Discurso no Senado Federal

PROPOSITO DAS CLASSES ECONOMICAS DOMINANTES, EM EXPOR A EXECRAÇÃO PUBLICA O CONGRESSO NACIONAL. INVERDADE NA ATRIBUIÇÃO DAS REFORMAS DA PREVIDENCIA E ADMINISTRATIVA COMO FATORES PRIMORDIAIS PARA O DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL DO PAIS.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • PROPOSITO DAS CLASSES ECONOMICAS DOMINANTES, EM EXPOR A EXECRAÇÃO PUBLICA O CONGRESSO NACIONAL. INVERDADE NA ATRIBUIÇÃO DAS REFORMAS DA PREVIDENCIA E ADMINISTRATIVA COMO FATORES PRIMORDIAIS PARA O DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL DO PAIS.
Aparteantes
Ademir Andrade, Humberto Lucena.
Publicação
Publicação no DSF de 04/07/1997 - Página 13009
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • DENUNCIA, CAMPANHA, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, EMPRESARIO, PARTICIPAÇÃO, SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS (SEBRAE), PREJUIZO, REPUTAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OPINIÃO PUBLICA, ACUSAÇÃO, OMISSÃO, REFORMA CONSTITUCIONAL.
  • CRITICA, INEXATIDÃO, DECLARAÇÃO, EMPRESARIO, PREVISÃO, CRIAÇÃO, EMPREGO, MOTIVO, REFORMA CONSTITUCIONAL.
  • REGISTRO, CONTRADIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VINCULAÇÃO, REFORMA CONSTITUCIONAL, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores:

O Congresso Nacional tem errado, há de errar em outras oportunidades, como erram todas as instituições, como erram todos os parlamentos do mundo. Funcionando como órgão de composição heterogênea e a portas sempre abertas, o Congresso Nacional é, por isto mesmo, mais exposto às críticas. Todas as críticas que visem a corrigir nossos erros são benéficas. O Parlamento, por ser o órgão próprio da democracia, delibera divergindo. Nós nos criticamos uns aos outros e, por isto mesmo, respeitamos o direito de crítica. Mas o direito de crítica não se confunde com o propósito de expor a instituição política à execração pública. É, precisamente, neste momento, o que vêm tentando fazer com o Congresso Nacional as classes economicamente dominantes. Instituições econômicas e empresários - não são todos, ressalvo - vêm desenvolvendo, de alguns dias até este momento, uma campanha de enfraquecimento do Congresso Nacional na opinião pública, digo melhor, uma campanha de descaracterização do órgão político. A crítica seria aceitável, a colaboração para que possamos melhor trabalhar seria respeitável. Não é respeitável, porém, isto exposto nos jornais. Toda uma página: "reformas já, quer dizer, emprego já, saúde já, educação já". Primeiro por ser uma inverdade, não estão eles preocupados nem com a educação, nem com a saúde e nem com o emprego. Estão preocupados em conquistar melhores condições para o desenvolvimento de suas atividades, tanto que não vêm ao Congresso, como vieram em outras oportunidades, dialogar, discutir, permutar idéias. Foram para a imprensa, e não foram apenas com essa página em que, por sinal, aparece, e nenhum de nós sabe o porquê, como signatário dela também, o Sebrae. O poder público deve tomar conhecimento dessa particularidade. Mas singular é que o Jornal do Brasil publicou, e não houve contestação alguma até este momento, que esta campanha, somente no Rio de Janeiro, se desdobraria em distribuição de milhares de panfletos e de outros tipos de propaganda, inclusive filmes, e que tudo isso custaria nada menos que R$900 mil.

Não se trata, portanto, de uma colaboração com o Poder Legislativo para que determinadas medidas sejam examinadas em menor tempo e sob ângulos diferentes. Trata-se de uma campanha, que começou em São Paulo, desdobrou-se em Brasília, em dois comícios fechados. Não vieram ao plenário desta Casa, nem ao plenário de nenhuma das comissões para discutir o problema da Previdência ou da reforma administrativa. Este é que seria o ambiente próprio para fazê-lo. Aqui é que se apreciam as medidas constitucionais, que estão sendo objeto de discussão.

