Discurso no Senado Federal

CONSEQUENCIAS NEFASTAS DA DERRUBADA DOS VETOS AO PROJETO DE LEI 114, DE 1994, QUE REGULAMENTA O PLANEJAMENTO FAMILIAR NA SOCIEDADE BRASILEIRA.

Autor
Odacir Soares (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • CONSEQUENCIAS NEFASTAS DA DERRUBADA DOS VETOS AO PROJETO DE LEI 114, DE 1994, QUE REGULAMENTA O PLANEJAMENTO FAMILIAR NA SOCIEDADE BRASILEIRA.
Publicação
Publicação no DSF de 22/08/1997 - Página 17084
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • CRITICA, DERRUBADA, VETO (VET), CONGRESSO NACIONAL, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, PLANEJAMENTO FAMILIAR, MOTIVO, INTERESSE, ORGANISMO INTERNACIONAL, PROVOCAÇÃO, BRASIL, PAIS, TERCEIRO MUNDO, DESEQUILIBRIO, DEMOCRACIA, GARANTIA, CONTINUAÇÃO, PREDOMINANCIA, IDEOLOGIA, PAIS INDUSTRIALIZADO, NATUREZA POLITICA, NATUREZA ECONOMICA, MUNDO.

         O SR. ODACIR SOARES (PTB-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com a derrubada dos vetos ao projeto de lei 114/94, que regulamenta o planejamento familiar na sociedade brasileira, o Congresso Nacional, na noite de 13 de agosto do corrente, franqueou todas as portas e suprimiu todas as barreiras que, até aqui, se antepunham à esterilização em massa de brasileiras e brasileiros em idade fértil.

         Assim é que, num prazo de cinco meses - o estabelecido para que o Ministério da Saúde normatize a medida - os hospitais da rede pública e os conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS) estarão realizando gratuitamente a laqueadura nas mulheres e a vasectomia nos homens férteis de nosso País.

         Embora fadada a provocar impactos incalculáveis no perfil demográfico do Brasil, a medida parece não ter sensibilizado de forma suficientemente vigorosa a grande maioria da população brasileira.

         É bem verdade que as feministas, encabeçadas pela CFEMEA, saudaram, eufóricas, a nova lei, o que não é de estranhar, posto que foram elas as "mães" da medida.

         A Primeira Dama e socióloga, D. Ruth Cardoso, também pareceu exultante, quando declarou:

         "Sempre fui favorável a que todas as mulheres de todas as classes sociais tivessem acesso a todos os métodos possíveis de planejamento familiar"

         É de notar que a ilustre socióloga, parece confirmar, nesta passagem, o episódio narrado pela Folha de S. Paulo, em sua edição de 14 do corrente:

         "Em janeiro de 1996, o Presidente Fernando Henrique vetou artigos de um projeto do deputado Eduardo Jorge (PT-SP) que incluíam à vasectomia e a laqueadura entre os métodos contraceptivos que o Estado deveria oferecer.

         Alertado pela Primeira-Dama - ela é "militante" dos grupos que defendem o planejamento familiar -, o Presidente veio a público reconhecer que tinha errado. Anteontem, o veto foi derrubado."

         A imprensa limitou-se a divulgar a aprovação da nova lei, em tom que mais refletia aprovação do que análise crítica de suas graves e múltiplas implicações.

         A opinião pública, como já foi dito, não se manifestou, passando a impressão de ter-se rendido piamente ao principal argumento dos grupos que propugnam a esterilização voluntária e o aborto, como os antídotos mais eficazes contra a propalada explosão demográfica que estaria a ameaçar a sobrevivência da espécie humana.

         Manifestações em contrário, só anotei duas. A dos representantes da Igreja Católica que, pela voz de D. Raymundo Damasceno Assis, Secretário Executivo da CNBB, verberaram vigorosamente a dita lei, por expressar "mentalidade antivida" e por reforçar "a idéia de que o crescimento populacional é prejudicial ao País".

         Anotei, ainda, a manifestação tímida e encabulada de S. Exª o Sr. Ministro da Saúde, quando, conforme citado em O Globo, de 4 do corrente, ponderou que, após a regulamentação da nova lei, é bem provável que se verifique uma verdadeira avalanche de cirurgias de vasectomia e de ligadura de trompas no Sistema Único de Saúde (SUS), devido à demanda repremida por parte daqueles que desejam fazer a esterilização, mas não contavam, até aqui, com o serviço nos hospitais públicos.

