Pronunciamento de Mauro Miranda em 09/07/1997
Discurso no Senado Federal
REGULAMENTAÇÃO DAS ELEIÇÕES DE 1998.
- Autor
- Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
- Nome completo: Mauro Miranda Soares
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
ELEIÇÕES.:
- REGULAMENTAÇÃO DAS ELEIÇÕES DE 1998.
- Aparteantes
- Ernandes Amorim, Ramez Tebet.
- Publicação
- Publicação no DSF de 10/07/1997 - Página 13714
- Assunto
- Outros > ELEIÇÕES.
- Indexação
-
- PREVISÃO, DIFICULDADE, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, ANALISE, POLEMICA, PROPOSTA, REGULAMENTAÇÃO, REELEIÇÃO.
- DEFESA, AMPLIAÇÃO, DEBATE, LEGISLATIVO, REFORMA POLITICA.
O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mal iniciaram os debates sobre a Lei Eleitoral do próximo ano e a Câmara dos Deputados já começou a conviver com os interesses de atacado e de varejo, que são parte inseparável do processo político. Vamos ter um calendário especialmente histórico na vida republicana, com a primeira experiência de candidaturas à reeleição nos três níveis do Executivo. E é natural que esse processo pioneiro suscite controvérsias para impor novas realidades e reconceituar os valores de nossas tradições políticas. Para chegar a uma lei que impeça o uso privilegiado da máquina pública pelos candidatos à reeleição, muito combustível deve ser queimado até 2 de outubro, que é a data fatal para a aprovação da matéria pelo Congresso.
A divulgação das primeiras idéias do Relator, Deputado Carlos Apolinário, mostra que vamos enfrentar um ciclo penoso de muitas dificuldades para regulamentar as próximas eleições. Coloco muita fé no idealismo e nos cuidados do meu companheiro de partido, mas já dá para apostar num longo calvário de discussões para conciliar as exigências do ideal e os limites do possível. Também defendo uma lei severa e detalhada para impedir abusos de poder, mas também uma lei que não impeça o Presidente, os governadores e os prefeitos de governarem na plenitude, até o último dia do mandato, com vitória ou derrota nas urnas.
O melhor princípio das leis da política é o espírito do bom senso para quem as faz. E o melhor instrumento para quem as aplica ou as cumpre é a ética, como salientou com sabedoria o Presidente desta Casa, o Senador Antonio Carlos Magalhães. Uma lei draconiana e inaplicável vai servir para fomentar crises desnecessárias e inundar a Justiça Eleitoral de processos legítimos ou oportunistas, conturbando o processo democrático com ações que vão sobrepor-se aos mandatos legitimados pelo voto. É aconselhável que o Deputado Carlos Apolinário socorra rapidamente as suas virtudes de homem público e busque na sua consciência uma proposta que recicle conceitos sem violentar convicções pessoais. Ele mesmo vai entender que a imposição de uma camisa de força vai paralisar o País, os Estados e os municípios.
Temos grandes desafios para vencer neste País ainda injusto na promoção do bem-estar social e ainda navegamos em muitas incertezas quanto ao futuro da economia. Mas se há alguma coisa de que os brasileiros podem se orgulhar é o fato de termos hoje uma democracia plena, com todos os canais de manifestação da sociedade absolutamente livres.
O Sr. Ernandes Amorim - V. Exª me permite um aparte, Senador Mauro Miranda?
O SR. MAURO MIRANDA - Ouço V. Exª com prazer.
O Sr. Ernandes Amorim - Senador Mauro Miranda, V. Exª fala em camisa de força, e eu gostaria de dizer o que aconteceu nas últimas eleições em meu Estado, em que eu era adversário do Governador da época. Em minha cidade, houve a inauguração de um leão, ou seja, de uma extensão de condução de energia e houve uma festa, em que subi no palanque. Eu era candidato, mas não usei da palavra. Apenas estava em cima do palanque. Isso bastou para que entrassem com uma ação contra mim, e a Justiça julgou-me inelegível por três anos, por abuso de poder. Pretendo rever essa ação e devo concorrer, no próximo ano, ao Governo do Estado, contra o atual Governador, que dispõe da máquina administrativa está fazendo campanha desde que se pensou no projeto eleitoral. Como vou concorrer com esse cidadão, se fui punido apenas porque subi no palanque do adversário. E quem vai estar com a máquina, inaugurando obra, repassando recursos, andando em avião pago pelo povo? Por isso é necessária a regulamentação da lei para as próximas eleições.
