Discurso no Senado Federal

AVALIAÇÃO INSATISFATORIA DA ATUAÇÃO DO GOVERNO FEDERAL NA AREA SOCIAL. APELO A CAMARA DOS DEPUTADOS PARA QUE VOTE AINDA ESTE ANO PROJETO DE GARANTIA DE RENDA MINIMA, DE AUTORIA DE S.EXA., EM TRAMITAÇÃO NAQUELA CASA DO CONGRESSO NACIONAL.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • AVALIAÇÃO INSATISFATORIA DA ATUAÇÃO DO GOVERNO FEDERAL NA AREA SOCIAL. APELO A CAMARA DOS DEPUTADOS PARA QUE VOTE AINDA ESTE ANO PROJETO DE GARANTIA DE RENDA MINIMA, DE AUTORIA DE S.EXA., EM TRAMITAÇÃO NAQUELA CASA DO CONGRESSO NACIONAL.
Aparteantes
Emília Fernandes.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/1997 - Página 15692
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • CRITICA, DEMORA, GOVERNO FEDERAL, CUMPRIMENTO, PROMESSA, POPULAÇÃO, MELHORIA, SITUAÇÃO SOCIAL, POPULAÇÃO CARENTE, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA, ASSENTAMENTO RURAL, FAMILIA, BRASIL.
  • EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO DE LEI, GARANTIA, RENDA MINIMA, POPULAÇÃO, TRAMITAÇÃO, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, MELHORAMENTO, SITUAÇÃO SOCIAL, POPULAÇÃO CARENTE, BRASIL.
  • REGISTRO, DESIGNAÇÃO, EMILIA FERNANDES, SENADOR, QUALIDADE, RELATOR, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, PROJETO DE LEI, GARANTIA, RENDA MINIMA, POPULAÇÃO CARENTE, PAIS.

O SR. EDUARDO SUPLICY (BLOCO-PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Governo Fernando Henrique Cardoso ainda não se deu conta da gravidade da crise social por que passa o Brasil.

O Presidente da República e os Ministros da área Econômica e Social, sobretudo, têm afirmado que a estabilidade de preços, a diminuição significativa da inflação e a diminuição do imposto sindical - na medida em que este acaba atingindo principalmente as camadas mais pobres da população - já seriam o suficiente para as pessoas do Governo, como aquele que acaba de ser designado, em Mensagem, pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, para ser o Presidente do Banco Central, o Sr. Gustavo Franco. S. Exª tem sido uma das vozes a dizer, para tranqüilizar o Governo, que a estabilização dos preços é suficiente e que a questão social está resolvida a contento para o estágio atual de dois anos e sete meses de Governo Fernando Henrique Cardoso.

Avaliamos que o progresso nessa área tem sido extremamente moderado, insuficiente, muito aquém daquilo que se poderia ter realizado, especialmente porque se sabe que o Brasil continua sendo um dos campeões da desigualdade econômica e social.

No campo específico da reforma agrária, obviamente uma das áreas onde mais se precisa tomar providências para modificar o atual quadro de distribuição de riqueza, a meta governamental tem sido atingida de forma bastante lenta. Segundo levantamento feito pela Universidade de Brasília, com informações do Incra sobre o assentamento de famílias para 1997, até 30 de junho deste ano, foram assentadas 12 mil 503 famílias. A meta do Governo Fernando Henrique Cardoso era assentar 80 mil famílias.

É possível que esteja havendo uma nova atitude do Ministro Raul Jungmann e do Presidente do Incra, Milton Seligman. Até louvo a ação ocorrida na última semana em Teodoro Sampaio, no Pontal do Paranapanema, onde o Ministro Raul Jungmann e o Presidente do Incra, juntamente com o Governador Mário Covas e o Secretário de Justiça, Belisário dos Santos, anunciaram a edição de um decreto segundo o qual grandes propriedades no Pontal do Paranapanema possam vir a ter definição legal, mediante concessão de 35 a 70% dessas áreas para reforma agrária, para assentamentos do Incra.

Obviamente, isso criou uma expectativa positiva entre os trabalhadores sem terra e representantes do Movimento dos Sem-Terra. Naquela ocasião, os Srs. Gilmar Mauro e José Rainha colocaram que tinham uma expectativa positiva sobre essa ação, mas que era necessário averiguar o que o Governo irá fazer. Por quê? Porque, muitas vezes, o Governo anuncia medidas, mas elas não se concretizam. Isso aconteceu, por exemplo, em relação à possibilidade de o Banco do Brasil ceder financiamento para a fecularia, para o beneficiamento de mandioca, em Sandovalina. Entretanto, até agora a Cooperativa dos Trabalhadores Sem Terra daquela região não pôde utilizar aquela fecularia. A expectativa, portanto, acabou sendo frustrada porque, até o presente momento, óbices de natureza burocrática estão impedindo que haja a efetivação daquilo que foi anunciado já há alguns meses pelo próprio Ministro de Assuntos Fundiários, Sr. Raul Jungmann.