Mas não podemos aceitar que transite como verdade declarações dessa natureza do Sr. Eduardo Eugênio Gouveia Vieira: "Diremos que se as reformas passarem o Brasil vai ganhar um milhão e oitocentos mil empregos por ano. Se considerarmos as pessoas que dependem desses trabalhadores, a conta sobe para nove milhões. Os que pretendem deixar as votações para depois, provocando um atraso de três anos, devem lembrar que milhões de pessoas serão prejudicadas com a sua decisão".

Esse empresário sabe que isso não é verdade. As medidas que poderiam concorrer para o aumento da atividade econômica e, conseqüentemente, para maior aproveitamento de mão-de-obra já foram votadas por esta Casa. Todas as reformas constitucionais de efeitos econômicos foram aprovadas há mais de dois anos. Foram aprovadas as reformas que modificaram a Constituição para reduzir as vantagens das empresas privadas nacionais e favorecer as empresas estrangeiras. Foram aprovadas as modificações tendentes a ampliar a iniciativa privada, reduzindo o poder do Estado com o estrangulamento dos monopólios.

Mas, por que daí não resultou o aumento de emprego? Ao contrário, tem-se verificado a todo dia na Imprensa que aumenta o desemprego. De quem é a responsabilidade pelo aumento do desemprego? É do Congresso, que votou as medidas capazes de ampliar o desenvolvimento econômico, inclusive a iniciativa econômica privada?

Assumam eles a sua responsabilidade, como temos assumido a nossa de votar o que nos parece adequado. Às vezes foram votadas concessões excessivas ao Poder Executivo, mas assumindo o Congresso a responsabilidade da decisão. Assumam eles a sua responsabilidade, mas não venham agora à opinião pública dizer que o desenvolvimento econômico está dependendo da reforma administrativa e da reforma da Previdência. Todo mundo sabe - não é preciso ser grande empresário ou economista - que essas duas reformas têm uma repercussão limitada na ordem econômica e financeira.

Mas não basta que eu diga, um Senador que não é economista. Quem diz que essa afirmação é inexata é um professor de Economia e Administração, ex-Ministro de Estado, o Sr. João Sayad, em artigo publicado no dia 30 de junho de 1997. E, precisamente rebatendo a essas insinuações falsas, é esse professor e ex-Ministro que declara:

      "Os economistas brasileiros são os únicos economistas do mundo que afirmam que a reforma da Previdência aumenta a poupança. Desde 1974, o Professor Martins Feldstein, da Universidade de Harvard, afirma o contrário e os alunos da FIPE são obrigados a ler esse trabalho".

Os alunos da Fipe, a que se refere o autor do artigo, são os que fizeram o documento para o poder econômico privado. Por isso também causa surpresa que o eminente Presidente da República, presente aqui à reunião dos empresários, tenha dado cobertura a essas críticas, afirmando: "Ou fazemos as reformas agora, ou não teremos mais recursos para avançar nas melhoras que conquistamos nos últimos dois anos".

Com o devido respeito ao Chefe da Nação, não é essa sua convicção, não é essa a verdade que Sua Excelência tem sustentado. Ao contrário, aqui está a entrevista do Presidente da República à revista Veja, do dia 9 de abril de 1997. Nela está expressamente dito isto:

      "Desde o começo" - refere-se ao começo do seu Governo - "me bati com a equipe econômica para não dar tanta ênfase à necessidade das reformas constitucionais. Elas são importantes, mas dizer que o Real depende das reformas é mentira. As reformas não representam solução a curto prazo. O Real não depende delas. As reformas são importantes do ponto de vista da organização do Estado ao longo do tempo".

Conseqüentemente, Srs. Senadores, não é verdade que as reformas que dependem de nossa decisão estejam colaborando para estrangular o desenvolvimento econômico, para reduzir a atividade econômica, para prejudicar, enfim, o progresso social e econômico.

O Sr. Humberto Lucena - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Josaphat Marinho?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Pois não, nobre Senador Humberto Lucena.

