Discurso no Senado Federal

DECRETAÇÃO PELO BANCO CENTRAL DA LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL DO BANCO DO ESTADO DO AMAPA. PROJETO DE LEI DE SUA AUTORIA, EM TRAMITAÇÃO NO SENADO, QUE DISPÕE SOBRE MANDATO FIXO PARA OS CARGOS DIRETIVOS DO BANCO CENTRAL. PUNIÇÃO DOS CULPADOS PELO ESCANDALO NO BANCO DO ESTADO DO AMAPA, EM ESPECIAL, DO GOVERNADOR DO ESTADO. REQUERIMENTO APRESENTADO POR S.EXA. AO PRESIDENTE DA COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, VISANDO ACIONAR O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, COM VISTAS A APURAR OS ESCANDALOS FINANCEIROS NO BANCO DO ESTADO DO AMAPA.

Autor
Gilvam Borges (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: Gilvam Pinheiro Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • DECRETAÇÃO PELO BANCO CENTRAL DA LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL DO BANCO DO ESTADO DO AMAPA. PROJETO DE LEI DE SUA AUTORIA, EM TRAMITAÇÃO NO SENADO, QUE DISPÕE SOBRE MANDATO FIXO PARA OS CARGOS DIRETIVOS DO BANCO CENTRAL. PUNIÇÃO DOS CULPADOS PELO ESCANDALO NO BANCO DO ESTADO DO AMAPA, EM ESPECIAL, DO GOVERNADOR DO ESTADO. REQUERIMENTO APRESENTADO POR S.EXA. AO PRESIDENTE DA COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, VISANDO ACIONAR O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, COM VISTAS A APURAR OS ESCANDALOS FINANCEIROS NO BANCO DO ESTADO DO AMAPA.
Aparteantes
Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 09/09/1997 - Página 18409
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • REGISTRO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), FRAUDE, EMISSÃO, CERTIFICADO, DEPOSITO, NEGOCIAÇÃO, EXTERIOR.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, FUNÇÃO FISCALIZADORA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, AMPLIAÇÃO, AUTONOMIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), ESPECIFICAÇÃO, DEFINIÇÃO, MANDATO, DIRETORIA.
  • REPUDIO, IRREGULARIDADE, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), REGISTRO, RESPONSABILIDADE, GOVERNADOR, NOMEAÇÃO, DIRIGENTE, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
  • DEFESA, APURAÇÃO, RESPONSABILIDADE, FRAUDE, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), REGISTRO, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, ENDEREÇAMENTO, COMISSÃO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE, SENADO, SOLICITAÇÃO, INSTAURAÇÃO, AUDITORIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), AUXILIO, INVESTIGAÇÃO.

O SR. GILVAM BORGES (PMDB-AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Banco Central do Brasil tomou, no dia três do corrente, a decisão de decretar a liquidação extrajudicial do Banco do Estado do Amapá, com base, como consta do Ato nº 728 de seu Presidente, na prática de graves irregularidades em operações de emissão de certificados de depósitos para negociação no exterior, caracterizadas pela utilização de documentação falsa e assunção de risco incompatível com sua capacidade financeira, infringindo normas legais e regulamentares disciplinadoras da atividade bancária.

No Correio Braziliense do dia quatro do corrente mês, chegam-nos mais detalhes sobre as razões da medida extrema tomada pelas autoridades financeiras federais. O Banco do Estado do Amapá, sob a administração da Srª Lenir Messias de Almeida, indicada para o cargo pelo Governador João Alberto Capiberibe, já vinha sendo alvo de gestão registrando patrimônio líquido negativo equivalente a 7,5 milhões e apresentando depósitos de apenas 11 milhões.

Não obstante essa situação deficitária, a direção do Banco do Estado do Amapá tentou captar no exterior recursos da ordem de seis bilhões e, portanto, mais de quinhentas vezes o valor de seu ativo circulante.

O mais alarmante e estarrecedor em tudo isso é que tal operação estava sendo baseada em fraude grosseira, montada da seguinte maneira: com fundamento em declarações de propriedade de uma área de 536.913 hectares de mata virgem, localizada em Mato Grosso e avaliada em R$ 6,028 bilhões, o Banco do Estado do Amapá apresentou proposta de obtenção de numerário no mercado internacional.

Os recursos seriam captados mediante emissão de certificados de depósitos lastreados nessas terras. Os papéis, no valor de R$ 6,028 bilhões e divididos em 12 lotes, chegaram até a ser emitidos, mas acabaram sendo bloqueados pelo Banco Central. Essa é a situação de fato.

Diante da gravidade do problema, solicitamos ao Dr. Gustavo Franco informações mais circunstanciadas sobre o processo que deu origem à liquidação.

Apesar do evidente prejuízo patrimonial advindo do fechamento da mais importante agência financeira oficial do meu Estado, não é possível deixar de reconhecer a eficiência da ação fiscalizadora do Banco Central, ao abortar operação eivada de vícios, urdida com evidente má-fé de seus idealizadores e impossível de ser honrada, destinada, afinal, a ser assumida pelos contribuintes não só amapaenses como brasileiros em geral, agravando ainda mais a nossa dívida pública.

