Pronunciamento de Gilberto Miranda em 27/08/1997
Discurso no Senado Federal
PROBLEMAS DO SISTEMA DE SEGURANÇA PUBLICA E DA JUSTIÇA NO BRASIL, QUE AGUARDAM SOLUÇÕES URGENTES.
- Autor
- Gilberto Miranda (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
- Nome completo: Gilberto Miranda Batista
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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SEGURANÇA PUBLICA.:
- PROBLEMAS DO SISTEMA DE SEGURANÇA PUBLICA E DA JUSTIÇA NO BRASIL, QUE AGUARDAM SOLUÇÕES URGENTES.
- Publicação
- Publicação no DSF de 28/08/1997 - Página 17458
- Assunto
- Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
- Indexação
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- ANALISE, SISTEMA, SEGURANÇA PUBLICA, JUSTIÇA, ESTRUTURAÇÃO, SOCIEDADE, BRASIL, NECESSIDADE, URGENCIA, ALTERAÇÃO, FORMA, TRATAMENTO, GOVERNO, CATEGORIA PROFISSIONAL, POLICIAL MILITAR, POLICIA CIVIL, MELHORIA, NIVEL, SALARIO, CONDIÇÕES DE TRABALHO, MODERNIZAÇÃO, EQUIPAMENTOS, ARMAMENTO, POLICIAL.
O SR. GILBERTO MIRANDA (PFL-AM) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passou o medo e o fragor das greves da Polícia Militar e da Civil, deflagradas durante a segunda metade do mês de julho último. As razões, no entanto, que motivaram aqueles acontecimentos não passaram. O incêndio, amainadas as chamas, deixou de produzir fumaça e de turvar os horizontes, mas as brasas continuam acesas, nas frustrações que ficaram, no desgaste, nos ressentimentos, na lembrança e nas conseqüências da violência e da dor. Sobre essas razões, desejo tecer algumas considerações, hoje, nesta minha fala.
Idéias de reformas, as mais diversas, se multiplicaram no calor das emoções, especialmente no seio dos segmentos do Estado responsáveis pela concepção e execução da política de Segurança Pública: mudança do artigo 144 da Constituição Federal, atribuição exclusiva ou mais autonomia aos Estados para a organização de suas polícias, criação da guarda nacional, desmilitarização, etc.
Vale a pena lembrar que a emoção não tem o apanágio de ser boa conselheira para empreendimentos adequados, certos e duradouros. Sua característica é a espontaneidade e a intensidade. Surge dos fatos e diante dos fatos reage, nem sempre sedimentada na razão, nem sempre marcada pela análise, sempre aberta, portanto, para soluções não suficientemente ponderadas.
Por seu turno, o arrefecimento da emoção, a cessação do fato gerador podem dar lugar ao esquecimento, à inércia, deixando disponível o caminho para a repetição dos mesmos problemas.
Os desdobramentos da greve ainda deverão continuar por certo tempo, como já aconteceu em reunião do Senhor Presidente da República com os Governadores dos Estados atingidos, no encontro de cúpula das Polícias Militares na cidade de Foz do Iguaçu e, mais recentemente, na reunião do Fórum Nacional de Segurança Pública, organização que congrega aproximadamente 15 mil oficiais associados a clubes em todo o território nacional.
No encontro do Fórum, ficou evidenciado que "o problema das polícias é realmente a ponta de um iceberg e assim deve ser tratado", segundo a afirmação de um dos promotores da reunião.
É necessário que os problemas das Polícias sejam analisados com profundidade, a fim de que as soluções não sejam apenas paliativas, mas satisfatórias; se não avançadas, pelo menos atuais; correspondentes às necessidades domésticas e profissionais dos policiais. Nesse sentido, o açodamento é desaconselhável, mas, por sua vez, a postergação e a superficialidade devem ser evitadas.
No âmbito dessas iniciativas, um fator é inquestionável: a remuneração dos policiais brasileiros, de modo geral, é baixa, insuficiente, humilhante. A reivindicação de melhores salários ou simplesmente de pagamento dos salários baixos e atrasados, que apareceu como estopim da greve, tem fundamento, é real e oportuna.
Os policiais civis e militares do Brasil, aliás, são acabrunhados de dois modos: do ponto de vista humano, porque são autoridade e não têm condições de dar dignidade de sustento ao seu lar; e, do ponto de vista profissional, porque as condições de trabalho e o equipamento de que dispõem são precários e antiquados. É vergonhoso, mas os marginais atualmente possuem armamentos mais sofisticados do que os dos policiais, braços do Estado para as tarefas de zelar pela ordem e pela tranqüilidade dos cidadãos.
No mês de julho último, a Datafolha publicou os resultados de uma pesquisa por ela realizada para avaliar o quadro social e econômico do País. A pesquisa ouviu 15 mil 688 pessoas em 411 Municípios brasileiros. Resultado: os excluídos do Brasil correspondem a 59% da população.
O jornal A Folha de S. Paulo, publicando os dados, definiu o que entende por excluídos: "são pessoas que estão à margem de qualquer meio de ascensão social".
O nobre Senador Josaphat Marinho, em comentário às conclusões do trabalho da Datafolha, escreveu: "os pormenores da pesquisa retraçam vivamente as marcas das desigualdades sociais e econômicas". O levantamento revela que "a elite se resume a 8% dos brasileiros". Isso significa que 92% não integram o que se chama a "nata" da sociedade, o conjunto dos grupos dominantes.
Esses dados trago-os à consideração desta Casa, para expressar minha preocupação quanto ao que pode estar sendo "gestado" no seio dessa massa de pobres "à margem de qualquer meio de ascensão social".
Em julho, foram os policiais, que não constituem nem provêm da "nata" da sociedade brasileira. Em outros momentos, serão outras categorias. Se providências não forem tomadas para sanear a situação, todas as categorias dos excluídos se hão de rebelar para exigir maior justiça. A história não é feita de eventos isolados, mas de acontecimentos interligados, desencadeados por causas que se vão acumulando sem solução.
Não estou também a advogar melhoramentos para os policiais para que esses contenham os excluídos, mas porque constituem um segmento essencial para a sociedade, para o Estado, e estão vivendo em graves dificuldades, experimentando revolta, por omissão do próprio Estado.
É claro, a questão das Polícias não se restringe apenas aos salários. Os problemas são do macrossistema da Segurança Pública e da Justiça do Brasil, além da própria cultura da sociedade brasileira.
Há poucos dias, a revista Veja trouxe comentário do jornal The New York Times, que assim se pronunciou sobre a greve dos policiais brasileiros: "Não vai ser fácil transformar os policiais do Brasil em cidadãos que respeitam as leis. A brutalidade deles é reforçada por uma crise no sistema judiciário e pela tendência dos brasileiros em confundir pobreza com criminalidade".
É fora de dúvida que todo esse macrossistema deve ser trabalhado e aperfeiçoado, para torná-lo consentâneo com as necessidades dos tempos modernos e com o grau de desenvolvimento atingido pelo País. Mas, entre as premências, a questão salarial é uma medida de necessidade imediata, urgente. Trata-se de condições básicas para a sobrevivência.
Sem meios para viver com dignidade, dentro do lar e na sociedade, não existe soldado em condições de desempenhar suas relevantes funções. Sem melhorar de imediato a remuneração desses profissionais e sem a correção das distorções mais gritantes, a insatisfação será reforçada pelos ressentimentos. Poderão recolher-se, mas permanecerão sentidos, comprometendo o cenário futuro na área da Segurança Pública.
Era o que tinha a dizer!