Mas, Sr. Presidente, na área social, o que podemos perceber é que nas mais diversas regiões do País os problemas sociais se acumulam. Na cidade onde moro, São Paulo, podemos perceber continuamente o problema das famílias que ali chegam dos mais diversos lugares do Brasil com a esperança de encontrar emprego, com a esperança de encontrar um local para moradia. Entretanto, a cada dia centenas, milhares de pessoas passam a morar em condições extremamente precárias, haja vista o levantamento feito pela Universidade de São Paulo, publicado no jornal O Estado de S.Paulo do último final de semana.

Segundo os dados do estudo, o número de pessoas que vivem em favelas vem crescendo aceleradamente e a oferta de edificações para moradia tem sido menor. Isso vem ocorrendo no centro econômico mais importante do Brasil. Não é à toa que a cada momento surgem movimentos de luta por moradia digna. O movimento pela moradia tem como adeptos aqueles que, ainda hoje em São Paulo, ocupam uma casa, o chamado casarão da Rua do Carmo nº 88. Lá estão mais de 80 famílias aguardando a possibilidade de um entendimento diante da ordem de reintegração de posse dada por um juiz. Desde às 8h de hoje as 80 famílias estão dialogando com o Governo Mário Covas e com o Secretário da Casa Civil, Walter Feldman. Estive no local esta manhã, durante algumas horas. Algumas famílias solicitaram ao Sr. Flávio, representante do Governo, autorização para visitar o local para onde seriam destinadas provisoriamente, no Cetren.

Uma vez ali chegando, acompanhando a comissão de moradores, o Promotor Público e assistentes sociais, pudemos constatar que não havia número de vagas suficiente para que, mesmo que precariamente, aquelas 80 famílias pudessem ter uma moradia, mesmo na situação de albergue - situação destinada aos mais pobres da cidade, aqueles que praticamente habitam as ruas da Grande São Paulo.

Parece que não há senso de urgência no Governo Fernando Henrique Cardoso para a resolução dos problemas dos mais pobres neste País.

Ainda ontem, conversava com o Professor Mununga, da Universidade de São Paulo, que se tem preocupado com a questão dos negros, particularmente. O professor Canembeb Mununga tem coordenado estudos na Universidade de São Paulo e em outras áreas sobre o que se fazer para compensar toda a população descendente de escravos que, por mais de três séculos, contribuiu para a acumulação de riqueza neste País, sem que lhe fosse dada a devida dignidade, a remuneração, o direito devido à educação, à saúde, o direito à vida condigna. Conversava sobre o Programa de Garantia de Renda Mínima, que seria justamente uma das medidas que, avalio, deveriam ser tratadas com maior urgência por este Congresso Nacional.

Na abertura dos trabalhos deste semestre, Sr. Presidente, quero dizer que é a minha expectativa que possa o Congresso Nacional - o Senado Federal, de um lado, e a Câmara dos Deputados, de outro - votar o Projeto de Garantia de Renda Mínima, que se encontra, hoje, tramitando por formas diferentes em ambas as Casas. Gostaria de salientar que o Senado Federal, em 16 de dezembro de 1991, após quatro horas e meia de debates, aprovou o projeto que institui o Programa de Garantia de Renda Mínima, um Imposto de Renda negativo a toda pessoa de 25 anos ou mais cuja renda não viesse a atingir determinado patamar, atualmente em torno de R$270,00, que passaria a ter o direito a um complemento de renda.

Esse projeto, que recebeu parecer favorável do Deputado Germano Rigotto, do PMDB do Rio Grande do Sul, encontra-se pronto para ser votado na Comissão de Finanças e Tributação, e recebeu inclusive algumas emendas a partir das experiências positivas ocorridas no Distrito Federal, com o Projeto Bolsa-Escola, e em Campinas, com o Projeto de Garantia de Renda Familiar, ambos relacionados a oportunidades de educação, bem como em Ribeirão Preto e outras cidades que instituíram projetos nesse sentido.

Também recebeu emendas do Deputado Germano Rigotto, afirmando que os beneficiários do Projeto de Renda Mínima, caso tenham crianças em idade escolar, deverão demonstrar que elas, efetivamente, freqüentam a escola.

A partir de 1995, surgiram outros projetos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, dos Deputados Nelson Marchezan, Chico Vigilante, Pedro Wilson, Fernando Ferro, Zaire Rezende, e dos Senadores Ney Suassuna, José Roberto Arruda e Renan Calheiros, todos instituindo alguma forma de bolsa-escola ou de renda mínima e procurando criar oportunidades de as famílias carentes estarem com as suas crianças freqüentando a escola, uma maneira de se quebrar o círculo vicioso da pobreza em nosso País.

