Discurso no Senado Federal

DEFICIT SOCIAL PROVOCADO NA REGIÃO DO MUNICIPIO DE VOLTA REDONDA DECORRENTE DA PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA SIDERURGICA NACIONAL. SOLIDARIZANDO-SE COM O MOVIMENTO 'VAMOS REPENSAR VOLTA REDONDA', QUE DEFENDE A TRANSFORMAÇÃO DE PARTE DOS GANHOS ECONOMICOS DA EMPRESA EM BENEFICIOS PARA AS COMUNIDADES DOS MUNICIPIOS QUE GRAVITAM EM TORNO DA SIDERURGICA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • DEFICIT SOCIAL PROVOCADO NA REGIÃO DO MUNICIPIO DE VOLTA REDONDA DECORRENTE DA PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA SIDERURGICA NACIONAL. SOLIDARIZANDO-SE COM O MOVIMENTO 'VAMOS REPENSAR VOLTA REDONDA', QUE DEFENDE A TRANSFORMAÇÃO DE PARTE DOS GANHOS ECONOMICOS DA EMPRESA EM BENEFICIOS PARA AS COMUNIDADES DOS MUNICIPIOS QUE GRAVITAM EM TORNO DA SIDERURGICA.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 29/08/1997 - Página 17550
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, REDUÇÃO, EMPREGO, COMPANHIA SIDERURGICA NACIONAL, POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO.
  • ANALISE, ESTATISTICA, EVOLUÇÃO, COMPANHIA SIDERURGICA NACIONAL, AMBITO, RENDIMENTO, REDUÇÃO, CUSTO, MÃO DE OBRA, AUSENCIA, BENEFICIO, COMUNIDADE, REGIÃO.
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, MUNICIPIO, VOLTA REDONDA (RJ), BARRA MANSA (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REGISTRO, MOBILIZAÇÃO, POPULAÇÃO, AUTORIDADE, BUSCA, SOLUÇÃO, RECUPERAÇÃO, ECONOMIA, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO, RIQUEZAS, ORIGEM, COMPANHIA SIDERURGICA NACIONAL, DEFESA, NEGOCIAÇÃO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (BLOCO-PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Ronaldo Cunha Lima, Srªs. e Srs. Senadores, em 1989 a Companhia Siderúrgica Nacional empregava diretamente 23.200 trabalhadores. Quando foi privatizada, em 1993, seu quadro já havia sido reduzido para 15.750, sendo que atualmente é de 11.440 empregados. Estima-se que haverá redução para, aproximadamente, 10 mil pessoas. Esse processo se relaciona um pouco com o que o Senador Lauro Campos acaba de descrever, ao mencionar o fenômeno do chupa-cabras, ou seja, em menos de oito anos, aconteceu um processo dramático de demissões no qual 11.819 trabalhadores perderam seus empregos, de acordo com os dados fornecidos pela Companhia Siderúrgica Nacional para a Abamec.

No processo de privatização, a CSN foi vendida por US$1,057 bilhões, sendo que, de acordo com a Gazeta Mercantil, apenas 3,8% desse montante foi pago à vista. Isto significa US$40 milhões dinheiro e os US$1,017 bilhões restantes em títulos de dívidas vencidas, cujo deságio médio à época era de 50%. Com base nesses números, o capital efetivamente desembolsado pelos acionistas que a adquiriram foi de US$540,1 milhões.

Considerando-se as informações constantes nos balanços da CSN de 1993 a 1996 e de acordo com cálculos efetuados pelo Sindicato dos Engenheiros de Volta Redonda, a preços de dezembro de 1996, a média anual de dividendos da empresa atingiu US$86 milhões, significando um retorno sobre o capital empregado da ordem de 16%. Dados fornecidos pela Diretoria da CSN, sem memorial descritivo, contudo, informam que essa rentabilidade foi de 6%.

Ainda de acordo com dados extraídos dos balanços da CSN, o custo dos produtos vendidos caiu de U$476/t., em 1993, para US$380/t., em 1996. Por outro lado, informações do Sindicato dos Engenheiros de Volta Redonda - SENGE-VR - dão conta de que todos os reajustes salariais concedidos aos trabalhadores foram menores que a inflação do período e o incremento conseguido no custo dos produtos.

Em 1996, enquanto o custo médio da mão-de-obra (incluindo todos os encargos e benefícios) era de US$15,30/hora na CSN; em Taiwan, para as siderúrgicas, foi de US$21,80/hora; nos Estados Unidos foi de US$34,5/hora e na Alemanha atingiu US$40,20/hora. Informa a direção da CSN, por outro lado, que o salário base médio da empresa evoluiu de R$478,00, em 1993, para R$958,00, em 1997. Poderíamos ter melhor conclusão, caso também tivesse sido demonstrada a evolução do salário real médio, acompanhada da informação do valor adicionado por pessoa empregada naquela empresa para que tivéssemos de fato uma evolução do salário real médio versus a evolução dos ganhos de produtividade. Mas essa informação ainda não foi fornecida para uma melhor análise.

