Discurso no Senado Federal

PARTICIPAÇÃO DE S.EXA. COMO UNICO REPRESENTANTE DA AREA POLITICO- PARLAMENTAR NO SIMPOSIO DO ATLANTICO SUL, SUBDENOMINADO 'POSSIBILIDADES: DA PAZ A COOPERAÇÃO', REALIZADO EM NEWPORT - EUA, OCASIÃO EM QUE DISCORREU SOBRE QUESTÕES DE INTEGRAÇÃO, SEGURANÇA, ESTRATEGIA E GEOPOLITICA NO HEMISFERIO SUL.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • PARTICIPAÇÃO DE S.EXA. COMO UNICO REPRESENTANTE DA AREA POLITICO- PARLAMENTAR NO SIMPOSIO DO ATLANTICO SUL, SUBDENOMINADO 'POSSIBILIDADES: DA PAZ A COOPERAÇÃO', REALIZADO EM NEWPORT - EUA, OCASIÃO EM QUE DISCORREU SOBRE QUESTÕES DE INTEGRAÇÃO, SEGURANÇA, ESTRATEGIA E GEOPOLITICA NO HEMISFERIO SUL.
Publicação
Publicação no DSF de 24/07/1997 - Página 14902
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REGISTRO, SIMPOSIO, ATLANTICO SUL, REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ASSUNTO, INTEGRAÇÃO, SEGURANÇA, POLITICA INTERNACIONAL, AMERICA DO SUL.
  • ANALISE, AUMENTO, IMPORTANCIA, PAIS ESTRANGEIRO, AFRICA DO SUL, POSTERIORIDADE, EXTINÇÃO, APARTHEID, ESPECIFICAÇÃO, COMERCIO EXTERIOR, OCEANO ATLANTICO.
  • IMPORTANCIA, INTEGRAÇÃO, REGIÃO SUL, PAIS ESTRANGEIRO, AFRICA, AMERICA DO SUL, COOPERAÇÃO, SEGURANÇA, GLOBALIZAÇÃO.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a cada dois anos, o Naval War College - a Escola de Guerra Naval dos Estados Unidos - realiza um Simpósio Internacional de Estudos Estratégicos voltados para a América do Sul. Em 1995, foi realizada a Conference on Confidence Building Measures in South America - Conferência para as Medidas de Construção de Confiança na América do Sul.

Neste ano de 1997, no mesmo local, a cidade de Newport, no Estado de Rhodes Island, no histórico prédio do Naval War College, em uma sala de conferências dominada pelo imponente retrato do Almirante Alfred Mahan, fundador do Naval War College e grande formulador do pensamento estratégico naval dos Estados Unidos, na verdade o pai da Marinha Americana, realizou-se o South Atlantic Symposium - Simpósio do Atlântico Sul, subdenominado Possibilidades: da Paz à Cooperação (Possibilities: from Peace to Cooperation).

Foram convidados conferencistas da área diplomática, da área militar e técnicos e especialistas em assuntos estratégicos representando todos os países do Mercosul, isto é, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, incluindo o Chile e, o convidado especial - talvez a grande novidade desse encontro -, a África do Sul. Representantes do Reino Unido foram convidados como observadores. O encontro foi assistido, como o é costumeiramente, por inúmeros professores da Escola de Guerra Naval dos Estados Unidos.

Falaram pelo Brasil o Almirante José Maria Amaral Oliveira, Diretor do Instituto Brasileiro para Assuntos Estratégicos; o Professor Renée Armand Dreyfus, da cadeira de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense; o Conselheiro Paulo Cordeiro, Diretor do Centro de Estudos do Ministério de Assuntos Estratégicos do Brasil; o Ministro Antonino Gonçalves, da Embaixada do Brasil em Washington. E este Senador, que lá foi como único representante da área Parlamentar em todo o Simpósio.

Convidado para a Conferência de 1995, procurei, naquela ocasião, mais do que expressar um ponto-de-vista estritamente pessoal, revelar com maior clareza e fidelidade possível aquilo que entendia ser o pensamento dominante no Congresso Nacional sobre questões de integração, segurança, estratégia e geopolítica no hemisfério sul. Honrado novamente com o convite para o Simpósio de 1997, não me afastei desse critério e desse enfoque, Sr. Presidente.

