Discurso no Senado Federal

CONTROVERSIAS DE DISPOSITIVO DA MEDIDA PROVISORIA 1.539-34, DE 1997, QUE INCLUI O COMERCIO VAREJISTA ENTRE OS SETORES QUE PODEM TRABALHAR AOS DOMINGOS.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • CONTROVERSIAS DE DISPOSITIVO DA MEDIDA PROVISORIA 1.539-34, DE 1997, QUE INCLUI O COMERCIO VAREJISTA ENTRE OS SETORES QUE PODEM TRABALHAR AOS DOMINGOS.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/1997 - Página 17657
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • ANALISE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), AUTORIZAÇÃO, COMERCIO VAREJISTA, FUNCIONAMENTO, DOMINGO, QUESTIONAMENTO, NUMERO, CRIAÇÃO, EMPREGO, PREJUIZO, FAMILIA, LAZER, TRABALHADOR.
  • DEFESA, AUTONOMIA, ESTADOS, MUNICIPIOS, REGULAMENTAÇÃO, FUNCIONAMENTO, COMERCIO VAREJISTA, DOMINGO, RESPEITO, NORMAS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobres Colegas, tenho recebido em meu gabinete inúmeras correspondências ora pedindo apoio para aprovar, ora para rejeitar, a matéria constante da Medida Provisória nº 1539-34/97, reeditada em 8 de agosto próximo passado e que vem gerando muita controvérsia no meu Estado e, acredito, no País. Essa é a razão que me traz a esta tribuna, para fazer algumas considerações, na expectativa de esclarecer melhor o assunto.

A medida provisória traz dispositivo de autoria do Ministério do Trabalho, que inclui o comércio varejista entre os setores que podem trabalhar aos domingos. Ao que parece, os domingos passarão a ser considerados como dia normal de trabalho, eliminando-se do calendário trabalhista o justo descanso dominical. Naturalmente, para os empresários, essa medida representa a possibilidade do aumento das vendas e geração de novas vagas com novos postos de trabalho para a população. As estimativas empresariais é de que vinte e cinco mil empregos seriam criados. Porém, para o professor da Universidade de São Paulo José Pastore, especialista no assunto, as pesquisas não são tão claras quanto à criação desses anunciados empregos.

As perspectivas empresariais, com os dados apresentados, são consideradas incorretas e aviltantes pelos sindicatos e outros segmentos trabalhistas, que vêem na iniciativa a quebra do elo familiar, que, invariavelmente, ocorre aos domingos. Entendem ainda ser a renúncia à prática do lazer, da religião e de outras atividades inerentes ao dia.

Por isso, Sr. Presidente e nobre Colegas, entendo que esta intervenção não objetiva entrar no mérito da questão, mas analisar o art. 6º da medida provisória, que dispõe: "Fica autorizado o trabalho aos domingos no comércio varejista em geral, respeitadas as normas de proteção ao trabalho e observado o art. 30, inciso I, da Constituição". O dispositivo constitucional mencionado diz, in verbis: "Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local;".

Ora, a forma federativa está identificada, dentre outros, nos arts. 1º e 18 da Constituição Federal. A característica principal do federalismo, a separá-lo do Estado unitário, de que é antítese, é a existência de autonomias regionais. No Brasil, essas autonomias são os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, além da União, por previsão expressa do art. 18, caput. Autonomia, do grego auto+nomos, significa autogoverno, poder de auto-organização, competência para gerenciamento de seus interesses próprios. Esse poder, por definição limitado pela Constituição Federal, e só por ela, expressa-se sob diversas formas: pela eletividade dos dirigentes executivos locais, pela eletividade de legisladores, pelo poder legiferante, pela capacidade licitatória, pela competência administrativa e gerencial e, principalmente, pelo poder de adotar e exercer todas as suas competências impositivas.

Isto posto, parece-nos inócua a autorização constante da medida provisória em tela, visto tratar-se de competência expressamente constitucional, que, salvo melhor juízo, far-se-á mediante manifestação da Câmara Municipal por meio de projeto de lei específico.

Trago este assunto ao Plenário porque a medida provisória citada prevê que o domingo passa a ser um dia normal de trabalho. A Constituição, no entanto, reza, em seu art. 30, que essa questão de haver trabalho aos domingos e feriados, ou não, é de competência dos Estados e Municípios. Não há por que entrarmos nessa seara. Essa medida está gerando problemas muito sérios, controvérsias enormes, em meu Estado, Santa Catarina. Já se trabalha de segunda a sábado e, agora, os lojistas e comerciários terão de trabalhar aos domingos também.

De acordo com a tradição, o domingo é o dia em que o trabalhador reúne a família, é o dia do descanso, da confraternização, mas que agora, com a edição dessa medida provisória, passa a ser um dia normal de trabalho. O Governo Federal, ao baixar essa norma, cria uma controvérsia, gera um mal-estar.

Então, se a Constituição estabelece que a competência para tratar dessa matéria é dos Estados e Municípios, por que vamos querer legislar sobre ela? Por que vamos entrar nessa seara?

Até admito que, em alguns municípios, em função da demanda de pessoas que o turismo exige, a Câmara de Vereadores daquela localidade deva legislar sobre a conveniência de haver trabalho aos domingos. Agora, editar uma medida para ser adotada nos quase seis mil municípios do Brasil, dizendo que o domingo será um dia normal de trabalho, não está certo.

Assim, temos de obedecer ao estatuído na Constituição e deixar a análise dessa matéria para a competência dos municípios. Há localidades em que, dada a demanda de mão-de-obra, se deva criar maneiras de atender ao público. O Senado Federal, no meu entender, não deve apreciar esse assunto.

Na última quarta-feira, assistimos à posse do Presidente dos Diretores Lojistas, em Belo Horizonte - por sinal, um catarinense. Nessa solenidade, soubemos que a nação dos lojistas está intranqüila. Não dá mais! Até seus filhos, que não têm aula aos domingos, não podem usufruir da companhia de pais e avós no final de semana, pois o domingo fica com a mesma rotina da semana. Isso descontrola tudo.

Então, o ponto de vista que defendo aqui é que não é da nossa competência legislar sobre esse assunto. Vamos respeitar o que diz a Constituição, vamos respeitar o princípio da autonomia, o princípio da auto-organização dos Estados e Municípios, enfim, o princípio federativo. Os vereadores têm competência para analisar essa matéria, eles estão lá para ouvir o povo. Há exceções, sim, mas deixemos que eles tomem decisões sobre esse assunto. Por que iríamos impor qualquer decisão aos mais de cinco mil municípios brasileiros?

Sr. Presidente e nobres colegas, trago essas considerações, nesta manhã, porque o assunto diz respeito a um movimento que está-se espalhando pelo Brasil inteiro - no Sul, no Norte, no Centro-Oeste, no litoral brasileiro, enfim, em toda parte. Senti isso na posse do Presidente da Confederação dos Lojistas, em Belo Horizonte, na última quarta-feira, onde mais de oito mil lojistas e comerciários estiveram reunidos em congresso.

Sr. Presidente e nobres colegas, percebi a necessidade de deixarmos que Estados e Municípios legislem sobre o assunto.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/1997 - Página 17657