Discurso no Senado Federal

COMENTANDO RELATORIO PUBLICADO PELA ONU PARA 1997, QUE CLASSIFICA OS 175 PAISES QUANTO AO INDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO E, EM ESPECIAL, A POSIÇÃO DO BRASIL.

Autor
Coutinho Jorge (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando Coutinho Jorge
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • COMENTANDO RELATORIO PUBLICADO PELA ONU PARA 1997, QUE CLASSIFICA OS 175 PAISES QUANTO AO INDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO E, EM ESPECIAL, A POSIÇÃO DO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 19/09/1997 - Página 19570
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), POSIÇÃO, CLASSIFICAÇÃO, PAIS, INDICE, DESENVOLVIMENTO, QUALIDADE DE VIDA, VIDA HUMANA, CRESCIMENTO ECONOMICO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, NIVEL, RENDA, POPULAÇÃO, EXPECTATIVA, VIDA, QUALIDADE, EDUCAÇÃO.
  • ANALISE, POSIÇÃO, BRASIL, CLASSIFICAÇÃO, RELATORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), DESENVOLVIMENTO, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.

O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Organização das Nações Unidas publicou, recentemente, o seu relatório para 1997 sobre o desenvolvimento humano referente a 175 países do mundo, cujos dados são relativos a 1994, como fez no ano passado em relação a 1993.

Nesse relatório, ela classifica os 175 países em várias categorias, dentro do chamado índice de desenvolvimento humano. O que significa esse índice? Falamos em crescimento econômico e desenvolvimento econômico. Na verdade, desenvolvimento humano é o fim buscado; crescimento econômico é o meio para alcançá-lo. Portanto, o crescimento econômico tem por objetivo, sobretudo, criar condições para enriquecer a vida das pessoas nos seus aspectos materiais, emocionais e espirituais. Mas, muitas vezes ou grande parte das vezes, não o faz.

Na verdade, verifica-se - e a própria Organização das Nações Unidas analisou - que não existe claramente qualquer ligação, qualquer correlação automática, podemos assim dizer, entre crescimento econômico e desenvolvimento humano. A não ser que sejam viabilizadas e fortalecidas, por meio de uma gestão política inteligente, as chamadas políticas compensatórias, corretivas ou indutoras.

O relatório da Organização das Nações Unidas demonstra que, em geral, é necessário que os países, para o advento do século XXI, precisam ter um expressivo crescimento econômico. Mas é importante que se mostre que a atenção a esse crescimento deve ser quanto à estrutura e à qualidade, de tal ordem que se possa assegurar o desenvolvimento humano, reduzindo a pobreza e minimizando os efeitos negativos do meio ambiente.

Em relação ao crescimento econômico, é bom lembrar que esse relatório mostra o alargamento entre as disparidades no desempenho econômico desses países, criando um mundo polarizado, entre pobres e ricos; e os dados são importantes. Dos 23 milhões do PIB mundial, ou seja, daquilo que é produzido, consumido, exportado, deduzidas as importações, 18 bilhões são dos países industrializados, só cinco bilhões pertencem aos demais países não desenvolvidos, que, no entanto, têm 80% da população mundial.

Além disso, mostra que, em 30 anos, o rendimento global dos 80% mais pobres decresceu de 2.3 para 1.4, enquanto que, no mesmo período, houve um acréscimo do rendimento dos 20% mais ricos da população mundial de 75% para 85%, representando o crescimento do fosso das disparidades regionais, nacionais e pessoais de renda do mundo.

Ora, como medir um índice de desenvolvimento humano tão importante como esse? É claro que a socioeconomia é complexa, mas podemos simplificá-la através de indicadores de modelos e selecionar alguns fatos importantes e algumas prioridades. Esse índice se baseou em três dimensões fundamentais. Primeira: uma vida longa e saudável; segunda: o conhecimento que as pessoas devem ter; e terceira: exatamente o padrão de vida de cada pessoa decente. Nesse sentido, foram escolhidas três variáveis básicas: a esperança de vida, o nível educacional e o rendimento das pessoas. Ou seja, esses índices variam de zero a um, e os países sobem nessa escala conseguindo um tempo médio de vida de 85 anos, um acesso global de toda a população à educação e um padrão de vida decente, com uma renda e um PIB per capita em níveis mais altos. Portanto, seria medir com uma régua, variando de zero a um, a obtenção desses objetivos importantes, que são: a esperança de vida, a qualidade educacional e a qualidade de renda das pessoas.

