Discurso no Senado Federal

REFLEXÃO TEORICA E DOUTRINARIA SOBRE O SISTEMA DE DOIS TURNOS PARA AS ELEIÇÕES NO BRASIL.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • REFLEXÃO TEORICA E DOUTRINARIA SOBRE O SISTEMA DE DOIS TURNOS PARA AS ELEIÇÕES NO BRASIL.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/1997 - Página 18741
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • ANALISE, INCOERENCIA, EXISTENCIA, BRASIL, SISTEMA ELEITORAL, SEGUNDO TURNO, MOTIVO, INCOMPATIBILIDADE, PRESIDENCIALISMO, PRECARIEDADE, FORMAÇÃO, COLIGAÇÃO, PARTIDO POLITICO, RESULTADO, EXCESSO, PLURIPARTIDARISMO, PAIS.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta semana, votamos, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, matéria relativa às eleições, votamos a chamada Lei Eleitoral. Na semana passada, também na mesma Comissão, foi aprovada uma emenda constitucional, visando reformar o sistema de dois turnos no Brasil.

Trata-se de tema muito sensível, delicado, que provoca uma certa emocionalidade, um nível de tensão um pouco mais alto, pois estamos em véspera de ano eleitoral. O ano de 1998 será o ano em que inauguraremos no Brasil o sistema de recandidaturas - esse deveria ser o termo devidamente adotado para o caso que, institucionalmente, estabelecemos no Brasil. Ou seja, permitimos que os atuais governantes, os atuais detentores de cargos executivos possam candidatar-se para o mesmo cargo, isto é, podem apresentar uma recandidatura, recandidatar-se ao cargo que ocupam.

Na verdade, Sr. Presidente, toda vez que, num ano anterior às eleições, temas legislativos, temas de ordem normativa a respeito da matéria vêm à tona, emergem aqui no Senado, ocorre também uma intensa polêmica. E acho muito natural, perfeitamente explicável e justificado, porque esta é uma Casa que tem seu nascedouro na competição legítima que a democracia exige, que é o pleito eleitoral.

Uma preliminar que deve ser levada em consideração é quanto ao fato de ser ou não aplicável às eleições de 1998 uma eventual reforma do sistema de dois turnos. Essa preliminar é importante, não pode ser desconsiderada e, em função dela, é possível até votar contra ou a favor de uma emenda que venha a suprimir esse sistema.

Mas, ultrapassando-a, faço uma reflexão de ordem talvez mais teórica e doutrinária a respeito da experiência que está sendo vivida no Brasil em relação a esse assunto.

Em primeiro lugar, um depoimento de quem foi Relator-Adjunto na Assembléia Nacional Constituinte e de quem foi Relator-Titular da Comissão que elaborou o texto do sistema de dois turnos.

Fui Relator dessa matéria, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, e estabelecemos um sistema tripartite de trabalho. Formou-se uma Comissão do Poder Executivo; outra, do Poder Legislativo; e uma terceira, do Poder Judiciário. Essas três Comissões trabalharam separadamente. Enquanto nas Comissões dos Poderes Legislativo e Executivo trabalhava-se na direção de um regime parlamentarista, nas demais Comissões da Assembléia Nacional Constituinte, o trabalho era dirigido para um regime presidencialista.

Recordo-me, inclusive, de que, quando chegamos a uma votação terminal no plenário, já estávamos diante desse hibridismo inevitável, já estávamos diante dessa contradição explícita, que era o fato de que a estruturação montada nas Comissões para o sistema de Governo e para o regime eleitoral adotado eram de índole parlamentarista, e toda a estruturação constitucional se voltava, de resto, para o regime presidencialista.

