Discurso no Senado Federal

HISTORICO DA QUESTÃO BRASIL/ARGENTINA. DISCORDANDO QUANTO A IMPORTANCIA DADA A PARTICIPAÇÃO DO BRASIL NO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • HISTORICO DA QUESTÃO BRASIL/ARGENTINA. DISCORDANDO QUANTO A IMPORTANCIA DADA A PARTICIPAÇÃO DO BRASIL NO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU.
Publicação
Publicação no DSF de 21/08/1997 - Página 16967
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • CRITICA, CONVITE, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), INGRESSO, ARGENTINA, ORGANIZAÇÃO DO TRATADO DO ATLANTICO NORTE (OTAN), CONSELHO DE SEGURANÇA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), EXCLUSÃO, BRASIL, MOTIVO, PRETENSÃO, PROVOCAÇÃO, DESTRUIÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, o Senador José Sarney praticamente esgotou a matéria com seu competente pronunciamento feito hoje sobre essa importante situação Brasil/Argentina.

Vejo-me na obrigação de falar sobre essa matéria, porque sinto-me a ela vinculado há longo tempo. Lá no nosso Rio Grande do Sul, na fronteira Brasil/Argentina, essa questão vem ao longo do tempo e ao longo da história. A amizade entre Brasil, Argentina e Uruguai sempre existiu. No entanto, no plano internacional ou central das nações se fazia sentir a existência de um conflito inevitável entre Argentina e Brasil.

A fronteira do Rio Grande pagou um preço muito alto. Há pouco tempo, metade do Exército brasileiro estava na fronteira do Rio Grande do Sul com a Argentina. Há cidades, como Santiago, com quatro quartéis federais do Exército, e Alegrete, com três quartéis federais.

Sr. Presidente, quando Ministro no Governo Sarney, participei das reuniões, quando iniciamos um relacionamento fraterno da Argentina como o Brasil. Como Governador do Rio Grande do Sul, continuei esse trabalho, que resultou na primeira integração absoluta Brasil/Argentina, seguida pela criação do Mercosul.

Vemos o êxito do Mercosul, percebemos que se trata de uma referência mundial e ficamos preocupados com as questões e questiúnculas que estão querendo se formar.

É impressionante, mas nossos irmãos dos Estados Unidos, com quem os povos da América Latina têm tantos laços fraternos de respeito e de amizade e com os quais nós, brasileiros, nunca tivemos nenhum tipo de conflito, parece que não gostaram do Mercosul. Desde o início, vêm-nos olhando com certa restrição. Primeiramente, criaram o mercado entre Estados Unidos, Canadá e México, o que é um direito . Depois, criaram a ALCA, que é a integração de todos os países americanos sem fronteira.

A América Latina, notadamente a América do Sul, compreensivelmente na reunião de Salvador - o Senado se manifestou e votou uma moção nesse sentido -, disse: "Devagar com a ALCA. Ainda não é tempo disso. Deixe-nos consolidarmos no Mercosul, para termos condições de abrir as nossas fronteiras para o titã dos Estados Unidos entrar e sair ao seu bel-prazer".

Como ficaria nossa indústria, nossa agricultura? Quais são as condições de competição? Esse é um debate que deve ser lançado, que pode ser tido com meta futura, mas não como eles queriam, de aceitação imediata. De lá para cá, há essas questões, essas restrições e essas interrogações.

Como bem disse o Senador José Sarney, acho normal o fato de o Brasil pertencer ao Conselho de Segurança Nacional. S. Exª colocou bem o Brasil, o Japão, a Índia, a Alemanha. Só não vejo importância nisso para nós. Não acho que seja uma condição fundamental pertencermos a um conselho que hoje, sabemos, tem um papel quase trágico. Na verdade, na verdade, tem o comando praticamente isolado dos Estados Unidos e com os outros países, não mais do que consentindo. Mas daí a um debate como este: pertence ou não pertence; não querendo não pertence, não há problema algum virem os Estados Unidos pinçar, afirmando que na América o seu aliado preferido do coração em questão de armamento é a Argentina, a qual vai fazer parte da Organização da OTAN. Qual o objetivo de os Estados Unidos afirmarem isto? Qual a razão disso? É um ato de provocação. Para mim, também não tem problema. Não vejo por que a Argentina, fazendo parte da OTAN vai alterar os rumos da América Latina. Qual o interesse dos Estados Unidos? As manchetes dos jornais estão publicando que os Estados Unidos estão estimulando, hoje, a produção das mais modernas armas atômicas.

Está havendo um estímulo dos Estados Unidos à modernização do seu parque de equipamento atômico. Por quê? Que haja uma modernização, que o americano entre na luta da busca espacial...Marte e tudo mais...ótimo! Mas num Brasil como esse, num mundo como esse, onde há a hegemonia americana total e absoluta sem segundo... Para que falar em dar mais verba para a modernização do parque atômico dos Estados Unidos? E para que - como disse o Presidente José Sarney, a exposição de armas moderníssimas, aqui, no Brasil - convidar os sul-americanos para conhecerem a fim de desenvolver o parque de vendas de armas dos Estados Unidos? Para que isso? Qual a razão disto? Se o americano sempre disse que deseja a América Latina em paz e tranqüila... Houve até um presidente que, em uma declaração infeliz, declarou que este quintal deveria estar sereno para os Estados Unidos. Existem democracia, liberdade e desenvolvimento. Aqui nunca esteve tão tranqüilo, pois não há os regimes de ditadura e de força que os americanos estimularam e deram força neste Cone Sul. Existe democracia, atualmente? Óbvio que há. É uma tranqüilidade, onde não há espaço para inventarem o perigo de Fidel Castro, de Cuba, do comunismo, ou de qualquer coisa. O ambiente é absolutamente calmo. Por que estimular, portanto, uma questão como esta entre Brasil e Argentina?

