Discurso no Senado Federal

DENUNCIANDO O TRABALHO DO GOVERNO NO SENTIDO DE QUE SEJA DECRETADA A FALENCIA DA CONSTRUTORA ENCOL E DA INVIABILIZAÇÃO DE QUALQUER ACORDO COM AS EMPRESAS MULTINACIONAIS INTERESSADAS NA SUA COMPRA. SOLICITANDO A INCLUSÃO NOS ANAIS DO SENADO FEDERAL DE ARTIGO DO JORNAL GAZETA MERCANTIL DE HOJE, SOBRE A QUESTÃO DA ENCOL.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA POPULAR.:
  • DENUNCIANDO O TRABALHO DO GOVERNO NO SENTIDO DE QUE SEJA DECRETADA A FALENCIA DA CONSTRUTORA ENCOL E DA INVIABILIZAÇÃO DE QUALQUER ACORDO COM AS EMPRESAS MULTINACIONAIS INTERESSADAS NA SUA COMPRA. SOLICITANDO A INCLUSÃO NOS ANAIS DO SENADO FEDERAL DE ARTIGO DO JORNAL GAZETA MERCANTIL DE HOJE, SOBRE A QUESTÃO DA ENCOL.
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/1997 - Página 18736
Assunto
Outros > ECONOMIA POPULAR.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, OBJETIVO, DECRETAÇÃO, FALENCIA, DIFICULDADE, NEGOCIAÇÃO, EMPRESA ESTRANGEIRA, INTERESSADO, AQUISIÇÃO, EMPRESA DE ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, PREJUIZO, MUTUARIO.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, GAZETA MERCANTIL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), PROPOSTA, ADVOGADO, PREVISÃO, ARRESTO, LEILÃO, IMOVEL, EMPRESA DE ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, PREJUIZO, MUTUARIO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dirijo-me aos Srs. Senadores e ao povo para fazer uma denúncia contra o Governo Fernando Henrique Cardoso. Como eu havia prometido, estive reunido com o Dr. Edson Soares Ferreira, Diretor de Crédito Geral do Banco do Brasil, e, pelo que entendo, pessoa do Governo encarregada de resolver o problema da empresa Encol.

Em primeiro lugar, chamo a atenção para o caos em que estamos vivendo. A impunidade gera o inconformismo no seio da nossa população. Somos um País que estamos a assistir falcatruas de toda ordem, cometidas por pessoas poderosas, milionárias, e a elas absolutamente nada acontece. Foi o caso dos rombos do Sistema Financeiro Nacional, ao qual o Governo imediatamente socorreu com R$25 bilhões. No entanto, ninguém foi preso até hoje, ninguém perdeu os seus bens ou deixou de continuar levando uma vida de mordomias, usufruindo das riquezas que roubou.

Agora, surge o caso da Encol, outro escândalo nacional, em que naturalmente o dono e os diretores dessa empresa, pelo que as reportagens de todo o Brasil mostram, estão ainda cheios de dinheiro. Cada um dos antigos diretores da Encol possui cinco ou seis empresas. E o Governo, nesse caso específico da Encol, está "lavando suas mãos".

Isso é ruim, porque não se toma nenhuma providência contra quem cometeu o crime e porque se deixam abandonados 12 mil funcionários e 42 mutuários que confiaram nesse Sistema Financeiro de Habitação.

O quadro que verificamos neste País é dantesco. Policiais militares, pelo salário miserável que ganham, pelas dificuldades que enfrentam e pela má índole que têm - alguns desses policiais entram na Polícia sem que se perceba a sua má índole -, cometem os crimes que estamos a assistir nestes últimos dias, como o assassinato bárbaro daquela criança de oito anos de idade e o seqüestro da filha do Deputado Distrital Luiz Estevão, crimes cometidos por oficiais e soldados da Polícia Militar.

Isso é extremamente lamentável! Este País está vivendo um enorme caos. Quando não se punem diretores de bancos e donos de uma empresa como a Encol, que deram desfalque, é muito fácil não se punirem policiais militares que fazem greve, desrespeitando a Constituição, e policiais civis, que a fazem armados e mascarados. Às vezes, até mesmo o MST, num movimento de ação legítima - porque o Governo não atende à demanda da sociedade no que se refere à reforma agrária -, extrapola nessa sua ação.