Apesar de ser uma preocupação antiga da Marinha brasileira e do Itamaraty, o Atlântico Sul como espaço geopolítico e geoeconômico é um processo que se encontra ainda em um estágio muito inicial. Há realmente pouca construção política em torno desta questão.

Reconheço também que aqui no Congresso Nacional, genericamente falando, pouco se debate sobre questões estratégicas envolvendo a geopolítica e a geoeconomia do Atlântico Sul.

O seminário trouxe à evidência que há um ator novo nesse cenário estratégico, que aliás é um ator exuberante, forte, politicamente expressivo e economicamente poderoso, que é a África do Sul. Diplomatas, militares e políticos podem impulsionar e regular as relações intra-sudatlânticas, mas é a chamada trade creation, isto é, a criação de comércio através de agentes econômicos privados que hoje move as relações entre os países. E a África do Sul, sem o apartheid, é, sem dúvida, um fato novo e extremamente importante. Um fato novo e exuberante, como um verdadeiro sol econômico que surge no cone Sul da África.

Há uma atração magnética entre o cone sul da América Latina e o cone sul da África. Uma complementaridade estratégica que pode encontrar, nesse espaço geoeconômico, novas perguntas e novas respostas, que aliás podem ir muito além das cinco questões mundiais que hoje são mais citadas nas agendas oficiais para um quadro pós-guerra fria: a) a delinqüência internacional, via tráfico de drogas e lavagem de dinheiro; b) a preservação ambiental; c) as garantias democráticas e o combate ao terrorismo; d) a manutenção da paz; e) o respeito aos direitos humanos, aos direitos individuais do cidadão.

Esses temas - que a meu ver são estreitos, porque são aqueles que constam apenas das agendas oficiais dos países - podem ser perfeitamente enfrentados, mas há outras questões que me parecem importante ser levantadas.

Sobretudo, porém, é absolutamente importante ressaltar a convergência de interesses econômicos, no âmbito das relações de comércio regional, entre o Mercosul de um lado e o Sadec - South African Development Community -, que é a Comunidade para o Desenvolvimento do Sul da África e reúne 12 países da África austral, entre eles Angola, Malawi, Zimbabwe, Swazilândia e a própria África do Sul.

Com o fim do apartheid, o mundo passou a olhar com outros olhos para essa parte do globo. Há novas expectativas e novas percepções do futuro papel estratégico das nações-líderes desses dois blocos regionais, sobretudo África do Sul, Brasil e Argentina. De um lado do Atlântico, minérios; do outro, alimentos. Até as reformas democratizantes implantadas na África do Sul pelo ex-Primeiro Ministro De Klerk e a ascensão de Mandela ao Governo, essa região, especificamente esse país, tinha problemas de relacionamento externo. O Atlântico era visto como uma imensa muralha de água a separar as duas plataformas continentais da África e da América Latina, assegurando também, por outro lado, por essa divisão e por essa separação, uma certa sensação de tranqüilidade militar.

Hoje a percepção é o contrário: o Atlântico não separa essas áreas, os dois Cones Sul da África e da América Latina, mas o Atlântico une. E essa constatação provoca novas cogitações geopolíticas.

De um lado do Atlântico, uma zona econômica voltada para a produção de minérios. De outro, uma área com grande capacidade de produzir alimentos, que é o Cone Sul da América Latina.

É bom lembrar que 75% do ouro produzido no mundo provém do sul da África. Nesta área, que pode ser compreendida como a zona estratégica do Atlântico Sul, há 701 plataformas marítimas de petróleo, 40% do petróleo do mundo inteiro circulam por essa região, e é essa região que produz 17% do carvão do planeta e conta com 23% dos recursos hídricos do mundo inteiro. Há 150 milhões de habitantes nas jovens nações africanas que compõem o cone sul da África e há 200 milhões de almas no cone sul da América Latina.

Cerca de três mil navios por ano cruzam a rota atlântica, transportando matérias-primas. Países como o Brasil e a Argentina usam a via marítima inclusive para transporte interno de mercadoria, uma vez que suas vias férreas são muito deficientes.