Quando chegamos ao plenário, votou-se o sistema de Governo e deu-se vitória a uma emenda presidencialista. Com a vitória do presidencialismo, aplicou-se a emenda sobre o texto que havia e mantiveram-se, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os hibridismos que, até então, vigoravam. E um desses pontos, digamos assim, de hermafroditismo político é exatamente a questão do sistema de dois turnos. É muito raro encontrar um regime presidencialista puro no mundo que adote o sistema de dois turnos. O caso da Argentina é exceção, mas é bom recordar que o segundo turno para a eleição presidencial na Argentina se dá no Congresso. Portanto, a Argentina não serve de exemplo nem de elemento semelhante. Por outro lado, o país que é o nascedouro, o criador, o inventor do regime presidencialista, o País de Thomas Jefferson e George Washington, os Estados Unidos, adota um sistema eleitoral que não inclui os dois turnos.

Então, este é um primeiro dado: trata-se de um hibridismo, de um corpo estranho. É uma análise técnica e não ética, porque tanto o sistema de dois turnos quanto o de turno único são amplamente democráticos. Não se trata aí de questionar a ética democrática do sistema, mas de salientar uma questão técnica. Do ponto de vista funcional do sistema, é como um órgão que tem um corpo estranho, de alguma maneira, estabelecendo certas disfunções, certos desarranjos.

Em segundo lugar, é importante salientar que o Brasil é o único País presidencialista do mundo que tem um regime multipartidário. E aqui quero fazer uma diferença entre pluralismo partidário, ou seja, o pluripartidarismo, e o multipartidarismo, que são coisas diferentes. Embora os prefixos aparentemente possam dizer a mesma coisa, do ponto de vista da sociologia política não se referem à mesma coisa. O pluralismo partidário, o pluripartidarismo, é o sistema pelo qual há liberdade de organização partidária e há diversidade de representação social e política. O multipartidarismo é a deformação, é o exagero, é a forma abusada e equivocada da utilização da instituição do pluralismo partidário, que é tão saudável e tão necessária à vida democrática.

Pois bem, todos os regimes presidencialistas do mundo, todos, sem exceção, elaboraram uma legislação eleitoral, elaboraram sistemas eleitorais que fazem confluir as forças políticas para um reduzido número de Partidos - não apenas para dois ou três Partidos, mas para um pequeno número de Partidos. Tão notória, tão indiscutível, tão evidente é essa tendência que só há um país no mundo em que o processo político é disputado, decidido, conduzido por mais de 20 Partidos - como, por exemplo, na nossa Câmara dos Deputados -, que é o nosso grande e querido Brasil de todos os brasileiros.

Pois bem, inventamos um sistema que o mundo não havia ousado ainda inventar: o regime presidencialista multipartidário - esfacelamento, pulverização, disseminação, dispersão dos Partidos. Qual é o resultado disso? Temos ou não, queiramos ou não, façamos bom proveito disso ou não, seja bom para o Governo ou seja mal, o resultado inevitável é o que estamos vivenciando hoje, em nosso País, que é a existência de um Congresso sem poder de iniciativa, sem autonomia de conduta, sem capacidade de autocomando. Congresso pulverizado é congresso que não tem iniciativa, ou ele é empurrado de fora pelo Governo ou pela opinião pública ou ele nada faz. O registro disso é a extrema raridade, a quase total inexistência de iniciativas originais do Congresso. O Congresso trabalha ou aprovando leis que o Governo manda ou estabelecendo CPIs que a imprensa pressiona para que existam, mas a sua iniciativa é extremamente débil, anêmica e inconseqüente.

Portanto, quero chamar a atenção para o quanto é disfuncional ao regime democrático o multipartidarismo no regime presidencialista. O multipartidarismo em um regime parlamentarista, como o da Itália, pode ser até bom, embora nem lá a estabilidade exista. Mas lá o regime é parlamentarista; o governo sai do Parlamento. Logo, há uma total interação, um equilíbrio do Governo com o Parlamento.