Que moral tem o Poder Executivo para exigir o cumprimento da lei pela Polícia Militar, pela Polícia Civil ou pelos militantes do MST, quando não prende os responsáveis por desfalques? Então, isso gera uma situação em que a sociedade age de maneira a se defender. É o que vamos assistir no caso da Encol.

Quero denunciar, neste plenário, que o Governo está trabalhando pela falência da Encol, a pior das soluções.

Essa decisão não poderia ter sido tomada sem que antes se avaliasse a questão, sem que se tivesse conhecimento do patrimônio da empresa, de quanto valem os esqueletos das 700 obras que iniciou e de qual o montante de seu débito. Ninguém tem conhecimento desses valores.

O Dr. Edson Soares Ferreira, que, tenho certeza, está falando pelo Ministro Pedro Malan e pelo Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso, faz colocações totalmente incoerentes.

S. Sª mostrou-me, ontem, um documento da Encol - o qual não me entregou por considerar confidencial -, em cujas informações diz acreditar, mas afirma taxativamente desconhecer a situação da empresa e que seria preciso levá-la à falência para que se tivesse acesso a esses dados. Estivemos reunidos com S. Sª durante duas horas - de meio dia às 14h05min -, buscando alternativas para o problema, mas o Governo, além de não querê-las, ainda quer atrapalhar uma possível saída, porque não foi capaz de levantar as contas da Encol durante os cinco meses em que o administrador que indicou esteve à frente da empresa.

Eu só aceitaria que o Governo defendesse a falência após obter esses dados concretos, mas o que existe é uma planilha da Encol acusando um déficit de R$1,8 bilhão e uma outra, do Sr. Pedro Paulo, que mostra um superávit da empresa.

Repito que o Governo não foi capaz de fazer esse levantamento e, de certa forma, está tentando impedir que as duas empresas multinacionais interessadas na compra da Encol - a World Mae e a CB Commercial Real State -, efetivem um acordo.

Na verdade, todos querem contribuir para que isso seja feito; os mutuários, de uma maneira geral, estão ávidos por se reunirem e levantarem a situação de prédio por prédio, possibilitando a apresentação dessas contas, mas o Governo não se interessa sequer em unir os interesses comuns.

O INSS entrou com uma ação e um Juiz Federal proferiu sentença bloqueando os bens da Encol e do Sr. Pedro Paulo. Com os outros diretores, que estão fora, não houve problemas. Ora, assim, está totalmente inviabilizado qualquer acordo com as duas empresas que têm interesse na compra, porque ainda que promovam essa auditoria, não poderão proceder às negociações, já que o Governo Fernando Henrique Cardoso, através do Ministério da Previdência Social e de uma ação judicial, bloqueou os bens da Encol. Enquanto os bancos ainda não o fizeram, enquanto as pessoas desistiram dos pedidos de falência já em curso, enquanto os mutuários não entraram na Justiça para garantirem seus direitos - todos esperando uma solução negociada - o Governo Fernando Henrique Cardoso procede de maneira a inviabilizar qualquer acordo da Encol com a World Mae ou a CB Commercial Real State.

O Governo está sendo absolutamente irresponsável diante dessa questão. Quando os bancos foram à falência, de maneira diferente, imediatamente arrumou dinheiro para subsidiá-los, a fim de que se recuperassem. Naturalmente - e aqui tenho dito permanentemente -, não o fez para resguardar os interesses dos poupadores brasileiros, mas para preservar os recursos internacionais, aplicados no sistema financeiro a juros que representam um verdadeiro paraíso para europeus, japoneses e americanos. Para manter seu bom nome internacionalmente, foi capaz de sacrificar o Tesouro e de captar dinheiro, pagando juros mais altos do que aqueles que recebe dos banqueiros, pois existem muitos europeus, americanos e japoneses com recursos financeiros aplicados no Brasil, ganhando 30% ao ano, quando, nos seus países, no máximo ganhariam 4%.

