contra-Revolução, o MDB; sempre foi ligada a pessoas contra e a favor de Getúlio Vargas, PTB, PSB, UDN. Nunca se reuniu um grupo com conteúdo, ideologia, formação e com perspectiva de chegar ao Poder para executar um conjunto de idéias, que é a razão de um partido político. O partido político é um conjunto de pessoas que se reúnem em torno de uma idéia, de um princípio, de um programa, de uma ideologia e busca o Poder para executar seu programa. Isso no Brasil nunca aconteceu.

Minha proposta vai adiante: realizado o referendo, promulgada a revisão constitucional, dou o prazo de seis meses para que se abra o leque da vida partidária; não se extingue nem se cria partido; durante seis meses o cidadão pode pegar dois partidos e formar um terceiro, criar um quarto, sair de um para outro, pois está aberto o quadro da vida partidária.

Aberto esse quadro, durante todo o tempo da revisão, vamos ficar fazendo a nova Constituição; durante todo o tempo do referendo, vamos ficar fazendo os "finalmentes" da nova Constituição. Com isso, vamos nos conhecendo: vou olhar aquele Senador e aquele Deputado, eles vão me olhar, e vamos ficar sabendo o que cada um pensa realmente.

Ao final disso, depois de ter acompanhado todo o trabalho da elaboração, quando estaremos na próxima legislatura, no primeiro ano, haverá a abertura e cada um vai escolher o seu partido político, que pode ser o atual ou pode ser outro. Findo o prazo de seis meses, vai haver a fidelidade partidária e o mandato passa a pertencer ao partido, que terá um percentual para que possa ter representação no Congresso.

Não podemos mais ter 36 partidos. Teremos uma representação de alguns partidos, que vão começar a ter consistência.

Debato com todas as pessoas sobre essa questão, inclusive já levei essa proposta ao Presidente da República no meio deste ano. No entanto, todas as pessoas com quem tenho conversado acham que é complicado, que o referendo não é fácil, mas é um grande caminho. Repito que tem as conseqüências de um golpe. É o mesmo que os militares fizeram com o AI-1. Na verdade, não houve revolução. Os militares, no dia 31 de março, derrubaram o Sr. Jango, e aqui nesta Casa o Presidente do Congresso, o Sr. Auro de Moura Andrade, disse: "Declaro vaga a Presidência da República". O Sr. João Goulart estava em Porto Alegre. Estávamos na casa do Comandante do III Exército quando o Presidente do Congresso declarou vaga a Presidência. Assumiu o Presidente da Câmara dos Deputados, que, dez dias depois, fez uma revolução no papel, baixando o Ato Institucional nº 1.

Os três militares nomeados pelo Presidente da Câmara no exercício da Presidência, Sr. José Maria Alkmim, para Ministros da Marinha, do Exército e da Guerra e da Aeronáutica, baixaram um ato institucional que não tinha nem número e passou a ser o número 1. Depois, veio o de número 2, o de número 3, 4 e 5. E fizeram tudo o que sabemos.

Mas não abriram, não democratizaram, não cuidaram do futuro do País porque não quiseram. A proposta que faço agora é a seguinte: sem violência, sem armas, sem o Exército, sem a revolução, como em 30, ouvido o povo, democraticamente, construirmos uma nova realidade institucional e sócio-política para nosso País.

O Sr. Ramez Tebet - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Pedro Simon?

