Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM A OMISSÃO DAS AUTORIDADES DIANTE DE UM IMINENTE CONFLITO ARMADO ENTRE OS SEM-TERRA E OS PROPRIETARIOS RURAIS.

Autor
Lúdio Coelho (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Lúdio Martins Coelho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • PREOCUPAÇÃO COM A OMISSÃO DAS AUTORIDADES DIANTE DE UM IMINENTE CONFLITO ARMADO ENTRE OS SEM-TERRA E OS PROPRIETARIOS RURAIS.
Aparteantes
Edison Lobão.
Publicação
Publicação no DSF de 23/08/1997 - Página 17238
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, INVASÃO, CONFLITO, POSSE, TERRAS, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA.

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto à tribuna do Senado para tratar de um assunto já diversas vezes abordado neste plenário. Refiro-me à Reforma Agrária e às invasões de terra.

A Nação brasileira toda vem assistindo; nesses últimos dias, a declarações das lideranças dos Srs. sem-terra comunicando que vão invadir propriedades e que vão invadir bancos, condicionando a não-invasão ao atendimento de suas solicitações de crédito.

Ontem e hoje, na televisão, os nossos irmãos da UDR e do Movimento dos Sem-Terra mostraram seus armamentos de briga - balas compridas - adequados para uma luta que poderá ser travada entre irmãos brasileiros.

Quero dizer à Nação brasileira e ao Senado Federal que os Poderes constituídos do nosso País não têm o direito de se omitir diante dessa situação. O Presidente da República, o Presidente do Supremo Tribunal Federal e o Presidente do Congresso Nacional não têm o direito de se omitir e de aceitar que haja uma luta entre irmãos nossos por omissão. Não concordo com isso. Não aceito isso.

Vamos aceitar que nossos irmãos troquem tiros e se assassinem mutuamente, dando conhecimento à Nação, por antecedência, que pretendem praticar uma luta armada? Onde é que estamos? Não entendo essa omissão! É necessário que evitemos essa ocorrência.

Tenho meditado muito - sou um Senador ainda novo - sobre o que está ocorrendo. Não podemos aceitar uma justiça para a área rural e outra para a área urbana, nem que que se desrespeite o direito de propriedade na área rural e que certas pessoas comuniquem, com antecedência, a invasão de propriedades, às vezes exploradas há séculos por pessoas que enfrentaram o sertão.

Há mais de 50 anos, conheço o Pontal do Paranapanema e pessoas que, como eu, contraíram malária. Conheço pessoas que se sacrificaram desbravando o sertão e hoje são desrespeitadas no seu mais legítimo direito de propriedade.

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Senador Lúdio Coelho, V. Exª me concede um aparte?

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB-MS.) - Com todo o prazer, Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Senador Lúdio Coelho, com o seu discurso, V. Exª chama a atenção dos Poderes da República para a gravidade do problema que estamos vivendo no campo. Creio que V. Exª não exagera em nada a que alude nesta manhã de sexta-feira. Em verdade, estamos diante da possibilidade até de uma guerra civil, de um confronto de grandes proporções. O que é pior: confronto permanentemente anunciado; anunciado muito mais pelo Movimento dos Sem-Terra do que pelos proprietários de terras, que sempre alegam que se encontram na defensiva, procurando proteger a sua propriedade e os seus bens. Não podemos deixar de admitir que o Presidente da República, Dr. Fernando Henrique Cardoso, tem manifestado interesse crescente na reforma agrária. Basta examinar os números, para que se chegue a essa conclusão. Todos os Governos passados, somados, distribuíram algo em torno de 250 milhões de hectares. O Presidente Fernando Henrique Cardoso, até o momento, com dois anos e meio de governo, já distribuiu 204 milhões de hectares. Então, verifica-se por aí a intensidade da penetração de Sua Excelência no que diz respeito à reforma agrária. Porém, os resultados não são correspondentes à sua ação, por um lado. E, por outro lado, em verdade, observa-se que falta uma palavra mais enérgica no sentido de pôr cobro a esse movimento que tantas ameaças à tranqüilidade nacional está causando. Portanto, junto-me a V. Exª na manifestação dessas preocupações com o futuro deste País. Com esses movimentos de sedição, em primeiro lugar, vamos acabar desorganizando a produção agrícola deste País e, em segundo lugar, estamos à beira de um confronto de proporções indizíveis no campo, que, realmente, poderá ter conseqüências danosas até no meio urbano. Cumprimentos a V. Exª.

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB-MS) - Senador Edison Lobão, agradeço seu aparte.

V. Exª colocou muito bem o esforço que o Presidente Fernando Henrique está fazendo pela reforma agrária. Concordo plenamente que Sua Excelência deseja fazer uma reforma agrária.

