Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A CRISE DAS POLICIAS MILITARES ESTADUAIS. TRABALHO DESENVOLVIDO PELA COMISSÃO COORDENADA PELA SECRETARIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS DO MINISTERIO DA JUSTIÇA, COM O OBJETIVO DE LEVAR AO PRESIDENTE DA REPUBLICA E AO CONGRESSO NACIONAL PROPOSTAS DE MUDANÇA DA SEGURANÇA PUBLICA DO PAIS, ATRAVES DA REGULAMENTAÇÃO DO ART. 144 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NECESSIDADE DA RACIONALIZAÇÃO DOS GASTOS DA MAQUINA PUBLICA DOS ESTADOS.

Autor
José Roberto Arruda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/DF)
Nome completo: José Roberto Arruda
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • REFLEXÕES SOBRE A CRISE DAS POLICIAS MILITARES ESTADUAIS. TRABALHO DESENVOLVIDO PELA COMISSÃO COORDENADA PELA SECRETARIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS DO MINISTERIO DA JUSTIÇA, COM O OBJETIVO DE LEVAR AO PRESIDENTE DA REPUBLICA E AO CONGRESSO NACIONAL PROPOSTAS DE MUDANÇA DA SEGURANÇA PUBLICA DO PAIS, ATRAVES DA REGULAMENTAÇÃO DO ART. 144 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NECESSIDADE DA RACIONALIZAÇÃO DOS GASTOS DA MAQUINA PUBLICA DOS ESTADOS.
Aparteantes
Josaphat Marinho.
Publicação
Publicação no DSF de 02/08/1997 - Página 15524
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • DEFESA, REGULAMENTAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, APARELHAMENTO, SEGURANÇA PUBLICA, ESTADOS, BRASIL.
  • COMENTARIO, REUNIÃO, COMISSÃO, AMBITO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS, DIREÇÃO, JOSE GREGORI, SECRETARIO, OBJETIVO, ORGANIZAÇÃO, PROPOSTA, ALTERAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, APARELHAMENTO, ORGÃOS, SEGURANÇA PUBLICA, BRASIL.
  • NECESSIDADE, AJUSTAMENTO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, ESTADOS, BRASIL, IMPEDIMENTO, EXCESSO, GASTOS PUBLICOS, EXTINÇÃO, PRIVILEGIO, ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL, PROMOÇÃO, MELHORAMENTO, SALARIO, FUNCIONARIO PUBLICO, FUNCIONARIO MILITAR, ESPECIFICAÇÃO, POLICIAL CIVIL, POLICIAL MILITAR, GARANTIA, QUALIDADE, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, SEGURANÇA PUBLICA.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, desejo que todos os Srs. Senadores tenham tido uma semana de recesso de descanso - e não vai nisso qualquer brincadeira com o Senador Geraldo Melo, que ficou aqui todo o tempo, e com o Senador Josaphat Marinho, que também trabalhou bastante.

Gostaria, nesta primeira sessão que marca o reinício das atividades do Congresso Nacional neste segundo semestre e terceiro período legislativo de 1997, de fazer uma observação que me parece importante, uma reflexão que todos os jornais brasileiros têm feito sobre um assunto que - é claro - fará parte da análise de todos nós no Congresso Nacional nos próximos dias.

O País viveu nas últimas semanas momentos de tensão com a crise das polícias militares estaduais. Acompanhamos pelos jornais e pela imprensa de um modo geral não só os lamentáveis conflitos ocorridos em algumas capitais brasileiras, mas também as declarações de estudiosos, de homens públicos, enfim, de autoridades sobre a necessidade urgente de mudanças na legislação no que diz respeito à organização da segurança dos Estados brasileiros.

Esta é uma Casa em que há vários ex-Governadores, como o que preside esta sessão; homens que aprenderam, no exercício da sua vida pública e no trato com as forças de segurança, a sentir o peso da responsabilidade da manutenção da disciplina e da autoridade para que a sociedade como um todo não ficasse sem os serviços básicos de segurança pública. Aprenderam também que a hierarquia militar existente dentro das tropas das polícias militares se explica exatamente pela natureza dos serviços que prestam à sociedade.