Portanto, Brasil e Argentina valem-se dessa rota atlântica, dessas rotas marítimas inclusive para o abastecimento interno, de norte a sul ou de sul a norte.

Como o Canal do Panamá é limitado a navios de 11 a 12 metros de calado, a frente atlântica de comunicação das nações do Norte com os oceanos Índico e Pacífico ainda se dá pelo Cone Sul. Assim, a região atlântica e o Cone Sul ainda são rota marítima fundamental para os países do Hemisfério Norte - os chamados países industrializados e desenvolvidos, Sr. Presidente.

A estabilidade política, no entanto, não é definitiva. A maioria dos países que compõem a África austral tem menos de 50 anos de vida como país independente. Dos 12 países da Sadec, South African Development Community, a Comunidade de Desenvolvimento do Sul da África, até há bem pouco tempo 11 estavam fora da democracia. Há poucos anos não eram sequer regimes democráticos. Onze dos 12 países, embora hoje somente a Swazilândia seja uma ditadura. Há desigualdades fantásticas no interior da Sadec, que representa 5,8% do PIB mundial, se incluída a África do Sul. Excluída a África do Sul, essa participação é de apenas 1,3%. Portanto, é lamentável dizer que os países mais pobres do mundo estão nessa região.

Para o Brasil, há implicações políticas e considerações preliminares que não podem ser esquecidas em um processo de aproximação com o Cone Sul da África. A primeira dessas cogitações e dessas considerações está no fato de que o Brasil tem fortes vínculos com a África portuguesa e nossa diplomacia investiu por mais de 30 anos nos países considerados mais pobres. Em outras palavras: em nome de uma rápida integração com a África do Sul não podemos, tanto política quanto economicamente, isolar a África subsaárica, que sempre foi privilegiada nas relações intercontinentais e nas relações diplomáticas do Brasil.

Quero lembrar aqui que nós, deputados de oposição ao regime militar - eu era Deputado Federal e fiz um pronunciamento a esse respeito na época - aplaudimos o fato de que o Governo brasileiro era o primeiro a reconhecer Angola como país independente nos anos 70.

Esta mudança, fundamental para todos nós, não deixa de ser agora algo que traz perplexidade, traz indagações, traz perguntas, mas, ao mesmo tempo, exige decisões. A África do Sul, que produz minérios, tem uma enorme intercomplementaridade com a região que produz alimentos que é o Cone Sul da América Latina. Há um chamamento quase que magnético para essa integração, para essa criação e intensificação de comércio. E a indagação é: em nome desta integração econômica vamos abandonar o privilegiamento político e diplomático que sempre demos à chamada África portuguesa e subsaárica? Esta é uma pergunta de caráter político, de noção estratégica, mas que, sobretudo, não só os diplomatas brasileiros devem responder; os políticos, os representantes da população também devem ter uma resposta para ela.

É sabido que a necessidade da geração de comércio, principalmente no plano internacional, corre com a rapidez da lebre e muitas vezes passa por cima de lentas avaliações e demoradas soluções que tanto os políticos quanto os diplomatas costumam tomar.

E é preciso reconhecer também que a institucionalização e a expansão de transações econômicas podem levar a que outras instituições venham a ser respeitadas e usadas como instrumentos de interação para a paz. Isto é, o avanço do mercado não é algo negativo e não deve ser visto como algo condenável.

Ademais, é preciso ressaltar a importância do Mercosul e de um dos seus mais notáveis subprodutos políticos: a garantia da estabilidade democrática. Países em vias de integração econômica precisam da democracia como um valor imprescindível, porque governos ditatoriais são avessos à integração. E a integração, por sua vez, impede que os países-membros caiam em ditaduras. Como uma verdadeira apólice de seguro democrática.

Exemplo significativo se deu por ocasião da ameaça de golpe por que passou recentemente o Governo de Alceu Wasmosy no Paraguai. A pronta manifestação dos governos da Argentina, do Uruguai e do Brasil fez os golpistas reconhecerem que sua ação não prosperaria e não encontraria respaldo no plano internacional. E o golpe recuou.