Digna, portanto, dos maiores elogios a atuação irrepreensível da Presidência do Banco Central no episódio, que cumpriu com exação sua missão legal de zelar pela observância das normas legais e estatutárias regedoras da atividade bancária, bem como das determinações do Conselho Monetário Nacional e do próprio Banco Central, no uso de suas atribuições conferidas pela Lei nº 6.024, de 1974, que dispõe sobre a intervenção e liquidação extrajudicial das instituições financeiras privadas e públicas não federais.

É preciso dar à Direção do Banco Central a condição de verdadeiros guardiões da moeda, e não - como até agora - de simples apêndice do Ministério da Fazenda.

Portanto, objetivando a verdadeira autonomia do Banco Central, a exemplo do que ocorre nas economias mais prósperas do planeta, apresentamos, recentemente, Projeto de Lei Complementar que institui, entre outras disposições, mandatos fixos e escalonados para a Diretoria do Banco Central.

Tais mandatos não seriam coincidentes com o do Presidente da República, o que resguardaria os seus detentores de eventuais caprichos da Chefia do Executivo, que, para demiti-los, precisariam de aprovação da maioria absoluta do Senado Federal, em escrutínio secreto, a exemplo do que a Constituição Federal dispõe em relação à dispensa ex-officio do Procurador-Geral da República.

Assim, conscientes da relação íntima historicamente existente entre moeda e soberania política; avisados do quanto depende a estabilidade política do País de sua estabilidade monetária e do muito que esta se articula com a autonomia das autoridades monetárias frente às pressões políticas, propomos este conjunto de medidas para tornar o Banco Central uma instituição enxuta, com a típica ação de formuladora e executora de uma política monetária independente e antiinflacionária, a exemplo de suas congêneres nas economias mais adiantadas que se conhecem.

Por tudo isso e em decorrência de nossa posição de representantes eleitos do nosso Estado, nesta Casa do Congresso Nacional, sentimo-nos autorizados, ao mesmo tempo em que saudamos a medida moralizadora da intervenção ora efetuada, a repudiar, com veemência e indignação, a conduta antiética e criminosa dos responsáveis pela condução dos negócios do Banco do Estado do Amapá.

O Sr. Romero Jucá (PFL-RR) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Romero Jucá?

O SR. GILVAM BORGES (PMDB/AP) - Ouço o aparte de V. Exª.

O Sr. Romero Jucá (PFL-RR) - Caro Senador, V. Exª traz, hoje à tarde, como tema do seu discurso a questão da intervenção do Banco do Estado do Amapá, fato extremamente lamentável que retira do Estado do Amapá um possível instrumento de desenvolvimento e de melhoria da condição de seu povo. Esse fato lamentável não é isolado, porque, também em Roraima, o Banco do Estado está para ser fechado, com um prejuízo de mais de R$25 milhões, configurado principalmente por conta de uma má gestão. E a observação que gostaria de fazer é a de que o Banco Central tem procurado agir contra esse tipo de atuação nefasta para os cofres públicos. No entanto, é de fundamental importância que não só a liquidação se dê, mas, sobretudo, que a cobrança e a responsabilização das pessoas culpadas pela dívida e pela má gestão sejam efetuadas. No caso de Roraima, o Governo do Estado e o próprio Banco Central querem impingir à sociedade e ao Estado essa dívida de R$ 25 milhões. Na verdade, diretores e presidentes do Banco, bem como Governadores agiram mal e geraram um déficit que, no futuro, será assimilado por toda a sociedade. O povo de Roraima é que pagará o prejuízo do Banco de Roraima, assim como é o povo do Amapá que arcará com o prejuízo do Banco do Amapá, o que não está certo. Temos de buscar a responsabilização daquelas pessoas que agiram mal, para que não sejam tomadas como exemplo e para que a gestão pública seja feita de maneira adequada. Gostaria de fazer esse alerta ao Banco Central e também a V. Exª, para que todos nós possamos acompanhar essa questão e exigir, após as investigações, que os responsáveis sejam punidos e cobrados pelas dívidas impingidas ao Estado do Amapá e também ao Estado de Roraima. Parabéns a V. Exª.

O SR. GILVAM BORGES (PMDB-AP) - Incorporo o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento.

E convenhamos, não há como eximir de responsabilidade a figura do Governador Capiberibe, em última instância, o autor das nomeações das autoridades financeiras locais, hoje envolvidas em tão sórdidas e rasteiras fraudes.

Como é sabido, a culpa que origina a responsabilidade de ressarcimento ou a aplicação das sanções administrativa, civil ou penal não consiste apenas de atos ou omissões do autor. Tem culpa até mesmo quem não agiu pessoalmente.

Tal é a situação de quem, por imperícia, negligência ou imprudência, encarrega um preposto inidôneo da execução de qualquer ato ou negócio jurídico. Esta é, na melhor das hipóteses, o caso do Governador Capiberibe, responsável por ter escolhido mal a administração do Banco Estadual.

