Discurso no Senado Federal

DIA NACIONAL DA HABITAÇÃO. PREOCUPAÇÃO COM O DEFICIT HABITACIONAL DO PAIS, DE APROXIMADAMENTE 14 MILHÕES DE CASAS, SEGUNDO ESTUDOS TECNICOS REALIZADOS PELA FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO E PELA FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONOMICAS - FIPE. ROMBO NAS CONTAS DO FUNDO DE COMPENSAÇÃO DAS VARIAÇÕES SALARIAIS - FCVS.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA HABITACIONAL.:
  • DIA NACIONAL DA HABITAÇÃO. PREOCUPAÇÃO COM O DEFICIT HABITACIONAL DO PAIS, DE APROXIMADAMENTE 14 MILHÕES DE CASAS, SEGUNDO ESTUDOS TECNICOS REALIZADOS PELA FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO E PELA FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONOMICAS - FIPE. ROMBO NAS CONTAS DO FUNDO DE COMPENSAÇÃO DAS VARIAÇÕES SALARIAIS - FCVS.
Publicação
Publicação no DSF de 22/08/1997 - Página 17082
Assunto
Outros > POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, DADOS, ESTATISTICA, ESTUDO, FUNDAÇÃO, PESQUISA, NATUREZA ECONOMICA, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, DEFICIT, HABITAÇÃO, FALTA, INSTALAÇÃO, AGUA, CONDIÇÕES SANITARIAS, COLETA, TRATAMENTO, LIXO, INSUFICIENCIA, ENERGIA ELETRICA, INFRAESTRUTURA, DOMICILIO, BRASIL.
  • ANALISE, FALTA, ORGANIZAÇÃO, INSTITUIÇÃO PUBLICA, AUSENCIA, POLITICA HABITACIONAL, POSTERIORIDADE, EXTINÇÃO, BANCO NACIONAL DE HABITAÇÃO (BNH), NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, CONGRESSO NACIONAL, REGULAMENTAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REFORMULAÇÃO, ZONA URBANA, IMPEDIMENTO, ESPECULAÇÃO IMOBILIARIA, CONTINUAÇÃO, DEFICIT, HABITAÇÃO, BRASIL.
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, HABITAÇÃO.
  • NECESSIDADE, ADOÇÃO, GOVERNO FEDERAL, POLITICA HABITACIONAL, GARANTIA, OBTENÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, REALIZAÇÃO, PROGRAMA, FINANCIAMENTO, HABITAÇÃO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estudos técnicos realizados pela Fundação João Pinheiro e pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas -- Fipe indicam que o déficit de habitações no Brasil aproxima-se da casa de 14 milhões de unidades. Segundo esses dados, em 1995, o País tinha uma carência de 4,9 milhões de imóveis e 8,8 milhões de habitações não preenchiam as mínimas condições de infra-estrutura, ou seja, não tinham instalações de água, esgotamento sanitário, coleta e tratamento de lixo e energia elétrica.

Os domicílios improvisados, carroças, tendas, grutas ou simples buracos chegavam a 146.535 em todo o País. Os domicílios rústicos, produzidos com materiais precários, eram 1.727.845. Os números da coabitação, ou seja, mais de uma família morando sob o mesmo teto, alcançavam 3.128.978. As residências carentes, aquelas desprovidas das mínimas condições de habitabilidade, eram 4.652.611. Por fim, as residências com infra-estrutura deficiente, que possuíam algum serviço, mas não tinham nem canalização interna nem banheiro, somavam mais 4.214.596. Assim, no total, tínhamos 8.867.207 residências carentes como mostramos acima, a partir dos dados da pesquisa sobre Déficit Habitacional no Brasil, realizada pela Fundação João Pinheiro, em 1995.

Outro dado preocupante aparece no último levantamento realizado nas contas do Fundo de Compensação das Variações Salariais -- FCVS. O cálculo revelou um tremendo rombo de 68,3 bilhões de reais. O Tesouro Nacional terá de cobrir esse déficit até o ano 2005 e o Presidente Fernando Henrique já não consegue mais dormir direito por causa dele.

A dimensão do buraco negro do Fundo de Compensação das Variações Salariais equivale a mais de 70% da arrecadação anual do Governo com impostos e contribuições federais. Com essa quantia enorme, o Governo conseguiria financiar durante dez anos os gastos oficiais com a área de saúde. Além disso, ela representa um montante maior do que o volume das reservas cambiais brasileiras que hoje atingem os 56 bilhões de reais. Segundo cálculos realizados pela Caixa Econômica Federal, se nada for feito no prazo de dois anos, no máximo, a dívida atingirá a marca de 100 bilhões de reais, o que é uma verdadeira temeridade.

A desorganização institucional e a falta de uma política habitacional são os maiores motivos do caos que se estabeleceu no sistema, desde a extinção do Banco Nacional de Habitação. Sem política habitacional, as médias e grandes cidades brasileiras entrarão brevemente em colapso, advertem os estudiosos da questão. Se o Governo Federal e o Congresso Nacional não assumirem uma posição de firmeza no sentido da regulamentação do capítulo constitucional da reforma urbana, o solo das cidades continuará sendo alvo fácil da especulação e os que precisam realmente de um teto permanecerão ao relento.