Sadec e Mercosul não lograriam, mesmo que tentassem, qualquer avanço na década de 70. A predominância dos regimes militares, a ditadura do apartheid, a desconfiança entre os dois blocos e a inconformidade internacional poriam por terra qualquer iniciativa. A cultura política setentista era basicamente avessa aos processos integrativos, simplesmente porque ditaduras não se integram; só se integram as democracias. De outra parte, a equação Cone Sul da África mais Cone Sul da América seria entendida como um acordo "contra" - contra alguém, contra quem quer que seja -, o que significaria, em termos mais explícitos, um acordo contra os mais importantes centros de gravitação da economia ocidental.

Nos anos 90, porém, com o fim da Guerra Fria, com a extirpação dos regimes autoritários, com a formação dos blocos econômicos, com a tendência inevitável à globalização dos mercados, criaram-se as condições para que um acordo dessa natureza fosse percebido como um acordo Cone Sul mais Cone Sul "pró", isto é, a favor de alguma coisa, a favor da incrementação do comércio, a favor da segurança coletiva, em defesa dos interesses dos cidadãos negros tanto da África do Sul quanto da América Latina, a favor das garantias e, sobretudo, a favor da estabilidade democrática de toda a zona estratégica do Atlântico Sul.

Há parâmetros comuns que hoje aproximam as políticas internas, a serem implementados nos próximos anos. Tanto isso vale para os países da Sadec quanto vale para o Mercosul, porque todos eles precisam: primeiro, ampliar os investimentos externos; segundo, expandir e diversificar as suas exportações; terceiro, realizar uma reforma patrimonial do Estado mediante a privatização de suas empresas e, quarto, manter rigorosamente a estabilidade monetária. Isso é o que estão fazendo os quatro países da América do Sul, mais o Chile, e os 12 países da Sadec, a South African Development Community. Essas exigências, na verdade, são internas, não são externas, não vêm de fora para dentro. Mas sem o seu atendimento, as metas externas ficam inteiramente comprometidas, porque se quebram os laços da integração regional. Um país que não tem estabilidade monetária dificilmente se integra, ou dificilmente encontra paridade de tratamento com seus companheiros de integração.

Portanto, Sr. Presidente, Srs. Senadores, somos dois cones geográficos, com três línguas: espanhol, português e inglês. Temos ainda, é verdade, um profundo desconhecimento recíproco das nossas histórias e das nossas culturas, diferenciadas por séculos de separação geográfica e incomunicabilidade política. Somos países caracterizados por grandes diferenças sociais internas, o que equivale a dizer que temos processos econômicos internos que registram imensas áreas de pobreza e outras de grande concentração de riqueza - esse exemplo vale para a África do Sul e para o Brasil.

Das 20 mil maiores empresas do mundo, capazes de produzir matrizes de conhecimento científico, nenhuma está localizada na região que envolve a Sadec e o Mercosul. Principalmente no que se refere às tecnologias de violência (produção de armas) e às tecnologias de persuasão (telecomunicações, televisão a cabo, telefonia celular, satélites, etc.), isso é especialmente verdadeiro. Note-se que Brasil e Argentina já assinaram compromisso de abrir mão da pesquisa nuclear com fins bélicos e militares. Mas essas variáveis não podem ser excluídas das considerações que emolduram qualquer perspectiva de integração no Atlântico Sul.

Por isso, é importante dizer: segurança no Atlântico Sul não é necessariamente defesa militar. Quando falamos em segurança, temos de ter a exata definição e abrangência do termo. É preciso distinguir claramente o conceito de "defesa" do de "segurança" no hemisfério. Segurança é mais do que defesa; segurança é um conceito que pressupõe, antes de tudo, desenvolvimento. Isso não significa que o conceito não possa ser abordado em diversos níveis de realidade.

Mas a pergunta que tem que ser feita é: qual é a realidade do Atlântico Sul? Note-se que o Brasil é um País que não representa ameaça para os seus vizinhos, nem mesmo para aqueles que estão do outro lado do Atlântico. O Brasil é um País que expressa, em suas relações internacionais, uma visão pacifista e executa uma ação abrangentemente estabilizadora. Temos 10 vizinhos terrestres e mantemos interfaces geopolíticas no âmbito do Atlântico Sul com 24 países. Não há registro, nas últimas décadas, senão de um comportamento amistoso e cooperativo do Brasil em toda essa complexa frente internacional de relacionamento diplomático e econômico. Nós, Brasil, contribuímos para fazer da América do Sul a região menos armada do mundo. A América do Sul é a parte do planeta que registra o menor índice de conflitos, e isso corresponde ao fato de que, não por mera coincidência, essa é a parte do mundo que tem o menor orçamento militar. Não há no planeta nenhuma região cujos países tenham um orçamento militar tão reduzido, como o tem os países do Cone Sul da América. Graças a isso, a região chamada América do Sul, em todo o Século XX, apresentou o menor número de mortos ou de feridos em ações militares ou operações de guerra em todo o globo terrestre.

