Discurso no Senado Federal

DEFESA DA ESTABILIDADE DO SERVIDOR PUBLICO. REFERENCIAS AO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR BERNARDO CABRAL, PROFERIDO NA SESSÃO DE ONTEM, ACERCA DO TEMA.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • DEFESA DA ESTABILIDADE DO SERVIDOR PUBLICO. REFERENCIAS AO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR BERNARDO CABRAL, PROFERIDO NA SESSÃO DE ONTEM, ACERCA DO TEMA.
Aparteantes
Ney Suassuna, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 09/07/1997 - Página 13368
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • OPOSIÇÃO, ORADOR, PRETENSÃO, GOVERNO FEDERAL, QUEBRA, ESTABILIDADE, FUNCIONARIO CIVIL, MOTIVO, NECESSIDADE, RESPEITO, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, MANUTENÇÃO, DIREITO ADQUIRIDO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, BRASIL.

A SRª BENEDITA DA SILVA (BLOCO/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, no momento em que o nosso Parlamento está para decidir sobre a manutenção ou a quebra da estabilidade do servidor público, gostaria, de mais uma vez, proferir algumas palavras sobre esse assunto. Na realidade, quero irmanar-me ao discurso do Senador Bernardo Cabral, proferido na sessão de ontem, neste plenário, a respeito dessa matéria sobre a qual tenho me pronunciado desta tribuna por várias vezes. E por que o faço? Pelo compromisso que temos e, também, porque fui uma constituinte e sei que a nossa Constituição, promulgada em 1988, em seu art. 37, § 4º, diz:

      "Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública..." etc.

Mais adiante, em seu art. 41, § 1º, diz:

      "O servidor público estável só perderá o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado ou mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa".

Portanto, na Constituição do Brasil estão contidos dispositivos que prevêem a perda do cargo do servidor público mediante processo judicial ou processo administrativo.

Depois, regulamentando muito bem esses dispositivos constitucionais, a Lei nº 8.112, de 1991, promulgada dois anos após a nossa Constituição, lei federal que rege os servidores públicos civis, traz, no Título IV, Do Regime Disciplinar; no Capítulo I, Dos Deveres; no Capítulo II, Das Proibições; no Capítulo IV, Das Responsabilidades; no Capítulo V, Das Penalidades; no Título V, Do Processo Administrativo Disciplinar, claramente previstas e regulamentadas as responsabilidades e condições, bem assim as penalidades a que estão sujeitos os funcionários públicos que não cumprirem devidamente com o seu papel.

Por exemplo, o art. 143 diz:

      "A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, assegurada ao acusado ampla defesa."

Um outro exemplo é o art. 121, que diz:

      "O servidor responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições".

Ou, ainda, em seu art. 132 que diz:

      "A demissão será aplicada nos seguintes casos:

      - crime contra a administração pública;

      - abandono do cargo;

      - inassiduidade habitual;

      - improbidade administrativa;

      - incontinência pública e conduta escandalosa na repartição;

      - insubordinação grave em serviço;

                  - ofensa física, em serviço, a servidor ou a particular, salvo em defesa própria ou de outrem;", etc.

Srªs e Srs. Senadores, fiz questão de transcrever algumas partes da nossa Constituição e da Lei nº 8.112, (que rege os funcionários públicos civis), para que fique bem claro, inclusive para todos aqueles que nos ouvem, que já existe legislação que regulamenta toda a questão da estabilidade do servidor público; a legislação está completa. O Executivo está chovendo no molhado! Ou então disfarçando outras intenções, porque esta está claramente colocada, regulamentada.

O que se faz necessário, sim, é que a lei seja aplicada e cumprida. E nesse sentido entendo que o Executivo poderia ter encaminhado ao Congresso Nacional, repetindo aqui as palavras do Senador Bernardo Cabral, "esforços no sentido de uma ampla reformulação da política e práticas de gestão pessoal, de forma a propiciar um efetivo controle do desempenho dos servidores e seus corolários, o estímulo aos dotados de capacidade e iniciativa e a dispensa dos incompetentes", se assim convier.

