Discurso no Senado Federal

URGENTE E NECESSARIA ADOÇÃO DE UM PROGRAMA PERMANENTE E RIGOROSO DE CONTROLE DOS BANCOS DE SANGUE DO PAIS. RECLAMANDO NOVAMENTE DO MINISTERIO DA SAUDE PROVIDENCIAS PARA A REGULAMENTAÇÃO DA LEI 9.273, DE 1996, QUE OBRIGA A INCLUSÃO DE DISPOSITIVO DE SEGURANÇA NAS SERINGAS DESCARTAVEIS, SEJAM IMPORTADAS OU NACIONAIS, DE MODO A IMPEDIR A SUA PERIGOSA REUTILIZAÇÃO.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • URGENTE E NECESSARIA ADOÇÃO DE UM PROGRAMA PERMANENTE E RIGOROSO DE CONTROLE DOS BANCOS DE SANGUE DO PAIS. RECLAMANDO NOVAMENTE DO MINISTERIO DA SAUDE PROVIDENCIAS PARA A REGULAMENTAÇÃO DA LEI 9.273, DE 1996, QUE OBRIGA A INCLUSÃO DE DISPOSITIVO DE SEGURANÇA NAS SERINGAS DESCARTAVEIS, SEJAM IMPORTADAS OU NACIONAIS, DE MODO A IMPEDIR A SUA PERIGOSA REUTILIZAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 12/07/1997 - Página 13912
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • RECLAMAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), REGULAMENTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, INCLUSÃO, DISPOSITIVOS, SEGURANÇA, UTENSILIOS, UTILIZAÇÃO, BANCO DE SANGUE, IMPEDIMENTO, REUTILIZAÇÃO, FORMA, PREVENÇÃO, DOENÇA TRANSMISSIVEL.

           O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, convocamos o Ministério da Saúde, há poucos dias, para que adote, sem mais protelações, um programa permanente e rigoroso de controle dos bancos de sangue do País. Os hemocentros, à falta de fiscalização eficiente, nem sempre realizam os testes obrigatórios da qualidade do material colhido, expondo a risco de vida o receptor de sangue eventualmente contaminado.

           Nessa mesma linha, voltamos hoje a reclamar providências daquele órgão ministerial, desta feita relacionadas à imprescindível regulamentação da Lei nº 9.273, de 3 de maio de 1996, que obriga a inclusão de dispositivo de segurança nas seringas descartáveis, sejam as aqui fabricadas, sejam as importadas, de modo a impedir a sua perigosa reutilização.

           Oriunda de projeto de lei do Senado, essa nova legislação foi aqui plenamente justificada, nos seguintes termos:

           "O risco de transmissão de doenças entre usuários de drogas injetáveis pela utilização de uma mesma seringa ou pela sua reutilização é conhecido e descrito na literatura médica há muito tempo. A epidemia de AIDS trouxe uma nova dimensão para este problema.

           O desenvolvimento da tecnologia na área dos materiais médico-hospitalares permite, hoje, no entanto, que um dispositivo incluído nas seringas plásticas descartáveis -- de longe as mais utilizadas pelos drogados -- impeça que a seringa seja utilizada mais de uma vez.

           Pela imprensa ficamos informados de que a lei antidroga italiana prevê a substituição gradual dos modelos de seringa hoje existentes no mercado daquele país por outros, dotados do mecanismo.

           Ao adotarmos em nosso País providência semelhante, estaremos não apenas reduzindo o risco de transmissão de doenças entre os usuários de drogas endovenosas, como contribuindo para a própria redução do seu consumo."

           Na fase decisória, a proposição foi amplamente acolhida pela Casa, tendo como orientação o voto da Comissão de Assuntos Sociais -- CAS, segundo o qual "as estatísticas sobre as doenças transmissíveis no País não permitem dúvidas sobre iniciativas que visem minimizar a sua incidência sobre a população brasileira.

           Enquanto mal maior, os números relativos à AIDS são reveladores. O Brasil ocupa o terceiro lugar em termos de registros (16.340), depois dos Estados Unidos e Uganda. As projeções indicam que, no ano 2000, em torno de 5,7 milhões de brasileiros serão portadores do vírus, com 260.000 casos de manifestação da doença. Como se observa, a incidência da doença deverá romper a barreira do grupo de risco e tornar-se uma ameaça à população de uma maneira geral.

