Discurso no Senado Federal

TRANSCURSO DO DIA DA AMAZONIA, EM 5 DE SETEMBRO, RESSALTANDO QUE MUITO PRECISA SER REALIZADO NAQUELA REGIÃO PARA QUE O SEU DESENVOLVIMENTO POSSA ACONTECER DE UMA FORMA SOCIALMENTE JUSTA E ECOLOGICAMENTE CORRETA. MANIFESTAÇÃO PACIFICA REALIZADA POR OCASIÃO DO DIA DA INDEPENDENCIA, DENOMINADA O 'GRITO DOS EXCLUIDOS'.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL.:
  • TRANSCURSO DO DIA DA AMAZONIA, EM 5 DE SETEMBRO, RESSALTANDO QUE MUITO PRECISA SER REALIZADO NAQUELA REGIÃO PARA QUE O SEU DESENVOLVIMENTO POSSA ACONTECER DE UMA FORMA SOCIALMENTE JUSTA E ECOLOGICAMENTE CORRETA. MANIFESTAÇÃO PACIFICA REALIZADA POR OCASIÃO DO DIA DA INDEPENDENCIA, DENOMINADA O 'GRITO DOS EXCLUIDOS'.
Aparteantes
Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 09/09/1997 - Página 18398
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, DIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA, NECESSIDADE, ADOÇÃO, POLITICA, GOVERNO, GARANTIA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, COMPATIBILIDADE, SITUAÇÃO SOCIAL, ECONOMIA, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE.
  • INICIATIVA, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), ORGANIZAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, MUNICIPIO, APARECIDA (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, NECESSIDADE, COMBATE, EXCLUSÃO, NATUREZA SOCIAL, MAIORIA, POPULAÇÃO, BRASIL, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS.
  • NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, GOVERNO, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA, BRASIL, PROMOÇÃO, INCLUSÃO, NATUREZA SOCIAL, POPULAÇÃO.

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no dia 5 de setembro - sexta-feira passada - foi o Dia da Amazônia. Não temos muito o que comemorar, mas devemos lembrar às autoridades e a nós mesmos que muito precisa ser realizado naquela região para que o seu desenvolvimento possa acontecer de uma forma socialmente justa, ecologicamente correta, possibilitand aos 17 milhões de brasileiros que ali vivem condição digna de vida.

Lamentavelmente, desde a falência da empresa extrativista, o que observamos é um crescimento exagerado das cidades, realidade que afeta todos os Estados da Amazônia, alguns mais que outros. O exemplo mais significativo é o Estado do Amazonas, onde mais de 70% da população vivem nas cidades, mais precisamente na capital; em segundo lugar, está o Estado do Acre, onde mais de 50% vivem na região urbana. Se verificarmos as demais regiões do País, com certeza perceberemos que a realidade é semelhante.

O que precisa ser feito para que a Amazônia deixe de ser lembrada apenas numa data e seja celebrada todos os dias, dada a sua grande importância para o Brasil e para o mundo, é que se estabeleça um plano de desenvolvimento que considere as experiências que vêm sendo realizadas por entidades não-governamentais, sindicatos, associações, cooperativas, governos municipais e estaduais, enfim, aqueles que têm projetos de desenvolvimento compatíveis com a realidade social, econômica e ambiental da região.

É fundamental que o Governo Federal compreenda que, na Amazônia, o Estado não está presente em demasia nos diferentes setores da economia; ao contrário, ele está ausente até mesmo naquelas atividades que devem ser da sua responsabilidade, como saúde, educação, investimento em pesquisa e tecnologia.

Faço questão de fazer este registro, porque, no dia da Amazônia, 5 de setembro, ainda não temos muito que comemorar; temos muito que cobrar, tanto do Governo quanto de cada indivíduo, inclusive de mim mesma, para que o desenvolvimento da nossa região possa acontecer de forma sustentável e socialmente justa.

Desejo também falar sobre os acontecimentos de ontem: a comemoração da nossa independência, o Dia da Pátria, o 7 de setembro, algo que vem sendo motivo de reflexão principalmente por parte da Igreja Católica, por meio da ação dos bispos. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil levou à cidade de Aparecida mais de 150 mil pessoas, para essa reflexão conjunta sobre os problemas sociais que estamos enfrentando.

A luta contra a exclusão social e em favor de uma democracia que leva em conta o sofrimento, o sentimento e o crescimento dos indivíduos é tarefa de todos os seres humanos, e não apenas um privilégio da Igreja Católica ou de outras igrejas. Trata-se de obrigação de todos os que não toleram a apartação social que ocorre em todo o mundo e, com muita força, no Brasil.