Neste primeiro momento, neste primeiro pronunciamento, Sr. Presidente, quero fazer algumas observações. A primeira delas é que uma comissão se reúne no Ministério da Justiça - mais especificamente na Secretaria Nacional de Direitos Humanos, liderada pelo Secretário José Gregori -, há mais de 90 dias, com representantes de vários segmentos organizados da sociedade brasileira, todos eles trazendo experiências importantes, com o objetivo de levar ao Presidente da República e apresentar ao Congresso Nacional, em nome do Governo Federal, uma proposta de mudança. Portanto, bem antes dos problemas ocorridos em Minas e em todos os outros Estados brasileiros, culminando com o Ceará, o Governo Federal, no âmbito do Ministério da Justiça, e desde a gestão do ex-Ministro Nelson Jobim, já se preocupava em fazer um estudo amplo, detalhado, aprofundado para apresentar soluções objetivas ao Congresso Nacional.

Esse grupo, tem-se notícias, vai apresentar ao Presidente da República, na próxima terça-feira, as conclusões dos seus estudos. É preciso que se diga, até para ser objetivo, que esse grupo, além do prazo de 90 dias de estudos e das matérias e informações colhidas em todos os Estados brasileiros, tem agora o ensinamento da crise; crise que, obviamente, a par de resultados negativos, de conflitos lamentáveis, traz também experiências e ensinamentos que certamente deverão estar contidos nessa apreciação.

Porém, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me preocupa é que, de plano, se coloca que a única solução viável neste primeiro momento, como acontece em toda sociedade em formação, é, mais uma vez, uma mudança radical. E quando se fala em mudança radical no terreno legal, fala-se em mudança na Constituição.

Não tenho a menor dúvida que esta Casa e o Congresso Nacional - obviamente sentindo a perspectiva de todos os problemas que aconteceram nos últimos tempos e também a necessidade de mudanças - não se furtarão a analisar qualquer tipo de mudança, inclusive eventuais mudanças constitucionais. Mas, antes de pensar nelas - e aqui temos a presença do Relator da Constituição de 1988, que com certeza poderá nos ensinar com maior precisão sobre o tema -, se faz necessário dizer que o art. 144, do Capítulo III, que versa exatamente sobre a segurança pública e que dispõe sobre o aparato da segurança pública no País, não está ainda devidamente regulamentado.

Ora, nove anos já se passaram desde a promulgação da Constituição de 1988, e a regulamentação do art. 144 - não só trazendo o espírito da Constituição de 88, mas dando a ela os aprimoramentos que se fizerem necessários em função das mudanças importantes que ocorreram no mundo e na sociedade brasileira - deve ser a nossa prioridade.

De todas as avaliações feitas neste momento, é preciso que fique claro que a sociedade brasileira, na sua imensa maioria, não deseja ver, de forma alguma, a quebra da hierarquia e da disciplina nos aparatos de segurança e, principalmente, naqueles que têm hierarquia militar e que, por força do seu trabalho, têm o uso contínuo de armas.

O episódio do Ceará, de forma talvez mais clara do que o dos outros Estados - até porque teve a oportunidade de apreender as experiências por que eles passaram e também pela postura enérgica, pela postura, ao mesmo tempo, firme e clara do Governador Tasso Jereissati -, demonstra que não se pode tergiversar quanto à questão da disciplina e da ordem. Essa é uma questão básica.

Embora esteja muito longe de ser um constitucionalista, durante esses dias de recesso li várias vezes o art. 144. Parece-me que há aqui um arcabouço básico, como deve ser no texto constitucional, para a estruturação das forças de segurança nos Estados. Qual deve ser a regulamentação apropriada para este momento? E quando falo neste momento, falo do imediato, porque a sociedade brasileira espera do Governo Federal e do Congresso Nacional medidas prontas, claras, que dêem direção, que dêem sentido a essa aparente desorganização que se notou nas forças de segurança pública. O que se pode fazer de claro, de preciso, neste exato momento, em se tratando da regulamentação do art. 144, para que episódios como esses não voltem a ocorrer?

