Discurso no Senado Federal

IMPORTANCIA DO PROJETO DE LEI 80, DE 1996, DE SUA AUTORIA, QUE INSTITUI O PLANO DE GERENCIAMENTO DO PANTANAL MATO-GROSSENSE, JA APROVADO PELO SENADO, E QUE GUARDA SIMILITUDE COM O PROJETO CABOCLO, PROPOSTO PELO SENADOR DARCY RIBEIRO.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • IMPORTANCIA DO PROJETO DE LEI 80, DE 1996, DE SUA AUTORIA, QUE INSTITUI O PLANO DE GERENCIAMENTO DO PANTANAL MATO-GROSSENSE, JA APROVADO PELO SENADO, E QUE GUARDA SIMILITUDE COM O PROJETO CABOCLO, PROPOSTO PELO SENADOR DARCY RIBEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 23/08/1997 - Página 17246
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, PLANO, ADMINISTRAÇÃO, PANTANAL MATO-GROSSENSE, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, BIODIVERSIDADE, ECOSSISTEMA, REGIÃO.
  • ANALISE, PROPOSTA, AUTORIA, DARCY RIBEIRO, EX SENADOR, ALTERNATIVA, OCUPAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, PROTEÇÃO, ECOSSISTEMA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, PRESERVAÇÃO, FLORESTA AMAZONICA, IMPLEMENTAÇÃO, COMUNIDADE, ORGANIZAÇÃO, COOPERATIVA RURAL, PRODUÇÃO, CONSUMO.

           O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi aprovado nesta Casa Legislativa o Projeto de Lei nº 80, de 1996, de minha autoria, que institui o Plano de Gerenciamento do Pantanal Mato-Grossense. Trata-se de um projeto que tive a honra de trazer à apreciação dos nobres colegas em 24 de abril do ano passado, e pelo qual tenho especial carinho, de vez que objetiva preservar um riquíssimo patrimônio brasileiro e um dos maiores redutos mundiais de biodiversidade.

           O projeto recebeu parecer favorável da Comissão de Assuntos Sociais, sendo relator o eminente Senador Jonas Pinheiro.

           Ocorreu-me, Srªs e Srs. Senadores, abordar novamente a propositura em tela, perante este egrégio Plenário, dadas as suas similitudes com o Projeto Caboclo, idealizado pelo saudoso Senador Darcy Ribeiro e a ser oportunamente adotado pelo Senado Federal, conforme anunciou o Presidente Antônio Carlos Magalhães.

           Conquanto se dirijam à preservação de áreas distintas, e inobstante suas diferenças de concepção, bastando dizer que o Projeto Caboclo não é ainda um projeto de lei, mas uma proposta alternativa de ocupação da Amazônia, ambos têm em comum o mesmo espírito de proteção do ecossistema, de promoção do desenvolvimento sustentável e de atendimento aos dispositivos constitucionais, especialmente ao art. 225, parágrafo quarto, que determina:

           "A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais".

           Ouso confessar que para mim, pessoalmente, uma iniciativa que viesse a proteger o Pantanal Mato-Grossense, ou qualquer outra área de condições ambientais privilegiadas, soaria como homenagem a Darcy Ribeiro, que dedicou boa parte de sua vida à defesa de nossos recursos naturais e da população nativa, que com sua milenar experiência deles tira o seu sustento sem contudo degradá-los.

           O Projeto Caboclo, como é do conhecimento geral, pauta-se nessa milenar e harmoniosa convivência do homem com o meio ambiente para propor uma ocupação alternativa e racional da Amazônia, alvo da cobiça internacional. A política ocupacional que tem prevalecido ao longo de nossa história sempre privilegiou a utilização econômica de nossas reservas, com evidentes prejuízos de ordem ecológica.

           Darcy Ribeiro, atento observador de nossa realidade, defensor incansável das populações indígenas e profundo conhecedor de nossas reservas, empenhou-se quanto pôde, apesar do organismo já debilitado pelo câncer, para ver concretizado o seu "canto do cisne". Sua lucidez, sua coragem e sua determinação não foram vãs, eis que sua proposta é hoje encampada de forma consensual no meio político, no meio acadêmico e no seio da sociedade brasileira.

           A preocupação de Darcy Ribeiro quanto ao destino da Floresta Amazônica justificava-se pelo vertiginoso processo de devastação que ali ocorre, a ponto de prever-se, em estudos e simulações feitos com o auxílio de computadores, que até o ano 2.050 aquela reserva estaria totalmente destruída. Assim, impunha-se adotar um modelo de ocupação e de desenvolvimento da Amazônia que permitisse preservar o ecossistema, privilegiando as formas de vida social fundadas no harmônico convívio de índios e caboclos com a floresta.

           Pode-se dizer que o Projeto Caboclo, basicamente, prevê a implementação experimental de comunidades autônomas, abrigando cada uma cerca de 50 famílias em áreas de cinco mil hectares de mata. Cada família teria assegurada uma renda mensal de um salário mínimo, de forma a complementar suas necessidades, até que as comunidades se tornem autônomas e se organizem na forma de cooperativas de produção e de consumo.

           Esse tipo de ocupação representa, como destacam seus formuladores, entre eles o próprio Darcy Ribeiro, a criação de "modos coletivos não destrutivos de adaptação e de desenvolvimento sustentável das comunidades à floresta tropical". Salientam, ainda, que "tanto as populações indígenas da Amazônia quanto as comunidades caboclas, quando não totalmente submetidas a um regime mercantil, têm uma existência muito mais farta e feliz do que as populações engajadas nos projetos modernos, aparentemente mais progressistas".