Repito:já está prevista na letra fria da lei a possibilidade de se demitir funcionário público civil a partir dos casos previstos. Precisamos é cumprir essa lei que existe. Como é cumprir essa lei? As leis estão sendo desrespeitadas e aí o servidor não tem absolutamente responsabilidade nesse contexto. A quebra da estabilidade do servidor público, tão alardeada como a nova mola mestra para a reforma administrativa, já consta da nossa legislação. É pura conversa fiada.

Preocupa-nos o fato incontestável de que o Executivo manipula a opinião pública, apresentando uma reforma que coloca como causa do caos administrativo o funcionário público. Sabemos que não é ele o grande culpado pelos descaminhos da administração pública. Notória e historicamente ela vem sofrendo todo tipo de desmando, irregularidades e abusos por parte da classe política, que tem acesso, que está no poder, e não tem, às vezes, o compromisso. É por isso que não poderia deixar de manifestar-me a respeito desta matéria.

Quero enfatizar a minha opinião, e já está me faltando argumentações necessárias, acredito que consegui esgotar o dicionário brasileiro, Aurélio, pois não encontro outras palavras para explicar essa proposição senão um desejo inaceitável, uma decisão quase que pessoal do Presidente da República em tirar do servidor aquilo que já tem conquistado. E sabemos que o Presidente da República foi um Constituinte, elaborou as leis e sabe que elas não estão sendo cumpridas. Por essa razão, aqui, determina-se que passem a ser cumpridas. Somente essa mensagem poderia ser aceitável para o Congresso Nacional brasileiro.

Portanto, quero aqui, mais vez, colocar-me contra essa proposição do Governo, porque a estabilidade é um direito adquirido, garantido constitucionalmente, e também pela colaboração e contribuição que o servidor público tem dado à Nação brasileira. Sem ele, tenho absoluta certeza de que não teríamos uma administração eficaz. Os nossos recursos são escassos e há uma falta de investimento nos servidores. A qualidade do servidor público é buscada por seus próprios méritos, porque não há estímulo e nem incentivo para que possa crescer na máquina administrativa.

O Sr. Ney Suassuna - Permite V. Exª um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Ouço V. Exª com prazer, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna - Senadora Benedita da Silva, quero me solidarizar com V. Exª. Fiz um discurso sobre este tema e concordo com V. Exª em gênero, número e grau. O direito adquirido não deve ser alterado. Nós temos que ser firmes nessa posição. Daqui para adiante é uma coisa, mas não para quem já tem o direito consolidado. Realmente, trata-se de uma injustiça contra aqueles que plantaram a vida toda e, na hora de colher, ou até mesmo já tendo colhido, mudam-se as regras. Por isso, solidarizo-me com V. Exª, e quero dizer, mais uma vez, da minha satisfação de ouvir o discurso de V. Exª.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Nobre Senador Ney Suassuna, agradeço o seu aparte e adendo, porque sei que V. Exª está imbuído de garantir ao servidor público os seus direitos adquiridos, a fim de que esses desejos do Governo Federal não sejam vestidos por nós, do Congresso Nacional brasileiro. Temos a responsabilidade em garantir que a Constituição seja cumprida - e ela será. Certamente, V. Exª, que é um zelador da Constituição, fará coro àqueles que não querem que o servidor perca esse direito.