Ora, Sr. Presidente, não tenho dúvidas de que o Ministério da Justiça, na pessoa do Ministro Iris Rezende, a Secretaria dos Direitos Humanos, sob a liderança do Sr. José Gregori, e o Presidente da República, até pelas suas claras manifestações na imprensa brasileira nos últimos dias, demostrarão, a partir da próxima semana, quais as iniciativas congressuais que poderão ser tomadas no sentido da regulamentação do art. 144, sem fugir de que, a seguir, se analisem com mais profundidade eventuais mudanças constitucionais.

Mas o que me preocupa, e manifesto o meu ponto de vista já nesta primeira sessão, é que, embora algumas iniciativas vinham sendo tomadas, algumas idéias vinham sendo ventiladas ao longo da última Sessão Legislativa, os acontecimentos dos últimos dias demonstraram que, ao contrário do que se imagina, ou do que se imaginava, a sociedade brasileira precisa e quer saber qual a força de segurança com a qual pode contar. Em primeiro lugar, se militarizada ou não, com os seus prós e contra. Há vantagens, para a própria força policial e para a sociedade, em se ter uma força de segurança pública estadual com os rigores e as eventuais vantagens da militarização, mas há também limitações quando se adota essa militarização.

O que a sociedade demonstra de forma inequívoca é que não deseja ver a indisciplina, a quebra da hierarquia e, principalmente, que não pode ficar à mercê de uma força policial armada que quando não tem um determinado direito seu, ainda que legítimo, atendido no momento que julga próprio, usa as armas que são pagas pela sociedade. Os seus salários - e, diga-se de passagem, na base são efetivamente pequenos e precisam ser revistos - são pagos pela sociedade. Entretanto, todo esse arsenal, toda essa força foram usadas contra a própria sociedade.

O que assistimos nos últimos dias, obviamente, contraria o postulado básico inserido na Constituição brasileira e o que entendemos por segurança pública. É claro que as forças de segurança do País, no momento em que recebem da sociedade e da legislação o direito de estar armadas para a defesa da sociedade, limitam, nesse exato momento, a sua forma de reivindicação. Ou entendemos isto ou, obviamente, estaremos dando um passo na direção da subversão da ordem.

No momento em que governadores de Estado - e eu diria que todos, cada um a seu modo e a seu tempo, e, mais exemplarmente, o Governador Tasso Jereissati - fazem prevalecer a hierarquia, fazem prevalecer a disciplina na organização social, eles dão um exemplo, um norte, uma direção a ser seguida. Cabe a nós, Congressistas, cada um a seu modo, fazermos o nosso juízo de valor.

Mas o que sociedade espera de nós, e tenho certeza de que este assunto irá nos ocupar a todos nos próximos dias, a partir do conhecimento dos detalhes desse estudo que faz o Governo Federal, a partir, obviamente, da nossa situação de base de sustentação de Governo, a partir da direção que o Presidente da República, depois que receber esses estudos, puder dar ao Congresso Nacional e à Nação brasileira, é que todos nos debrucemos sobre o art. 144 da Constituição, com muito cuidado, com muita propriedade. Entendo, Sr. Presidente, que a nossa ação e a segurança da nossa ação vai criar um clima, favorável ou não, à manutenção da hierarquia e da disciplina nas forças policiais do País.

Eu gostaria de acrescentar, Sr. Presidente, que há algo de que os jornais já falam e a que, por isso, não há problema referir-me aqui publicamente. É que me parece claro, absolutamente claro, que a par de medidas administrativas, como aquelas de certa forma já previstas na reforma administrativa - e, quem sabe, de forma particular agora -, outras têm que ser tomadas, por exemplo, com respeito à relação entre os salários daqueles que estão na base da pirâmide da estrutura policial e os que estão no topo. Essa relação não pode ser, como é, em alguns Estados brasileiros, tão díspar que ofenda a visão racional de uma estrutura que deve ser hierarquizada. É claro que todos nós desejamos ter, em cada Estado brasileiro, e, se possível, até de maneira uniforme, em todos eles, uma relação entre o mais baixo e o mais alto salário que não ofenda a nossa consciência. Mais do que isto, todos nós desejamos ver os brasileiros que trabalham na segurança pública - brasileiros, portanto, armados - ter condições dignas de sobrevivência, de manutenção de suas famílias, porque esses cidadãos é que saem às ruas para enfrentar o crime, para enfrentar o perigo, o risco, no seu dia-a-dia. Isto é uma coisa. Todos nós temos que, de alguma forma, buscar os caminhos para que isso prevaleça.