O Governo foi capaz de atender esse segmento, mas não é capaz sequer de avaliar a real questão da Encol. Diz que só pode fazê-lo se houver falência e chega a uma proposta absurda, para a qual os mutuários devem ficar alerta: faz-se a falência; durante 90 dias, faz-se a arrecadação dos bens e, posteriormente, a terceira fase da falência, o leilão desses bens.

Sr. Presidente, Senador Ronaldo Cunha Lima, atente para a idéia absurda do Governo e a frieza da sugestão do Sr. Edson Soares Ferreira - e ele fala, inclusive, como se o Juiz já estivesse pronto a fazer o que está sendo sugerido. A proposta dele é a seguinte: os cascos dos prédios seriam leiloados e os mutuários teriam preferência para a compra desses prédios com os créditos que eles têm. Ora, nessa circunstância, o Governo criaria a seguinte situação: o prejuízo para uns seria quase zero, enquanto para outros seria total. Por quê? Porque um prédio pronto, habitado e onde o investimento dos mutuários é menor do que o valor do prédio, é fácil leiloar, é fácil para os mutuários que ali residem entrar com os seus créditos para a compra desse imóvel; eles teriam que pagar apenas o que falta para terminar o prédio. Num prédio em estágio avançado de construção, isso fica tranqüilo. No entanto, imaginem quem comprou num prédio que está no segundo, terceiro ou quarto andar ou num prédio que ainda está na planta, ou no caso de alguém que deu uma propriedade sua ou que quitou um apartamento num prédio que ainda está na planta!? Quer dizer, as pessoas que vão participar de um leilão desses, entrarão com os seus créditos, que podem representar cem, para pagar um bem imóvel que vale dez.

Portanto, o que o Governo está propondo é o seguinte: uma parte dos mutuários seria atendida, aquela cujos prédios estão numa situação avançada de construção. A outra parte dos mutuários levaria quase que um prejuízo total, porque pagarão cem por aquilo que vale dez; porque eles já pagaram cem, o prédio está ainda na fase inicial, ele vale apenas dez. Quer dizer, para terminar de construir, praticamente vai ter que comprar novamente, isto é, pagar pelo mesmo imóvel. É uma situação que, evidentemente, os mutuários do Brasil não vão aceitar. Talvez 50% tenham um prejuízo de zero, que é pequeno; e os outros 50%, tenham um prejuízo quase total de todos os seus investimentos. Então, essa idéia do Governo é inaceitável pelos mutuários.

O que os mutuários estão propondo é que todos se sentem à mesa e que seja levantado o déficit da empresa, o seu ativo e o passivo, isto é, o patrimônio que a Encol tem, o que deve, e vamos ver qual é a diferença. A diferença é um bilhão? Tudo bem! Então, vamos dividir esse bilhão entre todos os credores da Encol, sem exceção: Governo, mutuário, empregado. Talvez até pudesse tirar os empregados fora, e pagar integralmente o que a empresa deve a eles, mas dividir, igualitariamente, esse prejuízo entre o Governo, os bancos e os mutuários. Esta é a proposta que está sendo feita pela Associação dos Mutuários. Mas todos os mutuários, sem exceção, entrariam com a mesma parcela de prejuízo. Não estamos querendo que o Governo tire dinheiro do Tesouro, como ele tirou para atender as necessidades dos banqueiros - e o Sr. Ciro Gomes, há poucos dias, deu um depoimento no qual dizia que o prejuízo que o povo brasileiro e o Tesouro estão tendo, em função do socorro aos bancos, chega a R$8 bilhões, que esse dinheiro está saindo do nosso bolso, do bolso dos consumidores, enquanto que o prejuízo da Encol, se socorresse - e não é o que os mutuários estão querendo -, não chegaria a R$1 bilhão.

O Governo está sendo extremamente irresponsável nesta questão. Quero alertar os mutuários do Brasil inteiro, que eles devem ter atenção ao que está acontecendo, porque o Governo está trabalhando contra o interesse dos mutuários, está lavando as mãos diante deste grave problema.