Ainda que lhe seja dado o benefício da dúvida sobre sua participação direta nas negociatas, sua culpa em relação ao assunto persiste. Trata-se da culpa in legendo, ou seja, da culpa de quem não sabe escolher os que executarão por ele políticas públicas vitais para o Estado, mostrando o total descaso para com os correntistas e para com o povo em geral, que agora se encontra privado de uma estratégica agência propiciadora do desenvolvimento econômico-regional.

Por tudo isso, envidaremos todos os esforços para elucidar cada aspecto, por mais obscuro que seja, dessa questão e dar a maior transparência pública ao que for apurado, para que o povo do meu Estado tenha a exata medida da inépcia ou do eventual dolo daqueles em que depositou não só sua confiança política, mas até mesmo entregou de boa-fé suas poupanças pessoais.

Assim, acompanharemos passo a passo as investigações a serem desenvolvidas pelo Ministério Público Federal, encarregado, através da respectiva ação civil pública e ação penal cabível, de determinar a extensão das falcatruas e de identificar precisamente a cadeia de responsabilidades, para que sejam tomadas as devidas sanções e reparações, podendo chegar até ao impeachment do Governador do Amapá, conforme o grau de envolvimento nesse triste episódio que enche de vergonha o honesto povo amapaense.

A tal ponto chegou o escândalo que já corre no Ministério Público Federal o Processo 08100.005898/97-29, de natureza criminal, tipificando, no caso, a ocorrência dos seguintes delitos: estelionato, gestão temerária ou fraudulenta, falsificação de documento público, uso de documento falso, formação de quadrilha ou bando e falso reconhecimento de firma.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, este golpe teria repercussões danosas para o País, chegando a atingir a comunidade internacional.

Neste ponto, cabe ressaltar serem gritantes os indícios de participação ativa do Sr. Capiberibe nestas lamentáveis ocorrências.

Só a título de exemplo destes indícios, pode-se citar o fato de que a firma responsável pela colocação dos títulos emitidos pelo Banap nos mercados norte-americano e europeu tem sede no Canadá e como razão social "Hugger International Investiment Corporation", sabendo-se das estreitas ligações do Chefe do Executivo Estadual com aquele País, tendo, inclusive, retornado de lá há poucos dias.

Ademais, é quase impossível alegar-se falta de ciência do Governador de fatos de tal montante e gravidade, uma vez que essas operações e negociações datam de dezembro de 1996, já tendo sido emitidos doze certificados de depósitos, totalizando a impressionante cifra de 6,58 bilhões de reais.

Não se tem notícia de golpe com tamanha ousadia por parte da quadrilha!

Para finalizar e tentar pôr cobro aos desmandos que têm marcado a administração do Sr. Capiberibe, trazendo à tona, com a máxima nitidez possível seus malfeitos, estamos hoje requerendo à Comissão de Fiscalização e Controle do Senado Federal a instauração de uma auditoria no Bacen, com vistas a dar mais agilidade às investigações em curso naquela instituição.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o meu mandato neste Senado já dura três anos. Nunca ocupei esta tribuna para fazer ataques pessoais, embora faça oposição ao Governo do Estado. Faço agora essa denúncia, Sr. Presidente, porque considero inadmissível que o Governador do meu Estado vá aos meio de comunicação dizer que não tem conhecimento de um golpe de seis bilhões de dólares. É simplesmente querer chamar o povo de idiota! Que diretoria estaria afinada, recebendo as orientações devidas do gestor maior do executivo estadual?

Lembram-se V. Exªs de que por apenas 900 milhões de dólares ocorreu um escândalo com aquele banco de 100 anos de tradição na Inglaterra? Imaginem uma operação calçada, entregando a metade das matas virgens do Mato Grosso.

Falsificação, Sr. Presidente, de assinaturas de diretores do Banco Central. E o Governador dizer que não tinha conhecimento?! Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, imaginem se essa operação viesse a ser consumada, o escândalo e as dificuldades que o País iria atravessar, com repercussões internacionais. Seria um abalo muito grave para o nosso querido Estado do Amapá.

Faço um apelo ao Senador João Rocha, Presidente da Comissão de Fiscalização e Controle do Senado Federal, que, ao receber o nosso requerimento, tome providências imediatas, para que o Tribunal de Contas da União seja acionado o mais rapidamente possível no sentido de apurar-se todo esse escândalo.

É muita ousadia, Sr. Presidente. Não se tem notícia na história de uma quadrilha ameaçando o sistema financeiro nacional e as relações internacionais do nosso País!

Concluindo, Sr. Presidente, agradeço a paciência de V. Exª e dos nobres Pares. Que Deus nos proteja e que a verdade venha à tona! Se o meu Governador fosse um homem de vergonha e de caráter e tivesse o senso da honestidade em um escândalo dessa proporção, teria vergonha e renunciaria ao seu mandato!

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/09/1997 - Página 18409