Esse projeto recebeu parecer favorável do Deputado Osvaldo Biolchi e, na forma de um substitutivo, foi aprovado consensualmente em dezembro último, na Câmara dos Deputados. Veio em seguida para o Senado e aqui, na Comissão de Assuntos Sociais, recebeu parecer favorável do Senador Lúcio Alcântara - houve uma proposta de modificação por parte da Senadora Marina Silva -, mas recebeu preferência o substitutivo do Senador Lúcio Alcântara e, agora, foi para a Comissão de Educação.

Gostaria de registrar, Sr. Presidente, que na Comissão de Educação o Presidente Artur da Távola designou como Relatora desse projeto a Senadora Emilia Fernandes, que, desde então, estudou seriamente a proposição e está em vias de concluir o seu parecer, inclusive tendo dialogado comigo e com assessores de meu gabinete. Além disso, assessores de ambos os gabinetes têm dialogado com a assessoria econômica do IPEA e do próprio Governo.

Tenho muita confiança, esperança mesmo, de que a Senadora Emilia Fernandes, com o trabalho extremamente sério que está realizando, apresentará à Comissão de Educação um parecer que merecerá a consideração a mais responsável desta Casa.

Avalio que poderemos, no Senado Federal, considerar as contribuições havidas nos projetos todos, consubstanciadas de alguma forma no parecer do Senador Lúcio Alcântara, levando em conta também o debate que se produziu com o conterrâneo da Senadora Emilia Fernandes, Deputado Germano Rigotto. Houve uma contribuição de experiências múltiplas, de caráter municipal e regional, que agora estão a merecer consideração mais completa.

A Srª Emilia Fernandes - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Com muita honra, Senadora Emilia Fernandes.

A Srª Emilia Fernandes - Em primeiro lugar, gostaria de cumprimentá-lo, mais uma vez, pela dedicação, pela insistência e pelo desejo que V. Exª tem manifestado, concretamente, de apresentar a este País, e principalmente às populações mais carentes, mais necessitadas, mais desassistidas, uma proposta de igualdade, de justiça e de cidadania, que é o que significa o seu Projeto de Renda Mínima. Existem projetos semelhantes ao seu, mas que apresentam algumas diferenças da idéia que V. Exª construiu e vem construindo, com uma visão de Municípios e de Estados que já adotaram esse sistema como alternativa de integração das pessoas à vida digna de cidadãos. De posse de um trabalho amplo e detalhado - resultante de contatos permanentes não apenas com V. Exª, com as lideranças e a assessoria do seu Partido, mas com outros Srs. Deputados autores de projetos, como o Deputado Nelson Marchezan, do Rio Grande do Sul, e o Deputado Osvaldo Biolchi -, queremos apresentar, como proposta do Senado Federal ao Brasil, o mais breve possível - e esse é o nosso compromisso -, o resultado dessa análise criteriosa de quatro projetos que estão apensados e que tratam praticamente do mesmo assunto. Acreditamos e temos esperança, como disse V. Exª, de que os nobres Pares desta Casa possam avaliar e analisar o conteúdo desse projeto - cuja idéia é, sem dúvida, de V. Exª - com a responsabilidade e a atenção que ele merece.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Senadora Emilia Fernandes, dada a responsabilidade com que V. Exª vem estudando a matéria, tenho a convicção de que está assimilando de tal maneira essa proposição que será mais uma pessoa a defendê-la, com o poder de sua extraordinária voz e de sua influência. Desde que chegou no Senado, V. Exª conseguiu granjear extraordinário respeito de seus Pares pela seriedade com que trata cada matéria que lhe chega às mãos.

V. Exª percebeu, desde pronto, que o Projeto de Garantia de Renda Mínima poderá ser uma das maneiras - no meu entender, das mais eficazes - de contribuirmos para que ocorra o que está no art. 3º da Constituição brasileira, que estabelece que o objetivo fundamental da Nação é a erradicação da miséria, a melhoria da distribuição da renda e da riqueza, a diminuição das desigualdades socioeconômicas regionais.

Assim, tenho a certeza de que compreendeu perfeitamente como o projeto de garantia de renda mínima, ao estabelecer que é direito de todas as pessoas estarem participando minimamente da riqueza de uma nação, que é próprio de cada família poder ter pelo menos o suficiente para que as suas crianças freqüentem a escola ao invés de terem que se submeter ao trabalho em idade precoce, o que lhes inviabiliza a possibilidade de estarem estudando, enfim, coisas que certamente deveriam estar na primeira ordem de prioridades.

Tenho a convicção de que é tempo e é hora, dado inclusive às experiências havidas, para que o Senado Federal conclua a votação dessa matéria, assim como também para que a Câmara dos Deputados complete o exame da matéria e isso se torne realidade no Brasil.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/1997 - Página 15692