Ora, a Organização das Nações Unidas conseguiu utilizar todos esses critérios e essas variáveis e fazer a sua mensuração mundial do desenvolvimento humano.

Vamos analisar rapidamente a posição do nosso País, nos anos de 1993 e 1994, no ranking dos 175 países, baseada nos estudos da ONU.

O Brasil, em relação a 1997, que corresponde ao ano de 1994 nos dados, está na 68ª posição.

Uma amostra da posição brasileira, em 1996, é interessante. Os índices ou os indicadores utilizados foram: esperança de vida à nascença, taxa de alfabetização de adultos, taxa de escolaridade bruta conjunta dos 1º, 2º e 3º Graus, o PIB real per capita, o PIB real ajustável, índice de esperança de vida, índice de educação, índice do PIB, ou seja, indicadores globais importantíssimos, que são reflexos daquelas três variáveis a que me referi no início.

Nesse sentido, Canadá, Estados Unidos, Japão, Holanda, Noruega, Finlândia, França, Islândia, Suécia, Espanha, em 1996, estavam entre os dez primeiros, ou seja, os de desenvolvimento humano mais elevado. O Brasil estava classificado na 58ª posição.

Os estudos publicados recentemente pelas Nações Unidas, numa análise de 1994, mostra uma nova posição no ranking do desenvolvimento global; os países que estavam nos dez primeiros lugares, continuam mais ou menos na mesma posição, mudando apenas entre eles. Canadá em primeiro lugar, seguido da França, Noruega, Estados Unidos, Islândia, Países Baixos, Japão, Finlândia, Nova Zelândia e Suécia entre os dez primeiros.

Entre os países latino-americanos mais bem classificados, temos o Chile na 30ª posição, Argentina na 36ª e Uruguai na 38ª.

É importante lembrar que as Nações Unidas classificaram essa hierarquia do índice de desenvolvimento humano em três grandes grupos: o chamado desenvolvimento humano elevado, desenvolvimento humano médio e o inferior ou baixo.

O Brasil é um dos primeiros no índice de desenvolvimento humano médio, mas temos vários países da América Latina que citei há pouco, como Chile, Argentina e Uruguai, que estão no patamar acima, no chamado índice de desenvolvimento humano elevado. Portanto, trata-se de um indicador importantíssimo!

Quero, nesse sentido, em relação aos aspectos da publicação do recente relatório da Organização das Nações Unidas, tecer algumas ilações e considerações. Realmente, houve algumas mudanças, como um pequeno ajuste para melhor, no Brasil, neste índice que passou de 0,74 para 0,783. Quero lembrar, que o índice varia de zero a um; nenhum país possui índice um. Os países desenvolvidos, todos eles estão na escala de 0,98, 0,99, e assim sucessivamente.

De qualquer maneira, houve uma pequena melhora nesse índice do Brasil, mas não foi suficiente para elevá-lo da categoria do índice médio para o elevado, como em alguns países da América Latina, como é o caso do Chile, da Argentina e do Uruguai. O Brasil, portanto, continua como um País de desenvolvimento humano médio, atrás do Líbano, Suriname e Rússia, por exemplo.

É claro que o Plano Real, em 1994, gerou impacto positivo - não tenho dúvida quanto a isso -, mas não foi suficiente para credenciar o Brasil a subir uma hierarquia a mais nesse ranking do desenvolvimento humano mundial. De qualquer forma, vamos esperar que a pesquisa de 1995, que será publicada em 1998, mostre a melhoria do Brasil nesse sentido.

Segundo estatísticas da ONU, a expectativa de vida dos brasileiros era, em 1993, de 66 anos, como foi também em 1964. De qualquer maneira, esse estudo mantém o Brasil na faixa média do desenvolvimento humano. A taxa de mortalidade de menores de cinco anos ficou acima da média, com 60 casos para cada mil crianças nascidas vivas. Os gastos de saneamento também não variaram, permanecendo nesses dois anos - 1993 e 1994 - com 2.8% do PIB.

Outros indicadores que aparecem no documento revelam que 73% dos brasileiros têm acesso à água potável; 44% ao saneamento básico; e existem cinco jornais por 100 habitantes e 25 televisores por cada 100. Esses são indicadores importantes que mostram, realmente, a melhoria da qualidade de vida.