Pode-se constatar que a CSN vem alcançando resultados positivos com ganhos ano a ano, maior rentabilidade para os acionistas, maior produtividade daqueles que permaneceram empregados. Entretanto, esses ganhos econômicos não estão se traduzindo em benefícios para a comunidade que gravita em torno da empresa. Os Municípios de Volta Redonda, de Barra Mansa e outros da região vivem um momento econômico delicado. As inúmeras demissões deprimiram as vendas do comércio, o que implicou queda na arrecadação dos impostos e taxas municipais, contribuindo ainda mais para o agravamento do quadro de miséria e desmotivação da população. Tomando-se como base o período de 1992 até 1996, o índice de inadimplência do consumidor de Volta Redonda cresceu 286%. Já o número de ocorrências policiais, que em 1993 foi de aproximadamente 4.800, em 1996 atingiu 6.200, sendo que, em média, ocorreram 22 roubos e furtos por mês na cidade. Atualmente, 15% dos volta-redondenses estão vivendo em barracos em áreas de posse. A economia informal tomou conta das ruas, e a bancarrota atinge o comércio e a indústria da região, conforme diagnóstico elaborado pelo Sindicato dos Engenheiros de Volta Redonda.

Tendo tomado conhecimento dessa situação por intermédio do Presidente do Sindicato dos Engenheiros, João Tomaz A. Pereira da Costa, resolvi visitar Volta Redonda no última sábado, 23 de agosto. Conversei longamente, por telefone, com o Presidente da CSN, Benjamin Steinbruch, e fui acompanhado numa visita à empresa pelo Diretor Superintendente, José Carlos Martins, e recebido por diretores e gerentes responsáveis por cada unidade de produção, quando tive a oportunidade de conversar com os trabalhadores. Durante o dia estive também com o Prefeito, Antonio Francisco Neto, e a Vice-Prefeita, Maria Aparecida Diogo Praga, que, além de me acompanharem na visita à CSN, levaram-me às áreas mais críticas da cidade, como por exemplo, ao bairro do Padre Josimo. Mantive encontros com o Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda, Luiz de Oliveira Rodrigues, com representantes da "Oposição Sindical" e do movimento "Vamos Repensar Volta Redonda". Esse movimento engloba entidades como as associações comercial, industrial e agropastoril de Volta Redonda. Pude constatar que a preocupação com o problema social da cidade é geral. É preciso encontrar um caminho para solucioná-lo e superar os obstáculos naturais, diante de pontos de vista divergentes.

Amanhã, 29 de agosto, haverá uma manifestação pública na cidade com o apoio da Igreja, sobretudo do Bispo Dom Waldir Calheiros, para chamar a atenção sobre o esvaziamento econômico de Volta Redonda, em face do grande número de demissões e suas conseqüências.

No domingo passado, em todas as igrejas de Volta Redonda, foi lida uma carta de Dom Waldir conclamando a cidade e todos aqueles que estão preocupados com a situação para amanhã participarem dessa manifestação e manterem o estado de alerta, para evitar que o progresso eventual da CSN signifique a retirada do pão de cada dia de tantas pessoas que antes trabalhavam na empresa. Todos devem ficar atentos para as repercussões que isso pode ter.

Em virtude da degradação do quadro, organiza-se um movimento envolvendo os mais diversos segmentos que desejam pensar em soluções para reverter tal situação, fazendo com que o sucesso econômico da CSN seja acompanhado de efetivo progresso social para toda a comunidade. Esse movimento deverá incluir os Governos Federal, Estadual e Municipal, o Poder Legislativo em suas três esferas, os sindicatos de trabalhadores, a Igreja, as associações comerciais, a sociedade civil, enfim, todos devem envidar esforços para que, no mais curto espaço de tempo possível, um pouco da riqueza que se está concentrando possa ser melhor distribuída.

Assim, venho fazer um apelo ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, a quem encaminho esse ofício, ao Governador Marcelo Alencar, ao Prefeito de Volta Redonda, Antonio Francisco Neto, à Prefeita de Barra Mansa, Inez Pandeló, à direção da CSN e a todas as entidades e sindicatos envolvidos, no sentido de que possam sentar-se à mesa o quanto antes e encontrar soluções para esse grave problema.

Desejo registrar que o Diretor Superintendente, José Carlos Martins, afirmou que a CSN está disposta a participar e colaborar com esse entendimento. Foi também essa a palavra de todos aqueles com os quais conversei - inclusive a do Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda, Luiz de Oliveira Rodrigues, bem como a das lideranças sindicais, que são filiadas à CUT, que obviamente têm divergências. Mas ambos os movimentos querem reunir-se; também o Sindicato dos Engenheiros e os membros das associações comercial, industrial e pastorial de Volta Redonda, bem como o bispo Dom Valdir Calheiros consideram muito importante esse encontro.