Entretanto, V. Exª também declarou que não podemos nos omitir. Penso que a Nação brasileira precisa definir o que deseja a esse respeito. A reforma agrária que se está pretendendo implantar no País, da maneira como está sendo feita, não tem nada a ver com agricultura, com produção agrícola - quero dizer isso à Nação com toda a clareza.

No século XX, até a agricultura está sendo comandada pela informática, como podemos pensar em reforma agrária trabalhando com enxada e foice?

Um dia desses, visitando uma propriedade agrícola, no Pantanal de Miranda, no Mato Grosso do Sul, fiquei feliz em ver um equipamento comandado por raio laser aplainando a terra; equipamento dos mais modernos. Nunca pensei que aquilo pudesse estar sendo aplicado lá.

As gerações futuras do nosso País não vão conhecer foice. Foice e enxada são equipamentos do passado. Esse pessoal não sabe colocar cabo em uma enxada e nem em uma foice. Eles nunca tiveram que fazer isso.

O que está se pretendendo na Nação brasileira é colocar o pessoal desempregado em relação às conseqüências da globalização da economia brasileira.

No Plano Real, esses ajustamentos estão penalizando setores importantes da sociedade brasileira. Então, estamos procurando aproveitar pessoas do campo por estarem desempregadas. Estou de pleno acordo que precisamos cuidar desse pessoal. Creio que talvez seja uma saída. Mas assistimos a isso em outros lugares do mundo.

Quando terminou a guerra do Vietnã, tiraram da sua capital cerca de um milhão de pessoas e as tocaram para o campo como se toca rebanho.

Na China, morreram mais de 30 milhões de chineses, quando fizeram aquela reforma enorme e jogaram no campo as pessoas de qualquer maneira.

E nós, aqui, estamos querendo fazer uma reforma agrária pertencente ao passado.

Então, não podemos ter duas justiças: uma, para a área urbana; e outra, para a área rural.

Imaginem se aqui, na cidade, um grupo de pessoas anunciassem que iriam invadir o supermercado para saqueá-lo, tomar conta dele e colocar fogo, como fizeram nas propriedades rurais de São Paulo. Naturalmente, as áreas de segurança impediriam que isso acontecesse. Mas estamos assistindo, de braços cruzados, a essas ameaças, que podem se transformar em conflito nacional.

Hoje, vim de Campo Grande, onde pude constatar a existência de cartazes, outdoors, divulgando que somos nós que produzimos alimentos para sustentar a área urbana e, por essa razão, é necessário que nos respeitem.

Penso que uma estrutura agrária que está fornecendo alimentação para a população brasileira, a preços absolutamente baixos - e, diga-se de passagem, o preço dos alimentos no Brasil está baixo -, não pode ser destruída. Devemos fazer uma reforma agrária que não venha comprometer o que existe.

Neste ano, a agricultura brasileira forneceu divisas importantes para a Nação brasileira, que não pode se esquecer de onde vieram os recursos para sua industrialização, para montagem de sua estrutura. Foi do café, da cana, da borracha, da carne, da soja, que tiramos divisas para a construção da Nação brasileira.

Não temos o direito de agredir os ruralistas como estão sendo agredidos. Qual é o sentido de desrespeitarmos um setor tão significativo para a produção nacional?

Tratei desta matéria, nesta tribuna, no primeiro ano em que estive aqui. A agricultura é o setor da Nação brasileira que mais gera emprego, não só no campo, mas também na fabricação de equipamentos, no transporte, na produção de insumos, na produção de caminhões, no beneficiamento e na venda dessas mercadorias.

Com essa crise pela qual a agricultura brasileira passou com o Plano Real, assisti, no meu Estado, à beira das rodovias, à desativação de uma grande quantidade de postos de gasolina, por não terem para quem vender óleo diesel, pois o nosso pessoal quebrou quase todo. Esses postos de gasolina - e o pessoal da cidade não sabe -, no interior, servem para tudo. Neles, há boliche, venda, borracharia, até prostituta; tudo o que o se quiser. E nós vamos desativá-los, gerando um desemprego enorme?

Apelo, perante o Senado da República, ao Presidente do Congresso Nacional, ao Presidente da República e ao Presidente do Supremo Tribunal Federal que assumam suas responsabilidades e não permitam que sejam mortos os nossos irmãos com aviso prévio. Para esse pessoal que denuncia a reforma agrária, o banditismo na área urbana, a mortandade que existe nos presídios não têm importância. O que tem importância é a morte de um homem no campo! Agora, não podemos, com aviso prévio, permitir que haja uma luta entre irmãos nossos.

Sr. Presidente, solicito que V. Exª transmita esse apelo que faço à Sua Excelência, o Senhor Presidente da República.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/08/1997 - Página 17238