Discurso no Senado Federal

O PAPEL DOS PEQUENOS PRODUTORES RURAIS NA ECONOMIA DE RONDONIA. NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DAS INSTITUIÇÕES DE PESQUISAS E EXPERIMENTAÇÕES AGRICOLAS (EMBRAPA/CPAF - RO E CEPLAC), DE EXTENSÃO RURAL E ASSISTENCIA TECNICA (EMATER). DEFESA DE RECURSOS MAIS VULTOSOS PARA OS BANCOS OFICIAIS (BANCO DO BRASIL E BANCO DA AMAZONIA), A FIM DE APOIAREM PROGRAMAS VOLTADOS PARA O PEQUENO PRODUTOR E PARA A AGRICULTURA FAMILIAR COMO O FNO E O PRONAF.

Autor
Odacir Soares (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • O PAPEL DOS PEQUENOS PRODUTORES RURAIS NA ECONOMIA DE RONDONIA. NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DAS INSTITUIÇÕES DE PESQUISAS E EXPERIMENTAÇÕES AGRICOLAS (EMBRAPA/CPAF - RO E CEPLAC), DE EXTENSÃO RURAL E ASSISTENCIA TECNICA (EMATER). DEFESA DE RECURSOS MAIS VULTOSOS PARA OS BANCOS OFICIAIS (BANCO DO BRASIL E BANCO DA AMAZONIA), A FIM DE APOIAREM PROGRAMAS VOLTADOS PARA O PEQUENO PRODUTOR E PARA A AGRICULTURA FAMILIAR COMO O FNO E O PRONAF.
Publicação
Publicação no DSF de 09/09/1997 - Página 18421
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ANALISE, MODELO, AGRICULTURA, ESTADO DE RONDONIA (RO), PREDOMINANCIA, PEQUENO PRODUTOR RURAL, TRABALHO, FAMILIA, DEFESA, POLITICA AGRICOLA, INCENTIVO, ATIVIDADE AGRICOLA, PEQUENA PROPRIEDADE.
  • DEFESA, REFORÇO, ORGÃOS, PESQUISA, EXTENSÃO, ASSISTENCIA TECNICA, ESPECIFICAÇÃO, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), COMISSÃO EXECUTIVA DO PLANO DA LAVOURA CACAUEIRA (CEPLAC), EMPRESA DE ASSISTENCIA TECNICA E EXTENSÃO RURAL (EMATER), NECESSIDADE, APOIO, GOVERNO, FUNDO CONSTITUCIONAL DE FINANCIAMENTO DO NORTE (FNO), Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).

O SR. ODACIR SOARES (PTB-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs., uma discussão muito encontradiça entre os economistas rurais, é a do dualismo da chamada agricultura empresarial ou "agricultura de ponta" e da agricultura familiar. Por se tratar do tipo de agricultura mais disseminada em Rondônia, e que preside os destinos da economia do Estado, dedicar-me-ei a discutir a participação e o papel do pequeno produtor rural.

A agricultura de Rondônia tem como base produtiva o migrante, o trabalhador rural, o meeiro ou pequeno produtor, que chegou a Rondônia, contando com um único capital e ferramenta: a sua força de trabalho e de sua família.

Utilizando um informe do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento-PNUD, de 1996, sobre desenvolvimento humano, faremos a seleção de trechos que destacam as virtudes e contribuições mais marcantes que as pequenas propriedades trazem à agricultura brasileira e, de modo particular, à agricultura do Estado de Rondônia.

As pequenas propriedades utilizam os recursos de forma mais eficiente que as grandes propriedades. Essa afirmação tem uma conseqüência bem conhecida em matéria de políticas: uma estratégia de desenvolvimento agrícola que fomente as pequenas propriedades, em lugar das grandes propriedades, pode servir ao mesmo tempo aos objetivos do crescimento econômico e da distribuição de renda, produzindo como resultado uma sociedade mais igualitária.

Muitas provas acerca de países tão diversos como o Brasil e a Índia indicam que existe uma relação inversa entre a dimensão das propriedades rurais e nível de produção e uso de mão-de-obra por unidade de superfície. Um estudo acerca das terras no Nordeste do Brasil assinala que a produção dos imóveis com até 10 hectares equivalia a 85 dólares norte-americanos, por hectare, enquanto que a produção bruta nos imóveis de mais de 500 hectares, equivalia a somente dois dólares por hectare.

Um estudo sobre a India, Sr. Presidente, revelou que os estabelecimentos de até cinco acres (1 acre = 0,40 hectares) tinham uma produção equivalente a 737 rúpias (moeda padrão da Índia) por acre, enquanto que os estabelecimentos com mais de 25 acres a produção equivalia a somente 346 rúpias por acre. O fator decisivo nesta relação inversa é a forma como funcionam os fatores de mercado especialmente o mercado de trabalho rural. As razões mais importantes dessa relação são:

. Intensidade do uso da terra: na medida em que aumenta o tamanho das propriedades, vai-se reduzindo a proporção de terras em uso produtivo.