O SR. PEDRO SIMON - Pois não, nobre Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet - Senador Pedro Simon, pedi a interferência em seu pronunciamento porque considero o assunto um desafio para todos nós. Veja V. Exª, todos aplaudimos a Constituição cidadã de 1988, mas nunca vi nenhuma constituição com tantas emendas a desafiar a capacidade do Congresso Nacional. Temos reforma tributária em andamento mexendo em dispositivos constitucionais; reforma previdenciária; reforma administrativa; reforma política; legislação eleitoral; já alteramos os capítulos Da Ordem Econômica, Da Ordem Social e outros da Constituição da República. Então, precisamos realmente ordenar, dar um tratamento sistêmico. E sem dúvida nenhuma, V. Exª, homem preocupado com a institucionalização, coloca para discussão e debate, no Senado e no Congresso Nacional, formas que entende serem as mais democráticas, as mais legítimas ou as melhores se fazer um ordenamento constitucional. Ainda ontem, o Presidente da República declarava: "Agora cabe ao Congresso", e o Presidente do Senado dizia o seguinte: "Não, o Senado está trabalhando, sim." E realmente estamos. Está em andamento no Congresso Nacional praticamente uma nova Constituição; portanto, não se pode culpar o Congresso Nacional. Sei que V. Exª não faz isso, propõe apenas um Congresso Revisor e com uma fórmula engenhosa. V. Exª quer o plebiscito, que é uma consulta anterior à população, e depois o referendo sobre aquilo que por acaso foi votado. Quero cumprimentar V. Exª, porque é preciso realmente agitar esse problema, no sentido de discutir em profundidade qual é a melhor saída. Porque a quantidade de reformas e de emendas constitucionais em andamento, demonstram que a Constituição vai ficar inteiramente retalhada na hora em que essas emendas forem aprovadas. E ninguém acha que elas serão aprovadas com a rapidez que setores da sociedade estão a nos cobrar.

O SR. PEDRO SIMON - Agradeço muito a V. Exª, por ser quem é, pela sua capacidade, pela sua competência. Fico feliz em ver que V. Exª interpretou e entende bem o significado do projeto.

É claro que vamos discutir. É claro que não me passa pela cabeça imaginar que o que estou apresentando é pronto e melhor acabado. Pode ter muitas modificações e muitas alterações, mas é um projeto pronto e acabado.

Por exemplo, há pessoas que dizem para mim o seguinte: Senador, o senhor cometeu um erro. O senhor deveria falar só no plebiscito. E o problema do referendo pode ficar para depois. Convocada e instalada a Assembléia Nacional Revisora, ela poderá decidir sobre o referendo. É uma tese.

Instalada a Assembléia Nacional Revisora, ela é quem dirá se os partidos vão abrir ou não, o que vai acontecer. É outra tese.

Mas coloquei tudo junto - não sei se o Senador notou - para mostrar a filosofia do conjunto do meu projeto. Ele é um todo. Ele poderá ser votado por partes. Poderemos votar agora que convocaremos uma Assembléia Nacional Revisora junto com as eleições, para fazer a revisão. E quem vai discutir, porque na verdade o que vai-se discutir é isso mesmo, por que votar agora e o referendo depois, a Assembléia Nacional Revisora instalada terá condições de discutir quando e como será o referendo.

Fiz questão de colocar minha proposta integralmente: 1) a Assembléia Nacional Revisora; 2) um ano para fazer a revisão, que será unicameral e por maioria absoluta; 3) referendo, onde as questões que não forem motivo de convicção irão para o referendo popular. Quer dizer, as teses são polêmicas? São. Quero ouvir o povo? Vamos ouvir o povo.

Como quarto ponto há a vida partidária. Se fizermos isso, se de repente tivermos partidos organizados em torno de idéias, se Deus e o povo brasileiro me derem o privilégio de voltar como Senador desta Casa para participar do debate, para elaborar uma nova Constituição, discutir, vivenciar essa nova Constituição, verei pessoas com quem me afino, aprenderei, muitas vezes, que coisas que penso estarem certas podem estar erradas. A recíproca é verdadeira. Do conjunto, do debate é que nasce a verdade.

Há pessoas que pensam diferente, Sr. Presidente, há pessoas que dizem que minha proposta peca por consultar demais o povo. É muita confuso, dá muito trabalho fazer um plebiscito, depois fazer um referendo, há pessoas que pensam ser perda de tempo. Aliás, na História do Brasil consulta popular é eleição. Os partidos políticos, até alguns anos atrás, não tinham sequer vida partidária, reuniam-se para escolher o presidente da executiva e também para escolher os candidatos a prefeito, governador e presidente, porque fora disso não tinham mais nada a fazer.