         Nessa ponderação torna-se visível o constrangimento do Ministro por dever indagar sobre quem irá pagar a conta dessa torrente de novos serviços a serem reclamados do desprovido e já sobrecarregado Sistema Único de Saúde.

         E foi assim que passou, quase despercebida, e, imune aos graves questionamentos que poucos lhe fizeram, a lei que aprova e até estimula a castração da fertilidade do povo brasileiro, sob o falacioso pretexto de concorrer para o exercício livre e esclarecido do direito de todos ao planejamento familiar.

         Dentre os que, no Congresso ou fora dele, aprovaram a malfadada proposição, ninguém ter-se-á dado ao trabalho de investigar, com rigorosa postura crítica, o verdadeiro alcance de tal medida, nem excogitado, em profundidade, sobre as graves conseqüências que sua aplicação, fatalmente, irá desencadear.

         Se assim houvessem feito, teriam forçosamente atentado para o fato de que o risco de uma explosão demográfica, no Brasil, válido para as décadas de 40 a 60, cedeu lugar a uma realidade não menos inquietante - o do rápido envelhecimento de nossa população, revelado pelos estudos analíticos dos resultados do censo de 1991, efetivados pelo IBGE.

         Segundo tais estudos, complementados por levantamentos recentes do FUNUAP, a taxa nacional de fertilidade, que havia despencado dos 3,0 na década de 50, para 1,9 no final da década de 80, e para 1,3, nesta altura dos anos 90, constitui um problema bastante inquietante porque já configura uma taxa situada abaixo dos índices de reposição.

         A persistirem tais indicadores, muito em breve seremos um país de população envelhecida, a exemplo do que já se tornaram os países prósperos da Europa.

         Diante de tais perspectivas, teria sido fácil concluir que, ao invés de programas de "regulação da fecundidade" ou de educação para o "planejamento familiar", estaremos, no curto prazo, carecendo, tal como ocorre nos países europeus, de programas vigorosos de incentivo à fecundidade responsável, para compensar a verdadeira devastação populacional levada a cabo em nosso país, graças aos projetos de controle populacional falaciosamente ditos de Planejamento Familiar, que há 30 anos nos vêm sendo impingidos de fora para dentro.

         A tranqüila, a distraída e inconseqüente derrubada dos vetos ao Projeto de Lei 114/94, acaba de demonstrar que quase ninguém pensou nisso, como também quase ninguém cuidou de identificar ou de denunciar os verdadeiros objetivos, as reais e obscuras motivações que dinamizam os governos, os organismos, as associações e os militantes dos grupos empenhados em despovoar o mundo, sobretudo o Terceiro Mundo, sob a máscara falaz do "planejamento familiar".

         Se tal fora feito, de certo, ter-se-ia tomado conhecimento desta preocupante realidade por mim, várias vezes, denunciada neste Plenário

         O intento do controle populacional, deriva, de duas perspectivas, não raro entrelaçadas: a eugênica e/ou a política.

         A perspectiva eugênica ou simplesmente, racista, é a que norteia os governos e organizações obcecados pela idéia da depuração étnica, de modo a assegurar o predomínio no mundo, de povos ou de raças supostamente superiores.

         Quanto ao controle populacional motivado por perspectivas políticas, não é difícil divisar suas principais fontes de inspiração - o temor da perda da hegemonia política e os obstáculos que os povos em desenvolvimento podem contrapor ao acesso dos países ricos às matérias primas, em áreas do Terceiro Mundo.

         Diretrizes e orientações extraídas de documentos editados pelas lideranças dessas correntes habilitam-nos a melhor compreender as estreitas afinidades entre as ideologias propagadas por essas correntes e os projetos de planejamento familiar em curso no Congresso Nacional.

         Magali Lugano, em artigo intitulado "A IPPF e os grupos Parlamentares", publicado em "Escoge la vida," jan/fev. 91 assim se expressa:

         "um em cada dez países do mundo tem tido apoio constitucional aos programas de planejamento familiar. A nova Constituição do Brasil, por exemplo, "reconhece o direito ao planejamento familiar, objetivo que ajudou a conseguir a BEMFAM, filial da IPPF nesse país".

