Discurso no Senado Federal

COLOCAÇÕES REFERENTES AO PLANO REAL, A PROPOSITO DO SEU TERCEIRO ANO. CULTURA INFLACIONARIA BRASILEIRA.

Autor
Guilherme Palmeira (PFL - Partido da Frente Liberal/AL)
Nome completo: Guilherme Gracindo Soares Palmeira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • COLOCAÇÕES REFERENTES AO PLANO REAL, A PROPOSITO DO SEU TERCEIRO ANO. CULTURA INFLACIONARIA BRASILEIRA.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/1997 - Página 13696
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, ANIVERSARIO, PLANO, REAL, REGISTRO, CONTRIBUIÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ESTABILIDADE, POLITICA.
  • CRITICA, SITUAÇÃO, INFLAÇÃO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, SUPERIORIDADE, PREÇO, TARIFAS, SERVIÇOS PUBLICOS, NECESSIDADE, ATUAÇÃO, CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONOMICA (CADE).
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, MODERNIZAÇÃO, RECEITA FEDERAL, CRITICA, TAXAS, CORREÇÃO MONETARIA, IMPOSTOS.

O SR. GUILHERME PALMEIRA (PFL-AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me traz à tribuna é o tema aqui abordado pelos Líderes do Governo no Senado, Senadores Elcio Alvares e José Roberto Arruda, quando das comemorações do terceiro ano do Plano Real. Gostaria não só de louvar essas posições de elogio mas também de fazer algumas colocações, para que amanhã possamos deixar registrado que o êxito do Plano Real teve a colaboração desta Casa, da Câmara dos Deputados, do Congresso, de uma maneira geral. Suas virtudes e seus êxitos não podem ser exclusivos, devem ser divididos. Se há omissões dentro do Plano Real, precisamos estar atentos para ajudá-lo a reencontrar o caminho que desejamos. Tanto o Governo quanto a Oposição jamais podem negar, um, o êxito, e o outro, qualquer fragilidade maior dentro desse plano.

Por esse motivo, quero registrar a minha opinião e um alerta, inclusive, com relação ao que pode ocorrer, e também a responsabilidade do próprio Governo Federal, de órgãos do Governo Federal, porque quando se cobra da iniciativa privada determinadas coisas, há omissões também por parte do Governo Federal.

Entretanto, Sr. Presidente, como já disse, a estabilidade da moeda, pressuposto essencial da estabilidade econômica, no entanto, não pode deixar de ser associada a uma fase de incontestável estabilidade política, que é o ambiente necessário para qualquer projeto de desenvolvimento auto-sustentado. Os avanços que conseguimos nesses três anos são visíveis, palpáveis e estão se materializando, virtualmente, em todas as áreas. Há progressos na área econômica, conquistas na área social e mudanças inestimáveis no processo político. Neste contexto, são enormes e promissoras as expectativas para o Brasil, muito embora o caminho a percorrer seja ainda longo, difícil e até conflituoso. Todos temos a convicção de que precisamos persistir, insistir e prosseguir em busca da excelência, sem a qual não superaremos nossos históricos desafios.

Não podemos perder de vista nossas fragilidades que são conhecidas em razão da persistência de muitos de nossos males. O mundo globalizado contra o qual podemos protestar, mas não ignorar, faz parte de uma etapa de transformações que atingem de forma profunda e diferenciada todos os países com algum peso e significação no mundo contemporâneo. Os desafios, no entanto, não são monopólio de nenhuma nação e nem mesmo deste ou daquele continente. Existem em todas as partes e estão presentes em todos os momentos. A visão serena, objetiva e lúcida deste fim de século nos impõe o dever de enfrentá-los, de tentar resolvê-los e de buscar soluções que estão ao nosso alcance, a despeito de nossas naturais divergências. Já disse uma vez que, em muitas oportunidades, concordamos nos diagnósticos, embora discordemos nos prognósticos.

Sob esse aspecto, Sr. Presidente, não sou pessimista, mas também não sou otimista; prefiro ser realista, consciente de que problemas como a Educação, a Saúde e o desemprego ainda exigem muito esforço, enormes investimentos e uma dose ainda maior de persistência.

No que diz respeito à estabilidade econômica, vencemos a memória inflacionária, mas ainda não fomos capazes de superar a cultura que a sustenta. As tentações a esse respeito são enormes e não temos por que ignorá-la. Nosso dever é combatê-la e tentar superá-la. Sou o primeiro a reconhecer que o Governo está atento e já conta com um valioso instrumento que é o CADE, no que diz respeito às garantias necessárias à livre concorrência, à competição de mercado e à prevenção de práticas como a cartelização, o dumping e os acordos de preços que ferem os interesses coletivos. No entanto, não basta coibir a atuação dos agentes privados; é indispensável que esse combate preventivo e a ação repressiva se estendam também à parcela do mercado que ainda está em mãos do poder público.

As evidências a esse respeito não deixam dúvidas quanto à necessidade de estarmos atentos a esses riscos. Chamo a atenção para os próprios dados do desempenho econômico nesses três anos do Plano Real, constatando que o aumento das tarifas públicas, em especial no setor de comunicações, superou em muito os índices da inflação acumulada. Enquanto os dados da Fundação Getúlio Vargas e da FIPE, em São Paulo, oscilam entre 63,4% e 65%, o aumento das tarifas telefônicas foi de 160%. Sei também que a justificativa é a de que foi necessário reestruturar a composição dos preços nesse setor, a fim de prepará-lo para a privatização, pondo fim aos chamados "subsídios cruzados", que mantinham artificialmente baixas as assinaturas residenciais e as chamadas locais, e artificialmente altas as tarifas interestaduais e internacionais. Mas não me refiro apenas a esse aspecto. A concessionária que venceu a licitação para a banda "B" da telefonia celular da região Centro-Oeste já anunciou que a tarifa a ser praticada é de cerca de R$17,00 contra os quase R$34,00 cobrados atualmente pela empresa oficial, e que o custo de habilitação será de cerca de R$160,00, equivalente também à metade do que é praticado atualmente.