Mas creio que esse debate, esse aperfeiçoamento no campo das idéias é importante, e é absolutamente necessário neste País. Alguma coisa me diz que essa é uma eleição que não terá tantos candidatos como das outras vezes, porque as coisas já estão mais ou menos definidas. Como já tem uma reeleição, já tem um candidato pronto, é uma candidatura que já existe independente de estar trabalhando ou não, estar fazendo campanha ou não, isso não importa, o que importa é que está na Presidência da República e é candidato à reeleição. Isso determinará com que o outro lado tenha que se definir e haverá de se definir. Dentro desse aspecto, nos prepararmos já para debater as grandes teses e as grandes propostas de fazer realmente a grande revisão é fundamental.

Ouvi a declaração do Presidente da República na Confederação das Indústrias e, também, o pronunciamento da Confederação das Indústrias, inclusive dos empresários. Só não sei se misturar a reforma da Constituição, principalmente reforma tributária, com o período que vai-se transformando ao natural num período eleitoral. Pergunto-me: a que isso pode conduzir?

Também concordo, Sr. Presidente, que neste Congresso Nacional o Executivo tem conseguido o que quer. Todas as votações importantes, nas quais o Executivo se joga de corpo e alma, ele tem ganho. Mas aquelas votações em que há indefinições, onde as questões são difíceis - como, por exemplo, esta em que, ao invés de se fazer uma reforma tributária, quer-se prorrogar a vigência de um imposto que abrange 20% dos Estados e municípios -, são mais confusas. Na verdade, há um enorme movimento por parte dos prefeitos e governadores no sentido de que seja equacionada essa questão. Isso foi feito de forma emergencial, para durar somente daquele período de final do Governo Itamar Franco até a entrada do novo Governo. Já deveríamos ter feito essa revisão tributária no final do Governo Itamar ou, pelo menos, no primeiro ano do Governo Fernando Henrique. Já estamos no segundo semestre do terceiro ano e já aprovamos o projeto da reeleição.

Sr. Presidente, sou favorável a essa questão. Não tenho dúvidas em debater a reforma administrativa, a reforma da Previdência e a reforma tributária. É importante que se diga aos empresários, de modo especial, que o meu projeto não retira do atual Congresso o poder de continuar votando as reformas que estão sendo analisadas e as aprovando com três quintos dos votos dos Parlamentares, como acontece hoje. Não quero alterar isso.

É importante esclarecer que não pretendo paralisar esse processo de votação. No meu projeto, não é dito que não se fará mais nenhuma votação, mesmo porque eu não poderia fazê-lo. A Constituição é muito clara; essa é uma norma permanente da Constituição. Em qualquer tempo, a Constituição brasileira pode ser reformada com os votos favoráveis de pelo menos três quintos dos Deputados Federais, em duas votações, e de pelo menos três quintos dos Senadores, também em duas votações. Isso vai continuar. O fato de aprovarmos o plebiscito e criarmos uma Assembléia Nacional Revisora no ano de 1999 não retirará do Congresso o poder de emendar e de aprovar as emendas que estão aí ou outras tantas quantas forem apresentadas e tiverem, repito, em duas votações, três quintos da Câmara, e em duas votações, três quintos do Senado.

Mas não tenho nenhuma dúvida, Sr. Presidente, de que, lá pelas tantas, pela maneira como está essa matéria, ela, cedo se transforme em remendo, como foi agora a questão da reeleição, que foi votada - e tinha que ser, porque queriam que se votasse. Mas a questão de como é que não são as desvinculações, se o Presidente, o governador e o prefeito tem ou não que se afastar, como é que vai ser feita a campanha, em que ela consiste ou em que ela não consiste, isso tudo ainda estamos debatendo, porque foi feito às pressas.

Na Assembléia Nacional Revisora, essas questões serão feitas com serenidade, porque será logo após a eleição de um Presidente que se começará a fazer esse trabalho, ou seja, com um Presidente e um Congresso fortes, porque vieram das urnas.