A própria ONU criou um novo conceito: o conceito chamado pobreza humana, que une renda, duração de vida, analfabetismo e falta de acesso aos serviços comuns, como é o caso de saneamento, habitação, saúde e educação. Ora, em termos mundiais, poderemos dizer que, nos países em desenvolvimento como um todo, como o próprio relatório mostra, a pobreza humana afeta cerca de um quarto da população mundial. Já a pobreza por insuficiência de renda, ou seja, aquelas pessoas que vivem com menos de um dólar por dia, atinge 1.3 bilhões de pessoas.

Mas há outras necessidades básicas. Perto de 1 bilhão de pessoas são analfabetas no mundo e bem mais que 1 bilhão não tem acesso à água. A situação mundial é muito grave também. As Nações Unidas calculam que é possível banir a pobreza extrema do mundo até o início da próxima década, acelerando o processo de desenvolvimento econômico e, sobretudo, implementando políticas direcionadas à redução dessas disparidades, desses conflitos violentos, dessa degradação ambiental.

Nesse sentido, queria fazer algumas considerações. Segundo o relatório do Banco Mundial para o ano 2010 e para o ano 2020, o Brasil está entre os grandes países com um dos PIBs mais importantes do mundo. Essa tendência mundial é irreversível, não temos dúvida, mas precisamos tomar algumas decisões agora para que surtam efeito a médio ou a longo prazo. Há críticas em relação ao Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, no sentido de que ele não está executando as chamadas políticas corretivas, compensatórias na área do social.

Na semana passada, fizemos uma análise sucinta do Plano Plurianual e do Orçamento de 1998, mostrando as prioridades do Governo em relação à política do desenvolvimento social. Como Relator do PPA, mostrei que o Governo, sobretudo nas áreas habitacional e social, deixou de cumprir metas significativas, como o fez em relação à chamada infra-estrutura, sobretudo energia e comunicação. Disse, à época, que no chamado orçamento das fontes livres, que dão um total de R$32 bilhões, o Governo selecionou 60% desses recursos para a chamada política do desenvolvimento social, envolvendo, sobretudo, saúde, educação, saneamento, habitação para os mais carentes e a reforma agrária. O Governo Federal utilizou uma estratégia de planejamento selecionando programas e projetos do chamado Plano Brasil em Ação.

Já teci detalhes e análises técnicas sobre esse Plano, mostrando que a estratégia utilizada pelo Governo, como, por exemplo, gerenciamento firme, controle firme e a prioridade em termos de recursos para os programas alocados no Plano Brasil em Ação, seria ideal se fosse utilizada em todos os programas do Brasil, mas o Governo selecionou alguns e está colocando prioridades para a área social. É o exemplo do Refosus, na área de saúde, para atender todas aquelas construções inacabadas na área da saúde; é o caso da mortalidade infantil, que está colocado como prioridade; é o caso do programa de valorização do magistério e melhoria do ensino básico. É um programa fundamental, como veremos logo a seguir. Temos também o programa ligado à reforma agrária, o Pronaf, que é voltado à agricultura familiar. São programas - não tenho dúvida alguma - direcionados para a faixa de renda mais baixa e para a redução do fosso impessoal entre a renda dos brasileiros.

Esse é um passo inicial que precisa ser ampliado e acelerado. Em relação a essa questão, como membro da Comissão de Orçamento e Líder do meu Partido nessa Comissão, procuraremos aumentar os recursos, remanejando-os de outras áreas para esta do desenvolvimento social, cujos detalhes, realmente, apresentei no último discurso da semana passada.

Exatamente em relação à tese das Nações Unidas, do desenvolvimento humano, a performance do Brasil não é muito alvissareira. O próprio Ministro Pedro Malan, não se referindo a esse texto, mas sobretudo a um encontro que teve esta semana, na Convenção Nacional de Supermercados, mostra que, nesses três anos e dois meses de Plano Real, acabou o efeito da queda da inflação sobre a renda dos mais pobres. Ninguém em sã consciência poderia imaginar que a estabilidade econômica levaria, por si só, a um processo continuado de redistribuição de renda no País.