           Tem-se, portanto, razões objetivas para uma maior preocupação com mecanismos que permitam reverter os prognósticos alarmantes aqui delineados. São as razões que norteiam a opção pela aprovação do projeto."

           De acordo com relatório da Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes, da Organização das Nações Unidas -- ONU, registrou-se aumento do consumo de cocaína no Brasil, no ano passado, dadas as informações colhidas junto a órgãos do Governo, especialmente as prestadas pelo Ministério da Saúde. Elas confirmam esse crescimento a partir dos registros de internações hospitalares determinadas, entre os anos de 1987 e 1993, pelo uso de substâncias entorpecentes.

           Nesse caso, o número de pacientes hospitalizados em decorrência do uso de cocaína ascendeu de 15,3% para 32%, considerando-se o total das internações de drogados nas redes pública e particular de hospitais. Deve-se acrescentar que as doenças decorrentes do uso de drogas e de álcool representaram cerca de 30% das ocupações dos leitos dos estabelecimentos psiquiátricos, correspondendo a 90 mil internações, em 1996.

           Nesse mesmo ano, conforme as informações do Ministério da Saúde, houve um aumento de cerca de 1% dos casos de internação, relativamente ao exercício anterior, observando-se que a região Norte respondeu por número superior à metade de todas as hospitalizações determinadas pelo uso de drogas.

           No qüinqüênio citado, de todos os atendimentos efetuados a consumidores de drogas, apenas na rede pública de hospitais, 53,9% corresponderam a usuários de cocaína. Ademais, em cidades como Salvador, Itajaí e Santos, 60% dos portadores do vírus da AIDS contraíram a doença mediante o uso de drogas injetáveis, utilizando-se de seringas usadas.

           Devemos acrescentar, ainda, que nos Estados Unidos o controle das seringas, como parte fundamental do programa de prevenção de doenças transmissíveis, compreende a exigência de receita médica para a venda; o serviço de trocas, mantido na cidade de Chicago; e até mesmo o uso de cães especialmente treinados para localizar as usadas e, assim, impedir a sua reutilização.

           No Brasil, o chamado programa de redução de danos, financiado pelo Ministério da Saúde, com o apoio da Organização Mundial de Saúde -- OMS, é interpretado pela Justiça como "um incentivo ao uso de drogas", crime que, pela vigente lei de entorpecentes, sujeita quem o pratica à mesma sanção aplicada ao traficante, ou seja, pena de reclusão de 3 a 12 anos.

           De fato, enquanto não se aprova legislação permitindo claramente ao viciado a troca de seringas, e também introduzindo dispositivo que lhes impeça a reutilização, abre-se margem à interpretação de que se está, com o programa, contribuindo para favorecer e difundir o uso indevido ou tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; quando, na verdade, procura-se evitar que os usuários se contaminem pela utilização de seringas não esterilizadas. Para pôr termo a esse tipo de entendimento, quer o legislador tão-somente ressalvar as hipóteses de ações de saúde promovidas pelos serviços oficiais de assistência, que, então, não se confundiriam com o tráfico ilegal.

           Não obstante, segundo nos revela a Folha de S. Paulo, na tentativa de reduzir a contaminação, os agentes de saúde vêm desafiando o rigor judicial, mantendo, em pelo menos três capitais, o serviço de troca de seringas com os usuários de drogas. A troca de seringas, em países como a Suíça e a Holanda, reduziu em cerca de 5% a ocorrência de Aids entre os usuários de drogas injetáveis, às quais se devem, no Brasil, 20% dos quase 100 mil casos identificados dessa doença.

           Conseguintemente, a providência reclamada requer ação imediata do Ministério da Saúde. A Lei, com vigência a partir de 3 de agosto de 1996, como se disse, deveria estar regulamentada até 3 de novembro desse mesmo ano, a cumprir-se a sua própria determinação, de que entraria em vigor três meses a contar de sua publicação (3 de maio de 1996), e de que o Poder Executivo deveria regulamentá-la no prazo de 180 dias.

           O diploma legal em questão fixou prazo razoável para a sua regulamentação, sem que o Executivo a tenha promovido. Portanto, desconsiderou-se o zelo do legislador, que pela via legal quis evitar a contaminação de pessoas às quais continua permitida a utilização de seringas usadas, e que assim se arriscam a contrair as mais graves doenças, numa trágica e continuada loteria da morte.

           Era o que tínhamos a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/07/1997 - Página 13912