Discurso no Senado Federal

LIQUIDAÇÃO DO BANCO DO ESTADO DO AMAPA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL. PREOCUPAÇÃO DE S.EXA. EM GARANTIR OS DIREITOS DOS MUTUARIOS DA ENCOL, DIANTE DO DESINTERESSE DO GOVERNO EM SOLUCIONAR O PROBLEMA.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS. ECONOMIA POPULAR.:
  • LIQUIDAÇÃO DO BANCO DO ESTADO DO AMAPA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL. PREOCUPAÇÃO DE S.EXA. EM GARANTIR OS DIREITOS DOS MUTUARIOS DA ENCOL, DIANTE DO DESINTERESSE DO GOVERNO EM SOLUCIONAR O PROBLEMA.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/1997 - Página 18105
Assunto
Outros > BANCOS. ECONOMIA POPULAR.
Indexação
  • CRITICA, LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), BANCO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP).
  • ESCLARECIMENTOS, ORADOR, QUALIDADE, PRESIDENTE, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), SENADO, INTERPELAÇÃO, EDUARDO SUPLICY, SENADOR, POSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, BANCO DO BRASIL, DECRETAÇÃO, FALENCIA, EMPRESA DE ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, RESULTADO, NECESSIDADE, ATUAÇÃO, MUTUARIO, MANIFESTAÇÃO, OPOSIÇÃO, GOVERNO, PROVIDENCIA, IMPEDIMENTO, PREJUIZO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (BLOCO/PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, fomos surpreendidos neste dia com a liqüidação do Banco do Estado do Amapá pelo Banco Central do Brasil.

Sr. Presidente, não sei as razões e os motivos que levaram o Banco Central a tomar tal decisão. O Governador do Estado do Amapá, João Alberto Capiberibe, um dos mais bem conceituados da Amazônia e que governa o Estado mais preservado da nossa região, é o único a sustentar uma política de desenvolvimento auto-sustentado, tão falado e comentado e pregado pelo próprio Presidente da República e que, na prática, apenas S. Exª o faz em toda aquela região. Por estar em visita ao Canadá, não tive a oportunidade de saber sobre o que pensa dessa decisão do Banco Central do Brasil.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em princípio, quero apenas lamentá-la, porque percebo que o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso quer acabar com tudo o que seja do Estado neste nosso País, pois deseja entregá-lo à iniciativa privada. Creio que, se depender do Chefe do Executivo, do seu Partido e daquele ao qual S. Exª segue as orientações - o Partido da Frente Liberal-, não há e não haverá mais Estado, dentro de pouco tempo. Porque é um Governo que já vendeu todo o parque siderúrgico nacional e a Companhia Vale do Rio Doce; está trabalhando de uma maneira insistente no sentido de vender todo o sistema elétrico nacional, inclusive impondo isso aos Estados, pois foi condição de renegociação da dívida de todos os Estados brasileiros o comprometimento da venda de suas respectivas distribuidoras de energia elétrica; está vendendo ou assumindo todas as companhias telefônicas estaduais e pretende, num futuro breve, vender todo o sistema telefônico do nosso País; e está tentando acabar com todo o sistema bancário estadual do nosso Brasil.

Já privatizaram o Banco do Estado do Rio de Janeiro e, permanentemente, pressionam os Governadores de todos os Estados do Brasil para entregarem os seus bancos ou acabarem ou transformarem os seus bancos em agência de desenvolvimento. Não nos parece seja outra a razão do Banco Central nessa atitude de liquidar o Banco do Estado do Amapá, do Estado governado pelo meu correligionário, o Governador João Alberto Capiberibe.

Estamos acompanhando, na nossa Amazônia, o nosso banco de desenvolvimento, o Banco da Amazônia, o banco que gere a aplicação do Fundo Constitucional do Norte, fundo que foi criado por nós na Constituição de 1988, que acaba de fechar nesses dias 16 agências bancárias na Amazônia, entre elas, três no Estado do Pará, nos Municípios de Oriximiná, Ponta de Pedras, Ananindeua, numa atitude que vem sendo a política permanente do Presidente Fernando Henrique Cardoso: liquidar com tudo que pertença ao Estado, tudo que é feito pelo Estado.

