Discurso no Senado Federal

IMPRESCINDIVEL REVITALIZAÇÃO DO SUS - SISTEMA UNICO DE SAUDE, COMO GARANTIA DE ATENDIMENTO DE QUALIDADE A POPULAÇÃO BRASILEIRA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • IMPRESCINDIVEL REVITALIZAÇÃO DO SUS - SISTEMA UNICO DE SAUDE, COMO GARANTIA DE ATENDIMENTO DE QUALIDADE A POPULAÇÃO BRASILEIRA.
Publicação
Publicação no DSF de 09/08/1997 - Página 15988
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, PROGRAMA, MINISTERIO DA SAUDE (MS), CONSOLIDAÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), OBJETIVO, AMPLIAÇÃO, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO.
  • ANALISE, PROBLEMA, SAUDE PUBLICA, BRASIL, COMENTARIO, PROCESSO, GLOBALIZAÇÃO, SETOR, SAUDE.
  • APREENSÃO, INDICE, OCORRENCIA, ENDEMIA, EPIDEMIA, FALTA, VACINA, IMUNIZAÇÃO, DOENÇA TRANSMISSIVEL, CRIANÇA.
  • DEFESA, AUMENTO, RECURSOS, SAUDE PUBLICA.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com esperança, devemos, ou deveríamos, comemorar hoje o Dia Nacional da Saúde, decretado que foi pelo Presidente da República o ano de 1997 como "O Ano da Saúde no Brasil". Recursos adicionais foram alocados para o setor com o recolhimento da CPMF, visando a dar um alívio aos problemas básicos de saúde que enfrenta o povo brasileiro. Mas, apesar da arrecadação da CPMF, o Governo nunca investiu tão pouco na saúde. Neste ano, o Governo investirá menos recursos per capita na saúde do que em 1995. E fala-se, agora, em prorrogar a CPMF, diluindo a sua destinação. Podemos imaginar a angústia do Ministro Adib Jatene, que passou a sua gestão trabalhando junto ao Presidente da República e aos parlamentares, no sentido de encontrar uma solução para os graves problemas de recursos que enfrentava o setor da saúde no País. 

O lançamento de um programa, no início do ano, traduziu, em linhas gerais, as diretrizes políticas a serem adotadas pelo Ministério da Saúde para a concretização do Plano do Governo. O programa tinha como meta a implementação de medidas vitais para a consolidação do SUS e para o desenvolvimento social. A revitalização do SUS é imprescindível para garantir a universalidade, a integralidade, a eqüidade e a descentralização na assistência médica, a fim de que todos os brasileiros sejam atendidos com segurança e tranqüilidade.

A princípio, o Ministério da Saúde se propôs a ser o gestor nacional do Sistema, comprometendo-se a transferir, aos poucos, para os Estados e Municípios a responsabilidade pela saúde da população brasileira. O novo sistema gerencial teria como base o financiamento estável, a descentralização dos serviços, a reestruturação interna e a fiscalização permanente da aplicação de recursos.

Estabeleceu o Ministério ações e metas prioritárias a serem cumpridas nos anos de 1997/1998, divididas em três grandes frentes: prevenção com ênfase no atendimento básico; melhoria da qualidade dos serviços de saúde; e mutirão social pela saúde. Já estamos no segundo semestre do ano e esperamos, sinceramente, que o Ministério esteja executando o plano que soube tão bem elaborar.

Temos assistido, Sr. Presidente, a um agravamento geral da crise da saúde pública no País, com o sucateamento e a superlotação de hospitais públicos, incapazes de atender à demanda. Uma crise estrutural e profunda que atinge, sempre, os mais humildes, os que não podem pagar um plano de saúde. Lamentável, por exemplo, o fechamento do Hospital das Clínicas em Belo Horizonte, modelo de Hospital Universitário, que atendia gratuitamente a grande parte da população da capital e de todo o Estado de Minas Gerais.

Presenciamos sérios problemas de saúde pública agravados pela extensão de nosso território e pelas peculiaridades de cada região. Com o êxodo rural, as características das doenças mudaram. Diminuíram as doenças infecciosas e parasitárias e aumentaram as crônico-degenerativas, especialmente as relacionadas com o coração.

Sabemos que o SUS não conta com os recursos de que deveria dispor de acordo com as normas constitucionais. Seus recursos advêm do que dispõe a Lei de Diretrizes Orçamentárias, ano a ano. Em saúde gasta-se pouco e mal. Não há fiscalização.

A globalização, Sr. Presidente, vem atingindo os serviços de saúde, em que a cobertura estatal diminui, dando lugar ao setor privado. Em 1995, os países industrializados destinaram, em média, 10,4% do PIB aos cuidados da saúde, enquanto no Brasil o Governo considera excessivo os menos de 3% a eles destinados. Em diversos países, assistimos a uma disputa por pacientes estrangeiros. Cuba, por exemplo, une turismo e saúde, por meio dos serviços de sua empresa Servimed, atraindo, por preços módicos, pacientes de todo o mundo, especialmente para tratamento de diversas doenças dermatológicas.

O mesmo acontece nos Estados Unidos, em Dallas, Houston e Boston, com suas indústrias de saúde. Assis Moreira, na Gazeta Mercantil de 17 de junho passado, cita o Embaixador Rubens Ricúpero, que, na reunião da Unctad, agência da ONU que se ocupa do desenvolvimento por meio do comércio e do investimento, disse: "Essa reunião aborda um tema pioneiro, porque saúde é um negócio de trilhões de dólares, o que demonstra que saúde não se limita apenas a uma questão política ou social, mas que é também uma questão econômica e comercial, com um dos crescimentos mais rápidos da economia".