No entanto, temos um regime partidário como o da Itália, com dezenas de Partidos, e adotamos não o parlamentarismo, como adotaram os italianos, mas o regime presidencialista. O resultado disso é que o Congresso vira uma espécie de "Geni", porque nenhuma decisão que saia de dentro dele sai como resultado de uma autodeterminação, de um autocomando, como uma autoprodução, ou seja, como uma geração autóctone de decisões. Essa é a verdade, Sr. Presidente. Um Congresso assim é sempre objeto das mais candentes críticas, e creio que essas críticas, na imensa maioria das vezes, são inteiramente procedentes e justificáveis.

Ora, o regime de dois turnos empurra para a pulverização partidária, porque força os Partidos, no primeiro turno, a lançarem candidatos para se habilitar, mesmo que não vençam, mesmo que não se posicionem entre os dois primeiros classificados, mesmo não sendo bem votados, porque isso permite que, no segundo turno, possam negociar parcelas de responsabilidade ou na Oposição ou no Governo. Portanto, eis uma questão que quero registrar como mais um ponto que me parece merecedor de reflexão: os dois turnos são um instrumento de pulverização partidária, de esfacelamento partidário.

Recordo-me aqui da campanha eleitoral que experimentamos recentemente em Porto Alegre, na minha cidade. Pelo fato de termos dois turnos, o PMDB, o meu Partido, lançou um candidato excelente, homem da mais alta qualificação, mas obviamente houve um erro político. É evidente que era preciso haver uma convergência, um acordo prévio, uma coligação. E ela não se deu, por quê? Porque não é interessante fazer coligação quando o sistema é de dois turnos. O interessante é espraiar, o interessante é pulverizar para depois, com o ganho de valor adquirido no processo eleitoral, com a importância e com o poder político que é adquirido no primeiro turno, fazerem-se as negociações de segundo turno. Esse é um sistema que empurra para a disseminação partidária.

No entanto, Sr. Presidente, parece-me que o inverso, isto é, que o sistema de turno único empurra para uma convergência prévia, para uma predefinição partidária em torno de coligações ou até em torno de confluência dos Partidos.

Veja V. Exª, estamos vivendo um momento pré-eleitoral no Brasil - se assim já se pode chamar esse período de tentativas, de audácias, de projeções que alguns candidatos já estão fazendo - e há quem queira se candidatar pelo Partido Socialista Brasileiro sem nunca ter sido socialista porque imagina que, estando no primeiro turno, dentro dessa esfera política, no segundo turno, obterá apoio. Primeiro divide; depois, obtém a unidade e a união políticas.

O fato, Sr. Presidente, é este: os dois turnos funcionam como um estímulo ao divisionismo partidário. Eu que defendo com unhas e dentes o pluralismo quero dizer que o multipartidarismo, no regime presidencialista, é extremamente disfuncional e extremamente contrário a uma valorização e a uma força cêntrica mais adequada ao Congresso Nacional.

As convergências devem ser feitas previamente, porque o sistema de dois turnos faz com que, no espaço de tempo entre os dois turnos, num período de pouco mais de 15 dias, sejam feitas as coligações. Elas são feitas de maneira extremamente precária e imperfeita. Eu diria até que são tão malfeitas que ficam como coligações mal resolvidas até o fim do mandato.