Não posso compreender como o Presidente Fernando Henrique Cardoso imagina que o setor privado vá atender aquilo que é necessidade social. Não imagino um banco como o Bradesco ou o Itáu a fazer financiamentos à agricultura com juros condizentes com a necessidade desse setor. Não imagino uma companhia de telecomunicações nas mãos da iniciativa privada, principalmente do capital multinacional, a colocar telefones nos lugares mais longínquos do meu Estado, ou de Roraima, ou do Acre. Não imagino o dono do sistema elétrico brasileiro - até a hidrelétrica de Tucuruí o Governo já está preparando para vender -, executivos de multinacionais, que serão donos desses sistemas, pensarem em colocar energia nos rincões do Pará. E energia é uma necessidade social. Telefone é uma necessidade social, assim como um banco, principalmente um banco de desenvolvimento. São coisas que apenas o Estado tem capacidade de fazer.

Lamentavelmente, o Governo Fernando Henrique Cardoso perpetra esse crime contra a Nação brasileira, esse crime da política neoliberal, demonstrando mais uma vez que não existe nada mais falso no Brasil do que o Partido da Social Democracia Brasileira. Eu nunca vi algo tão falso na minha vida como a tentativa de enganar a sociedade brasileira, defendendo uma proposta de socialdemocracia e agindo com a política do neoliberalismo. Lamentavelmente isso está ocorrendo. Manteremos contato com o Governador do Amapá e voltaremos a esta tribuna para questionar a ação do Banco Central com relação à liquidação do Banco do Estado do Amapá.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP.) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - (Bloco/PSB-PA) -Ouço o Senador Eduardo Suplicy com alegria.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP.) - Prezado Senador Ademir Andrade, neste final de tarde, permita-me solicitar a V. Exª uma informação relativa a assunto da Comissão de Assuntos Sociais. Há na tribuna de honra do Senado Federal inúmeros trabalhadores da Encol, muito angustiados com o destino da empresa com relação aos 12 mil funcionários e aos 42 mil mutuários. V. Exª presidiu ontem a audiência pública da Comissão de Assuntos Sociais, que contou com a presença dos Presidentes do Banco do Brasil, Paulo César Ximenes, e da Caixa Econômica Federal, Sérgio Cutolo. Hoje houve uma manifestação diante do Palácio do Planalto, em que toda essa comunidade solicitou uma audiência junto ao Presidente da República. Eles gostariam de saber que encaminhamentos a Comissão que V. Exª preside resolveu dar após a reunião. Agradeço em nome dessas pessoas se puder dar a informação.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB/PA) - Se o Presidente permitir-me ficar na tribuna mais cinco minutos, darei a explicação com muito prazer.

O SR. PRESIDENTE (Otoniel Machado) - Está concedido o tempo solicitado por V. Exa.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB/PA) - Ontem conseguimos, de certa forma, desmascarar o Governo que vinha enganando a sociedade brasileira, afirmando que a falência não interessava a ninguém. Mas, no final da nossa reunião de ontem, após insistente pressão dos Parlamentares que lá estavam, o Diretor de Crédito do Banco do Brasil deixou claro - ao substituir o Presidente daquela instituição nos debates - que o Governo está defendendo a falência da Encol.

O Governo considera que a única solução possível para a crise da Encol é a falência. Em tal caso, eu não tenho nenhuma esperança de que mutuários tenham direito a absolutamente coisa alguma no final desse processo. Os mutuários perderão todos os seus direitos. Num processo de falência, haverá um leilão, os esqueletos da Encol serão leiloados - e outras empresas construtoras haverão de adquirir esses esqueletos - para pagar os débitos prioritários num processo de falência: direitos trabalhistas, débitos dos Governos, hipotecas dos bancos e, por último, os mutuários. Portanto, a solução de falência não deve ser a opção do Governo.

Ontem, houve uma reunião bastante tensa. Hoje pela manhã, telefonei para o Dr. Edson, que estava em Fortaleza, e solicitei uma nova reunião. Ponderei sobre a possibilidade de esperar a negociação com essas duas empresas americanas que pretendem comprar a Encol.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso, que gosta de vender tudo no Brasil, ficará feliz quando vir duas empresas estrangeiras tomarem conta de uma empresa de construção em nosso País. É uma solução que, portanto, deve interessar-lhe bastante.