Em alguns momentos, tenho dito, ao fazer alusão a um fenômeno que ocorre periodicamente na Região Amazônica, que os melhores lagos não são os que permanecem eternamente isolados, mas aqueles que se deixam encher, de vez em quando, por novas águas. São as novas águas que trazem novos peixes, novos microorganismos e novos nutrientes que fazem crescer e diversificar a vida.

Assim também, no meu entendimento, deve ser a postura dos governantes. Antes de tentar transmitir à sociedade que o "Grito dos Excluídos", manifestação realizada ontem, no Dia da Pátria, é mais um ato de oposição, é fundamental que o Governo busque identificar de que maneira tais manifestações podem contribuir com a nossa democracia; que contribuições efetivamente serão dadas para resolver os graves problemas sociais que estamos enfrentando na área da saúde, da educação, do atendimento aos excluídos de um modo geral, bem como a questão da reforma agrária, da democratização das possibilidades de vida digna para a maioria do nosso povo.

Sempre que ocorrem determinadas manifestações ou comemorações, os governos se apressam em dar algumas respostas na data do acontecimento. Espero que essas tentativas de resposta não sejam mais uma satisfação para a mídia, mas uma preocupação em resolver os problemas que o Brasil enfrenta.

É preciso que os governos deixem de responder a fatos, com posicionamentos que, muitas vezes, não são levados a cabo. Quanto à verbalização do Presidente da República de que é fundamental o combate à exclusão social, de que é essencial que as crianças freqüentem a escola - cerca de 9% das nossas crianças estão fora dela -, com tudo isso a sociedade brasileira concorda. Resta saber se essa atitude se dará na prática, se passará do verbo para a ação concreta, algo que possibilita aos cidadãos medir as ações dos governantes.

É isso que o Brasil espera daqueles que estão no Palácio do Planalto. É isso que o Brasil espera do Congresso Nacional e de cada cidadão brasileiro, mas, principalmente, de quem tem uma responsabilidade maior, que é o Presidente Fernando Henrique Cardoso.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso disse as seguintes palavras, com relação ao problema da exclusão social:

      "Não existe liberdade onde impera a violência. Não há democracia onde prevalece a discriminação. Não se constrói a igualdade onde segmentos expressivos da população são excluídos da participação das riquezas, da cidadania política ou do saber."

Com tudo isso os brasileiros - velhos e jovens - concordam. Mas é preciso sair para uma ação concreta; é sair das constatações, das intenções e afirmações para as realizações.

Nesse sentido, é fundamental que o Governo agilize o processo da reforma agrária, já que conta com grande apoio do povo brasileiro. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra promoveu uma grande discussão e conseguiu a sociedade brasileira como aliada. Esse é um presente que nenhum outro governante recebeu do povo brasileiro.

É fundamental que o Presidente Fernando Henrique Cardoso encare a reforma agrária como uma das metas prioritárias para a inclusão social; é primordial que o programa do Governo na área social compatibilize ações emergenciais com políticas efetivas de geração de emprego e renda.

Na Amazônia, geração de emprego e renda significa atividades econômicas sustentáveis, que possibilitem o processamento da nossa matéria-prima, transformando-a em atividades geradoras de empregos para milhares de excluídos que hoje não têm condição de sobrevivência.

É fundamental que os programas de saúde e de educação sejam levados a cabo pelo Governo numa parceria com a sociedade, permitindo as que estão à frente melhorem a qualidade desses serviços necessários para a maioria dos brasileiros.

O Dia da Pátria será de comemoração, poderá ser um dia de reflexão, mas também um dia de reparação e, como tal, não basta o anúncio das intenções. É necessário que esse dia seja um marco de realizações que precisam ter continuidade, mas que, principalmente, tenham início, pelo menos em alguns setores que hoje estão completamente desassistidos por parte do Governo.

Devo dizer que tenho muito respeito pela Drª Ruth Cardoso e também pela Drª Ana Maria Peliano, que, à frente do Programa Comunidade Solidária, tenho absoluta convicção, têm se esforçado para encontrar as respostas para os problemas que o Brasil está vivenciando. Mas não basta uma ação de boa vontade dos que ocupam postos-chave no Governo. É preciso haver uma ação de Governo articulada com os Ministérios, em que a solidariedade e a parceria, que muitas vezes se cobra da sociedade, sejam realizadas efetivamente entre os diferente órgãos de Governo.

Sempre tenho dito que os responsáveis pela ação social e ambiental deste Governo parece, muitas vezes, que pregam no deserto para os demais segmentos do próprio Governo, criando uma relação esquizofrênica, porque, entre os programas, que no papel até são muito bonitos, e a possibilidade da sua realização há uma grande diferença, agravada pela insensibilidade muito grande por parte, principalmente, dos responsáveis pela área econômica.