           Num breve comentário, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de ressaltar, entre outros méritos do Projeto Caboclo, seu baixo custo e sua expansão gradativa, que ao propiciar formas de vida digna para os habitantes da região sinalizariam com eficácia para um modelo de ocupação daquelas terras que não venha a provocar danos ao ambiente.

           O PLS nº 80/1996, de minha autoria, dirige-se, conforme destaquei, à preservação de outro ecossistema igualmente importante, que é o Pantanal Mato-Grossense. Não diria que se distingue do Projeto Caboclo quanto ao "modus operandi", porquanto seu escopo é a instituição de um Plano de Gerenciamento, definindo objetivos, metas e diretrizes, instrumentos e planos de ação e atribuições institucionais.

           Representando um Estado que tem boa parte de suas terras nesse ecossistema, é natural que fique emocionado ao falar do Pantanal, a maior bacia de inundação contínua do planeta, com 150 mil quilômetros quadrados. Já salientei anteriormente, nesta mesma tribuna, que o Pantanal é uma área de transição que comporta diversos subsistemas, tendo como características principais as imensas vastidões de água e uma biodiversidade capaz de atrair as atenções de especialistas e curiosos do mundo inteiro.

           Trata-se de uma imensa planície que recebe as águas oriundas de outras regiões, e ao recebê-las, ao absorver esse imenso caudal, evita que outras unidades federativas sofram enchentes catastróficas. A preservação do Pantanal, portanto, impõe-se também por uma razão de ordem prática e imediata aos brasileiros em geral, e não apenas aos mato-grossenses.

           Sua fauna, com destaque para a vastíssima variedade de peixes, é destacada nos mais elementares compêndios escolares; sua vegetação, com predomínio de cerrados, comporta espécies da Floresta Amazônica e do Chaco. Ali, Srªs e Srs. Senadores, em meio àquele santuário ecológico, em harmonioso convívio com a natureza, habita o pantaneiro, tal qual habitam, na Amazônia, o índio e o caboclo; ali desenvolvem-se atividades primárias, como a caça e a pesca, além de uma rústica pecuária; ali o pantaneiro ganha sua vida e sustenta os seus, preservando o meio ambiente, ciente de que o desequilíbrio ecológico pode significar o fim de sua subsistência.

           Preocupa-nos a atividade pecuarista do pantaneiro em meio àquele santuário, como também nos preocupam a pesca e a caça predatórias. No entanto, nossa mais grave preocupação vem de fora, das fronteiras de expansão agrícola e da atividade mineral, particularmente do garimpo, que se exerce nos mananciais cujo desaguadouro é o Pantanal Mato-Grossense.

           Assim, o gerenciamento do Pantanal não pode ser compreendido como interesse exclusivo de autoridades e populações mato-grossenses; será, necessariamente, um exercício de preservacionismo e de cidadania de autoridades, políticos, empresários, pesquisadores de todos os Estados. O Plano de Gerenciamento do Pantanal, por isso mesmo, aplica-se a toda a bacia hidrográfica do Rio Paraguai situada em território brasileiro, desde sua nascente e as nascentes de seus formadores até sua saída do território brasileiro.

           O Plano de Gerenciamento será formulado, coordenado e executado por uma Comissão da qual participarão representantes do Governo Federal, dos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e de Municípios cujos territórios estejam total ou parcialmente localizados na grande planície pantaneira.

           Pretende-se com a implementação do Plano de Gerenciamento, entre outros objetivos específicos, harmonizar a coexistência da atividade produtiva com a utilização dos recursos naturais; impedir a exploração predatória dos recursos da região que venha a degradar o ecossistema pantaneiro; incrementar os processos produtivos; preservar áreas representativas do ecossistema e recuperar aquelas que eventualmente já tenham sido degradadas; promover o uso de tecnologias adequadas na fixação e no desenvolvimento de populações na planície pantaneira.

           Para isso, o Plano de Gerenciamento do Pantanal Mato-Grossense utilizará o zoneamento ecológico-econômico, quando serão identificadas e selecionadas as áreas que, por suas características físicas, biológicas e sócio-econômicas, mereçam tratamento especial, além de desenvolver ações integradas entre órgãos das três esferas de governo.

           O Plano prevê igualmente a instituição de mecanismos de participação das comunidades, o incentivo aos empreendimentos e tecnologias que contribuam para o desenvolvimento sustentável, a formulação de políticas específicas para o desenvolvimento do turismo e a criação de unidades de pesquisa adaptadas às necessidades da região.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tal como o Projeto Caboclo, o Plano de Gerenciamento do Pantanal Mato-Grossense, a ser instituído pelo PLS nº 80/1996, é passo preliminar, mas decisivo, para salvaguardar uma região belíssima, de riquíssima biodiversidade, de invejável potencial turístico, de rara densidade populacional, que necessita ser ocupado racionalmente. Não se trata apenas de promover melhores condições para o habitante da região; não se trata, da mesma forma, de preservar um santuário ecológico apenas por sua extraordinária beleza. Trata-se de evitar um crescente processo de degradação do ecossistema que, num futuro muito próximo, pode tornar-se irreversível e resultar em trágicas conseqüências para todos nós. Trata-se, em suma, de conciliar razão e sentimento, para que a ocupação e o processo produtivo possam ser incrementados sem prejuízo à qualidade de vida da nossa geração e das gerações vindouras.

           Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/08/1997 - Página 17246