Considerando isso, não há por que pensarmos nos termos geopolíticos ainda datados de 1914, antes da Primeira Guerra Mundial, como se o mundo estivesse às vésperas do conflito daquela primeira guerra. Quando os bolivianos trocam seus aviões por aviões mais desenvolvidos, não significa que querem fazer a guerra, querem apenas atualizar os seus equipamentos militares, fazer um up to date no seu arsenal militar.

Há alguns anos, isso seria impossível dizer. Mas, hoje, o Brasil precisa que a Argentina tenha uma Marinha forte, porque sabe que isso ajuda a garantir a segurança do Atlântico.

O SR. PRESIDENTE (Ronaldo Cunha Lima) - Peço permissão para interromper V. Exª. Para permitir que V. Exª conclua o seu importante pronunciamento, prorrogo a Hora do Expediente por mais 15 minutos, já que há três oradores inscritos para fazer uma comunicação inadiável. 

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Agradeço a V. Exª.

Hoje, a África do Sul pode dar respostas positivas a um chamado de cooperação internacional. Se considerarmos que integração econômica e cooperação militar são questões que devem andar juntas, pode-se dizer que a África do Sul estaria preparada tanto para uma quanto para a outra. Pode-se dizer que questões relativas às Malvinas, à pesca marítima, ao transporte de minérios por via marítima, à venda de armas para uso civil, tudo isso interessa à África do Sul no seu relacionamento com os Países do Cone Sul da América, a tal ponto que esse País não hesitaria em buscar acordos com o Chile, com o Brasil, com a Argentina e com o Uruguai.

É importante deixar bem claro, porém, que as questões de cooperação para a segurança não têm nem podem ter um viés exclusivamente militar. As respostas militares são insuficientes para uma série de questões emergentes que exigem um tratamento interdisciplinar.

O tráfico de drogas, por exemplo, não é uma questão para os exércitos em operações militares, embora o seu concurso não possa, nem deva ser desprezado. Um conceito básico de estratégia nos ensina que o instrumento a ser usado deve ser apropriado à natureza do conflito. Assim, quando a literatura de segurança do Pentágono fala em "ameaças novas", devemos sempre lembrar que conflitos de diferente natureza exigem vias e soluções distintas. Conflitos financeiros exigem participação dos Bancos Centrais. Não devemos, pois, inventar "novas ameaças". Não devemos, sobretudo, militarizar o enfrentamento às novas ameaças. Soluções políticas para conflitos políticos.

As Forças Armadas, nesses tempos de construção de blocos regionais, devem agir dentro deste contexto e desse conceito abrangente de segurança.

O velho lema si vix pacem para bellum, ou seja, "se queres a paz, prepara-te para a guerra", deve ser substituído por "se queres a paz, prepara-te para cooperar".

Por isso, entendemos também que seria um erro supor que bastaria constatar que não existem novas ameaças e desistir de tudo. Nossa visão é a de que os dois Cones do extremo austral do Atlântico têm muito em comum e devem-se reunir permanentemente, para ver o que podem fazer para melhorar um ao outro.

Achamos que esse caminho de aproximação deve ser encarado como alguma coisa extremamente importante para o futuro estratégico da região. Talvez tenha realmente chegado a hora de dar os passos que nos permitam enxergar o mundo a partir do ponto de vista de nossos interesses comuns. Poderemos com isso firmar, quem sabe, nesse futuro próximo, uma identidade do Atlântico Sul. Quem somos, o que somos e que papel queremos ter no processo de globalização.

Era essa a minha manifestação, Sr. Presidente.

Obrigado pela tolerância de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/07/1997 - Página 14902