. Densidade de mão-de-obra: há uma relação inversa entre tamanho do imóvel e a quantidade de mão-de-obra por unidade de superfície.

Para os pequenos agricultores, o custo de oportunidade da mão-de-obra é baixo, porque combina-se a força de trabalho da família com preços relativamente elevados da terra e do capital, enquanto que os agricultores grandes enfrentam o problema de um maior preço da mão-de-obra contratada, somada a preços relativamente baixos da terra e do capital.

Devido a essas diferenças quanto aos preços relativos dos fatores, os pequenos agricultores familiares dedicam à produção mais mão-de-obra que os grandes agricultores, e estes consideram a terra como recurso relativamente abundantes, substituindo a mão-de-obra por máquinas.

Os pequenos agricultores poderiam ser ainda mais produtivos se pudessem adquirir mais terras ou obter crédito a preços razoáveis. Esses agricultores necessitam de quantidades relativamente pequenas ( a parte a mão-de-obra) para obter grandes aumentos do produto. Os grandes, ao contrário, requerem grandes quantidades de capital para lograr o mesmo aumento no rendimento com uso da mecanização.

Considerando que o capital é um recurso escasso, essa é uma alternativa socialmente ineficiente para aumentar a produtividade na agricultura.

Em uma situação em que o predomínio de grandes imóveis na distribuição da terra é tão forte, não há nenhuma manipulação de preços relativos ou de impostos que possam modificar o papel fundiário.

A conclusão principal é que uma estratégia de desenvolvimento agrário, centrada na agricultura familiar e não nos latifúndios, aumenta simultaneamente a eficiência social do uso dos recursos na agricultura e melhora a eqüidade social por meio da criação de empregos e da distribuição mais igualitária da renda gerada pelos pequenos produtores.

Uma outra importante manifestação sobre o papel da agricultura familiar, colhi no artigo do professor José Eli da Veiga, livre-docente do Departamento de Economia e presidente do programa de pós-graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo, publicado no "O Estado de São Paulo", edição de 26 de julho de 1997.

O tema do artigo do professor José Eli da Veiga, é "O Padrão Binswanger de Agricultura Bem-Sucedida", no qual comenta documento preparado pelo consultor do Banco Mundial, Hans P.Binswanger. Segundo Binswanger, o Brasil, a África do Sul e a Colômbia, são nações que adotaram um padrão de desenvolvimento agrícola e rural caracterizado pela "expulsão prematura de trabalho".

A partir dos anos 60, o Brasil, a África do Sul e a Colômbia, passaram a adotar políticas governamentais com o objetivo de promover a superação de relações anacrônicas de trabalho por meio de caríssima modernização de grandes fazendas que envolveram crédito subsidiado, investimentos a fundo perdido em infra-estrutura e sistemas estatais de comercialização (no Brasil, por exemplo, o extinto Instituto Brasileiro do Café-IBC, e Instituto do Álcool e Açúcar-IAA).

Uma modernização que condenou um grande número de agricultores à decadência; levou grande parte da força de trabalho rural a favelizar periferias das grandes cidades; fez dobrar ou triplicar o número de pobres rurais, elevando a níveis insuportáveis a violência, a destruição ambiental e a criminalidade. Essa é a visão do consultor do Banco Mundial, Hans P.Binswanger.

Segundo ele, o padrão oposto é o dos países que conseguiram promover uma modernização na qual o crescimento agrícola resultou em drástica redução da pobreza. Uma modernização baseada em unidades de produção tocadas por famílias, com pesados investimentos em tecnologias para produtores de pequeno porte e uma tributação leve ou mesmo inexistente carga fiscal para a agropecuária.

Esse foi o padrão, diz Binswanger, da América do Norte; padrão adotado, após a 1ª Guerra Mundial, por toda a Europa (incluindo a Grã-Bretanha); após a 2ª Guerra Mundial, pelo Japão, Coréia do Sul e Taiwan; mais tarde, pela Indonésia e Malásia e, a partir de 1978, pela China.

Isso não quer dizer que essas agriculturas não tenham também "expulsado trabalho". Basta lembrar que, em apenas 20 anos (1950-1970), enquanto o Primeiro Mundo dobrava sua produção alimentar o pessoal ocupado na agricultura americana diminuía de 23 milhões para 10 milhões e, na agricultura européia, de 42 milhões para 22,6 milhões. Também não quer dizer que tenham evitado a redução do número de estabelecimentos, principalmente os de menor área. Mas foi um processo gradativo.