Outra coisa é admitir que, por qualquer motivo, ainda que legítimo, esses cidadãos usem armas que são da administração pública, armas que lhes são confiadas para que prevaleça a ordem, para que prevaleça a segurança dos cidadãos, em manifestações e reivindicações de classe. Ainda que legítimo, ainda que justo, esse tipo de manifestação não está em acordo com o desejo majoritário da sociedade brasileira.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Ouço, com muito prazer, o Senador Josaphat Marinho.

O Sr. Josaphat Marinho - Estou ouvindo-o com toda a atenção, nobre Senador. V. Exª faz referências ao problema das polícias militares, e o faz serenamente. Ao que me parece, há dois problemas em que se atentar. Há a questão de conjuntura, a crise de disciplina nas polícias militares em função de remuneração. E há provavelmente um outro problema, de caráter permanente, a reestruturação dessas corporações. A mim parece que o Governo deveria preocupar-se, neste momento, em dar, conjuntamente com os Estados, uma solução à questão da remuneração, para restaurar a tranqüilidade nos quartéis. E somente depois pensar no problema da reestruturação das polícias militares. Nós não devemos marchar também precipitadamente para uma reformulação dessas corporações, porque toda solução de caráter emocional perturbará a boa definição do quadro. Neste momento, creio que, no interesse da Federação, deveríamos nos voltar antes de tudo para a reforma tributária. A reforma tributária é que dará recursos aos Estados para a manutenção regular de seus serviços, inclusive o serviço das polícias militares. Compreendo a preocupação do Governo Federal, mas quero deixar esta ponderação. Não é hora de nos precipitarmos na solução de reestruturação, até para não parecer que se está querendo buscar soluções punitivas, que não concorrerão para o bom enquadramento das medidas de caráter permanente. Era esta a ponderação que desejava deixar, porque tenho também me preocupado com o assunto e tenho me preocupado muito com as notícias de que se cuida de uma revisão das polícias militares. Se nós marcharmos para soluções emocionais, não estaremos resolvendo o problema, mas talvez criando novos complicadores.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Recolho as ponderações do Senador Josaphat Marinho, fruto da sua grande experiência de vida pública, somando-as exatamente à preocupação que me traz aqui. O Senador Josaphat Marinho resume, de forma muito clara, o que faz parte das minhas preocupações.

Lendo o noticiário da imprensa nos últimos dias, Srs. Senadores, o que me preocupou, de um lado, foi a falta de serenidade no exame de questão tão grave. A impressão que ela dá ao leitor menos acostumado ao exame das questões de políticas públicas é que quando eclode uma crise em qualquer setor da administração pública brasileira surgem imediatamente dezenas de soluções, todas elas radicais, no sentido da profundidade, mudando tudo, uma normalmente em direção oposta à outra. Há, então, muitas vezes, falta de serenidade no exame das questões.

De outro lado - e aí a minha preocupação maior, falando como Líder do Governo -, lançam-se expectativas enormes. A impressão que se tem é que o Presidente da República, agora, para fazer prevalecer a sua autoridade, está obrigado a tomar decisões muito duras, radicais e profundas - S. Exª tem que mudar tudo -, senão não prevalece a sua autoridade.

E eu ainda não consigo pensar assim. Ao contrário, em primeiro lugar temos que imaginar que o art. 144 da Constituição está aguardando a devida regulamentação, que dá lugar a que todos esses pontos de vista sejam analisados - e quero dizer com clareza que não me furto a analisar nenhum dos pontos de vista espojados publicamente...

