Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A LIQUIDAÇÃO DO BANCO DO ESTADO DO AMAPA - BANAP.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A LIQUIDAÇÃO DO BANCO DO ESTADO DO AMAPA - BANAP.
Publicação
Publicação no DSF de 05/09/1997 - Página 18191
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), LIQUIDAÇÃO, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), ANTERIORIDADE, APURAÇÃO, POLICIA FEDERAL, MINISTERIO PUBLICO, IRREGULARIDADE, OPERAÇÃO FINANCEIRA, AMBITO INTERNACIONAL, SUSPEIÇÃO, PARTICIPAÇÃO, RICARDO JAAD FILHO, EMPRESARIO, GOVERNADOR, DIRETORIA.
  • DEFESA, PRESERVAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), SALARIO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, DIREITOS, FUNCIONARIOS, CORRENTISTA.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (Bloco/PDT-AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto que me traz à tribuna na tarde de hoje, mais uma vez, é o escândalo que culminou com a liquidação do Banco do Estado do Amapá, o Banap, liquidação procedida pelo Banco Central na manhã de ontem, com data que retroage a 5 de julho de 1997. Estamos, na verdade, diante de um escândalo quase das mesmas proporções do escândalo dos precatórios, só que atingindo, até o momento, apenas um Estado. Houve a máfia dos precatórios, agora trata-se da máfia dos CDBs - Certificados de Depósitos Bancários. Não há qualquer dúvida de que toda a operação tenha sido montada através de uma quadrilha especializada. O próprio Banco Central fez essa afirmação e pede que o Ministério Público apure o provável crime de formação de quadrilha na tramitação dessa operação que geraria um calote, em nível internacional, da ordem de aproximadamente US$6 bilhões.

Ontem, da tribuna do Senado, expus minha preocupação e minha visão do problema. Eu defendia que, antes da liquidação - eu não conhecia as razões básicas do problema- houvesse a intervenção.

Nesta oportunidade, aliás, quero tentar, pelo menos, propor-me a separar bem as coisas. Em primeiro lugar, louvar a decisão do Banco Central de sustar, imediatamente, a operação. Entendo que o Banco Central agiu corretamente, evitando um calote em nível internacional da ordem de US$6 bilhões, que colocaria em risco o suporte financeiro do Governo do Estado do Amapá, inclusive, o principal controlador do Banap, e o próprio sistema financeiro nacional, em função da repercussão negativa da credibilidade desse, em nível internacional. Essa é uma questão pontual. O Banco Central agiu corretamente ao suspender a operação.

Sr. Presidente, há outro aspecto que quero separar bem. Embora não seja economista, - como sabem, sou médico - o entendimento é o de que poder-se-ia muito bem, ao suspender a operação, fazer uma intervenção e não partir, diretamente, para a liquidação do Banap.

Foi publicado, na Folha de S.Paulo, a relação da situação real de todos os bancos estaduais. Os bancos que se encontram em liquidação são os do Amapá e de Alagoas, sendo que em relação ao segundo, parece-me estar havendo reversão da liquidação. Os demais, ou estão em saneamento, com proposta sob exame, ou em regime de administração especial temporária, a RAET, ou com proposta de privatização.

Sr. Presidente, insisto em dizer que, pela ação pontual e ágil do Banco Central, o rombo não aconteceu nas contas do Banap, que tem, sim, um patrimônio líquido negativo de R$7,5 milhões, o que por si só já coloca o Banco em uma situação desfavorável, sobretudo para garantir uma operação de US$6 bilhões. Contudo, essa operação não se consumou: os títulos foram emitidos - doze títulos de US$ 500 milhões cada um -, emitidos inclusive em inglês, circularam no mercado internacional, mas não foram negociados; portanto, não houve a captação dos recursos. Assim, a operação não se consumou.

Dessa forma, Sr. Presidente, defendo a tese de que havia a possibilidade de o Banco Central, antes de fazer uma intervenção, investigar as responsabilidades dos diretores do Banap, do próprio Governo do Estado do Amapá - e daqui a pouco pretendo passar a apresentar a versão do Governo e dos diretores do Banap -, uma vez que não temos ainda elementos suficientes para fazer um julgamento justo desse caso.

Tenho informações ainda muito embrionárias de parte do Banco Central, a quem requisitei, através da Mesa do Senado, fossem complementadas. Espero que o Banco Central nos envie essas informações.