O que vemos hoje no Brasil em matéria de política habitacional são programas vagos, desarticulados e que são testados a cada momento com o dinheiro do trabalhador e com os recursos limitados do Orçamento da União. Praticamente, todos esses programas terminam em fracasso e, a cada vez, o dinheiro público é jogado fora com sérios prejuízos para o País, para a sociedade e para o sistema habitacional como um todo. A modalidade da carta de crédito, por exemplo, que é uma idéia recente, não conseguiu até agora melhorar coisa alguma. Em verdade, é mais um fracasso que se junta a muitos outros e já nasceu caracterizado pela desorganização, pela burocracia, pela morosidade, pelas elevadas custas cartoriais e pelo desconhecimento da realidade habitacional do País. Espalharam a idéia da carta de crédito, mas desconheciam o volume de unidades habitacionais disponíveis para venda. O resultado é que existe o dinheiro mas não existem as habitações desejadas.

Outros programas como o Pró-Moradia e o Habitar Brasil estão sendo implementados de maneira lenta e com resultados também pouco significativos. Além disso, quando os candidatos obtêm o financiamento, depois de uma verdadeira epopéia para reunir o rol de papéis exigidos, o dinheiro não é suficiente para comprar os imóveis. Vale ressaltar que todos esses programas estão contidos no Plano de Ação que o Governo brasileiro apresentou na Conferência Mundial Habitat II, que se realizou em junho do ano passado em Istambul.

A maior novidade em matéria de financiamento habitacional, lançada oficialmente dias atrás pelo Governo, é o chamado Sistema Financeiro Imobiliário -- SFI, que, com estardalhaço, promete revolucionar o mercado imobiliário. O otimismo é tão grande que algumas autoridades chegam a dizer que dentro de três a cinco anos, quando o plano estiver consolidado, o ritmo de trabalho no setor de construção de habitações deverá igualar ou mesmo ultrapassar os níveis alcançados nos anos 80 a 85. Em suma, o SFI pretende substituir a "Poupança Azul Imobiliária", que também não apresentou resultados significativos. Segundo o Governo, as linhas gerais do novo projeto são :

1 - Aumentar o volume de recursos para o setor habitacional, de forma a permitir o financiamento de 600 mil imóveis por ano. Os recursos também vão financiar a construção de imóveis comerciais e industriais, hospitais, hotéis, cinemas, teatros, escolas e centros de lazer;

2 - Os recursos a serem liberados serão os da caderneta de poupança tradicional, da poupança vinculada, de empréstimos externos e da emissão de títulos lastreados em operações de crédito imobiliário -- debêntures, certificados de crédito imobiliário e cédulas hipotecárias --, que serão vendidos no mercado secundário;

3 - O sistema será desregulamentado. Os financiamentos serão concedidos de acordo com regras de mercado, sem limites de valor, juros ou prazo, seguindo a mesma modalidade do Sistema Financeiro de Habitação -- SFH;

4 - Os créditos que os bancos têm para com as construtoras e os mutuários serão vendidos a uma agência securitizadora. Esta, por sua vez, emitirá títulos lastreados nas operações de empréstimo, que serão vendidos para seguradoras, fundos de pensão ou investidores estrangeiros;

5 - Os imóveis comprados com financiamento pelo novo sistema, ficarão alienados aos bancos que concederem os empréstimos. O novo mutuário terá a posse do imóvel e passará a ser proprietário do mesmo, após o pagamento da última parcela do empréstimo;

6 - Em caso de não pagamento ou inadimplência das obrigações assumidas, o mutuário perderá o imóvel num prazo máximo de três meses, a partir da execução.

O Governo Federal, em seu Plano de Ação Habitacional, apresentado na Conferência Mundial Habitat II, estabelece metas ambiciosas para vencer o déficit habitacional no País. Sua promessa é a de aplicar 22 bilhões de reais entre 1996 e 1999, com o objetivo de atender a um milhão e trezentas mil famílias pobres. Todavia, devemos reconhecer que a obtenção desses recursos repousa no terreno das incertezas. Apenas 7,3% virão de dotações orçamentárias, enquanto mais de 50% dependerão de fontes que o Governo não tem condições de garantir, como, por exemplo, poupanças privadas ou recursos de contrapartidas de tomadores de empréstimos.

Chegou a hora de o Presidente Fernando Henrique Cardoso e sua equipe econômica pensarem uma política global de habitação para o País. O mesmo zelo que o Governo teve nesses dois anos em relação à economia, à estabilização e ao combate sistemático às altas taxas inflacionárias deveria agora, demonstrar em relação ao déficit habitacional, realizando o saneamento do sistema, garantindo recursos, cobrando prestações realistas e oferecendo financiamentos acessíveis, principalmente em benefício das camadas mais carentes. Infelizmente, até agora, o País não tem política habitacional e só acumula fracassos em todos os planos testados. O Plano de Ação apresentado na conferência de Istambul, e que é o documento mais recente sobre a nossa situação habitacional, não passa de uma mera carta de intenções, sem maiores implicações.

Neste dia nacional da habitação, apesar de termos muito pouco a comemorar, devemos entender que o resgate da dívida social brasileira passa, necessariamente, pela superação das deficiências em matéria habitacional. Assim, perseguindo esse caminho, temos o dever de impedir que o aumento do exército de desabrigados continue a tornar mais deletéria, mais desumana e mais degradante a paisagem urbana do Brasil.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/08/1997 - Página 17082