Se há uma resposta em termos do crescimento do Produto Interno Bruto, imagina-se então que o crescimento econômico e o desenvolvimento social já estão resolvidos. Não se busca saber, efetivamente, se esse crescimento significa a melhoria das condições de vida da população brasileira, traduzindo isso nos benefícios sentidos pela maioria dessa população. E, então, as figuras simbólicas, muitas vezes utilizadas para ilustrar o quanto o Brasil está vivendo às mil maravilhas, são motivo de riso da imprensa e da sociedade brasileira.

Tenho buscado sempre contribuir, dentro das minhas limitações, naquilo que posso, para dar respostas efetivas aos problemas vividos pela população brasileira, particularmente, da região onde tenho atuado com maior ênfase: a Amazônia. Nunca me neguei a oferecer sugestões para os problemas sentidos pela população da minha região, independentemente de Governo. Para mim, isso é fazer política grande; é fazer política com pê maiúsculo. E espero que, da parte do Governo, essa grandiosidade seja bem maior no sentido de ouvir o Grito dos Excluídos, a colaboração que a Igreja, o Movimento Social e o Parlamento têm a oferecer.

Com certeza, as respostas não virão das batinas nem da tecnocracia dos gabinetes, mas da ação concreta de homens e mulheres de bem capazes de renunciar às suas vaidades para fazer aquilo que é fundamental para o povo brasileiro.

Nesse sentido, a resposta e a colaboração que a CNBB tem tentado oferecer, levantando os problemas sociais, não está em nenhum momento imbuída de qualquer tipo de prepotência de ser uma resposta de batina. É, isto sim, uma contribuição que qualquer governante deve tomar, analisar e encaminhar junto aos seus Ministérios para que, efetivamente, sejam dadas as respostas que a sociedade brasileira está a esperar.

Com estas palavras, Sr. Presidente, Srs. Senadores, devo dizer que ontem, Sete de Setembro, foi um dia de manifestações contra a exclusão social, poderia ser um dia de reparação das injustiças praticadas e o início da efetivação do que o Governo tem anunciado como fundamental para reparar os problemas que ele mesmo reconhece ao dizer não existir democracia onde existe exclusão social.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB/MS) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª MARINA SILVA (BLOCO-PT/AC) - Concedo aparte a V. Exª.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB/MS) - Senadora Marina Silva, cumprimento-a pela oportunidade do seu pronunciamento. Realmente, ontem, o Brasil, como sempre, comemorou o Dia da Pátria. Foi com alegria que vimos o Desfile Cívico Militar, vimos o entrosamento das nossas Forças Armadas com a população civil, principalmente com a nossa juventude, em festa pela comemoração de mais um ano da independência política do nosso País. Ontem, como V. Exª está salientando em seu pronunciamento, houve também uma manifestação democrática. Estas, quando dentro da ordem, da lei, quando encampam causas justas, como a dos excluídos, dos desempregados, dos que clamam por melhores dias, regozijamo-nos no Senado da República, demonstram o amadurecimento das instituições brasileiras, demonstram que o Brasil realmente caminha para o aperfeiçoamento democrático. Vejam - V. Exª salientou muito bem - o caráter reivindicatório dessas manifestações em favor dos desprotegidos, em favor de maior justiça social, para poder sintetizar o aparte que faço ao brilhante pronunciamento de V. Exª. E nós, no Senado da República, por meio de V. Exª, estamos dando a nossa solidariedade, aplaudindo o acontecimento cívico, popular, a manifestação das entidades, daqueles que estão pedindo melhores dias. Tudo isso é altamente alvissareiro e nos anima a prosseguir na luta em favor de um País que queremos cada vez mais justo, mais humano e mais cristão. Meus cumprimentos a V. Exª.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço a V. Exª pelo aparte e o incorporo ao meu pronunciamento.

Concluo, Sr. Presidente, dizendo que a democracia é fundamental para o crescimento de qualquer civilização. A democracia, como muitas vezes tem dito o Deputado José Genoíno, é o meio e é o fim, é a nossa causa, porque é a partir dela que poderemos construir uma civilização que aprenda a valorizar os direitos dos seres humanos.

Nesse sentido, as manifestações que tivemos ontem pela comemoração do Dia da Pátria foram pacíficas, ordeiras e, acima de tudo, colocaram o Brasil num encontro consigo mesmo, com a sua realidade de país em que muitas pessoas não têm terra para plantar, não têm teto, não têm emprego, não têm saúde, não têm educação, mas uma nação que tem muita coragem, ousadia, criatividade e, acima de tudo, disposição para superar seus problemas.

As instituições públicas, os governos federal e estadual e o Congresso Nacional devem aproveitar essas novas águas do movimento social, possibilitadas pela democracia, para se alimentar dos melhores nutrientes e fazer valer aquilo que é o desejo da nação brasileira: a justiça social, que, hoje, lamentavelmente, não vem acontecendo em função dos diversos problemas que acabei de elencar.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/09/1997 - Página 18398