Não vou longe: apesar da competência do Governador Antônio Britto, apesar da habilidade com que S. Exª lida com a coligação sobre a qual governa o Rio Grande do Sul, como a coligação foi montada para o segundo turno, até hoje seus dois Partidos políticos mais fortes vivem numa ambivalência, numa ambigüidade enorme; não sabem se são aliados ou se não são; vivem em contradições permanentes. Portanto, as alianças de segundo turno são precárias e com uma tendência à insolvência.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP.) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS) - Tendo encerrado o meu raciocínio, dou a palavra a V. Exª, com muito prazer.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Permita-me, Senador José Fogaça, discordar de V. Exª. Estou acompanhando com atenção o seu pronunciamento, no qual V. Exª pondera a favor e contra o sistema de dois turnos. É perfeitamente possível haver uma coligação de natureza precária e esta dar certo. Isso pode ocorrer com o sistema de um ou de dois turnos. O Presidente Fernando Henrique Cardoso, disputando a eleição num sistema de dois turnos, venceu ainda no primeiro turno; entretanto, acabou formando uma coligação que, em alguns momentos, dá certo; em outros, entra em curto-circuito. Por exemplo, além do PSDB e do PFL, que o apoiaram desde o início, acabou formando uma coligação com o Partido de V. Exª, em parte - havendo dissidências aqui e acolá; com o PPB, que também tinha outro candidato à Presidência, e com outros Partidos. Essa coligação, pelo que podemos observar nesses quase três anos de governo, por vezes, caminha coordenadamente; por outras, entra em choques, como é próprio de uma heterogeneidade bastante grande, num País como o Brasil, possuidor de Partidos grandes. Entretanto, ouvindo com atenção V. Exª, não consigo me convencer de que o sistema de dois turnos não ofereça, de fato, maior possibilidade de escolha, sobretudo ao eleitor. Avalio que o sistema de dois turnos dá mais opções ao eleitor - principalmente quando ele tem três, quatro, cinco, seis possíveis candidatos concorrendo a um cargo executivo - de escolher aquele que realmente considera o melhor. E, caso o seu candidato não se eleja no primeiro turno, ele ainda tem a possibilidade de escolher, digamos, a sua segunda melhor opção. E, quando há quatro, cinco ou mais candidatos, é perfeitamente possível que cada eleitor tenha uma primeira e melhor opção e uma segunda e melhor opção. Estamos experimentando há pouco tempo o sistema de dois turnos para querermos destruí-lo ou torná-lo algo que já foi suficientemente experimentado. Observo, da experiência relatada por V. Exª sobre o que aconteceu em Porto Alegre, um exemplo que pode não ter dado tão certo; mas, do ponto de vista do aperfeiçoamento da democracia, da possibilidade de o eleitor ter maior liberdade de escolha, dadas as vantagens e desvantagens ponderadas por V. Exª, ainda estou convencido de que é melhor para o eleitor ter mais possibilidades. Inclusive...

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS) - Se V. Exª me permitir, eu quero pedir que V. Exª seja breve no aparte, embora muito interessante. Eu pediria que V. Exª fosse o mais breve possível.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - É a última frase. Por que razão, basicamente, é melhor para o eleitor? Temos que pensar nele. Porque havendo dois turnos, possivelmente haverá mais candidatos, mais opções haverá para ele e, depois, será dele a opção de escolher qual é o melhor dentre as possibilidades se não houver a maioria de 50% ou mais.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS) - Senador Eduardo Suplicy, o aparte de V. Exª foi longo, até já me esqueci do início da sua intervenção.

Mas, precariamente, lembro-me que V. Exª disse, no início da sua intervenção, que o Governo Fernando Henrique foi eleito em um turno só. Isto é verdade. A ele depois se agregaram outros Partidos, dentre eles o meu, o PMDB, o PTB mais tarde, e são esses quatro partidos, basicamente, em torno dos quais o Governo se sustenta no Congresso Nacional.

Agora, se V. Exª olhar bem, vai ver qual é a coligação que realmente funciona. Qual é a coligação que tem dado certo, qual é a coligação que está comandando o Congresso, qual é a coligação que é estável, que tem harmonia, convergência e funcionalidade? É a coligação feita antes da eleição, com acordos prévios, sólidos, definidos, com tempo e racionalidade para tomar decisões. É a coligação entre o PSDB e o PFL. Ela é a que funciona.

O PMDB, como entrou num processo precaríssimo, não consegue saber até hoje se ele é ou não Governo. Não me refiro ao aspecto formal. Formalmente, o PMDB é Governo, houve uma decisão oficial, tomada pelo Conselho Político do Partido, e registrada. Mas temos um partido cujas bancadas atuam como partido de Governo e cujo presidente nacional faz oposição radical ao Governo.

Essa precariedade foi gerada nesse processo de alianças feitas açodadamente, que também são geradas pelo sistema de dois turnos.

