Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES ACERCA DO DOCUMENTO DA COMISSÃO PASTORAL DA TERRA, INTITULADO CONFLITOS NO CAMPO, BRASIL 96.

Autor
Odacir Soares (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • CONSIDERAÇÕES ACERCA DO DOCUMENTO DA COMISSÃO PASTORAL DA TERRA, INTITULADO CONFLITOS NO CAMPO, BRASIL 96.
Publicação
Publicação no DSF de 25/07/1997 - Página 15127
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ANALISE, DOCUMENTO, AUTORIA, COMISSÃO, ENTIDADE, INTERESSE, DISTRIBUIÇÃO, TERRAS, AUMENTO, AGRAVAÇÃO, CONFLITO, CAMPO, POSSE, TERRA PUBLICA, TERRA PARTICULAR, PERIODO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • SAUDAÇÃO, ESFORÇO, GOVERNO, INICIATIVA, AUTORIZAÇÃO, SENADO, CONTRATAÇÃO, EMPRESTIMO, BANCO MUNDIAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PROJETO DE REFORMA AGRARIA, BRASIL.

O SR. ODACIR SOARES (PFL-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pousou sobre o Governo Fernando Henrique Cardoso uma terrível estatística. A Comissão Pastoral da Terra informa que nos dois anos e meio do mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso já morreram 112 brasileiros em conflitos rurais.

Esse número que reflete um agravamento da violência no campo, não pode ser, obviamente, atribuído a Fernando Henrique Cardoso, mesmo assim poderia provocar um surto de modéstia na linguagem triunfalista do Planalto em relação ao estado dos direitos humanos no País.

O documento da Comissão Pastoral da Terra, intitulado "Conflitos no Campo, Brasil 96" apresenta um bem documentado cadastro dos conflitos no campo que "... não pode guardar somente para si"; para a formação da consciência e opinião públicas divulga-os anualmente.

O Quadro "Conflitos no Campo 1996, Violência Contra a Pessoa" apresenta uma série de indicadores, por região e por Unidades Federativas. No total, o número de conflitos ascendeu a 750 , envolvendo um numérico de 935.134 pessoas; foram assassinadas 54 pessoas; sofreram tentativas de assassinato 71; ameaçados de morte 88; torturados 12; agredidos fisicamente 124; presos 198 e sofreram lesões corporais 220 pessoas.

A região Nordeste foi, tristemente, a campeã, destas estatísticas, com um número total de 256 conflitos, envolvendo 179.960 pessoas, que resultaram em 9 mortes; 2 tentativas de assassinato; 26 ameaçados de morte; 6 torturados; 66 agredidos fisicamente; 54 presos e 68 pessoas com lesões corporais.

A região Norte fica numa quarta posição, com 114 conflitos, do que resultaram: envolvidos 67.726 pessoas, com 39 mortes, dentre as 54, ou seja, 72% do total. Ocorreram ademais, 56 tentativas de assassinato; 42 pessoas ameaçadas de morte; 5 torturados; 9 agredidos fisicamente ; 80 presos e 53 pessoas que sofreram lesões corporais. O Estado de Rondônia contribuiu com 16 conflitos dos quais participaram 9.290 pessoas. Uma única pessoa foi assassinada; 3 sofreram tentativa de assassinato; 11 ameaçadas de morte; 6 presos e 3 com lesões corporais. Estes dados estão colocados em meu discurso como o ANEXO Nº 01.

O documento da Comissão Pastoral da Terra, de 1996, faz uma listagem das chacinas ocorridas entre 1985 e 1996. São consideradas chacinas, quando ocorrem três ou mais assassinatos numa mesma data e conflito. O Estado de Rondônia aparece com as chacinas da Fazenda São Felipe, no município de Pimenta Bueno,. ocorrida em 3 de março de 1987 quando foram assassinadas seis pessoas; uma outra chacina ocorreu em 27 de junho de 1987, na fazenda Belo Horizonte, no município de Jaru, com três mortes. A mais violenta chacina ocorreu em Rondônia no município de Corumbiara, no dia 9 de agosto de 1985, na Fazenda Santa Elina, quando foram assassinadas 11 pessoas.