Sr. Presidente, penso que a resposta do Presidente Fernando Henrique foi serena; no entanto, a manifestação do Presidente Menem não foi feliz. Alguém cobrou - inclusive a imprensa - que o nosso Presidente deveria ter sido mais duro e enérgico. Penso que Sua Excelência agiu com a competência de um estadista. Penso que eles se encontrarão daqui a alguns dias, provavelmente, sem que tenhamos conhecimento disso. Essa reunião deverá ser séria, profunda e responsável. Talvez, não seria necessária a presença de ambos os presidentes, pois se deixaria a reserva desse assunto aos respectivos embaixadores que equacionariam o problema.

O Sr. Romeu Tuma (PFL-SP) - A reunião já está programada.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS) - Conforme diz o Senador Romeu Tuma, já está programada, e acho da maior importância. Isso tem que desaparecer. Temos que mostrar competência para que os norte-americanos entendam que não aceitamos essas picuinhas. Se não tivermos competência para isso, vamos ficar à disposição dos americanos. Sabemos que para nós, Brasil, não dá vantagem nenhuma e para eles, Argentina, também não.

Ora, Sr. Presidente, eu me lembro de quando iniciamos o diálogo Brasil-Argentina. Naquela época, comprávamos dois milhões de toneladas de trigo: um milhão do Canadá, um milhão dos Estados Unidos e zero da Argentina. Hoje, praticamente, somos o grande importador do trigo argentino, mais de dois milhões de toneladas. Hoje somos um grande importador de petróleo argentino, coisa que era considerada ridícula quando nos reunimos naquela vez, o Presidente José Sarney e nós, seus Ministros.

Quando falei em petróleo e em trigo, as pessoas arregalaram os olhos e não conseguiram entender o que era aquilo. Pois eu falei em trigo e em petróleo. E eu disse exatamente isso: "Se queremos buscar o entendimento". O então Ministro das Relações Exteriores, o Sr. Olavo Setúbal, argumentava: "Mas o Simon, que é o Ministro da Agricultura, lá do Rio Grande do Sul, está dificultando esse entendimento porque eu quero trazer mais maçãs da Argentina. E o Simon está dizendo que compete com as maçãs de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Eu estou querendo trazer mais outros produtos da Argentina e o Simon está dizendo não." O Presidente José Sarney se virou para mim e disse: "Simon, logo tu que é gaúcho!" Eu disse: "Não, Presidente, não é isso. Podem trazer maçãs, podem trazer o que quiserem. Só acho que não devem trazer sem avisarem antes. Olha, em tal data, vai haver tanto de produto argentino.

Sr. Presidente, se queremos iniciar um diálogo com a Argentina não pode ser na base da maçã. Estamos importando 2,5 milhões de toneladas de trigo dos Estados Unidos e Canadá e não compramos um quilo da Argentina. Importamos milhões de dólares de petróleo do Oriente e de outros países e não importamos uma tonelada de petróleo da Argentina, que é exportadora. V. Exª quer ir, Sr. Presidente, e ser recebido? Quer dar uma batida na mesa e ser recebido como o grande líder na Argentina e iniciar o entendimento? Então, diga: eu vim aqui para comprar petróleo, para comprar trigo. E foi o que aconteceu. Fomos lá dizendo que queríamos comprar petróleo e trigo. O diálogo se iniciou. E olha a prosperidade deles, Sr. Presidente.

Por isso, penso que o Presidente do Brasil e o Presidente da Argentina têm a obrigação - porque nós, brasileiros, nós argentinos, queremos isso - de se entenderem, de buscarem o entendimento e que, nesse entendimento, o americano tenha a resposta que merece a um ato infeliz, deselegante, desnecessário - os americanos estão tão por cima, têm tanta força, têm tanto poder que não precisavam mexer nos seus irmãos mais fracos aqui do sul, quando estamos começando um projeto de sobrevivência nessa globalização. E os nossos irmãos do norte têm uma atitude completamente incompreensível como essa. Feliz e competente o pronunciamento do ex-Presidente José Sarney.

Sou daqueles que acreditam que o Senado tem essa responsabilidade. O Senado viveu um grande momento hoje, porque aqui nós, Senadores, temos essa responsabilidade com relação à política internacional.

Espero que o Presidente vá adiante. Para mim, que não dou importância a essas questões de Conselho de Segurança ou de OTAN, para mim, que penso que a nossa integridade, a nossa intimidade, a nossa confraternização e desenvolvimento econômico e social Brasil- Argentina e demais países da América é muito mais importante do que isso, penso que o que a Argentina quer, e o que o Brasil quer é que os dois Presidentes façam um entendimento imediatamente, Sr. Presidente. E que a resposta seja um abraço de solidariedade e um recado aos Estados Unidos para que se acautelem, porque eles não haverão de impedir a integração e o desenvolvimento da América Latina.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/08/1997 - Página 16967