         Também a publicação das Nações Unidas, intitulada "Inventory of Population Projects in Devoloping Countries Around the World (1998/1990), faz as seguintes e, até certo ponto, estarrecedoras afirmações:

         "Parte dos recursos dos 6,8 milhões de dólares destinados pela IPPF, à sua filial, no Brasil, a BEMFAM para os exercícios de 1988/1989 foi destinada a "Manter assessoramento e assistência ao Grupo Parlamentar de Estudos de População e Desenvolvimento".

         Nessa mesma publicação, encontramos, entre os projetos financiados pelo "The Pathfinder Fund:

         "Planejamento Familiar e a Assembléia Constituinte Brasileira. Monitorar e onde necessário, dar assistência no desenvolvimento do tema planejamento familiar no texto da Constituição brasileira. Membros do Grupo Brasileiro de Parlamentares sobre População e Desenvolvimento receberão instruções técnicas sobre temas que contribuirão para debates sobre planejamento familiar - Valor do projeto: US$ 112.755".

         É, ainda, na publicação já citada do FNUAP - "Inventário dos Projetos de População para os Países em Redor do Mundo, que figuram projetos tais como:

         Planejamento Familiar e Constituição Brasileira, Esterilização "Voluntária", Distribuição de Contraceptivos, Treinamento de Pessoal Médico e Para-Médico em técnicas contraceptivas e esterilização, Doação de Laparoscópios, Educação Sexual e coisas que tais.

         É dito, ainda, na referida publicação:

         "Manter assessoramento e assistência ao Grupo Parlamentar de Estudos de População e Desenvolvimento. Esse grupo foi útil, assegurando que a nova Constituição de 1988 explicitamente: (1) garantisse o livre exercício do direito ao planejamento familiar, (2) determinasse ao estado proporcionar os recursos científicos e educacionais para esse efeito, (3) vedasse qualquer forma coercitiva desse direito ao planejamento".

         E posto que quase ninguém cogitou dessas realidades, poucos, bem poucos, também, tiveram sua consciência despertada para estes dois absurdos que agora aponto à consideração de V. Exªs:

         a - o monitoramento e encaminhamento de instruções a parlamentares brasileiros para inserção, na Constituição brasileira, de dispositivos do interesse de potências estrangeiras;

         b - a similitude redacional entre o texto do § 7º, artigo 226 da Constituição da República Federativa do Brasil e o texto das diretrizes ditadas ou dos jargões propalados pelos governos, associações e grupos que militam pela causa da acelerada extinção das populações "descartáveis" do Terceiro Mundo.

         Se tudo isso que agora, e mais uma vez, trago à colação, tivesse ocupado as cogitações dos que aprovaram a esterilização em massa de brasileiras e brasileiros, ter-se-ia concedido uma atenção crítica mais rigorosa a esses grupos que há mais de trinta anos vêm trabalhando obstinadamente pela drástica contração do perfil demográfico brasileiro.

         Assumam tais organizações as denominações e os despistamentos mais variados: Sociedade Civil de Bem-Estar Familiar (BEMFAM); CENTRO de Pesquisa e Assistência Integrada à Mulher e à Criança (CPIMMC); Associação de Entidades de Planejamento Familiar (HBEPF); CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIA (CFEMEA), a verdade é que todas elas outra coisa não fazem senão dar cumprimento, em nossa Pátria, a diretrizes ou a implementar projetos umbilicalmente ligados aos interesses de governos e entidades internacionais, dos quais têm recebido verbas e estipêndios vultosos.

         A CFEMEA, muito especialmente, transita com airosa desenvoltura, pelos gabinetes e demais dependências de ambas as casas do Congresso, na aguerrida militância em favor do "lobby" antinatalista.

         Sua correspondência e publicações, de excelente tratamento gráfico, endereçados a todos os parlamentares, inundam os gabinetes, evidenciando apoio logístico de primeira, assim como suporte financeiro invejável.

         Mal concluiu-se a votação que derrubou os vetos à esterilização, já vão chegando aos gabinetes as mensagens da CFEMEA aos parlamentares, agradecendo "o indispensável apoio de Vossa Excelência para a derrubada dos vetos aos projeto de lei (PLC 114/94) que regulamenta as ações de planejamento familiar em nosso país".

         Acompanha a referida mensagem a publicação "Fêmea", de número 54, Ano VI, julho/97, na qual, revelando-se rigorosamente em dia com a pauta do Congresso, a CFEMEA, faz o anúncio de sua próxima arrancada lobista, com a seguinte chamada:

         "Aborto Legal estará na Paula dia 20 de agosto"!