Esta Casa é sabedora de quanto tenho apoiado o Governo democrático do Presidente Fernando Henrique Cardoso, mas não posso deixar de reproduzir as informações coligidas pela Comissão Pastoral da Terra. Certamente, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, não terá gostado da leitura da Folha de São Paulo, do dia 14 de julho, na qual o importante veículo de comunicação anuncia que com 112 mortos, nos seus dois anos e meio o Governo arrisca terminar o seu primeiro mandato com mais cruzes no campo do que a ditadura militar em seus dez anos, quando foram assassinados, 127 pessoas. Essa comparação se refere, é claro, apenas às vitimas de conflitos de terra. Nada a ver com os números da repressão política.

O número de mortos do Governo Fernando Henrique Cardoso, no campo, supera com folga, a soma das vítimas da repressão durante os governos Castello Branco, Costa e Silva e Geisel. No período de Presidência dos três generais morreram 82 pessoas, contra os já indicados 112 do governo Fernando Henrique Cardoso. Fica de fora o General Médici, com 200 mortes.

"No tempo dos generais", diz a matéria da Folha de São Paulo, "houve uma onda de estatização, e enquanto ela durou, a violência do Estado foi muito bem vista pela plutocracia. Agora o governo Fernando Henrique Cardoso está promovendo uma onda de privatizações, terceirizando tudo o que é possível. Os números da Pastoral da Terra sugerem a possibilidade de estar diante de um fenômeno novo: a violência privatizada".

O renomado escritor português, José Saramago, em seu veredito no Tribunal Internacional para julgar os massacres de Corumbiara e Eldorado do Carajás, afirma: "O latifúndio é algo absolutamente anti-humano. Algum dia alguém chegou e disse: isso aqui é meu e a partir daí começaram as desgraças todas, porque quem disse "isso aqui é meu", pôs imediatamente para guardar aquilo que disse ser seu: a polícia. E alguém disse: mas não posso ter aí um bocado ou aquilo de que necessito só para viver? Não pode. E se teima, entra e insiste, é abatido a tiro ou sacrificado de qualquer outra maneira". O latifúndio é cruel. Não tem coração, nem alma. E saber que quase todo ele tem origem espúria...

A reflexão que me impus e que me permiti passar aos Senhores Senadores, tem como uma resposta prática o interesse do Governo Fernando Henrique em resolver o angustioso problema da Reforma Agrária. Em sessão do dia 22 de julho, foi autorizado no Plenário do Senado Federal, a contratação de um empréstimo de US$ 90 milhões com o Banco Mundial. O empréstimo destina-se a bancar um projeto de reforma agrária no qual o Governo Federal teria pouca participação e associações comprariam as terras para os seus filiados.

Na análise do Ministro Extraordinário da Política Fundiária, Raul Belens Jungmann Pinto, o governo sozinho tem dificuldade de efetivar a reforma agrária e essa descentralização experimental poderá vir a indicar novos rumos para a necessária redistribuição de terras.

As primeiras associações beneficiadas com o empréstimo se localizarão nos Estados da Bahia, Ceará, Maranhão Minas Gerais e Pernambuco. O Projeto Piloto será desenvolvido durante três anos. No total, com a participação do governo federal e dos governos estaduais serão gastos no programa piloto R$150 milhões. Além de pagar a aquisição das terras para os assentamentos, os recursos serão empregados em obras de infra-estrutura comunitária, assistência técnica, treinamento e administração do projeto.

Em dia da próxima semana deter-me-ei em analisar de forma circunstanciada a proposta do Projeto Piloto de Alívio à Pobreza e Reforma Agrária, cujo recurso de empréstimo foi aprovado, no último dia 22 de julho.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/07/1997 - Página 15127