É preciso levar em conta o bem-estar de toda a comunidade e não somente resultados econômicos para uma melhor rentabilidade dos acionistas que adquiriram o controle dessa empresa, símbolo da história da industrialização brasileira.

O Sr. Lauro Campos (BLOCO-PT-DF)- V. Exª permite-me um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (BLOCO-PT-DF) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Lauro Campos (BLOCO-PT-DF)- - A importância do pronunciamento de V. Exª encontra seu ponto crucial na preocupação em detectar as conseqüências sociais, o desgaste humano, o déficit cultural provocado por esse processo de privatização. Congratulo-me com V. Exª porque, como economista, V. Exª não cai naquele vício de muitos profissionais da área, que restringem seus calculozinhos apenas ao imediatismo econômico. Nesse universo mais amplo em que V. Exª colocou o problema, como que procurando os rastros dos chupa-cabras que aí estão presentes, privatizando, sucateando, destruindo e doando para uns e levando, como V. Exª mostra, o desemprego e o desespero à grande parte da nossa população.

Muito obrigado.

O SR. EDUARDO SUPLICY (BLOCO-PT-SP) - Agradeço a consideração de V. Exª, Senador Lauro Campos, que percebe e aqui denuncia, com muita assertividade, alertando as autoridades, inclusive todos aqueles pertencentes - e aqui vou falar em termos de símbolo - ao partido dos chupa-cabras, que é preciso levar em conta que não se pode simplesmente agarrar o pescoço das ovelhas indefesas, silenciosamente, durante meses. Não se pode alegar simplesmente o fato de que algumas pessoas estão tendo direito à sobrevivência e a uma relativa segurança.

Eu conversei com alguns trabalhadores, engenheiros da CSN, que informam que estão razoavelmente satisfeitos com a maior produtividade da empresa. Visitei diversas unidades produtivas da empresa junto com a ex-Vereadora Maria das Dores, a Dodora, que observou que antes costumava ver mais trabalhadores em cada unidade produtiva. Pareceu-nos que houve, de fato, um enxugamento, uma racionalidade crescente.

Quero registrar que o Diretor Superintendente, José Carlos Martins, mencionou que há , agora, pelo menos uma atitude de maior respeito a esse movimento, que se fortalece, pedindo que não haja mais demissões.

Registro que ele mencionou, a mim e perante os que conosco dialogavam - todos os aqui citados -, que não é mais intenção da empresa demitir, salvo no caso, digamos, de indisciplina ou de problemas que eventualmente ocorram. Então, não é uma norma rígida, mas, de agora em diante, disse-me ele que apenas serão afastados aqueles que venham a atingir a idade de aposentadoria, que inclusive são em maior número do que a necessidade de trabalhadores - algo em torno de 2.300 para o próximo ano e meio - e, portanto, haverá necessidade de se contratarem novos trabalhadores. Faço o registro, porque ele disse que não haverá novas demissões em larga escala.

Gostaria de ressaltar algo que me veio à lembrança: a Companhia Siderúrgica Nacional acabou ficando com todas as grandes áreas de terrenos - mesmo aquelas fora de sua área industrial, como uma fazenda -, e disse-me o Prefeito, inclusive mostrou-me, que todas as áreas vazias da cidade pertencem à CSN.

Quando o Governo vendeu a Companhia Siderúrgica Nacional, não se deu conta de que talvez fosse interessante repassar essas áreas vazias para a prefeitura. O Prefeito disse-me que não tem muitas possibilidades, pois todas as áreas da cidade são da CSN, e que está em dificuldades; se houvesse um grande progresso na cidade, haveria uma grande demanda para a construção de novos imóveis. Alguns estão sendo efetuados. Mas, se começa a haver esvaziamento e desemprego na cidade, como construir novas unidades habitacionais? Há uma grande procura, inclusive por habitações populares; 15% dos trabalhadores hoje estão em atividades informais e vivendo em ocupações, em barracos ou moradias extremamente precárias.

Indaguei ao Prefeito sobre o IPTU, e ele respondeu que o Governo Federal leva R$250 milhões de impostos, o governo estadual, um pouco menos e a Prefeitura, apenas R$20 milhões em impostos por ano. Destes, cerca de R$8 milhões são do IPTU, e 80% advém da própria CSN.

Estive pensando, naquele dia, e repensando, nos últimos dias, e também pensando no que Tony Blair fez recentemente na Inglaterra, de requerer das empresas privatizadas que paguem mais impostos à Nação a fim de fazer o contrabalanço. Quem sabe - fica aqui a minha sugestão ao Prefeito Antônio Francisco Neto - ele possa fazer uma reavaliação do valor venal dos terrenos e cobrar um IPTU mais de acordo com a necessidade da cidade e a responsabilidade da empresa, se é verdade que a CSN deseja o bem-estar da comunidade, e se o próprio Presidente e o Governador quiserem pensar numa solução com vistas à Nação, e não apenas pensar na rentabilidade dos acionistas que ganharam no jogo da privatização.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/08/1997 - Página 17550