O Sr. Ramez Tebet - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Concedo o aparte a V. Exª, nobre Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet - Nobre Senadora Benedita da Silva, V. Exª, hoje, dá continuidade aos pronunciamentos oportunos realizados aqui no Senado na sexta-feira última. Lá do meu Estado, fiquei ouvindo, com alegria e satisfação, o discurso pronunciado pelo Senador Bernardo Cabral. Lembro-me bem do aparte do eminente Senador Romero Jucá, sentado aqui à minha esquerda, representando o Estado de Roraima, como também o do Senador Jefferson Péres, sentado aqui à minha direita, que representa o Estado do Amazonas, do Senador Josaphat Marinho e de outros Senadores que se pronunciaram a respeito deste palpitante assunto, que é a estabilidade do servidor público. V. Exª vem, nesta terça-feira, dar continuidade a este tema, e o faz com a característica que lhe é peculiar, demonstrando, no meu entendimento, que será muito difícil o Governo obter, aqui no Senado da República, o que pretende nesta matéria da reforma administrativa. Não só porque se trata de um direito adquirido, mas, como muitos têm salientado aqui - e o Senador Jefferson Péres o fez muito bem -, a estabilidade, longe de ser somente uma garantia do servidor público, é muito mais do que isso, representa a própria eficiência do serviço público, ao contrário do que vêm apregoando aqueles que são contra ela. O interessante é que, no projeto do Governo - e é esta colaboração que quero dar ao brilhante e oportuno pronunciamento de V.Exª -, há apenas umas modificações que não sei o que pretendem. Hoje, não existe a estabilidade absoluta; ela existe em termos. Se o servidor público age ao arrepio da lei a administração pública, mediante processo regular, pode apurar-lhe a falta e ele sofrerá uma das sanções previstas. Pois bem, na legislação que o Governo pretende, que está causando tanta celeuma na Câmara dos Deputados, parece que é dada uma forma que não resolve nada. O que faz o Governo no seu projeto? Ele amplia de dois para cinco anos o estágio probatório. Creio que isso dificulta o aprimoramento do serviço público. Não preciso de cinco anos para saber se um servidor público tem condições, realmente, de prestar serviços à administração pública. Em outro tópico, fala-se em bom desempenho. Veja a gravidade, Senadora Benedita da Silva: será motivo para demissão se o funcionário não tiver bom desempenho, mediante avaliação que ainda será estabelecida em lei complementar. Não sei o que se pretende. Devemos pôr um ponto final nisso. Acredito que a Câmara dos Deputados o fará, mas, se não o fizer, pelo que observo das manifestações colhidas dos meus pares, reforçada pela posição que V. Exª sempre teve nesta Casa - e quero parabenizá-la por isso - nós o faremos. V. Exª é defensora dos direitos adquiridos. Creio que esta Casa vai sepultar, definitivamente, essa pretensão e vai fazer aquilo que o Constituinte de 1988 fez, isto é, vai manter a estabilidade do servidor público, nos termos em que está inserida na Constituição da República. Meus parabéns a V. Exª!

A SRª BENEDITA DA SILVA - Muito obrigada, Senador Ramez Tebet, tenho certeza de que V. Exª, no seu aparte, coloca uma das muitas preocupações que tenho, que é a de não entender o que o Governo está querendo.

Por essa razão, fui buscar, na Constituição brasileira, todos os dispositivos que regulamentam esta matéria e que podem demitir o servidor público, no caso de uma irregularidade dele. Tive também a oportunidade de ouvir os nobres pares que ontem estiveram aqui, nos apartes ao Senador Bernardo Cabral. E tenho certeza de que, doravante, S. Exªs ocuparão esta tribuna, para dizer desta minha preocupação, de trazer os dispositivos constitucionais, e buscar, junto a esta Casa, uma saída como a que V. Exª coloca. Penso que este assunto deve ser encerrado. Não tem por que atender o Governo, pois tudo o que ele pretende - se é que fiz uma boa leitura - já está contido na Constituição brasileira.

Por outro lado, também é importante dizer, Senador, que, com relação à qualidade da prestação de serviços, está se colocando fora uma experiência de anos a fio, que está adequada à administração pública, para um melhor atendimento. Quero crer que, apesar de todas as dificuldades governamentais, existe também a questão do conhecimento, que não pode ser colocado à margem. É claro que devemos dar lugar a outros valores, a outros conhecimentos, mas não se trata de direitos adquiridos e sim de conhecimento acumulado, que é benéfico para a administração pública comprometida.

Agradeço a colaboração dos Srs. Senadores que me apartearam. Certamente todos os apartes farão parte do meu discurso.

Trago aqui a minha preocupação, a qual, sem dúvida, receberá o apoio de todo o Senado Federal. Espero que possamos dar por encerrada essa matéria, como bem colocou o nosso Senador Ramez Tebet, ainda que ela não tenha vindo a esta Casa para uma votação. Agradeço também a oportunidade que tive de receber servidores públicos - que hoje ocupam o plenário da Casa -, que estão atentos para essa questão da estabilidade no serviço público.

Era o que tinha a dizer, Srª Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/07/1997 - Página 13368