Hoje, visitei o Procurador-Geral da República substituto, Dr. Aroldo, que me disse que o documento já estava no Ministério Público, mas que ainda não tinha examinado o processo, cuja cópia ele ficou de analisar a possibilidade de nos passar, para que possamos tomar conhecimento. O Banco Central ficou de expedir, ainda na tarde de hoje, uma nota explicativa da seqüência e da cronologia dos fatos que motivaram a liquidação do Banco do Estado do Amapá.

Nosso pensamento continua sendo o de que os fatos constatados são muito graves. Como disse, é uma quadrilha que tem conexão norte-sul: o empresário Ricardo Saad Filho é de São Paulo; o endereço das empresas é de São Paulo, Rua Estados Unidos, não me consta o número; as terras ficam em Mato Grosso; o cartório que reconheceu como verdadeiras as assinaturas falsas dos diretores do Banco Central é de Brasília, e a operação estava sendo feita no Amapá. É uma conexão norte-sul que visava fraudar certamente instituições financeiras internacionais, porque há indícios de que essa operação poderia, nesse contexto todo, estar visando lavagem de dinheiro de origem suspeita e criminosa.

Não contesto de forma alguma e louvo, mais uma vez, o Banco Central pela suspensão da operação, mas quero discuti-la. Por isso requeri na Comissão de Assuntos Econômicos desta Casa a convocação do Presidente do Banco Central, Dr. Gustavo Franco, para que ele possa mencionar, de fato, se há constatação de envolvimento dos diretores do Banco Central ou do próprio Governo do Estado. No momento em que houver a liquidação do banco os indícios, ou seja, a interpretação desse ato fulminante do Banco Central é no sentido de que a diretoria do banco estaria envolvida. Caso contrário, se há responsabilidade no julgamento do Banco Central pela falsificação dos documentos, apenas, do empresário e dos demais envolvidos. Se não se estendesse aos diretores do Banap, na visão do Banco Central, certamente este órgão não teria decidido pela liquidação.

É importante que o Dr. Gustavo Franco e o Banco Central afirmem abertamente: Há a constatação direta dos diretores do Banco Central, ou dos diretores do Banap ou, apenas, uma omissão, uma administração temerária, como propõe inclusive o próprio Banco Central a respeito disso.

Eu espero que o Ministério Público, que está com o processo em mãos, possa agir de forma rápida junto com a Polícia Federal e chegue às conclusões a respeito da responsabilidade dessa operação e dessa fraude de grandes proporções que poderia ter acontecido se o Banco Central não tivesse agido com rapidez.

Quero mencionar que o empresário Ricardo Saad Filho, segundo informações que recebemos de Macapá, está preso na Polícia Federal daquela capital. Numa ação policial foi encontrado numa residência, que vou fazer algumas referências sem comprometer ninguém, mas é o que circula no Estado do Amapá, para dar oportunidade às pessoas na utilização de instrumentos possíveis em sua defesa.

Segundo informações circuladas no Amapá quanto ao caso, há suspeição de parentesco do Sr. Ricardo Saad Filho com diretores da Rede Bandeirantes de Televisão.

Ontem, a emissora divulgou nota negando esse parentesco. Mas é importante que a emissora encaminhe esses documentos aos representantes do povo do Estado do Amapá, para que eles possam confirmar que não há qualquer parentesco ou envolvimento de diretores da Rede Bandeirantes de Televisão.

Existe uma empresa, a Platec, envolvida no processo que procedeu a avaliação das terras. Segundo consta, é uma empresa de Mato Grosso. É importante que o Banco Central divulgue o nome dos proprietários dessa empresa, pois, supostamente, as terras, que ficam em Mato Grosso, foram supervalorizadas, superavaliadas.

Segundo corre no Amapá, o dono dessas terras seria o Sr. Cecílio do Rego Almeida, proprietário da CR Almeida. Essas terras teriam sido repassadas ao Sr. Ricardo Saad Filho para que ele pudesse colocá-la em disponibilidade junto ao Banco do Estado do Amapá para servir de lastro na busca, na captação dos US$6 bilhões correspondentes a essa avaliação, possivelmente fraudulenta, da Platec.

Acredito que eu tenha resumido a situação atual do escândalo proporcionado pelo Banco do Estado do Amapá, ao emitir esses certificados sem constatar a veracidade, a legitimidade dos documentos que lhe foram apresentados. Depois que a Polícia Federal e o Ministério Público apurarem os fatos, iremos aos responsáveis. Isso é claro e não é preciso insistir nessa tese. Uma operação de tal porte não pode ser levada a efeito sem o conhecimento do Governador do Estado. S. Exª, em várias emissoras de rádio e televisão do Estado do Amapá, negou - como era previsível - qualquer envolvimento seu e de diretores do Banap em todo esse episódio. Todavia, o Chefe do Executivo amapaense não pode negar que conhecia a operação, haja vista o volume de recursos envolvido.