Alguém se assusta, Sr. Presidente, comparando o trabalho da Assembléia Nacional Revisora, que estou propondo, pensando no que foi a Assembléia Nacional Constituinte.

Ora, Sr. Presidente, dou mil pontos a favor da beleza do que foi feito na Assembléia Nacional Constituinte, mas há um ponto errado pelo qual pagamos muito caro. Na Assembléia Nacional Constituinte, quando o Dr. Tancredo Neves eleito Presidente da República, antes de assumir, pensando em convocar uma Constituinte, designou uma comissão, denominada Comissão dos Notáveis, e lhe solicitou que elaborasse um texto. E esse texto, o Presidente Tancredo Neves, se tivesse tomado posse, pretendia enviar ao Congresso Nacional, para que servisse de orientação; um texto básico sobre o qual seria feita a reforma.

A Assembléia Nacional Constituinte não aceitou aquele, que - diga-se de passagem -, na minha opinião, era um belo texto. A Assembléia Nacional Constituinte não partiu do texto básico feito pelos notáveis. A Assembléia Nacional Constituinte poderia ainda, como não quisesse aceitar o texto básico, ter partido da Constituição de 1946, que era muito boa; poderia ter partido da Constituição de 1967, que, embora feita por um Congresso que tinha sobre a cabeça um Ato Institucional, era uma Constituição democrática.

Não. A Constituinte de 1988 houve por bem partir do zero. Fez a divisão: a Comissão de Sistematização, as Comissões Temáticas e as Subcomissões Temáticas.

E lá, nas Subcomissões Temáticas, lá no início, sete ou oito Deputados e três Senadores se reuniam e, sob uma Presidência, debatiam um tema da Constituição - como, por exemplo, menores ou normas tributárias - a partir do zero, Sr. Presidente.

O Relator apresentava uma proposta, e todos se viam na obrigação de apresentar uma proposta: "ora, se sou membro de uma Subcomissão, como posso apoiar a proposta do Senador Fulano e não apresentar a minha?"

Cada um se via na obrigação de apresentar a sua proposta, da qual ele passava a ser dono. Foi um trabalho inexpugnável. Só mesmo a competência e a garra do Dr. Ulysses para fazer a Assembléia Nacional Constituinte chegar ao fim e promulgar a Constituição. Por pouco, não saía!

Se a Constituinte de 1988 tivesse sido feita como deveria, os Constituintes teriam sido chamados a apresentar emendas a um texto já pronto. Lá estaria o texto sobre lei tributária, reforma agrária, seja o que for. Lá estaria o texto. Ninguém se sentiria obrigado a apresentar emendas. Quem quisesse, poderia fazê-lo. Outros poderiam escolher manter aquele texto. Não haveria autoria, não haveria mais aquele sentimento: ou faço ou sou irresponsável. Não! Poderia cada um escolher não fazê-lo por julgar bom o texto original.

Isso vai acontecer na Assembléia Nacional Revisora. Se o projeto for aprovado, o número de emendas vai ser infinitamente inferior, porque poderemos optar por manter o texto existente ou por apresentar propostas de emendas para modificá-lo. Portanto, não serão milhares e milhares de emendas como ocorreu na Assembléia Nacional Constituinte. Serão centenas de emendas a serem apresentadas na Assembléia Nacional Revisora.

Chamo a atenção para esse detalhe tremendamente importante.

Lembro-me de que muitas pessoas, durante a Assembléia Nacional Constituinte, fizeram um esforço enorme para evitar que partissem do zero, mas que, ao contrário, apresentassem emendas a um texto inicial.

Partiram do zero. Não aceitaram o texto dos notáveis, colocaram-no no arquivo. Não aceitaram trazer a Constituição de 1946; não aceitaram partir da Constituição de 1967. E deu toda essa confusão.