O Sr. Humberto Lucena - Congratulo-me com V. Exª pelo seu pronunciamento oportuno e sempre brilhante - por isso mesmo o silêncio do Plenário para ouvi-lo bem - porque, na verdade, V. Exª lavra um protesto que não é apenas seu. Desejo também subscrevê-lo e acredito que muitos desta Casa, porque não há como admitirmos críticas de tal natureza ao Poder Legislativo. V. Exª já deixou claro que o Congresso tem dado ao Senhor Presidente da República um grande apoio parlamentar muito grande, sobretudo no que tange à realização das reformas econômicas, que estão praticamente implementadas, dependendo apenas da aprovação de algumas leis regulamentadoras, como é o caso, já em última instância, do projeto de lei que regulamenta as telecomunicações e do projeto de lei que regulamenta a questão da Petrobrás. No mais, tudo já foi feito. E com o apoio do Congresso. Evidentemente, com o apoio crítico, porque não podemos deixar de reconhecer que não há apoio incondicional. E V. Exª diz bem: o desemprego que aí está não é produto da demora em terminar as reformas constitucionais. O desemprego é mundial. Sabe V. Exª inclusive a participação que tem nisso a chamada automação do setor industrial. A cada dia que passa, a máquina vai substituindo mais o homem, tanto assim que ainda há poucos dias lembrava aqui, em um discurso que fiz, a palavra do mestre Celso Furtado, alertando que a coisa chegou a tal ponto no Brasil que estava na hora de o homem voltar ao campo. Adiantava-me ele até que o Movimento dos Sem-Terra era um pouco fruto do desemprego na zona urbana, porque sabe V. Exª que a indústria hoje pouco dá margem à absorção de mão-de-obra. Tanto que o Governo já se volta para outras iniciativas, como a do estímulo à pequena e à microempresa por intermédio de estímulos fiscais. Mas quero é exaltar a oportunidade do discurso de V. Exª na defesa da autonomia do Poder Legislativo e dizer a V. Exª que estamos atentos às suas palavras e as subscrevemos. Esperamos que os Srs. Senadores, de um modo geral, as acolham como estímulo, como incentivo às nossas atividades. Faço justiça aliás ao Presidente Antonio Carlos Magalhães, que, nesse ponto, tem-se pronunciado sempre oportunamente para rebater essas interferências indébitas no Poder Legislativo. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Agradeço as expressões de seu aparte e os comentários que acresceu ao que venho sustentando.

Em verdade, das emendas que estão no Congresso, duas têm sido largamente discutidas.

O Congresso não as desprezou, não revelou desinteresse nem pela reforma da previdência, nem pela reforma administrativa. Ninguém está defendendo interesse corporativo. E se de interesse corporativo se fosse falar, não há maior do que o que está agora se estendendo por todo o País em nome do poder econômico privado.

O que se tem discutido na reforma da previdência, como na reforma administrativa, é a preservação dos direitos de determinadas categorias economicamente fracas: funcionários, trabalhadores assalariados, aposentados.

As emendas não têm permanecido paralisadas na gaveta de nenhum parlamentar. O que se vem verificando é que as divergências entre o Congresso e o Governo não têm permitido a solução em menor prazo.

As ponderações feitas na Câmara e no Senado em defesa da igualdade de direitos de funcionários em atividade e funcionários aposentados, o resguardo dos direitos adquiridos, a preservação dos fundos de pensão são particularidades que se discutem. O que tem faltado, portanto, é a oportunidade do encontro de pensamento entre o Governo e o Congresso para a solução adequada.

Não se trata de obstar o curso das emendas, mas de discuti-las, como é dever do Congresso, sustentando seus pontos de vista e resistindo o quanto puder, ao que lhe parece desacerto. É um direito e um dever resistir contra providências, que, por exemplo, atropelam direitos adquiridos.

Não somos responsáveis pelos direitos conquistados por funcionários aposentados e trabalhadores. Esses direitos decorrem, ao longo do tempo, de toda a legislação que vigeu no País e tem vigorado. O que estamos fazendo, portanto, é preservar a ordem jurídica para que não se diga amanhã que o Congresso Nacional esqueceu a situação dos mais fracos para beneficiar os poderosos.

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª me concede um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Concedo o aparte a V. Exª