Lembra-me aqui o Relator da Constituinte, Senador Bernardo Cabral, que a competência de cada uma das forças policiais está absolutamente constante dos parágrafos do art. 144. Mais do que isso: preocupa-me o fato de que decisões, obviamente, terão que ser tomadas.

O Senador Josaphat Marinho, de forma hábil, aborda um problema grave, que é a crise fiscal brasileira - e ela existe. Alguns Estados brasileiros conseguiram, nesses últimos dois, três anos - e os seus respectivos Governadores pagaram até um preço alto de impopularidade pelos ajustes internos que fizeram -ajustar, de certa forma, as contas públicas. Não resta dúvida de que, primeiro, a Constituição de 88 e, depois, o fim da inflação são dois marcos a mudar a administração pública brasileira, só que alguns governantes não quiseram enxergar isso e vão pagar um preço muito alto no final dos seus mandatos.

Quero dizer aqui, de forma bem clara, que, com os dados de que disponho e com os do Ministério da Fazenda, não é de se supor que o ano que vem seja calmo em alguns Estados brasileiros. Haverá um grande déficit em nível das contas públicas. Basta dizer que, no ano passado, tivemos um déficit público de 4,5% do PIB, sendo que 3% destes se deram exatamente no déficit dos Estados - nem no da União, nem no dos Municípios, mas no dos Estados.

Alguns Estados brasileiros vivem momentos de grande dificuldade. Eu diria que alguns deles já conseguiram fazer ajustes, modificar o papel da máquina pública, eliminar excessos, desperdícios, privilégios; conseguiram racionalizar os gastos da máquina pública; alguns, inclusive, já no próximo ano, terão condições até de superar essa situação.

Porém, esses ajustes levam tempo, e não conheço nenhum Estado brasileiro - pode ser que haja, mas será a exceção a confirmar a regra - que já tenha condições, sem reforma tributária, de fazer um ajuste naquelas carreiras típicas do Estado, como deseja também o Governo Federal, e este me parece o cerne da questão, quando, de forma geral ou pontual, tratamos a questão da reforma do Estado brasileiro.

O Estado tem algumas carreiras típicas, como, por exemplo, a segurança pública, a diplomacia, as forças militares, as arrecadações, os serviços de educação e de saúde. Enfim, há alguns serviços públicos que a sociedade brasileira não questiona, mas deseja que sejam efetivamente prestados pelo Estado nos seus diversos níveis.

O Sr. Josaphat Marinho - Pemite V. Exª uma nova intervenção?

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Com o maior prazer, Senador Josaphat Marinho.

O Sr. Josaphat Marinho - Na esteira das suas ponderações, inclua esta observação: pouco importa fazer modificações de profundidade na estrutura das instituições e serviços dos Estados se a estes não forem dados, ao mesmo tempo, os recursos financeiros necessários. Se se proceder a esta modificação antes da garantia dos recursos, as novas instituições incidirão nas dificuldades por que estão passando as atuais.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - O Senador Josaphat Marinho toca em um ponto central, e penso que S. Exª fala não apenas em seu próprio nome, mas também em nome desta Casa, que é a Casa da representação dos Estados.

Essa reforma terá que ocorrer, inclusive porque, como mais uma vez lembra o Senador Bernardo Cabral, haverá futuros Governadores que arcarão com essa responsabilidade. É óbvio que isso terá que acontecer!

Mas a questão fundamental - talvez por isso a reforma tributária não tenha avançado como desejaríamos na Câmara dos Deputados - é que os recursos são finitos e ninguém quer perder. Em um ponto estou certo: a sociedade brasileira não agüenta pagar mais imposto.

No Senado, em termos tributário, vivemos experiências bem sucedidas, quando, por exemplo, da modificação do Imposto de Renda. As alíquotas foram diminuídas e, com isso, aumentou-se a base de arrecadação. O Senado viveu outra experiência extremamente positiva no caso das microempresas, em que também, mais uma vez, simplificaram-se os procedimentos, diminuíram-se as alíquotas e se aumentou a base de arrecadação, elevando-se, portanto, a arrecadação total.