Não sei se essa falência pretendida pelo Governo, através do Sr. Edson Soares Ferreira, do Banco do Brasil, não sei se o Banco do Brasil está ávido para receber os empréstimos que tem e que, aliás, não informa para ninguém, alegando ser sigilo bancário. Nunca vi uma coisa tão absurda como essa. Em um momento de tamanha dificuldade, em um momento em que todos querem receber informações precisas a respeito do débito da Encol, o Governo se nega a dizê-lo, porque, segundo ele, trata-se de uma informação sigilosa.

Então, trata-se de uma demonstração clara de que o Governo não quer, em hipótese alguma, resolver o problema da Encol, dando continuidade à empresa, que acredito ser a única solução viável. Não se pode pensar em falência da Encol. Se a Encol falir, o Governo será responsável por um verdadeiro caos que este País vai enfrentar. Por quê? Porque não duvido que ocorram suicídios, e o Governo será responsabilizado por isso, pois há pessoas que jogaram todo o investimento de uma vida inteira na Encol; não duvido que venha a ocorrer invasão dos prédios da Encol; não duvido que venha a ocorrer a destruição desses patrimônios da Encol; não duvido que venha a ocorrer violência, porque, ao decretar a falência, o arresto dos bens representa, inclusive, tomar 12 mil apartamentos de pessoas que já estão morando neles, cujos prédios estão hipotecados a bancos.

Sr. Presidente, imagine o que é ser proprietário de um apartamento quitado, estar morando nele e, de repente, não ter mais direito sobre esse imóvel, ter que desocupá-lo porque a Justiça terá que arrestar esse bem para poder fazer o leilão? Imagine o caos que isso representará, porque são 42 mil os mutuários que ainda não receberam o imóvel, mas há outros 12 mil mutuários que já estão morando em imóveis hipotecados aos bancos e, por isso, não têm a escritura. Imagine a situação de intranqüilidade que isso gerará no nosso País.

Penso que nós, Senadores, não podemos ficar alheios a essa questão. A Câmara dos Deputados criou uma Comissão Especial para tratar desse assunto. Esta semana houve uma reunião conjunta de três Comissões tratam dessa questão, e os Presidentes dessas três comissões, juntamente com a Comissão Especial, estão trabalhando para encontrar uma solução para o problema. Mas, percebemos da parte do Poder Executivo, depois de duas horas de reunião que tivemos, ontem, com o Sr. Edson Soares Ferreira, que a solução que o Governo quer é a falência da Encol. S. Sª disse claramente para mim: "Se a maioria tiver atendido o seu problema, o resto não importa, não importa que 20% dos mutuários - segundo ele - tenham um prejuízo total. Isso não é problema, pelo menos 80% foram atendidos." Quer dizer, há uma frieza por parte do Governo diante de uma questão como esta. Na verdade, penso que o cálculo de S. Sª está errado, porque, pela sua proposta, 50% teriam um prejuízo menor e 50% teriam um prejuízo quase total e absoluto.

Portanto, quero aqui fazer uma alerta aos mutuários da Encol: enquanto o Governo está pedindo a todos para que não entrem na Justiça, para que evitem qualquer ação judicial, ele, o Governo, entrou com uma ação judicial e, se ganhar, o patrimônio da Encol ficará preso e inviabilizará a possível solução de compra por empresas estrangeiras.

Então, queremos denunciar o Governo por essa ação que ele fez e o arresto do patrimônio da Encol e do Sr. Pedro Paulo, que inviabiliza qualquer outra negociação. Se o Governo não foi capaz e não assumiu a responsabilidade de levantar as contas da Encol, que permita pelo menos que essas empresas americanas e argentinas façam esse levantamento, que se dê tempo para resolver essa questão, mas não se pode agir de maneira irresponsável. Ou repito, ele será responsabilizado pelos suicídios, pelas invasões, pelas destruições, pelas violências, até possíveis mortes que poderão ocorrer neste País, diante desse caso tão grave que estamos assistindo.

Peço ao Governo, ao Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso que pense duas vezes sobre o que está ocorrendo e que tome para si esta questão, que seja responsável e que defina uma solução que não seja a falência da empresa, porque essa será o caos e a destruição.

Sr. Presidente, solicito que faça parte do meu pronunciamento a reportagem publicada, hoje, na Gazeta Mercantil sobre essa questão da Encol.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/1997 - Página 18736