O Sr. Ademir Andrade - Senador Josaphat Marinho, V. Exª é um homem brilhante. Espero um dia vê-lo de volta às suas origens no Partido Socialista Brasileiro. V. Exª é um homem que mantém uma coerência inigualável. A cada dia que vejo V. Exª falar e votar nas comissões às quais pertence, eu o admiro mais e entendo que V. Exª já passou da hora de voltar às suas origens. V. Exª tem toda razão: o Governo, às vezes, usa de inverdades para tentar convencer a opinião pública, da mesma forma como fez na propaganda para vender a Vale do Rio Doce, da mesma forma que diz usar a privatização para servir à educação, à segurança pública e à saúde, o que não é verdade. Nada está sendo mais privatizado neste País do que a própria saúde. O Governo usa muito esse tipo de "enganação", não fala a verdade. Disse para o Brasil inteiro que a Vale do Rio Doce descobriu uma mina de ouro em Serra Leste, quando, na verdade, era o ouro de Serra Pelada que havia sido dimensionado. O Governo acredita que falando pela televisão pode sempre enganar o povo. Lamentavelmente alguns se convencem dessas inverdades. V. Exª restabelece a verdade dos fatos, colocando-os nos devidos lugares. Espero que a grande imprensa brasileira, que dá tanto ouvido às falas dos empresários e do Presidente, dê à fala de V. Exª a repercussão que ela merece.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Agradeço-lhe o aparte nobre Senador. Permita dizer-lhe que, como vê, na democracia, se pode ser socialista em qualquer legenda. O problema é fazê-lo com correção e sinceridade. É o que procuro fazer.

Se há uma reforma pendente de decisão do Congresso, sem encaminhamento devido, a culpa não é do Congresso: é da reforma tributária. Por que não tem andamento a reforma tributária? O Congresso é que pôs a pedra sobre o projeto? A Nação toda sabe, sabem todos, nesta e na outra Casa do Congresso, que a reforma tributária não tem tramitação regular porque o Governo não pôde entender-se devidamente com os Estados e Municípios.

Com a sua franqueza habitual, aliás, já o disse, em nome do Congresso, o Presidente Antonio Carlos Magalhães, ao ressalvar que nem tudo pode ser atribuído à nossa responsabilidade.

Mas esta reforma, sim, esta é fundamental, esta deveria ter precedência porque influi no equilíbrio financeiro dos Estados e dos Municípios e, concorrendo para esse equilíbrio, concorre para o aumento das atividades e, conseqüentemente, para maior capacidade de aproveitamento de mão-de-obra, em todas as regiões do País.

É preciso acabar com o sistema de prorrogar medidas transitórias, como o Fundo de Estabilização Financeira. É preciso acabar com outras medidas transitórias e marchar para a votação - esta, sim, definitiva - da reforma tributária. Na medida em que o fizermos, os Estados e os Municípios não só adquirirão seu equilíbrio financeiro, como passarão a agir com a autonomia própria do sistema federativo. Não ficarão dependendo a todo momento de auxílios financeiros da União, não ficarão expostos os Estados e os Municípios à declaração de Ministros de Estado, como a que hoje está nos jornais, segundo a qual o Governador que quiser dar aumento, ou fizer qualquer concessão aos servidores, que o faça sob sua responsabilidade, porque a União não ajudará.

Faça-se a reforma tributária, que é essencial ao mecanismo da Federação e ao desenvolvimento das atividades de todas as Regiões. Mas não é de nossa responsabilidade a demora na tramitação da reforma tributária.

Essas verdades é que não foram ditas pelos empresários, e deles também as cobrou o Sr. João Sayad, quando, depois de assinalar que reforma da Previdência não aumenta poupança, fez este acréscimo: "Só não sei por que o estudo da FIESP não fala palavra sobre o câmbio. Nada sobre política industrial. Nada sobre investimentos em infra-estrutura".

Curioso também é que os empresários, diante do próprio Presidente da República, não manifestaram nenhum interesse pela reforma tributária. Essa é importante, porque, além de concorrer para o equilíbrio financeiro dos Estados e Municípios, racionalizará a distribuição dos encargos dentro da sociedade, fará com que haja menos impostos e melhor aplicação deles a todas as classes sociais, sobretudo em relação àquelas economicamente poderosas. Disso não cogitaram os ilustres empresários; não revelaram nenhum apoio ao encaminhamento da reforma tributária.

Ora, Srs. Senadores, devemos discutir as nossas idéias e defendê-las, mas não podemos defender apenas o que é do nosso interesse. Na vida pública - e os empresários têm que se situar dentro dela para que possam proceder eticamente -, empresários como parlamentares hão de cuidar sobretudo dos interesses da coletividade; hão de defender as medidas que sejam de repercussão coletiva. Cada qual assuma a responsabilidade de suas decisões. Temos nos investido das nossas, mas não podemos admitir que nos queiram atribuir responsabilidades e erros alheios.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/07/1997 - Página 13009