O SR. MAURO MIRANDA - Percebo a preocupação de V. Exª. Em Goiás, aconteceu algo semelhante ao que V. Exª expõe agora. É necessário, neste momento, fazer uma reciclagem, porque este Congresso aprovou a reeleição. Em função disso, estou trazendo essa discussão à Casa.
Nunca tivemos uma imprensa tão atenta e tão vigorosa para denunciar os desvios de administração. Se este ou aquele candidato a presidente, governador ou prefeito quebrar os princípios da lei na campanha eleitoral, ele será seu próprio algoz ante a desconfiança do eleitor e a cobrança dos adversários. Chego a imaginar que os privilégios dos candidatos à reeleição serão negativos diante da fiscalização rigorosa que vai marcar as suas campanhas.
Para mim, não faz sentido impedir o governante de inaugurar obras nos três meses anteriores às eleições. Considerar que o Presidente não pode, mas o Ministro pode, é criar um jogo de aparências, enganoso e hipócrita, porque, de um modo ou de outro, para o povo, o autor do benefício será o candidato. Essa tática de faz-de-conta, protegida pela lei, seria um desrespeito à inteligência do eleitor e um desserviço à cidadania. Para impedir a divulgação dos atos de governo, que são fatos rotineiros na vida dos administradores públicos, seria o caso de censurar a imprensa. Como isso não vai acontecer, a proposta é inócua, para não dizer ingênua.
A idéia de obrigar o Partido do Presidente a cobrir os gastos com as despesas aéreas não é absurda em tese, mas inviável na prática. Imobilizar o Presidente em Brasília é impedir o País de caminhar, e a comparação com os Estados Unidos não serve para as nossas realidades. Os americanos têm dois únicos partidos nacionais, ricos e poderosos, que podem bancar essas despesas, o que não acontece aqui. Nesse caso específico, poderemos caminhar para um ponto de equilíbrio e de consenso que não abra espaço para polêmicas. Admito que não será fácil definir as subjetividades de uma viagem presidencial quanto às suas intenções eleitorais.
O Sr. Ramez Tebet - Senador Mauro Miranda, V. Exª me permite um aparte?
O SR. MAURO MIRANDA - Com todo o prazer, Senador Ramez Tebet.
O Sr. Ramez Tebet - Ouço V. Exª com muita atenção. V. Exª traz à consideração desta Casa, como bem salientou, um assunto de transcendental importância, porque se trata de regulamentar, pela primeira vez, aquilo que vai acontecer. Vai ser iniciado no Brasil o processo de reeleição, o direito de os governantes dos três níveis - municipal, estadual e federal - pleitearem a recondução aos seus cargos. Inevitável, portanto, que haja uma legislação eleitoral que aborde assuntos referentes a esse aspecto, até porque aqueles que se opunham à reeleição argumentavam com a possibilidade do abuso de poder, da vantagem que leva numa campanha eleitoral quem está no exercício do mandato. Portanto, o mérito de V. Exª está, a meu ver, além do que seu pensamento está transmitindo, ou seja, em fazer com que o debate no Senado inicie-se imediatamente, porque só temos alguns meses para discutir uma matéria dessa relevância. E, como ainda o projeto não passou sequer pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, muito provavelmente essa legislação vai chegar ao Senado da República ao apagar das luzes, quando poderá acontecer o mesmo que ocorreu quando regulamentamos as eleições municipais de 1996. Fui Relator e lembro-me de que tive de trabalhar muito. Fiquei noites de vigília relatando centenas de emendas, a fim de que pudéssemos dar uma resposta à Nação. Conseguiu o Senado dar essa resposta naquela oportunidade. O grande dilema era: se o processo voltar para a Câmara, não haverá legislação. Vamos, dessa forma, capitular. E o Poder Legislativo, que tem de legislar, terá de aceitar a regulamentação do Poder Judiciário. Penso, assim, que devemos discutir este assunto no Senado desde agora, apelando para que a Câmara aprove, o mais rapidamente possível, a matéria, a fim de que ela chegue a tempo de o Senado da República ter condições de, com toda a prudência, cautela e serenidade, dar a sua contribuição a uma legislação que - V. Exª está afirmando muito bem - será diferente porque, pela primeira vez na história republicana, haverá reeleição.