         A mesma publicação, em sua pagina 12, oferece uma amostra da pauta diversificada e versátil de interesses da CFEMEA, onde, sob o título de "Seminário Nacional de Lésbicas" é difundido o informe de que:

         "O II Seminário Nacional de Lésbicas será realizado em Salvador, de 25 a 28 de setembro, com a participação de grupos feministas, de lésbicas e gays. O tema do Encontro será "Saúde e Cidadania".

         Interessante porém, assim como extremamente instigante para a reflexão dos senhores Senadores é o trecho que hora destaco, da Carta CFEMEA Nº 537/97, endereçada às "prezadas companheiras".

         Nesta, a integrante do colegiado da entidade, informa sobre a audiência que as representantes da CFEMEA, guiadas por cinco expressivas representantes da bancada feminista do Congresso, mantiveram com o líder do governo no Congresso Nacional, Senador José Roberto Arruda (PSDB-DF), para tratar da inclusão dos vetos ao projeto de lei que regulamenta o planejamento familiar.

         São dadas, a seguir, as seguintes informações adicionais que muito elucidam as formas de atuação do lobby anti-natalista nos bastidores do Congresso:

         "Naquela oportunidade, o Senador José Roberto Arruda (PSDB-DF), afirmou que o governo tinha todo o interesse na derrubada de TODOS os vetos parciais ao projeto (no total, são 14 vetos parciais) e comprometeu-se em viabilizar com o Presidente do Congresso Nacional, Senador Antônio Carlos Magalhães, o seguinte:

         1) convocação de uma sessão para a apreciação dos vetos na segunda semana de agosto.

         2) que essa seja uma sessão administrativa, em outras palavras, o parlamentar que não comparecer terá o valor correspondente à sessão subtraído dos seus rendimentos, como forma de garantir o quórum necessário para a votação;

         3) que o primeiro item da pauta seja uma Medida Provisória consensual, o que permitirá a verificação de quórum da sessão, para que depois se possa colocar os vetos em votação sem que se corra o risco de que eles sejam mantidos;

         4) que da pauta dessa sessão não conste nenhum outro veto. (De outras vezes, a falta de acordo em relação a outros vetos gerou a obstrução das sessões, inviabilizando a votação);

         5) que o restante da pauta será constituída de Medidas Provisórias consensuais e nem a oposição, nem o governo, requererão a inclusão de matérias polêmicas."

         Nessa mesma reunião ficou agendado um novo encontro com o Líder do Governo no Congresso Nacional para o dia 5 de agosto, às 11 horas, afim de que fossem encaminhados os acertos finais em relação à convocação da sessão para a derrubada dos vetos presidenciais ao projeto de lei que regulamenta o planejamento familiar.

         Dispenso comentários mais extensos a tudo o que aqui relatei.

         Descarto, da mesma forma, o ensejo que teria de alinhar algumas conclusões pessoais.

         De tudo, extraio uma única conclusão: no atual panorama político-social brasileiro, raros são os brasileiros que logram pensar e decidir pela própria cabeça.

         Os "lobies" e as ongues é que andam a pensar e a decidir por eles.

         No caso do planejamento familiar, nem o Presidente da República, nem seus líderes no Congresso, nem os parlamentares, em sua maioria, pensaram o que decidiram ou decidiram pelo que pensaram.

         As militantes fizeram-no por eles.

         Assim, emasculados em nossos atributos pensantes e despidos de nosso poder decisório, temo, senhor Presidente, ver aprovados de roldão, sob a "irresistível" pressão do lobby feminista, outras proposições extremamente controvertidas e explosivas, tais como o aborto legal, a união estável dos homossexuais, a eutanásia, assim como tudo o mais que nos impingirem, por vias indiretas, as potências dominantes, afim de assegurar a sua hegemonia sobre uma nação moral, política e demograficamente desmantelada.

         Pena é que não se possa exaltar as feministas por essas equívocas vitórias.

         É que também elas não pensam o que decidem, nem decidem pelo que pensam.

         Quem o faz por elas são os governos e entidades internacionais que as financiam, instrumentalizam, e as transformam em meras torres de repetição, em nosso país, de ideologias concebidas e emitidas à distância, e que só servem a seus intentos espúrios.

         É o que penso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/08/1997 - Página 17084