Muito embora o Presidente da empresa estatal tenha esclarecido que os preços anunciados pela concorrência não incluem os impostos que gravam a telefonia, o que estarreceu a todos é a circunstância de ter ele previsto que, a partir de novembro, quando haverá concorrência, por exemplo, a Telebrasília praticará os mesmos preços.

Ora, Sr. Presidente, se tais preços podem ser praticados a partir de novembro das duas uma: ou os assinantes estão sendo extorquidos ou o milagre da concorrência deixa de ser uma questão de eficácia para se transformar numa questão de tempo. É o Estado confessando uma prática abusiva, que deve ser denunciada, combatida e reprimida com o mesmo vigor que tem agido o CADE em relação à iniciativa privada.

O outro exemplo a que gostaria de me referir diz respeito à Secretaria da Receita Federal, no que concerne ao Imposto de Renda. Ressalve-se, desde logo, que a atuação do atual Secretário tem-se pautado pela serenidade, pelo equilíbrio e pela eficiência. No que diz respeito à antecipação das regras que têm sido sistematicamente anunciadas no ano anterior ao de cada exercício fiscal, pondo fim a uma prática que tinha se incorporado aos vícios do sistema tributário brasileiro.

Outro significativo avanço é o da não prorrogação de prazos de entrega das declarações, que era uma novela de fim sempre anunciado. Adotando tempestivamente as providências necessárias à regularidade do processo, há três anos que os prazos são os mesmos, sem necessidade de prorrogá-los, algo que pareceria impossível de se conseguir em nosso País.

Ressalte-se ainda os avanços tecnológicos conseguidos com o processo de informatização que permitiu que, neste ano, 500 mil privilegiados brasileiros, que têm acesso à Internet, fizessem as suas declarações sem sair de casa, sem o manuseio de formulários, sem a enxurrada de papéis que, como foi dito, seria a causa do próximo dilúvio universal.

Ouso mesmo dizer, Sr. Presidente, que pode haver em qualquer outro país um sistema tão avançado, tão eficiente, tão prático quanto o nosso, mas em nenhum outro governo de qualquer nação encontra-se um sistema superior ao implantado no Brasil.

Agora mesmo acaba de se anunciado que, dentro em pouco, esse benefício se estenderá ao pagamento mensal que também poderá ser feito via Internet ou através de terminais remotos que o usuário tenha para a movimentação de suas contas-correntes nos bancos com a vantagem do crédito imediato e automático, em favor do Tesouro Nacional.

Parabenizo não só o Secretário da Receita, cuja competência tem sido posta à prova, sempre com inusitado êxito, mas também o Ministro da Fazenda, que o escolheu como um de seus principais auxiliares, e o Governo, que tem sustentado sua ação eficiente, serena e de excelentes resultados.

Isso, no entanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não me exime de chamar a atenção para o assunto objeto desta minha intervenção, a cultura inflacionária. As regras mudaram e, a meu ver, para pior, do ano passado para este exercício. As quotas pagas em 1996 não eram corrigidas, como também não eram as devoluções. Por que corrigi-las em 1997 se a inflação está em baixa? Além dos juros de 1%, cobra-se a taxa selic, acumulada a partir do segundo mês. Minha crítica refere-se, em primeiro lugar, à própria natureza dessa correção monetária disfarçada. No ano em que a inflação foi de quase 17%, não se cobrou. Quando não deve ultrapassar 7%, passa-se a cobrar. É uma indagação. Com um agravante, Sr. Presidente, de que a correção, somados os seis meses, deve estar explícita nos propósitos do Governo, de aumentar, por via indireta, a carga tributária que já é a maior da nossa história, ultrapassando os 31% do ano passado, com a cobrança da CPMF. Merece críticas também a adoção dessa taxa, essa cobrança é tecnicamente imprópria e politicamente injustificável. Chamo a atenção, Srs. Senadores, para que a Comissão de Assuntos Econômicos estude mais aprofundadamente, mais atentamente essa matéria.

Mas nada disso invalida os avanços que temos que aplaudir, mas também não justifica os retrocessos que temos que condenar. O Governo está certo na busca da modernização, da estabilidade e das reformas, sem as quais não avançaremos em relação ao progresso desejado por toda a Nação. Mas deve também estar atento ao excesso de burocracia, aos riscos do preciosismo que trava o progresso, aumenta desnecessariamente os custos econômicos e os encargos sociais que fazem parte do chamado custo Brasil.

Espero que minha advertência, Sr. Presidente, e meu apelo sejam recebidos como o sincero desejo que tenho de contribuir para o êxito do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o sucesso de seu governo e a eficiência de sua administração. O resgate da credibilidade do nosso País não passa só pela conquista da estabilidade, mas depende também da legitimidade dos seus atos. Daí por que confio que minhas advertências não cairão no vazio, nem deixarão de merecer a atenção das autoridades econômicas, pela relevância das implicações que possa ter em relação aos direitos da cidadania e à racionalidade da administração.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/1997 - Página 13696