Ora, o importante é que saímos de uma inflação vergonhosa para uma inflação realmente civilizada, mas, só pelos impactos que o Plano Real tem trazido, isso não é suficiente para corrigir as distorções na área social. Significa dizer que a cesta básica teve, durante os três anos e dois meses do Plano Real, um incremento de 13% - praticamente não houve crescimento. Significa um benefício em favor das populações mais carentes. Não temos dúvida nenhuma sobre isso, mas o próprio Ministro reconhece que temos realmente que usar estratégicas compensatórias e corretivas, como o caso da melhoria do setor educacional, para reverter esse quadro negativo, global do problema da pobreza no Brasil.

Estão se reunindo hoje, em Hong Kong, o FMI e o Banco Mundial, para discutir as perspectivas do mundo desenvolvido e subdesenvolvido. Um dos assuntos que está sendo discutido e que faz parte de alguns relatórios do FMI diz respeito aos efeitos do Plano Real na vida dos brasileiros; ou seja, que o Plano ajudou a reduzir a questão da pobreza significativa nos dois últimos anos. Porém, adverte que ele não conseguirá sozinho produzir melhorias substanciais daqui por diante, se não houver mudanças, por exemplo, nas políticas educacional, de distribuição de terras e outras políticas compensatórias. O próprio especialista do FMI, Benedict Clements, mostra que a distribuição de renda tende a ser a mais desigual possível na América Latina e que entre os países da América Latina a maior distância entre pobres e ricos ocorre no Brasil. Ele usa o coeficiente de Gini para mostrar exatamente essa disparidade de renda entre os grupos e as regiões no País. Mas, de qualquer forma, o Relatório do FMI mostra que, apesar do índice tão alto, a situação brasileira melhorou muito a partir do real. Ele mostra que em, relação a esse aspecto, a taxa de pobreza brasileira foi reduzida de forma significativa no curto prazo de dois anos, passando de 30,4% da população, em 1993, para 20,6%, em 1995.

A própria equipe do Governo concorda com o FMI de que temos que redefinir políticas sociais, na área educacional, fundiária, etc, a fim de corrigir as distorções hoje verificadas, responsáveis pelo elevado índice de pobreza no País.

Ao Plano Real tem sido atribuído o declínio da pobreza e da desigualdade de renda, mas seus efeitos têm um limite, um patamar que está sendo exaurido. É fundamental que políticas compensatórias corretivas definidas e sugeridas pelas Nações Unidas, pelo FMI e pelo Banco Mundial sejam rigorosamente implementadas.

Não vou entrar em considerações sobre discussões que hoje se travam em Hong Kong acerca da atuação do Banco Mundial e do FMI. Isso será objeto de um pronunciamento especial. Quero apenas lembrar que o Banco Mundial publicou estudo a respeito dos cinco gigantes que, no ano 2020, terão produtos internos brutos significativos. É o caso do Brasil, da China, da Índia, da Indonésia e da Rússia. Também estudos de universidades inglesas e americanas mostram que o PIB brasileiro, a partir do ano 2005/2006, deverá estar incluído - possivelmente um PIB de US$ 1,3 trilhão -, entre os seis primeiros do mundo, na seguinte ordem: China, Estados Unidos, Japão, Alemanha, Índia e Brasil.

Não temos dúvida de que esse processo é irreversível.

Fazendo uma síntese do relatório do Banco Mundial: os cinco países, que hoje participam do total do PIB mundial com 7,8%, no ano 2020, terão uma participação de 16,1%. E os países desenvolvidos e ricos, que hoje detêm 84%, deterão apenas 70%. Isso mostra, portanto, uma efetiva participação desses cinco grandes países, que começam a crescer e a ter uma participação importante. O próprio Brasil, que hoje participa com 1,7% do PIB mundial, passará a ter uma participação quase dobrada de 2,5% no ano 2020.

É claro que essa é uma previsão, uma projeção, considerando que as variáveis, as políticas atuais continuem sendo realmente viabilizadas, o processo de globalização continue permitindo a abertura global do comércio internacional e as correções sobre os impactos negativos que esse processo traz, como o desemprego e outras seqüelas aconteçam.

Eram essas as considerações que gostaria de fazer sobre o resultado dos estudos das Nações Unidas em relação ao Índice de Desenvolvimento Humano.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, voltarei a falar sobre esse assunto para aprofundar a questão relativa às teses da globalização e as discussões que hoje estão sendo discutidas em Hong Kong pelo FMI e pelo Banco Mundial.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/09/1997 - Página 19570