Senador Eduardo Suplicy, quero agradecer a V. Exª por ter-me dado o argumento, talvez definitivo, do qual eu precisava para mostrar que alianças feitas com antecipação, com antecedência, são as melhores, as mais sólidas, as que têm mais funcionalidade.

Sr. Presidente, para concluir - percebo que o meu tempo está-se esgotando -, eu gostaria de apresentar dois argumentos. O primeiro deles é que os candidatos que passam para o segundo turno gastam todas as suas propostas conseqüentes e sérias no primeiro turno. Propostas de trabalho, de obras, de administração e de projetos sérios e conseqüentes, tudo isso se esgota no programa de televisão gratuito, no primeiro turno.

No segundo turno, os candidatos não querem repetir que vão asfaltar determinada rua, que vão construir um certo hospital, que vão realizar uma obra numa determinada estrada ou que vão tratar da educação. Não! As questões transcendentais, importantes e fundamentais já foram gastas, consumidas e inteiramente apresentadas pelos candidatos no primeiro turno.

Como eles não querem se repetir, o que sobra para o segundo turno? Um festival de agressões mútuas, de palavrões, muita vezes, e de baixarias políticas.

Recordo-me do segundo turno entre o ex-Governador Alceu Collares e o Deputado Nelson Marchezan na eleição para o Governo do Rio Grande do Sul, em que o final da história teve o Deputado Marchezan na Polícia Federal, investigando o então Deputado Alceu Collares, e o candidato Collares na Justiça, tentando incriminar o Deputado Marchezan por calúnia e difamação.

Este, Sr. Presidente, é um sistema que se arrasta para a grosseria política, porque não há mais o que dizer no segundo turno. É só troca de insulto e agressão! E a agressão torna-se pessoal; é uma "deseducação" política que se instala no sistema de dois turnos. Felizmente, o Presidente Fernando Henrique Cardoso não viveu esse momento, porque venceu no primeiro turno.

Mas recordo-me que, no segundo turno entre Collor e Lula, o Sr. Collor utilizou-se da filha do Lula, de uma ex-companheira do Lula, porque a agressão tinha que ser pessoal, tinha que destruí-lo pessoalmente. Essa baixeza só ocorreu porque, no sistema de dois turnos, não há mais o que dizer no segundo turno!

Tudo o que havia de positivo e bom foi gasto no primeiro turno. O sistema de dois turnos é um estímulo à grosseria e à falta de ética política.

Por último, Sr. Presidente, nós, aqui, no ano passado, vivemos uma situação interessantíssima no Congresso: foram 60 dias sem fazer nada, sem votar uma lei. Foi durante o período eleitoral? Não. As eleições já tinham terminado. Mas havia o segundo turno em São Paulo, uma grande capital, a maior do País, que é apenas uma cidade, é apenas um Município. Embora São Paulo seja a locomotiva do País, o Congresso Nacional não pode parar porque há segundo turno em São Paulo ou porque há segundo turno no Rio de Janeiro. E como havia segundo turno em São Paulo e no Rio de Janeiro, o Congresso parou por 60 dias, à espera do processo político.

Esta é a outra infeliz decorrência do sistema de dois turnos: o País pára, além de todo o período eleitoral, por mais 60 dias, até a divulgação dos resultados oficiais e o Congresso não vota nada, não faz nada, não se aplica em nada, porque está aguardando as decisões do processo político.

Daí por que, Sr. Presidente, ressalvada a preliminar de que uma emenda constitucional suprimindo os dois turnos possa até valer apenas para as próximas eleições, para além de 98 - ressalvada esta preliminar, que discuto, porque é uma questão importante, a mudança brusca do sistema pode não ser algo inteiramente acertado -, do ponto de vista doutrinário, do ponto de vista político, do ponto de vista institucional, do ponto de vista técnico-político não tenho nenhuma dúvida de que o sistema de dois turnos não funcionou no Brasil.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/1997 - Página 18741