O que se questiona é o seguinte: que destinação se quer dar a esse recurso que é arrecadado pelos três níveis de Governo? Obviamente, essa destinação deverá ter uma reciprocidade com as responsabilidades de cada nível de atuação.

Sr. Presidente, em um ponto estou certo: poucos Estados brasileiros fizeram os ajustes necessários para conseguir, a partir deste momento, remunerar melhor as carreiras típicas de Estado, partindo-se do princípio de que o mercado trataria, de alguma forma, de regular aquelas outras carreiras não típicas. Nesses casos, quando o Estado estiver presente, terá também a concorrência do setor privado. Mas nas carreiras típicas de Estado, não!

É preciso que o servidor público tenha salários dignos. Algumas pessoas questionam o fato de haver funcionários públicos federais sem reajustes há quase três anos. Há alguns Estados brasileiros que não conseguem dar aumento também há mais de três anos. Há governadores que leram Maquiavel de ponta a cabeça e, no seu primeiro dia de governo, fizeram o bem de uma vez só, mas, agora, gastam o mandato fazendo o mal aos pouquinhos. E aí? Como fica o servidor público? Só há um caminho, que é a reforma do Estado trazer para essas carreiras típicas uma remuneração digna. Não há mágica, não há truques, e aqueles que foram governadores sabem: sem uma reforma profunda no aparelho de Estado, não haverá recursos para se remunerar melhor, por exemplo, as forças de segurança pública.

Sr. Presidente, neste primeiro momento, quero, em resumo, dizer que o Congresso Nacional e fundamentalmente o Senado Federal, com a ponderação que se espera - não tenho dúvidas -, não vai faltar à Nação neste momento. Há um desafio à nossa frente. Haverão de ser tomadas medidas claras na área da segurança pública, para que a sociedade volte a sentir tranqüilidade no seu dia-a-dia. Há de se tomar medidas também profundas no sentido de que a disciplina seja mantida; que a hierarquia das forças de segurança sejam absolutamente respeitadas; que os secretários de segurança dos Estados possam, de verdade, comandar as suas forças policiais, todas elas. Hoje não comandam; as crises o demonstraram.

Além disso, no Brasil, há alguns setores da atividade ilícita que merecem um tratamento especial - e está na hora de se ver isso. Falo especificamente sobre o tráfico de entorpecentes. Ora, todos os países que conseguiram, de alguma maneira, tangenciar esse problema, criaram estruturas específicas para tratar do assunto. Não dá para tratar do tráfico de entorpecentes simplesmente com as forças de segurança normais; há que se ter uma estrutura própria, que possa inclusive gerenciar recursos internacionais e dar dimensão à atuação das forças de segurança estaduais.

Segundo os pronunciamentos feitos pelas autoridades do Ministério da Justiça e pelo Presidente da República nos últimos dias, não tenho dúvida de que o Governo Federal, no momento apropriado, com a firmeza que a sociedade exige, mas com a serenidade que lembra aqui o Senador Josaphat Marinho, colocará publicamente para o Congresso Nacional quais os pontos que podem ser discutidos e modificados, para que todos possamos, sem nenhum tipo de política revanchista - até porque todos temos que ter muito respeito pelos cidadãos brasileiros que trabalham nas forças de segurança pública -, ver o problema como um todo e tomar as medidas necessárias ao restabelecimento da ordem, da disciplina e da hierarquia que se deseja.

Não tenho dúvida, Sr. Presidente - e falo não apenas como Líder do Governo, mas como Parlamentar - de que todos os partidos políticos representados no Congresso Nacional estarão prontos a dar a sua contribuição para que essa discussão se dê no tempo mais rápido possível e para que o Congresso Nacional possa dar à sociedade brasileira a resposta que ela deseja; e aos Governos Federal e Estaduais, mecanismos e instrumentos de que necessitam para que as forças de segurança não venham mais manifestar problemas como esses que, obviamente, não fazem parte das expectativas do povo brasileiro.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/08/1997 - Página 15524