Espero que tudo seja esclarecido e que os responsáveis sejam punidos. Até agora, os grandes prejudicados são os correntistas, os funcionários e os servidores públicos - do ex-território, sobretudo - que recebem os seus vencimentos através desse banco. São essas pessoas e também o empresário Ricardo Saad Filho, que, como disse, encontra-se preso na Polícia Federal do Estado do Amapá.

Infelizmente, o volume de dados não justifica a instalação de uma CPI no Senado da República ou na Câmara dos Deputados, em função de envolver apenas um Estado da Federação e por ser um episódio específico que o Ministério Público e a Polícia Federal, no meu entendimento, têm plenas condições de investigar, de encontrar os culpados e de puni-los.

Falo em nome do povo do Amapá, porque o que se exige, neste momento, do Banco Central, do Ministério Público e da Polícia Federal, é que os responsáveis sejam identificados e devidamente punidos, podendo responder ao dolo que devem ter cometido nessa operação gigantesca de captação de recursos internacionais de forma fraudulenta.

Não posso concluir sem antes dizer que, segundo um dos Diretores do Banap, teria sido o próprio banco quem teria solicitado uma avaliação quanto à autenticidade do documento que apareceu no processo - documento este expedido pelo Banco Central. O Banco Central confirma que houve essa solicitação do Banap para confirmar a procedência desse documento, mas nega que o banco tenha tomado qualquer providência. Então, com isso, o Banco Central justifica a liquidação do Banap.

Nós, da Bancada federal, estamos agindo no sentido de definir uma posição conjunta da Bancada. É claro que há Parlamentares que entendem, desde já, existir uma culpa definitiva do Governador e dos Diretores do Banco do Estado do Amapá. Posiciono-me em uma situação mais cautelosa, no sentido de não fazer acusações enquanto as culpas das várias personalidades que atuaram nesse episódio não estiverem comprovadas.

É nossa obrigação, como representantes do Estado, defender a nossa instituição. Se os diretores agiram de forma a comprometer o patrimônio da instituição bancária, se houve envolvimento do Governador do Estado, isso será devidamente apurado - assim espero. Mas é nosso dever exigir que o Banco Central, suspendendo a operação, dê ao Banap - Banco do Estado do Amapá, a mesma oportunidade que deu aos demais bancos de recuperarem-se.

Se tivesse que fazer uma intervenção, se tivesse que destituir os diretores, que o fizesse, mas que procurasse preservar o Banap, da mesma maneira como - divulga-se - vai-se preservar os demais bancos estaduais, transformando o Banap numa agência de fomento da economia e do desenvolvimento do Estado do Amapá. Nesse aspecto, continuo contestando a liquidação fulminante, brusca, intempestiva do Banco do Estado do Amapá pelo Banco Central.

Não faço isso em meu nome. Não tenho interesse particular no banco, nada tenho que me comprometa com o banco. Faço isso em nome do povo do Estado do Amapá, dos funcionários do banco, dos servidores do Estado e dos correntistas. 

Só para se ter uma idéia, o Governo do Estado do Amapá, segundo relatório do Banco Central, tinha, no mês de julho - não sei se o balanço atual vai confirmar esses dados - R$9,5 milhões em depósito, depósito esse que fica bloqueado.

Se o patrimônio líquido negativo é da ordem de R$7,5 milhões, esses R$9,5 milhões vão servir apenas para compensar o patrimônio líquido negativo do Banap. Então, haverá um prejuízo muito grande para os cofres públicos do Estado.

É claro que, se for comprovada responsabilidade dos direitores ou do Governador, nesse caso, o Banco Central terá agido corretamente. Mas, se não ficar comprovada formalmente qualquer responsabilidade, se judicialmente não ficar constatado envolvimento de nenhum dos diretores diretamente com o assunto, então o Estado terá tido prejuízos decorrentes de uma ação intempestiva do Banco Central.

Por isso, Sr. Presidente, faço este alerta: que sejam preservados os recursos públicos existentes no Banco, os salários dos servidores públicos federais e os direitos dos funcionários e dos correntistas, que se encontram nessa situação drástica no Estado do Amapá.

Era o que eu tinha a comunicar.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/09/1997 - Página 18191