Indaguei ao Dr. Edson se haveria tempo de o Governo esperar que essas empresas americanas estudem a possibilidade de comprarem a Encol, porque, assim, os mutuários teriam alguma chance nesse processo. Ele respondeu que era possível e que haveria disposição para esperar.

Marcamos uma nova reunião, a ser realizada na terça-feira de manhã, para a qual estou convidando alguns Deputados Federais interessados e envolvidos no assunto.

Na nossa opinião, a negociação tentada pelo Senador Iris Rezende - Ministro da Justiça - a qual não teve solução de prosseguimento, era de que fosse para a Comissão de Assuntos Sociais. Proponho que as nossas reuniões não sejam reuniões públicas nem de debates ou discursos com a imprensa presente. Sugiro reuniões que tenham como objetivo discutir, apresentar soluções e manter aberto esse espaço de negociação. Particularmente, eu não admito e não consigo compreender a hipótese da falência. A falência acarretará um caos total e absoluto para nosso País, para os mutuários, enfim, para todos.

Vamos, pois, continuar trabalhando no sentido de garantir uma solução para esse problema.

Saí extremamente assustado da reunião. A impressão que tive foi de que a falência seria decretada esta semana. Por esse motivo, hoje pela manhã, procurei o Dr. Edson. Na nova conversa que tive com ele, senti que ainda há espaço para se trabalhar antes que a falência seja decretada. Por mais que eles digam que os próprios mutuários podem comprar esqueletos em leilão, insisto que considero isso absolutamente inviável. 

Vamos, assim, continuar negociando na busca de uma solução.

Creio que a única forma de fazer o Governo retroceder na sua posição é a pressão política. Os mutuários devem compreender o que está acontecendo, ou seja, que o Governo está querendo lavar as mãos. E devem partir para as ruas, iniciar a luta, mobilizar parlamentares, repetir o que fizeram hoje em frente ao Palácio do Planalto, organizar-se em seus Estados, pressionar seus governadores. Não é possível receber o tratamento que o Governo está dando aos mutuários da Encol.

Vou concluir, Sr. Presidente, fazendo uma comparação. Comparo, Senador Eduardo Suplicy, o tratamento que o Governo está dando à Encol com o tratamento dado aos bancos. Para salvar os bancos, o Governo subsidiou empréstimos com recursos do Tesouro. E isso está prejudicando o povo brasileiro, pois aumentou a dívida pública interna. O Governo capta dinheiro no mercado com juros mais altos do que o que empresta a esses bancos. E está tratando os mutuários da Encol de outra maneira.

Sua Excelência tratou os policiais militares e os policiais civis, quando fizeram greve armados, de forma diferente da qual tratou os funcionários das áreas de saúde e de educação que fizeram greve.

Tratou os bancos como tratou os PMs e a polícia civil. A polícia civil, armada na sua greve, foi quase totalmente atendida nas suas reivindicações. Não está atendendo os mutuários da Encol da mesma forma como não está atendendo os funcionários públicos das áreas de saúde e de educação, porque, para ele, educação e saúde não têm importância alguma. As áreas de saúde ou educação podem ficar seis meses, um ano de greve. Para o Governo, não faz diferença alguma.

É esse tipo de diferenciação que estou vendo o Governo fazer; usa dois pesos e duas medidas. O Governo não apurou sequer as contas da Encol; não estudou sequer as contas da Encol para, a partir daí, tentar uma solução.

Nós, da nossa parte, vamos continuar fazendo o que for possível para ajudar os 12 mil funcionários da Encol e os 42 mil mutuários. Aliás, não são só 42 mil. Esses são os que têm imóvel a receber. Há mais quase 30 mil que já receberam imóvel, mas que, num processo de falência, como seu bem está hipotecado em função das dívidas, estão também sujeitos a perdê-lo, porque não tem escritura dele.

O problema é muito maior do que se imagina. E o Governo não pode simplesmente lavar as mãos, como está fazendo neste momento.

É preciso que cada mutuário compreenda a necessidade de pressionar. É precisa que cada mutuário entenda que nossa força política não é suficiente para fazer o Governo mudar de posição. Mas a força do povo nas ruas, a força dos mutuários nas ruas, a mobilização dos funcionários, esta sim, é capaz de fazer o Governo mudar de posição.

Agradeço, Sr. Presidente, a oportunidade de prestar esse esclarecimento.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/1997 - Página 18105