Na França, por exemplo, o processo deu-se em quatro etapas. Primeiro, atingiu os que tinham área inferior a 5 hectares. Em segundo, entre 1955 e 1963, alcançou os de área entre 5 e e 10 hectares. Num terceiro momento, entre 1963 e 1967, estes últimos continuaram a diminuir, mas o estrato posterior de 10 a 20 hectares, passou a imitá-los. E foi só no final da década de 1960, que o processo passou a atingir as unidades com área entre 20 e 35 hectares.

É importante notar, que a elevação da área média não alterou a distribuição: o número de unidades com área inferior à média representava dois terços do total, tanto no início quanto no fim do período.

Em qualquer processo de modernização agrícola, são os menos aptos a adotar novas tecnologias os condenados a desistir. Mas isso também é um processo. Enquanto são apenas os agricultores de vanguarda que adotam uma inovação produtiva, a oferta aumenta pouco e não afeta significativamente o preço de mercado.

Até aí, quem produz com custos mais altos do que a vanguarda ainda pode se manter. É somente quando uma grande massa de produtores imita a vanguarda que o preço de mercado despenca, por causa do forte aumento da oferta. E é a partir daí que os mais retardatários constatam que as receitas não cobrem mais os custos, sendo levados a deixar o agronegócio.

O que não é intrínseco a qualquer processo de modernização é que sejam os agricultores familiares os menos aptos a adotar inovações, e os grandes fazendeiros os mais aptos a adotá-las. Também não é obrigatório que somente os grandes fazendeiros estejam capacitados a comprar ativos postos à venda pelos que saem do mercado. Isto depende de políticas governamentais.

Nos Estados Unidos o número de agricultores caiu de mais de seis milhões, em 1920, a menos de dois milhões, enquanto que a área média dos establecimentos subia de 60 hectares para quase 200 hectares. Mas o caráter familiar da agricultura americana não parou de se afirmar. O último censo mostra que a participação das corporações patronais no valor das vendas do setor é declinante, representando apenas 6% em 1992. As vendas das sociedades de tipo familiar aumentaram, chegando a 21%.

A tradicional agricultura familiar foi responsável por 54% da produção comercializada. E os restantes 19% referem-se a outras formas societárias que não podem ser rigorosamente classificadas como familiares ou patronais.

O padrão que Binswanger considera "bem-sucedido"é característico de sociedades que valorizam a agricultura e o espaço rural e, por isso, preferem ter muitos agricultores familiares e poucos bóias-frias, a ter muitas favelas e um punhado de "reis", sejam eles do gado, da soja, da cana ou da laranja.

No padrão bem-sucedido há uma clara opção preferencial pela agricultura familiar. A opção inversa é o cerne do padrão de "expulsão prematura de trabalho" que parece tão inevitável aos entusiastas do patronato agrícola brasileiro.

É certo, Sr. Presidente e Srs. Senadores, que o Movimento dos Sem-Terra, está chamando a atenção da sociedade para o problema social, e este é tão agudo que as políticas do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, caminham na direção de efetivar a Reforma Agrária. Por outro lado o Governo está vivamente empenhado na efetivação do Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar-PRONAF, o que levará de certa forma, a contraditar a assertiva do consultor Hans P.Binswanger, do Banco Mundial, de que o modelo brasileiro de desenvolvimento rural condenou o Brasil à miséria.

Se é verdadeira a afirmativa de Binswanger, é certo também que o Governo Fernando Henrique Cardoso, está fortemente empenhado em resgatar tão importante setor da penúria e da miséria.

No caso específico do setor agropecuário de meu Estado, Rondônia, o nascimento da atividade nasceu sob os auspícios do pequeno produtor, dos migrantes que se fixaram na região. Desde a atividade do café, o carro-chefe do setor, passando pelo cacau, algodão, produção de alimentos e pecuária de leite, quem mais produz é o pequeno produtor. Com exceção da pecuária de corte, onde Rondônia conta efetivamente com grandes criadores, tudo nosso é de pequeno porte.

O que precisamos, Sr. Presidente, é de fortalecer as instituições de pesquisa e experimentação agrícola (EMBRAPA/CPAF-RO e CEPLAC), de extensão rural e assistência técnica (EMATER); destinar mais recursos para os Bancos oficiais (Banco do Brasil e Banco da Amazônia) a fim de apoiar programas voltados para o pequeno produtor e para a agricultura familiar, como o FNO e o PRONAF.

Rondônia precisa obter ganhos em produtividade e preparar-se para ser mais competitiva. Precisa, também, manejar com mais responsabilidade, e com sustentabilidade os seus recursos naturais: de solos, de águas, de florestas, de fauna, em benefício do homem rondoniense.

Muito Obrigado


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/09/1997 - Página 18421