Discurso no Senado Federal

INDAGANDO DO NIVEL ETICO DA PROPRIA SOCIEDADE BRASILEIRA, QUE COBRA, COM CERTA RAZÃO, AÇÕES ETICAS DE SEUS POLITICOS, TENDO COMO EXEMPLO A DECISÃO DOS TELESPECTADORES DO PROGRAMA 'VOCE DECIDE', DA REDE GLOBO DE TELEVISÃO, QUE FEZ ALUSÃO AO ESCANDALO DOS PRECATORIOS.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA NACIONAL.:
  • INDAGANDO DO NIVEL ETICO DA PROPRIA SOCIEDADE BRASILEIRA, QUE COBRA, COM CERTA RAZÃO, AÇÕES ETICAS DE SEUS POLITICOS, TENDO COMO EXEMPLO A DECISÃO DOS TELESPECTADORES DO PROGRAMA 'VOCE DECIDE', DA REDE GLOBO DE TELEVISÃO, QUE FEZ ALUSÃO AO ESCANDALO DOS PRECATORIOS.
Publicação
Publicação no DSF de 16/07/1997 - Página 14201
Assunto
Outros > POLITICA NACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PROGRAMA, EMISSORA, TELEVISÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PARTICIPAÇÃO, POPULAÇÃO, CRITICA, ORADOR, FALTA, ETICA, SOCIEDADE, APOIO, CORRUPÇÃO.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a sociedade brasileira cobra muito, com certa razão, do nível ético da média dos políticos brasileiros. Mas como andará, Sr. Presidente, o nível ético da própria sociedade brasileira?

O programa de televisão levado ao ar pela Rede Globo nesta semana dá margem a preocupação. Refiro-me ao programa intitulado Você Decide, que colocou uma questão a ser decidida pelos telespectadores.

Dir-se-á que o universo alcançado pelo programa não reflete a sociedade. Eu creio que sim, Sr. Presidente. A televisão, hoje, penetra todos os lares do País, todas as classes sociais. É verdade que nem todos têm telefone para responder ao programa, mas diria que, talvez, com exceção da classe "E", aquela mais desvalida, uma boa parte da própria classe "D" já dispõe de aparelho de telefone. Existe o telefone público, também, ao alcance muitas vezes da comunidade mais carente, e estes também são usados para dar respostas à Rede Globo. Então, diria que as 134 mil respostas dadas a Rede Globo refletem, pelo menos aproximadamente, o perfil da população urbana do País.

A questão colocada qual era, Sr. Presidente? Aqueles que viram o programa se lembram. Fazia alusão ao escândalo dos precatórios. Um empresário, dono de uma corretora, tinha um relacionamento profissional correto com a sua secretária, pessoa de confiança que servia ao mesmo há alguns anos.

De repente, a secretária percebeu que o patrão andava envolvido em atividades escusas. O patrão, ao perceber a desconfiança da secretária, de maneira nada sutil, tentou comprar-lhe o silêncio, oferecendo-lhe uma certa quantia em dinheiro, que ela recusou. Posteriormente ela se viu envolvida com problemas familiares muito sérios. O marido irresponsável, jogador, fizera uma vultosa dívida de jogo que não podia saldar; sofreu agressão física por parte dos credores e ameaça de morte.

Em desespero, a secretária recorreu ao patrão e, voltando atrás, decidiu aceitar a importância que lhe fora oferecida. A esta altura o escândalo dos precatórios já era do conhecimento de todos por meio da imprensa e com a instalação da CPI. O patrão acedeu em dar-lhe o dinheiro, que antes fora recusado, mas, agora com uma condição, exigia que a secretária assinasse cheques em branco para serem depositados em contas- fantasmas.

Essa foi a questão colocada diante dos telespectadores. A direção do programa colocou três opções: a primeira, pedir demissão, mas ficar em silêncio - talvez por lealdade ainda ao chefe; a segunda, pedir demissão e denunciar o chefe às autoridades; a terceira, aceitar o dinheiro e se mancomunar com a operação ilícita, com todo o esquema de corrupção.

Sr. Presidente, 32 mil telespectadores responderam pela primeira opção; 35 mil, pela segunda; e 67 mil, pela terceira, ou seja, para que ela aceitasse e participasse do esquema de corrupção.

V.Exª, que é vice-Presidente, no momento na Presidência da CPI dos Precatórios, tome conhecimento desse fato, se não viu o programa. Sessenta e sete mil telespectadores acharam que a moça devia se corromper, Sr. Presidente. Foi a opção que prevaleceu e o programa terminou numa grande pizzaria, patrão e secretária comendo uma pizza gigantesca.

Sr. Presidente, eu não sou tão pessimista que acredite que a maioria fez opção pela corrupção, pela conivência, porque, somadas as duas opções éticas, a primeira e a segunda, o resultado foi de exatamente 67 mil. Ou seja, foi meio a meio. A metade achou que a moça deveria resistir e pedir demissão ou silenciar ou denunciar o patrão; a outra metade achou que ela deveria aceitar o suborno e se acumpliciar com a imoralidade.

É esta a sociedade brasileira: metade achou que a moça deveria participar da corrupção. Metade! Foi meio a meio. Será que o Congresso não reflete esta sociedade? Metade fez uma escolha antiética.

Eu não sei se a visão dessa situação é pessimista ou otimista. É a velha história do copo com água pela metade. O pessimista dirá que o copo está meio vazio e o otimista dirá que está meio cheio.

Eu prefiro me enfileirar entre os otimistas, achando que a sociedade brasileira está meio podre - metade é podre -, mas que, na evolução, haverá de prevalecer, creio eu, no futuro deste País, dos meus filhos, dos meus netos e de todos os brasileiros, a banda sã, a banda sadia da sociedade, espelhada nos que responderam que a moça deveria pedir demissão e resistir.

Sr. Presidente, se prevalecer a banda podre, nada mais haverá a fazer - pobre deste País!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/07/1997 - Página 14201