Então, era essa a consideração que eu gostaria de fazer ao pronunciamento de V. Exª. Tomara que outros colegas nossos sigam os passos de V. Exª. Tenho alertado da tribuna do Senado, já por algumas vezes tenho afirmado que a própria Lei das Inelegibilidades perdeu o sentido, porque, se o Presidente da República e o Governador podem ser candidatos à reeleição, por que um parente seu não pode ser candidato? Por que o próprio Governador pode ser candidato à reeleição e não pode concorrer a outro posto do Legislativo, sem permanecer no cargo? Para disputar um cargo maior, do Executivo, ele fica no cargo, mas para disputar uma vaga no Senado ou na Câmara tem de sair seis meses antes da eleição? Então, estamos diante de um quadro em que a própria Lei das Inelegibilidades não tem mais razão de ser, perdeu o sentido. Urge reordenar a legislação eleitoral no Brasil e a Lei das Inelegibilidades. Tomei o tempo de V. Exª, mas agradeço a sua atenção e o cumprimento por estar discutindo esse assunto.
O SR. MAURO MIRANDA - Agradeço o aparte de V. Exª, que enriquece muito o meu debate. Vejo que as nossas preocupações são as mesmas. Por isso, penso que temos urgência em discutir esse processo da reforma eleitoral.
Outro ponto de difícil absorção para a garantia de que a Administração não será prejudicada é o veto das transferências voluntárias a Estados e Municípios. Sou incapaz de encontrar uma explicação lógica para essa amputação dos fluxos orçamentários. A distribuição maciça e antecipada desses recursos para antes de noventas dias das eleições seria o suficiente para desmoralizar o princípio. Confrontar cronograma eleitoral com cronograma administrativo é farsa que agride a realidade e pune a população.
Não vejo, Srªs e Srs. Senadores, como esses pontos polêmicos da proposta possam sustentar-se nas nossas realidades políticas. Não tenho dúvidas de que essa versão preliminar do projeto, que tem prazos definidos de aprovação, sofrerá fortes reações dos setores mais conscientes do Congresso. Acrescentar um novo alimentador de impasses, numa pauta que exige rapidez por reformas prioritárias, é dar um nó na vida do Legislativo e ampliar os espaços de insatisfação da Opinião Pública com a lentidão de nossas decisões.
Considero fundamental que o Deputado Carlos Apolinário abra o diálogo com todo o Congresso e ouça as Lideranças partidárias, para chegar a uma posição final de consenso e abreviar a tramitação do projeto. Com o movimento de recuperação da imagem do Legislativo, que está empolgando todas as correntes de opinião da Câmara dos Deputados, o clima para o entendimento é amplamente favorável a opções mais realistas na elaboração da lei eleitoral.
Srªs e Srs. Senadores, ao trazer essas preocupações ao Plenário não carrego a intenção de criticar o trabalho do Relator. Pela importância da questão para os interesses nacionais, ela está acima dos julgamentos de caráter individual, e é por isso que eu reclamo a atenção e a participação de todas as forças do Congresso, incluindo o Senado, em discussão aberta. O diálogo simultâneo entre as duas Casas do Congresso vai favorecer o projeto de agilidade na futura tramitação do Senado.
A regulamentação do processo de reeleição não pode ser uma camisa de força contra o País, os Estados e os municípios e não pode servir de pretexto para sitiar o Presidente da República, os Governadores e os Prefeitos, nos limites de seus gabinetes.
Temos de definir muito bem o essencial para assegurar a preservação da ética, dispensando os acessórios supérfluos que só vão servir para complicar e conturbar o ambiente, nesse marco importante que será o ano de 1998 para a história política do País.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.