Repito, Sr. Presidente: junto com as eleições para Presidente, Governador e Parlamentares, deve ser realizada uma simples consulta para verificar se o povo é favorável a que o Congresso eleito se transforme em Assembléia Nacional Revisora. Se o resultado for contrário, morre o projeto. Se o povo não quiser, não se fala mais no assunto. Se o resultado for favorável, no dia primeiro de janeiro, junto com o Senado e com a Câmara, instala-se a também a Assembléia Nacional Revisora, para vigorar pelo prazo - proponho - de um ano. 

O Senador Francelino apresentou uma emenda depois da minha sugerindo o prazo de dois anos. É uma questão a ser decidida. Nós vamos decidir se deve valer por seis meses, um ano ou dois anos. Só não pode ser como uma emenda que há na Câmara dos Deputados: nós, Congresso Nacional, criarmos a Assembléia Nacional Revisora sem ouvir o povo pelo plebiscito. Isso é um absurdo. Isso é irreal. Isso não existe. Isso não tem nenhuma sustentabilidade. Cairia no mandato de segurança. 

Têm razão os juristas e os que são contra a idéia quando dizem o mesmo que diz o Presidente da Câmara dos Deputados, que é um ilustre jurista: "vamos fazer uma revisão que a qualquer momento qualquer item está sujeito a cair no Supremo Tribunal Federal".

E eu acho que cai.

Mas se for realizado o plebiscito, instalada a Assembléia e, depois de passado algum tempo, for feito o referendo e publicada a decisão, duvido que haja Supremo que diga que não é legítimo. Eu duvido!

Poderá haver texto mais legítimo do que aquele feito por quem tenha ido buscar o seu mandato em urnas que lhe deram também o poder de Congresso Revisor? Não satisfeito com isso, depois de feita a revisão, volta-se a consultar o povo.

Duvido que o Presidente da Câmara, o ilustre jurista Michel Tamer, haverá de dizer que o texto como o estamos apresentando tenha as nuances que o preocupam - e o preocupam corretamente - na peça que tramita na Câmara dos Deputados. Essa peça - repito - pura e simplesmente é uma emenda constitucional que votaremos dando ao futuro Congresso poderes de, por maioria unicameral, realizar a revisão em 1999. É claro que o Supremo Tribunal Federal vai dizer que não pode. É evidente que não pode! É algo que não tem sustentabilidade. Daí por que concordo com as interrogações e as dúvidas do ilustre Presidente da Câmara dos Deputados.

Mas, realizando o plebiscito, a revisão e o referendo, não há por que duvidar que a proposta será recebida com simpatia pelo Supremo Tribunal Federal.

Depois de publicada, deve-se, então, iniciar a revisão da vida partidária, para as pessoas se agruparem, não pelo cheiro, não pelo interesse, não pela história, não pelo sei lá eu o que, mas para as pessoas se agruparem porque se identificam em algumas idéias, em alguns princípios, porque a sua concepção de organização da sociedade, do nosso povo, da nossa gente, da nossa terra, isso os identificará para estarem juntos em um mesmo agrupamento, defendendo as mesmas idéias.

Olha, Sr. Presidente, eu me apaixonei por essa proposta. Tenho procurado muitas pessoas, e não apenas aqui no Congresso: professores de direito constitucional de universidades, pessoas ligadas a entidades como OAB, intelectuais. Eles acham que é um caminho importante. Seria uma bela maneira de encerrarmos o século e entrarmos no terceiro milênio: em um país que tenha uma organização jurídica estável, que tenha partidos políticos consolidados, partidos que nos dêem as condições e os instrumentos para poder fazer aquilo que todos nós queremos.

Muitas vezes não basta a vontade, não basta querer. É a fórmula, é a burocracia, é - eu diria - o anárquico organismo em que a gente vai se metendo, em que a gente, como que numa teia de aranha, vai entrando e não consegue se ver livre.

Isso faz com que, muitas vezes, querendo, querendo, desejando, a gente não consiga sair do atoleiro em que se encontra

Essa é a proposta, Sr. Presidente, que, com o maior respeito, pedirei ao Senador Bernardo Cabral comece a circular na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, porque considero importante uma definição deste Plenário.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/07/1997 - Página 12940