A Unctad acha que a globalização vai derrubar restrições em muitos países e abrir o mercado para empresas estrangeiras, provavelmente mediante apólices de seguros, públicas ou privadas.

Sobre o mesmo tema falou o Dr. José Aristodemo Pinotti, em artigo publicado em O GLOBO de 14 de julho, quando enumerou, referindo-se ao que está para se concretizar a um só tempo: "a privatização do sistema público de saúde, um substancial aumento do mercado e do lucro dos planos e seguradoras de saúde que se internacionalizarão e a desincumbência governamental de um setor que sempre incomodou o Governo e para o qual ele foi sempre incompetente, que é a saúde".

É verdade que temos alcançado alguns progressos no setor. A UNICEF reconhece que o Brasil vem combatendo a desnutrição com programas diversos, mas não podemos negar que ela persiste como causa grave de incapacitação para milhares de brasileiros carentes de proteínas e calorias. O Brasil tem procurado suprir a deficiência de vitamina A em menores de dois anos, o que pode evitar a morte de milhares de crianças, a deficiência alimentar e até mesmo a fome, mas não é suficiente para a resolução total do problema.

Em 1994, por exemplo, 59% das crianças brasileiras em áreas de risco receberam suplementação, o que salvou 9 mil e 700 crianças. Mas, se o programa tivesse atingido uma superfície maior, outras 6 mil e 800 vidas poderiam ter sido salvas.

Outro setor em que o Brasil se vinha destacando era a erradicação de doenças por meio da vacinação em massa de sua população infantil. A poliomielite é um exemplo. Outras doenças, como o sarampo, que pode trazer seqüelas graves; a pneumonia, que constitui a principal causa isolada de morte de crianças em todo o mundo; a coqueluche, o tétano, a difteria, a tuberculose precisam ser amplamente cobertas pelos programas de imunização. Embora o Governo tenha prometido ampliar a cobertura dos atuais 70% para 95% das crianças menores de um ano, o que vemos nos postos de saúde, inclusive no Distrito Federal, é a falta de vacinas. Crianças sem vacinação, expostas a todos os riscos de contraírem doenças infecto-contagiosas por descaso total do poder público.

A região metropolitana de São Paulo, por exemplo, acusa a pior epidemia de sarampo dos últimos anos, conseqüência da escassez de vacinas na década de 80. Foram confirmados, no início de julho, 1.193 casos da doença. Cinco crianças morreram. É a rotina da ausência de vacinas no País.

O mero acesso à água limpa e a noção de princípios de educação sanitária, como uso de latrinas, lavagem das mãos antes da manipulação de alimentos, condições higiênicas para o preparo e a estocagem de produtos alimentícios, são itens que podem diminuir doenças entre a população. O Brasil, por exemplo, tem 70% de suas cidades com água potável e 30% com esgotos. 

O mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue e da febre amarela vem sendo combatido, sem sucesso, pelas autoridades sanitárias. Embora tenham declinado os números de pessoas infectadas pela cólera (cerca de 5 mil casos confirmados e 96 óbitos em 1995) e pela malária, essas doenças ainda constituem preocupação para as autoridades sanitárias. Só no ano passado, registramos 170 mil novos casos de dengue, o maior índice do continente americano. E os de casos de leishmaniose, de leptospirose? Todos em crescimento no País. São endemias e, até mesmo, epidemias, que voltam a assustar os brasileiros. E os casos de hepatite? Mais de 70% da população do Rio Branco, no Acre, está infectada com o vírus da hepatite. Falta vacina contra a hepatite B e faltam remédios indispensáveis ao tratamento das hepatites B e C. Casos de hepatite D (de Delta) com sintomas parecidos com o do vírus Ebola, já foram confirmados em vilarejos do Vale do Baco.

Em 1995, foram notificados cerca de 90 mil casos de tuberculose, o que só nos pode causar preocupação, uma vez que já estivemos bem perto do controle total dessa doença. O Governo promete executar ações estratégicas em 230 Municípios, onde se concentram 75% dos casos. A tuberculose, Sr. Presidente, é prova de miséria, de falta de higiene, o que nos compromete seriamente. 

Em 1993, segundo dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, mais de 4 mulheres brasileiras morreram, diariamente, em função de complicações de gravidez, parto e puerpério, o que nos deixa em situação deprimente em face de países civilizados. Constrangedor também é saber que o parto é maior causa de internação de meninas de 10 a 14 anos.

A prevenção de doenças no Brasil vem sendo feita especialmente mediante o Programa de Agentes Comunitários da Saúde -- PACS e o Programa Saúde da Família -- PSF, que utilizam pessoas da comunidade e equipes de médicos e paramédicos que se deslocam até as casas dos doentes e procuram tratá-los em suas residências, o encaminhamento para hospitais só sendo feito em casos que de fato requerem a internação. Em alguns Estados, como Ceará, Maranhão e Pernambuco, esses programas vêm obtendo êxito acima do esperado.

O Brasil, Sr. Presidente, precisa se conscientizar de que só estará colocado entre os países realmente civilizados, quando conseguir descentralizar, com seriedade, os serviços de saúde e der atenção especial à prevenção de doenças.

Com dificuldade conseguimos aprovar o SUS, pelo qual precisamos lutar, para a manutenção de um mínimo de seriedade nos programas de saúde pública brasileira. É preciso, porém, estabelecer mecanismos novos de financiamento da saúde. Recursos de Seguridade Social e percentagem fixa dos orçamentos fiscais da União, dos Estados e dos Municípios precisam, com urgência, ser alocados definitivamente para a saúde. Só assim começaremos a ter condições de dar a todos os brasileiros um serviço de saúde digno, a que todos têm direito.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/08/1997 - Página 15988